ANGOLA GROWING
NEGÓCIO NÃO REGULAMENTADO NA INTERNET

Comércio electrónico sustenta jovens mulheres

VENDAS ONLINE. Grupos do ‘Facebook’ ou ‘WhatsApp’ ou as páginas individuais são o palco para muitas mulheres buscarem o auto-sustento. Apesar de não estar regulamentado, negócio tem ganho vida própria e resultado em realização de sonhos.

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São três mulheres e jovens. Têm em comum o facto de venderem produtos pela internet e o sonho de vencerem na vida. Isabel Gonçalves, 27 anos, Zenilde Muandula, 32 anos, e Verónica Pindali, 26 anos, usam as redes sociais e os grupos de vendas no ‘Facebook’ e ´WhatsApp’ para comercializarem os seus produtos.

Cada uma à sua maneira vai realizando os sonhos aos poucos, sem pressa, dizem. No meio de um negócio liderado pelas mulheres, pelo número de páginas de compra e vendas administrado por senhoras ultimamente, as jovens encontram na internet uma forma de ganhar dinheiro e de auto-sustento. Nas suas páginas ou nos grupos como ‘Bazar da Mamã’, ‘Vendas Online’, ‘Mulheres Empresarias’, ‘Negócios entre Mulheres’ e ‘Desapegos’ o negócio ganhou asas.

Isabel Goncalves começou a sua “aventura” como vendedora online há três anos. A história iniciou com o desejo de ter um par de ténis que custava mais de 30 mil kwanzas. A jovem decidiu aproveitar o facto de ter um amigo na China para comprar os ténis mais baratos. O amigo, invés de mandar os ténis, lançou um desafio: Mandava cinco pares de ténis e ela vendia a 20 mil kwanzas, sendo que um era para ela. Isabel Gonçalves aceitou o desafio. Mostrou os sapatos aos amigos e familiares, mas ninguém comprou. Por sugestão de uma amiga, fez uma publicação na sua página do Facebook e grupos online a anunciar as vendas, desta vez já a 18 mil kwanzas. Demorou um mês para que alguém se interessasse pelos ténis. “Quando já estava a desistir e a entregar o negócio alheio, o músico Mauro Tuga interessou-se pelos ténis. Foi o começo de tudo.”

O músico passou a mensagem a colegas e os cinco ténis foram vendidos dois dias depois. Com o sucesso e com o dinheiro das vendas, o amigo na China enviou umas semanas depois uma mala de ténis. “Tudo comprado com o dinheiro das vendas.” Hoje, Isabel Gonçalves construiu uma loja pequena em casa com o dinheiro das vendas e continua os anúncios pela internet. Além dos ténis, vende carteiras, roupas, cintos e óculos. “Demorou, mas venci. Não foi fácil conciliar os lucros com o meu sustento e o da minha mãe, mas cheguei lá. Tenho a loja que sempre sonhei. Mesmo com a loja, vendo mais continuando a anunciar nas redes sociais.”

Enquanto Isabel Gonçalves já conseguiu ter uma loja por causa das vendas online e tem o sonho “grande” de ter um empreendimento em cada província, Zenilde Muandula ainda vê a ambição como uma miragem. A jovem começou as vendas na brincadeira para saber o impacto das reacções dos seus amigos no Facebook. Colocou as suas próprias sandálias para venda e recebeu um ‘feedback’ positivo, com várias solicitações. Não esperou e começou a publicitar outros produtos. Actualmente, vende roupas e calçados para adultos e crianças vindos da Namíbia e sonha com a abertura da sua loja. Por causa das vendas, teve de largar o emprego, numa loja e sair da faculdade em que cursava Direito. “Apenas deixarei de estudar esse ano. As vendas ocupam muito tempo. Tenho de fazer entregas eu mesma.”

Diferente de Isabel Gonçalves e Zenilde Muandula, Verónica Pindali entrou para as vendas online de “caso pensado” e sonha com um empreendimento e o desejo de ser uma empresária reconhecida. “ Sempre quis ter a minha empresa e vou ter.” A jovem vende “de tudo um pouco”, sendo que muitos dos produtos, como garrafas decorativas e vazos, são confeccionados por ela. Licenciada em Gestão e Marketing, começou as vendas no ano passado, nos grupos de vendas e tem sido “um desafio todos os dias”. Os produtos que não são feitos por ela são fornecidos por uma amiga que viaja constantemente para a Namíbia.

