ANGOLA GROWING
ANTÓNIO MATIAS, DIRECTOR NACIONAL DAS TECNOLOGIAS AMBIENTAIS

“Faltam empresários no negócio do ambiente”

António Matias defende uma conduta de equilíbrio no consumo e chama atenção para o uso dos processos de reaproveitamento de produtos como óleo alimentar, visando o fabrico de sabão em grande escala. Desafia os empresários a investirem no ambiente.

Grande Ent 120

 Como avalia a qualidade do ar em Angola?

A qualidade do ar requer um estudo minucioso. Existem convenções internacionais que regulamentam produtos químicos que estão na origem da poluição atmosférica. E, nestas convenções, há uma delimitação progressiva desses poluentes. Angola tem estado a cumprir com as metas, decididas na Convenção de Viena e do Protocolo de Montreal que regulamentam produtos colorados e bromados. Angola e 197 países signatários estão a trabalhar na eliminação progressiva de uma única substância poluente, o hidroclorofluocarbono, até 2050.

Qual é o nosso índice de poluição atmosférica?

O teor de poluição tem que ver com o número de indústrias instaladas. Angola é um país com uma indústria ainda ‘adormecida’ e, por isso, a poluição é muito reduzida. Mas é sempre preocupante quer seja em pequena, média ou grande escala.

Se o país não é produtor e apenas consome, deve estar em estado de alerta?

Por termos um fraco desenvolvimento industrial, significa que o país é consumidor. Mas, sendo signatário de vários acordos internacionais e tratados ligados ao ambiente (Protocolo de Quioto e de Montreal), Angola deve trabalhar de modo a diminuir ao mínimo a poluição. É neste sentido que estão orientadas as nossas acções. Elevam-se os altos níveis de nutrientes no mar e, com isso, aumentam substâncias tóxicas que ameaçam a vida das comunidades costeiras.

Quer comentar?

A feira das tecnologias ambientais trouxe várias soluções para resolver os danos ambientais. Isto quer dizer que, aplicando estas alternativas, naturalmente isso evita a poluição do mar, dos rios, do ar e dos solos. O mais importante para o homem é a vida. Temos de ser educados para evitar a contaminação, quer dos solos, quer do mar a partir de poluentes plásticos. De acordo com dados das Nações Unidas, 13 milhões de toneladas de plásticos chegam aos oceanos a cada ano. Isto prejudica o ecossistema marinho. Por isso, o apelo vai a cada governo e habitante do planeta Terra no sentido de trabalhar para reduzir o uso de plástico e de outras substâncias que contribuem para a poluição dos oceanos.

O que o Ministério do Ambiente tem feito para reduzir a poluição do mar do qual depende o desenvolvimento da chamada ‘economia azul’?

Angola tem estado já a trabalhar na implementação das tecnologias ambientais. O Governo aprovou o decreto presidencial 88/14 de Junho que visa promover e incentivar a aplicação das tecnologias. Todavia, a realização da feira visa alertar a população e a comunidade internacional na óptica de aplicar as novas práticas no processo produtivo para reduzir a degradação a todos os níveis. A ‘fuga’ de pessoas do campo para as grandes cidades, como Luanda, é uma realidade. Isso aumenta os ‘musseques’ e com eles a pobreza, complicando ainda mais a qualidade de vida... Estamos a falar das assimetrias e nesse âmbito há políticas do Estado para as reduzir. Por esta razão, as autoridades trabalham em todas as vertentes para mitigar a fome e a pobreza. Naquilo que nos compete, o Ministério tem passado a informação da criação de cooperativas para uma melhor aplicação do óleo alimentar usado, que deve ser reutilizado para o fabrico de sabão. Com isso, as populações carentes aumentam a sua renda e reduzem a poluição das águas e dos solos. Não se refere à qualidade de vida… Do ponto de vista ambiental, onde há qualidade de vida, existe implementação de projectos ligados às tecnologias. Aliás, tecnologias significa prevenir e mitigar danos ambientais. Onde são aplicadas, há melhorias na qualidade de vida. É preciso garantir com carácter de urgência a implementação dos projectos.

