ALEXANDER THOMSON-PAYAN, EMPRESÁRIO NORTE-AMERICANO

“Ao invés do medo, devemos pensar que será boa a vinda de empresários estrangeiros”

Assume-se como angolano e é assim que fala na primeira pessoa. Há 12 anos a viver e a liderar a empresa em Angola, sente-se “da terra” e, como tal, elogia as últimas medidas governamentais, sobretudo as de incentivo à entrada de estrangeiros. Avisa que não se deve ter medo, mas recomenda que o país não se iluda com o ligeiro aumento do preço do petróleo. Garante nunca ter corrompido, mas admite ter sofrido com isso.

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Que avaliação faz do estado actual da economia angolana?

Estamos numa situação perfeita, a sair de uma crise. Estamos a deixar de ser um dos países mais caros e difíceis de operar para ser um dos mais eficientes. Estão a registar-se mudanças que proporcionarão grandes oportunidades. A abertura das fronteiras, por exemplo, vai ser incrível para o desenvolvimento do país, visto que ficámos fechados por mais de 45 anos e era muito difícil entrar nos últimos 15. Com a abertura, o país poderá receber, com mais facilidade, tudo o que o mundo aprendeu e desenvolveu enquanto estivemos fechados.

Fala com muita expectativa, quando há sectores empresariais que ainda se manifestam receosos. Há alguma razão em particular?

É preciso crer, acreditar que as coisas boas vão acontecer. Acredito muito na capacidade das pessoas. Nós, TGI, por exemplo, não investimos em negócios, mas em pessoas. Se conseguirmos ser um grupo onde todas as pessoas evoluem, o grupo também vai desenvolver-se.

Uma das operações do grupo é o da prestação de serviços ao sector petrolífero, que foi um dos que mais se ressentiu com a crise. Como inverteu a situação?

Foi muito interessante. Olho para o mundo de forma um pouco diferente. Tudo no mundo é criado por átomos. Ou seja, positivo, neutro e negativo. Cientificamente, tudo no mundo tem o positivo, neutro e o negativo. Com a crise, obviamente, aconteceram muitas coisas negativas, perdemos contratos, mas comecei a pensar onde estão os protões desta situação. Encontrei três situações. Primeiro, todos os concorrentes estavam a deixar o país, mais de metade das empresas saiu e nós investimos mais. Procurámos estar mais fortes para quando a situação melhorasse e estivéssemos mais preparados. Segundo, todos os nossos potenciais clientes estavam a procurar baixar os custos. Foi para nós uma oportunidade de apresentar novas propostas com preços mais baixos e conseguir ‘roubar’ contratos das outras empresas. Crescemos muito na diversificação dos clientes, estamos com quase todos da área petrolífera.

E qual a terceira situação?

Uma das grandes dificuldades em Angola é o capital humano. Desde 2002, até ao início da crise em 2015, todas as grandes empresas, como a Chevron, BP, Total e Exxon, treinaram muitos angolanos, mas despediram muitos por causa da crise. E, pela primeira vez, tivemos um mercado de capital humano incrível, muitos angolanos com capacidade para operar em multinacionais. Decidimos investir no capital humano, aproveitámos para trocar a nossa equipa e, actualmente, mais de 80% é angolana. Temos uma equipa incrível, estamos fortes e prontos para o que vier.

A folha salarial tornou-se mais pesada?

Sim, mas foi compensada pelos novos contratos. Ainda que não fossem tão lucrativos, mas foi bom para o crescimento da empresa. Foi uma possibilidade de mostrarmos o nível de serviço que podemos prestar. Estamos numa posição boa para o futuro.

O petróleo continua a ser o principal produto de exportação, mas fala-se numa aposta na diversificação. Como olha para esta realidade?

