Governar às três pancadas
Tenhamos em atenção os três episódios que se seguem.
Primeiro episódio. Na terceira semana do mês passado, o ministro das Telecomunicações, Tecnologias de Informação e Comunicação Social garantiu, perante os deputados, que as televisões suspensas por alegadas transgressões administrativas estavam a tratar da sua regularização para restabelecerem as respectivas emissões. Manuel Homem não se comprometeu com prazos, mas deixou a expectativa de que se tratava de qualquer coisa para breve, ao especificar nomeadamente que estavam em causa ajustes administrativos para as televisões voltarem a emitir com normalidade. Um mês e uma semana depois, Nuno Caldas Albino, o secretário de Estado da Comunicação Social, é citado no ‘Novo Jornal’ praticamente a distanciar-se do seu ministro. Nas palavras do secretário de Estado, o regresso da Zap Viva, da TV Record e da Vida TV não está para breve, porque, entre outras razões, “a criação de um canal de televisão obedece a um conjunto de regras, inclusive a sua aprovação final”. E, segundo Caldas Albino, “a nossa lei estabelece a sua aprovação em sede do Conselho do Ministros”. Ora, entre os 92 artigos que compõem a Lei n.º 3/17, de 23 de Janeiro, a Lei sobre o Exercício da Actividade da Televisão, não há um único que atribua competências ao Conselho de Ministros em matéria de autorizações e licenciamentos a órgãos de comunicação social, muito menos a televisões. Pode dizer-se o mesmo em relação à Lei n.º 1/17, de 23 de Janeiro, a Lei de Imprensa, que funciona como uma espécie de lei de bases. Nessa Lei, em igualmente 92 artigos, não há uma única menção de competências conferidas ao Conselho de Ministros para autorizar operadores de televisão.
Segundo episódio. Os membros do Governo que se desdobram a apresentar a proposta da nova Divisão Política Administrativa exibem, com um dos argumentos de fundo, o combate às assimetrias regionais e a consequente promoção do desenvolvimento. Não somos o primeiro a afirmá-lo, mas vale a pena reforçar que qualquer indivíduo mentalmente saudável sabe que a dimensão territorial das províncias não consta dos problemas centrais que têm emperrado o desenvolvimento do país. Tanto é assim que os próprios proponentes da ideia sabem que o Bengo, quase 15 vezes mais pequeno que o Moxico, com apenas seis municípios e à porta de Luanda, não apresenta nada que o diferencie substancialmente de Malanje. Pela mesma lógica, os proponentes da nova divisão do país não saberão explicar a razão por que o Cunene, o Bié e o Namibe, que são muito maiores que o Uige, onde há menos densidade populacional que o Uige e onde reina a mesma miséria que no Uige, não vão passar pela faca.
Terceiro episódio. Na sua recente visita às obras da futura sede da Comissão Nacional Eleitoral (CNE), o Presidente da República garantiu que as eleições vão mesmo ocorrer em 2022. E, para assegurar que falava a verdade, argumentou que não fazia sentido erguer uma estrutura como aquela que será a CNE, se as eleições não fossem acontecer. Provavelmente, de forma despercebida, o Presidente estabeleceu uma relação causa-efeito entre a construção da futura sede da CNE e a realização das eleições do próximo ano. Como se aquela estrutura estivesse a ser levantada exclusivamente para as eleições de 2022.
Três episódios aparentemente desligados, mas que revelam um drama comum: a inevitabilidade das contradições e a impossibilidade de se arranjarem argumentos racionais, quando se tomam decisões infundadas; quando se gere o país como a extensão do quintal da própria casa, e quando se inventam projectos de dimensão estrutural às três pancadas.
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