LUCROS CHEGAM AOS 100 MIL KWANZAS

Com lucros variáveis todos os meses, Isabel Gonçalves revela que, em média, por mês, pode chagar a lucrar 100 mil kwanzas, com as vendas online. Os lucros que recebe dos clientes que vão directamente à loja não chegam nem a 50% deste valor. Zenilde Muandula diz que tem tido de lucro entre 40 mil e 80 mil kwanzas. A jovem revela que sempre recebe mais de 50% a 60% dos gastos que realiza. Verónica Pindali não contabiliza os lucros, mas diz que, em produtos que compra a 10 mil, recebe de lucro cinco mil a sete mil kwanzas.

As vendas para as jovens não são feitas apenas de momentos de satisfação e ganhos. Isabel Goncalves revela que teve que “engolir muitos sapos” por ter os produtos expostos na internet. “Já ouvi que os meus produtos são piratas. Que só vendo gatos. Perguntam e nunca compram. São muitas coisas.” Zenilde Muandula diz que enfrenta os mesmos dissabores mas que o que mais a entristece e quando a “cliente lhe puxa no ‘chat’, encomenda e, na hora de pagar depois de ter gasto táxi, diz que não gostou dos produtos”. Já Verónica Pindali diz que a falta de literacia de alguns internautas é o seu maior desafio. “Fazem perguntas repetitivas. Não percebem o que escrevo e ainda gozam da minha paciência.”

COMÉRCIO SEM REGULAMENTO DESDE 2007

O comércio electrónico ainda não está regulamentado em Angola, desde que foi aprovada a lei das Actividades Comerciais em 2007. Segundo uma fonte do Ministério do Comércio, o tempo deve-se ao facto de o “fenómeno” das vendas online ser novo no país. “Quando surge qualquer conflito entre os vendedores e os clientes, o único meio a usar é o Instituto Nacional de Defesa do Consumidor (INADEC). O cliente ou vendedor lesado apresenta a queixa e o instituto chama as partes.”

As vendedoras declaram que os conflitos com os clientes nunca chegaram a parar ao INADEC. “Resolvemos mesmo entre nós.”

Dificuldades para constituir empresa

Os jovens, à semelhança dos comerciantes informais, justificam a tendência de apostar no online, ao qual escapam da tributação, por alegados altos preços e a burocracia para a concepção de uma empresa, seja “pequena ou grande”.

Adão Felisberto, vendedor de sapatos e calções de diferentes marcas, adquire a mercadoria na fronteira com a Namíbia. Antes de ser também taxista, vendeu nos mercados do 30 e Kicolo e considera “atractiva” a venda de produtos na internet, mas sublinha já ter tentado formalizar o negócio, só que se “deparou com enormes exigências”. Para ele, o processo devia ser mais “célere e barato”. “O alvará tinha de ser menos oneroso e de rápida obtenção para quem mostre que pretende investir, não como acontece hoje em que muitos o tratam para alugar a ‘mamadus’”, desabafa Adão Felisberto que arrecada de 80 mil a 110 mil kwanzas por mês, 10 dos quais usados para pagar a dois distribuidores. Cláudio José partilha da posição de Adão. E conta que, por falta de um posto comercial, a maioria dos que realizam a venda na internet recusam-se a ser procurados pelos clientes, optando pela entrega ao domicílio. Com três colaboradores, que auferem cada 12 mil kwanzas por mês, Cláudio compra os relógios, nas lojas do Hoji Ya Henda, por “darem margens satisfatórias de lucro”. Por exemplo, um Olympic custa mil kwanzas e ele vende a três mil; o Cásio é comprado a 2.500 kwanzas e comercializado a 5.500 kwanzas. Os funcionários da Administração do Sambizanga afirmam que falta informação aos pequenos comerciantes. “Antes de acorrerem ao Guiché de Empresas, dado o pouco nível de negócio que possuem, podem ir à administração local, onde lhes darão, por apenas cinco mil kwanzas, uma autorização precária”, explica um deles, sublinhando que por 100 kwanzas/dia, o documento é válido por um ano.