Eleições credíveis? Não é possível
Qualquer indivíduo com raciocínio médio sabe que as comparações devem sempre ser feitas com necessárias cautelas. Mais do que uma opção subjectiva, é, sobretudo, um imperativo intelectual.
No estrito campo do processo político, determinados casos exigem que as comparações levem em conta razões históricas e estruturais e sem descurar aspectos conjunturais de incidência política, social, económica, cultural e por aí adiante. É com base nessa construção lógica que o conhecimento humano sentencia que não se devem comparar laranjas com bananas.
Vem isso a propósito do repto lançado por João Lourenço a todos os partidos para que se esforcem a credibilizar as eleições de Agosto. Certos analistas, na tentativa de contruírem uma narrativa que dê sentido às palavras do presidente do MPLA, atacam o discurso da oposição que cataloga o conjunto do processo eleitoral como inquestionavelmente fraudulento. E, para o efeito, socorrem-se de pseudo-argumentos como o facto de o fenómeno da contestação de resultados eleitorais ser alegadamente característico dos maus perdedores em África, mas também em democracias consolidadas, como a dos Estados Unidos da América. Tão simplista quanto banal, este tipo de comparações não só roça a ignorância como só pode ter enquadramento numa certa prática instalada de defesa do indefensável, consciente ou inconscientemente.
Até porque os contra-argumentos são simples. Qualquer indivíduo razoavelmente são e que se tome por intelectual sabe que, ao contrário das queixas que se ouvem em democracias consolidadas, os aspectos que legitimam as denúncias antecipadas de fraude em Angola são, particularmente, de natureza estrutural. É assim em Angola, como o é nos demais pares africanos governados por regimes que resistem, com todos os meios, aos avanços nos processos democráticos. Ao contrário das queixas em democracias cristalizadas, em Angola toda a organização dos processos eleitorais está inquestionavelmente em mãos de instituições controladas pelo partido poder. Da Assembleia Nacional que aprova as leis, passando pelo Ministério da Administração do Território que trata do registo, até ao Tribunal Constitucional que legitima as candidaturas e resolve os contenciosos eleitorais, todas as instituições estão inquestionavelmente sob comando de um concorrente. Sem esquecer, pelo meio, a Comissão Nacional Eleitoral que, de facto, realiza as eleições e anuncia os vencedores. E porque não os meios de comunicação social públicos relevantes que, no alto da sua autoproclamada soberania, chegam a dedicar 90% de noticiários nacionais ao MPLA e ao Governo que suporta, em pleno período de campanha eleitoral. Não é necessário, portanto, discernimento incomum para se perceber que nada disso pode ser comparado ao que se passa nos Estados Unidos, no Brasil ou na Argentina. Dito de outra forma, no contexto actual, a simples evocação da possibilidade de ocorrência de eleições credíveis em Angola é, pelo menos, um insulto à inteligência de qualquer cérebro minimamente aclarado. Isto, sim, para dizer mesmo o mínimo.
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