O petróleo continua a ser, mas a crise foi uma bênção porque nos forçou a apostar na diversificação. É verdade que, durante anos, o Governo já apelava para a diversificação, mas os empresários não investem apenas pelo apelo do Governo, precisam de alguma justificação financeira. Quando não havia dólar, os empresários olharam para as várias oportunidades. A crise empurrou-nos para a diversificação da economia. Ou seja, é verdade que o petróleo continua a ser o principal produto, mas vão surgindo outras empresas.

Como é que a vossa empresa tem estado a gerir a falta de divisas?

Temos uma boa relação com os nossos parceiros, bancos e fornecedores. Todos sabem que pagamos as dívidas e foram muito pacientes. Mas também nos sacrificámos muito. Algumas vezes, tivemos de adquirir no mercado informal, mas era necessário.

Acredita na melhoria da situação com a tendência crescente do preço do petróleo?

Espero que nos ajude, mas também que não nos sintamos confortáveis porque esta subida não será para sempre. Temos de aprender a viver sem o petróleo, como um mercado normal. Temos de estar dispostos a trabalhar para chegarmos ao nível dos países que não têm petróleo, mas estão muito bem. Temos uma terra produtiva, portos e rios. Só temos de estar dispostos a sacrificar as nossas energias e esforços. Precisamos de perder o medo de que temos de nos proteger. Temos uma população pequena e muito boa.

Como olha para o turismo em Angola na diversificação da economia?

O turismo de negócios vai ser incrível se abrirmos as fronteiras. Quando é difícil viajar para um país, os investidores desistem. Para vir para Angola, em muitos casos, as pessoas tinham de viajar antes para um outro país. São muitos gastos. Isso desvia muitos investidores. Temos um país com muitos recursos. Há muitas coisas que ainda não estão em Angola, mas já é uma realidade no resto do mundo devido ao período de guerra que tivemos.

Há muito para ser feito. Temos de facilitar a entrada dos investidores, não podemos ter medo, precisamos de abrir o país e deixar os empresários entrarem. Há correntes que acreditam que a abertura total pode provocar o surgimento de monopólios estrangeiros, considerando a posição de desvantagem dos nacionais. Concorda?

Não. Porque é que iriamos criar monopólios estrangeiros? Temos de ter confiança que esta é nossa terra. Falo como se fosse angolano porque estou a investir aqui há 12 anos e gosto do país. Temos de lembrar que ninguém vai conseguir operar tão bem como os angolanos, é a nossa terra. Ao invés do medo, devemos pensar que será boa a vinda dos empresários estrangeiros. Vão causar concorrência, melhorar o nível de serviços e produtos. As empresas internacionais vão puxar pelas nacionais e, quando estiverem ao mesmo nível, por uma questão natural, os angolanos vão preferir comprar nas nacionais. Isso acontece em todas as partes do mundo. Por que é que temos de ter medo? Se o Governo quer combater os monopólios nacionais, por que protegeria os dos estrangeiros? Não temos de ter medo, porque o Governo também não irá proteger porque são ilegais em toda parte do mundo.

Mas concorda que os empresários nacionais têm uma desvantagem visto que não encontram nos bancos, por exemplo, o mesmo suporte que os estrangeiras têm nos países de origem?

A questão da falta de apoio da banca é mais pela falta de divisas porque, de uma forma geral, os empresários precisam de divisas e a banca não tem. E, mais uma vez, os empresários angolanos têm maior probabilidade de se relacionarem com os bancos nacionais. Eu, por exemplo, não sou angolano, mas sinto-me assim e tenho boas relações com os bancos e tenho certeza de que teria mais sucesso comparativamente a uma empresa estrangeira que fosse nova. Se eu estou com esta confiança, os angolanos que levam toda a vida deveriam ter ainda mais.

A TGI tem feito recurso à banca nacional para financiamento?

Localmente, não por não precisar de financiamento em kwanzas, precisamos de moeda estrangeira. As taxas dos bancos aqui são muito altas. Tem que ver, em parte, com a desvalorização do kwanza, mas também estão a pagar boas taxas para os depósitos a prazo. Na verdade, não consigo falar muito sobre o assunto, porque não temos solicitado financiamento.

