Arábia Saudita ameaça vender petróleo barato aos compradores de Angola
CRUDE. Incumpridores do acordo do corte de produção recebem ultimato da Arábia Saudita. Ou cumprem, ou correm o risco de perder os clientes para este gigante da produção mundial. Com o cumprimento do acordo, Angola perde cerca de 8 milhões de dólares por dia.
A Arábia Saudita endureceu o discurso face a Angola e aos demais membros da OPEP, incumpridores dos acordos de corte da produção alcançado pela OPEP+, e ameaça oferecer petróleo ao desbarato aos principais compradores da produção destes países, caso persistam com o incumprimento.
“Angola estava com plano de fingir que corta, mas a Arábia Saudita agora está a controlar e chamou os países violadores (Angola, Nigéria e Iraque) e ameaçou-os directamente que, se continuarem, vai falar com os compradores destes países e vender-lhes o seu petróleo ao desbarato. Vai oferecer o petróleo com a mesma qualidade a um preço inferior. É esta arma que a Arábia Saudita está a jogar contra Angola”, revela fonte próxima ao processo.
Alcançado em Abril entre os membros da OPEP e os parceiros liderados pela Rússia, o acordo entrou em vigor em Maio. Nos dois primeiros meses, Angola deveria produzir 1.180 mil barris por dia, mas produziu sempre acima desta cifra.
Em Junho, a produção média diária foi de 1.230 mil barris, representando um aumento de 8 mil barris, comparativamente a Maio, em que a média de produção foi de 1.222 mil barris, de acordo com os dados da Organização dos Países Produtores de Petróleos baseados nas fontes primárias.
Na sequência, os países incumpridores foram avisados que teriam de compensar, tendo-se considerado a possibilidade de os ajustes acontecerem no final do ano ou ainda ao longo da vigência do acordo que vai até Abril de 2022.
No entanto, em Julho, os incumpridores voltaram a violar o acordo. Angola, por exemplo, produziu 1.275 mil barris por dia, quando, para o período Julho/Dezembro, a quota atribuída é de 1.249 mil bpd. Este novo incumprimento alterou a abordagem dos membros do acordo e os incumpridores passaram a ser obrigados a compensar já em Agosto e Setembro. E foi nesta altura que a Arábia Saudita terá mostrado qual seria a retaliação.
Em Julho, citando fonte da OPEP, a Reuters noticiou que Angola, face à pressão, informou que não compensaria a sua superprodução no período Julho/Setembro como o resto dos países, mas seria capaz de compensar apenas entre Outubro/Dezembro. “Estamos a tentar convencê-los (a cumprir) ”, terá dito fonte da OPEP à Reuters. A mesma agência adiantou que a Nigéria e a Argélia prometeram compensar a superprodução nos dois primeiros meses e prometeram trabalhar no sentido de convencer Angola a fazer o mesmo. “Todo o grupo (OPEP+) está a colocar pressão sobre Angola e sobre os demais que não cumprem o que concordaram”, sublinhou a fonte.
Questionado pelo VALOR, um quadro sénior do Ministério dos Recursos Mineirais, Petróleos e Gás respondeu, entretanto, “não ter esta informação”, referindo-se à ameaça da Arábia Saudita de vender petróleo barato aos compradores dos países incumpridores. Quem também disse desconhecer a intenção da Arábia Saudita é José Oliveira, pesquisador do Centro de Estudo e Pesquisa da Universidade Católica de Angola.
“Todos sabemos, só não querem abordar o assunto pela sua sensibilidade”, insistiu, entretanto, a fonte do VALOR.
No primeiro trimestre de 2020, a China manteve-se como líder do ranking dos maiores compradores do petróleo angolano ao adquirir 66,9% da produção, seguindo-se a Índia (7,8%), Tailândia (6,2%), França (3,4%) e Portugal (3,2%). Espanha, Singapura, EUA, Taiwan e Holanda foram os outros destinos do petróleo angolano.
SUSPENSÃO DA OPEP É A SOLUÇÃO
O cumprimento do acordo de corte representará uma redução nas receitas petrolíferas de cerca de 8 milhões de dólares por dia ou 240 milhões de dólares/mês. Situação considerada “bastante e suficiente” pela corrente que defende a saída e ou suspensão temporária de Angola da OPEP.
“Angola tem prevista a presidência no próximo ano, deveria enviar uma carta à OPEP a renunciar à presidência neste ano, demonstrando que a situação económica e financeira do país está de tal forma complicada que a única hipótese é suspender os cortes, porque a função de um presidente é controlar os países que não cortam e definir estratégias da organização de forma a ser muito mais eficiente no controlo dos países incumpridores. Nesta perspectiva, Angola ia jogar o papel chave neste processo. Então o ideal é suspender a presidência e pedir a suspensão temporária da OPEP”, defende Pedro Godinho.
No entanto, os defensores da permanência do país no cartel consideram “deselegante” Angola sair agora apenas pelo facto de a situação não lhe ser favorável, quando em outras alturas beneficiou de ser membro da organização que, esta semana, completa 60 anos de existência.
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