ANTÓNIO CANDEIAS, PCA DA SISTEC

“Atrasos com a obtenção de divisas afectam a imagem do país”

Considera que os atrasos com a obtenção de divisas afectam a imagem do país e descredibiliza a classe empresarial lá fora. Reconhece que o volume de negócios diminuiu 40% no primeiro mês da pandemia, ressalta, porém, que a procura por produtos tecnológicos aumentou 25%.

“Atrasos com a obtenção de divisas afectam a imagem do país”
D.R

Que implicações está a ter o isolamento social nos negócios da Sistec?

O volume de negócios diminuiu quase 40% no primeiro mês, imediatamente depois de ser decretado o estado de emergência, fruto das restrições de circulação, abertura de lojas, etc. 

 

E a procura não registou um contributo positivo?  

Face à necessidade de isolamento social e de teletrabalho, entre (CONFIRMAR O MÊS) e Março do presente ano aumentou 25%, em comparação aos resultados em igual período de 2019. Esta evolução resultou do aumento do contributo da procura por produtos de natureza informática, essencialmente computadores portáteis, impressoras, routers, amplificadores de sinal wi-fi e câmaras para PC.

 

E quem são os vossos concorrentes?

São muitos. Relativamente ao retalho, em que a localização da rede de lojas acaba por ser talvez o factor crítico para a fidelização de clientes é, seguramente, o sector com maior concorrência, tanto de nacionais como de estrangeiros.  Estes últimos, muitos deles, chegaram a Angola há meia dúzia de anos. No que concerne à política de corporate, cujo mercado é mais segmentado, temos uma quota relevante com significativa presença na venda e fornecimento de equipamentos.

 

Acredita no investimento estrangeiro?

Não obstante o capital ser cada vez mais transnacional, acredito sobretudo, em projectos bem estruturados e planificados, com previsões de receitas realistas e com planos de contingência capazes de se adaptar a uma realidade como a angolana.

 

Acha possível produzir-se tecnologia em Angola?

Sim, é possível. Aliás, a Sistec (Sistemas, Tecnologia e Indústria), como a própria denominação formal indica, tem uma interessante experiência industrial. Recordo que, há mais de 20 anos, produzimos cofres e detínhamos uma linha de montagem de computadores, cujos componentes electrónicos vinham da China, com capacidade idêntica, ou mesmo superior, a computadores concorrentes de preço equivalente.

 

O que aconteceu a essa linha de montagem?  

Acreditamos que esse negócio, em particular, exige uma componente de serviços elevados com infra-estruturas eficazes de suporte, como água, energia e distribuição, para que se tenha o retorno financeiro investido, não bastando apenas pensar em tecnologia.

 

De que tipo de tecnologias a empresa dispõe para apoiar os sistemas de saúde?

A nossa empresa participa no desenvolvimento da Appy Saúde através de um projecto tecnológico para a incubação de startups angolanas. Trata-se de uma aplicação que aproxima a população aos serviços de saúde que concentra informações sobre farmácias, hospitais, clínicas de todo o país, permitindo a compra de medicamentos, marcação de consultas, aquisição de planos de saúde, etc.

 

A tecnologia tornou a prática da medicina menos complexa...

E mais acessível. A principal consequência real é o aumento global da esperança média de vida nas últimas três décadas.

 

É inevitável recorrer a provedores externos para alojamento dos dados do país?

De facto, é inevitável, dada a dimensão de recursos necessários para garantir o actual nível de serviços. Seria demasiado oneroso para o Estado ou outras empresas nacionais assumirem esse serviço. Mesmo para uma organização como a Sistec que tem um data center.

 

O Estado deve ser um rigoroso árbitro...

Naturalmente. O papel dos Estados é o de funcionar como árbitros e fiscalizar os provedores de comunicações electrónicas para que assegurem o bom uso, tratamento e confidencialidade dos dados dos cidadãos.