Que projectos devem ser já alavancados?

Além da questão da produção do sabão, vou dar mais outros exemplos como o de consumo de água, do reaproveitamento de águas residuais, da energia, tudo isso deve ser feito de forma equilibrada e rentável. Devemos ter uma cultura de poupança e de reaproveitamento. Temos de assegurar para a nossa população uma vida económica e socialmente digna. As nossas florestas que representam os ‘pulmões’, para purificar o ar estão a ‘acabar’.

No meio rural, o abate indiscriminado de árvores é uma realidade e, nas cidades, a arborização é praticamente nula. Isso preocupa-o?

É preciso que se faça o uso racional das florestas. Recomendamos que, ao cortar uma árvore, se plantem 10. Mas também há que saber que tipo de árvore derrubar. Nunca se deve cortar árvores com 40 a 50 anos. Estas servem de monumentos, logo é preciso usar as florestas de forma racional para que sejam igualmente benéficas às gerações vindouras. Luanda tinha uma mata de eucaliptos nas imediações da actual Avenida Brasil. Outras cidades, como Huambo, também tinham à sua volta.

Isso não afecta a qualidade do ar?

De facto, afecta negativamente, mas cabe aos governos provinciais, com os seus gabinetes de gestão do ambiente, tratar de implementar programas de arborização. Além disso, cada um de nós deve participar na ‘guerra’ da arborização da cidade ou do local onde reside. Com a ‘mussequização’ das cidades, aumentou em ‘flecha’ a produção de lixo. No caso de Luanda, o ensaio de vários modelos de recolha ainda não trouxe melhorias... Os ministérios do Ordenamento do Território e o da Habitação têm estado a tratar destas questões. O número de pessoas na capital é elevado e cada um produz lixo. A educação é muito importante. Por isso é que o Ministério do Ambiente tem estado a trabalhar na educação ambiental para que cada um de nós trabalhe no sentido de colocar os resíduos nos locais apropriados e não atirá-los ao sol.

Que soluções aponta para ‘aliviar’ a problemática dos resíduos, sendo que Luanda, de acordo com alguns dados disponíveis, é uma das cidades mais sujas da África ocidental?

Na feira, tivemos a oportunidade de presenciar a exposição de empresas que trouxeram algumas soluções que podem ser aplicadas. Aqui a educação ambiental surge uma vez mais como elemento importante. Os adultos e crianças que visitaram a exposição observaram como podemos tratar o lixo de forma correcta. Em Luanda, poderíamos adaptar o modelo de separação do lixo por tipologia. O vidro e o plástico devem estar separados, assim como a biomassa para a produção de energia. O lixo deve passar por um processo de esterilização para matar bactérias e, deste modo, as doenças. Uma gestão bem conduzida dos resíduos é fonte de riqueza. Portanto, já existem tecnologias para valorizar os detritos, o que falta é a entrada de empresários no negócio. Temos ali uma ‘rica’ oportunidade.

A informação ambiental credível é escassa?

Os ministérios do Ambiente e da Educação já têm trabalhado bastante para disseminar a informação sobre o ambiente nas escolas. Mais importante ainda são os órgãos de comunicação social. Nesta ‘cruzada’, deviam desempenhar um papel relevante.

Os órgãos de comunicação social negligenciam o tratamento de matérias do ambiente?

Sim, assistimos que ignoram muito a divulgação de informação ligada ao ambiente em benefício de outros sectores. Se estes colocarem na sua grelha questões sobre a biodiversidade, alterações climáticas, gestão do lixo e outras tantas que perigam a vida da população isso iria contribuir para uma boa cultura ambiental das pessoas. Para além da necessidade da introdução de cadeiras no currículo escolar que é de extrema importância a informação para uma sensibilização mais alargada. É preciso criar mais programas sobre o ambiente.