Empreendedores em ‘choque’ com empregos de limpeza
EMPREENDEDORISMO. Políticas viciadas de auto-empregabilidade contribue significativamente para os níveis alarmantes de desemprego, constatam empreendedores, que defendem a ‘higienização’ da mente dos jovens e aconselhando a reinventarem-se.
O concurso público para auxiliares de limpeza na educação causou alvoroço nos locais de inscrição e em algumas escolas do ensino de base, com jovens universitários e já licenciados a acorrerem em massa para formalizar a candidatura e levantar o certificado da 6.ª classe nas escolas que frequentaram há mais de dez anos. O desemprego é a justificação de muitos candidatos que se abstiveram do grau superior ao tentarem à sorte, apesar do alerta do Ministério da Educação de não existir posteriormente promoção de categoria.
Para alguns empreendedores, o concurso demonstra a “triste realidade que deriva da velha formatação da sociedade”, feita pelo Governo, em estudar com vista a obter emprego no sector público, tido como “bom e seguro.” José Lima considera os jovens licenciados “vítimas do sistema” por não conseguirem empreender o conhecimento adquirido durante os longos anos de estudo. “Infelizmente, poucos aprenderam a pensar fora da caixa, isto é um problema transversal. Tem tudo que ver com a forma como o país está desenhado. Por outro lado, ser vítima também tem sido uma opção, pois o conformismo e comodismo tem sido marca de muitos jovens, aceitam ser vítimas ao não saberem fazer uso da formação,” observa.
Com a crise a apertar e com as reformas necessárias impostas ao abrigo do empréstimo financeiro concedido pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), o empreendedor aponta a necessidade de se acabar com a ideia de supostamente “os funcionários públicos terem a sensação de ‘intocabilidade’, logo, “quem está de fora quer ter as mesmas garantias, que com o mínimo de esforço, cumprindo ou não as metas, o salário é uma garantia.”
A opinião é sublinhada por Daniel Pires, também ele empreendedor, que lamen-ta a falta de compromisso do Governo na promoção e no apoio aos jovens empreendedores. “Nos últimos 10 anos, há um interesse dos jovens em empreen-der, só para não dizer que o empreendedorismo está no ADN dos angolanos, infelizmente, tudo isso corre sem o apoio financeiro do Estado”, assinala.
O empreendedor na área da moda e cultural sugere uma revisão das políticas actuais de fomento ao auto-emprego. O ponto de partida é o Governo, através do Instituto Nacional de Estatística (INE), fazer um censo dos jovens desempre-gados, criar “políticas directas junto do Ministério do Trabalho e do sector privado para se apurar a capacidade de cada um nos diversos sectores, promover for-temente o micronegócio de acção com vista a estimular os jovens a empreender e abrir espaço para os jovens expressarem as ideias e daí o Governo perceber que tipo de jovens tem e como trabalhar com os mesmos.”
José Lima também aponta erros nos programas, citando, como exemplo, o Plano de Acção de Promoção para Empregabilidade (Pape), desde a concepção até à execução. “Peca-se muito nos quesitos público-alvo, atribuição, gestão e fiscalização dos fundos. Quando se recebem os valores, sem obrigações concretas de retorno, os que tutelam (tais valores) fazem festa. Estes programas deviam ser entregues a associações e cooperativas de negócios”, defende, “sob pena de não mendigarem ao Estado, chegar ao ponto de passar humilhações nas filas inter-mináveis de desempregados a tentar sorte nos concursos públicos, quando o principal desafio é diminuir ‘gorduras’ na função pública”.
Daniel Pires recomenda os jovens a reinventarem-se. “Não posso acreditar que um jovem que termina uma licenciatura sofra humilhações do género, depois surgir a dizer que está a engraxar sapatos na rua. Onde está o seu plano de estudo, pesquisa ou investigação científica? Cada um na sua área de formação deve ser útil para o desenvolvimento do nosso país. Se esperarmos pelo Governo va-mos morrer à fome, deixem que este trace as políticas e crie leis.”
Desde o início das inscrições, revela Isau Queta, director pedagógico do Colégio Tungo Ya Tena, recebeu em média cinco solicitações de levantamento de certi-ficado da 6.ª classe por parte de ex-alunos, a maior parte já licenciados. Cautelosamente, na maioria dos casos, optou por não os entregar. “Conheço como é trabalhar na limpeza, um licenciado na limpeza é somente ilusão, quanto mais na função pública. Não perco tempo a passar certificados”, deixa claro.
Já na escola 5033, localizada no Distrito do Zango, em Luanda, a solicitação foi maior, sobretudo na primeira semana de inscrição, chegou a uma média de 20 por dia. Contudo, a falta de papéis para imprimir os certificados impediu atender todos no prazo estipulado.
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