 

Tem encontrado resistência de alguns sectores da sociedade em partilhar ou comprar tecnologias de informação?

Há sempre resistências que, muitas vezes, até podem ser conjunturais.

 

Por exemplo?

Olhe, há dois anos, o mercado do software de gestão estava muito desregulado, tendo sido melhorado em 2019 por causa da adesão ao IVA e a imposição da AGT na obrigatoriedade de se utilizarem programas certificados.  Passamos a comercializar, com um moderado sucesso comercial, o nosso software de gestão, o ERP Eticadata, proporcionado um serviço de qualidade aos nossos clientes. De (CONFIRMAR O MES) a Março, renovámos mais de 70% do parque de clientes activo, registando um crescimento de 80% face ao período homólogo.

 

O agro-negócio já é atractivo para as empresas de tecnologia?

É um mercado com elevado potencial, particularmente em Angola. Temos sido solicitados para fornecer vários pequenos projectos ligados à agricultura, nomeadamente sistemas de irrigação e energias renováveis, cujo valor ronda, em média, 1,5 milhões de dólares.

 “Atrasos com a obtenção de divisas afectam a imagem do país”

A obtenção de divisas continua a ser um ‘quebra-cabeças’?

Este é um assunto crónico, transversal a todas as pequenas, médias e grandes empresas do nosso país, pois todos dependemos sempre da importação de produtos. Os atrasos com a obtenção de divisas, por culpa dos bancos, afecta a imagem do país e descredibiliza as empresas nacionais junto dos fornecedores lá fora. Tem sido bastante difícil cumprir com os compromissos assumidos, tanto com os fornecedores, como com os clientes.

 

Quanto ao crédito bancário?

Não trabalhamos com crédito, mas sim com capitais próprios.

 

A crise forçou-vos a despedir trabalhadores?   

Entre 2014 e 2019, a crise económica, que culminou com a desvalorização do kwanza, obrigou-nos a providenciar um plano de reestruturação que levou à saída  de 545 trabalhadores, correspondente a cerca de 50% da nossa força laboral.

 

E ...

Quanto à crise da covid-19, actualmente, estamos a trabalhar por turnos, o que afectou a nossa produtividade. Contudo, não baixámos os salários. Dispensámos 11 trabalhadores, sendo nove por reforma e dois por comum acordo. O passo seguinte é a ambição de voltar a crescer já em 2021.

 

Já foram identificados os possíveis negócios para os próximos tempos?

Estamos a fazer um investimento significativo na reestruturação da área comercial da Sistec com a total renovação de uma das nossas lojas do Maculusso, a qual será reinaugurada no final deste mês. No próximo mês, lançaremos também a nossa loja online. Será uma plataforma de comércio electrónico com mais de mil produtos disponíveis, melhorando a qualidade de serviço e reforçando a conveniência para os nossos clientes, com serviço de pagamento remoto disponível através de referência multi-caixa e também com a entrega ao domicílio.

 

Como estão os centros de formação da Sistec?

Fomos forçados a encerrá-los, devido à pandemia. O único em funcionando é o de Luanda, ministrando unicamente acções de formação online. Temos centros de formação em Cabinda, Benguela, Huambo e Lubango. Existem há 29 anos e já formaram para cima de 50 mil pessoas, em mais de 41 áreas.

 

Perfil

Nascido no Huambo em 1952, António Candeias é contabilista, com actividade predominante nas áreas de Finanças e Logística. Durante anos, foi responsável pela organização, em Angola e Moçambique, da contabilidade de diversas empresas, designadamente nas áreas das pescas, agrícola, transportes, distribuição e obras públicas. Foi ainda responsável pela elaboração dos planos directores de Informática do Ministério da Juventude e Desporto e da Televisão Pública de Angola. Em Fevereirode 2019, assumiu a presidência do conselho de administração da Sisrec, SA., da qual é quadro há 26 anos.