CONTRA A COVID-19, NÃO À CRÍTICA
1. Antes de mais, um alerta aos entusiastas do acriticismo em época da Covid-19. O reconhecimento unânime da necessidade de encorajamento às medidas das autoridades não pode justificar o branqueamento dos erros cometidos ao longo da gestão da crise. Especialmente quando tenham ocorrido erros graves que se posicionam no limite da negligência e da irresponsabilidade.
Convenhamos: as incidências que vieram a público, na sequência da alvoroço no Aeroporto 4 de Fevereiro, protagonizado pelos passageiros que aterraram de Lisboa na quarta-feira, 18, em qualquer país sério levaria obrigatoriamente à queda de ministros. Ou à demissão de qualquer governante a qualquer nível, susceptível de ser directamente responsabilizado. E há uma explicação mais do que razoável para isso. Ao contrário de vários países da Ásia e da Europa, Angola não pode afirmar propriamente que tivesse sido apanhada desprevenida. Tanto não pode que, pelo menos até ao dia 18, o Governo deu garantias de que estava preparado para colocar em quarentena institucional os passageiros que chegassem dos países de elevado risco, incluindo Portugal. A explicação da incapacidade dos espaços de quarentena dada a posteriori foi por isso, no mínimo, ridícula. Porque faz pressupor que o Governo fez promessas, desprovido de dados tão básicos quanto o número de passageiros que chegariam ao país a partir do dia em que as regras de prevenção foram agravadas.
O Governo teria outra oportunidade para provar que se tinha emendado, mas, outra vez, voltou a colocar os pés pelas mãos. Ao mandar, a certo momento, centenas de passageiros aterrados de Lisboa para o Calumbo sem antecipar as condições de acomodação, um dia depois de a ministra da Saúde ter oficializado os primeiros dois casos em Angola.
A frontalidade na identificação das falhas na gestão desta crise, através da crítica fundada, cumpre por isso vários propósitos. Destacamos dois. Primeiro, porque é crucial manter as autoridades alertas de que todo e qualquer empenho no sentido da solução da crise não vai além da responsabilidade mínima que qualquer governo assume perante os seus governados. Segundo, porque, perante crises como a que atravessamos, será obrigatório, no fim de contas, recapitular o processo e finalizá-lo com relatórios que identifiquem erros, acertos e responsabilidades.
2. Falhas e responsabilidades do Governo à parte, crises como a que vivemos são daquelas que deveriam apelar necessariamente para a razoabilidade, o bom senso e, porque não, o espírito de unidade e solidariedade. Não é isso o que infelizmente se verifica de parte significativa de comerciantes que fornecem materiais essenciais à prevenção da pandemia. Com doses excessivas de oportunismo criminoso, muitos comerciantes elevaram os preços de produtos como máscaras, álcool em gel e luvas ao limite do escândalo. Como quem consciente e afrontosamente tivesse escolhido colocar em risco milhares de vidas, em nome do lucro. É a falta de pudor estampada em letras garrafais nas vitrinas das farmácias e queijandos. Tenham vergonha.
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