Mas as empresas nacionais estão, em princípio, dependentes dos bancos nacionais. Não considera uma desvantagem em comparação às estrangeiras?

É verdade, mas o financiamento fora do país também é difícil. Nós, TGI, somos uma empresa angolana, tivemos muitas dificuldades, não foi fácil. Conseguimos depois de muita luta. As empresas angolanas também podem conseguir depois de muita luta, mas não é fácil porque estamos atrasados. Não temos bens em todo o mundo, não temos um sistema bancário onde o dinheiro flui facilmente. Mas temos de chegar lá. Sou um bom exemplo, porque estou no meio-termo. Sou estrangeiro, mas considero-me angolano e somos uma empresa angolana. Definitivamente, teremos coisas negativas (com a abertura), mas não é por causa da banca. Tivemos em guerra durante muito tempo, estamos atrasados como país e temos de alcançar o nível mundial, mas, para isso, teremos de estar abertos ao mundo para que as empresas angolanas possam ganhar o respeito da banca internacional. Nada é perfeito, temos algumas coisas boas e outras más. O negativo é que realmente é difícil conseguir financiamento; a coisa boa é que conseguimos operar no país muito melhor que qualquer outro que chegue, porque Angola ainda não é um país fácil para operar.

Quais são as grandes dificuldades do mercado?

Obviamente, o problema de divisas. Antigamente, havia muita burocracia e o Governo envolvia-se muito nas regras de investimento.

Já sente menos burocracia?

Roma não foi criada num dia, mas os sinais são muitos bons. A alteração da Lei do Investimento e a supressão e facilitação dos vistos são sinais. As tecnologias também vão ajudar. Não teremos de fazer o mesmo trabalho que os outros fizeram e permitem mais transparência. A tecnologia vai fazer com que tenhamos, por exemplo, empresas públicas muito transparentes e vamos conseguir avançar em menos tempo.

Desde que está em Angola já teve de recorrer à corrupção?

Graças a Deus, não. Muitas pessoas entram com esta mentalidade e esta passa a ser a prática. A corrupção não é um problema nem angolano, nem de ninguém. Nem do MPLA, nem africana, é do ser humano. Há corrupção em toda a parte do mundo e as pessoas decidem se querem ou não entrar. Têm aparecido oportunidades e temos perdido por não entrar. Gosto de jogar com regras. A curto prazo, ter-nos-á nos afectado, mas, a longo prazo, não, porque todo o mundo sabe que a nossa empresa não entra no jogo da corrupção. Somos uma empresa de dignidade.

Então não é certo que estrangeiros apresentem a corrupção como uma das barreiras do mercado angolano?

Não estou a dizer que não exista. Em qualquer parte do mundo, se conseguir corromper alguém, vai dar o que se quer mais rapidamente, mas, se decidir pelo caminho menos tomado, que é fazer a coisa certa, é provável que, de imediato, seja mais difícil. Sofri durante muitos anos aqui. O meu negócio não correu bem ao princípio, lutamos muito, tivemos roubos, mas, com o tempo, este investimento de não ser corrupto ajudou-nos e fortaleceu-nos muito mais do que aqueles que nunca conseguiram aprender a fazer as coisas sem corromper. São estes os que estão a chorar muito mais.

Alexander Thomson-Payan

Residente em Angola há 12 anos, Alexander Thomson é filho de pai americano e mãe colombiana. Nasceu nos Estados Unidos da América e criou a primeira empresa em 2006, a Electrix Telecom que se dedica na distribuição de telemóveis de marcas IPHONE, LG, ALCATEL e SAMGSUNG no país. Em 2017, criou o grupo TGI, vocacionada em investimentos que identifica os melhores projectos actuando como parceiro local, para empresas internacionais. A TGI presta serviço às companhias petrolíferas