ANGOLANIZAÇÃO DO SECTOR PETROLÍFERO

Incapacidade financeira trava entrada de privados na exploração

PETRÓLEO. País parece estar bem na formação de quadros angolanos, mas a elevada exigência financeira no sector tem travado a entrada de investidores nacionais privados na área de exploração.

 

A incapacidade financeira de investidores nacionais privados dificulta o cumprimento pleno do programa governamental de Angolanização do sector petrolífero, especificamente a sua participação nos segmentos de exploração e produção, disse ao VALOR o presidente da Associação das Empresas Contratadas da Indústria Petrolífera de Angola (AECIPA), Bráulio de Brito.

“Operação e exploração são actividades de grande exigência técnica. Ainda não temos técnicos angolanos desta envergadura, nem fábricas que possam produzir a matéria-prima e equipamentos de apoio à indústria”, explica Bráulio de Brito, acrescentado que, por outro lado, “tem exigências financeiras extraordinariamente elevadas que não estão ao nosso alcance”.

A fraca participação de angolanos na produção de petróleo tem sido ‘dolorosa’, dada as dificuldades de investidores em honrar compromissos financeiros. Em 2014, o consórcio Nazaki Oil & Gaz foi excluído da participação em dois blocos devido ao não pagamento das quotas-partes nos blocos 9/09 e 21/09. Segundo a imprensa nacional e internacional, a operadora foi constituída pelo vice-Presidente da República, Manuel Vicente, pelo ministro de Estado e chefe da Casa de Segurança do PR, Hélder Manuel Vieira Dias ‘Kopelipa’, e pelo general Leopoldino do Nascimento.

Num outro decreto ministerial, do mesmo ano, a Falcon Oil Holding Angola, ligada ao empresário António Mosquito, também foi afastada, pelas mesmas razões, do consórcio de exploração de um bloco, onde detinha 5% de participação. Além da exclusão, as duas operadoras foram obrigadas a transferir as suas participações para a Sonangol Pesquisa e Produção.

No entanto, segundo a Sonangol, em 2015, a Falcon Oil Holding Angola registou o maior crescimento de produção de petróleo fruto da operação em outros blocos, com um aumento na ordem dos 3% face a 2014, ano em que, por incumprimento de obrigações financeiras, perdeu o direito de participação no bloco 18/06.

A companhia foi responsável pela produção de 1.714.641 barris de crude em 2015. Estes são considerados casos raros na Angolanização do sector petrolífero.

Para o presidente da AECIPA, não é ainda o momento para empresas nacionais pensarem em tornar-se operadoras ou exploradoras. Aponta a consolidação do sector da prestação de serviços e a melhoria do ‘conteúdo local’ como caminhos a seguir, por enquanto.

Apesar de as condições legais para o processo de angolanização da indústria petrolífera terem sido criadas na década de 1980, com decreto 20/82, apenas no início dos anos 2000 começaram a surgir empresas nacionais privadas do sector, na maioria envolvidas na prestação de serviços.

No entanto, Bráulio de Brito chama atenção para o facto de a maior parte dessas empresas não estar a criar conteúdo local. “Temos, sim, muitas empresas parceiras de multinacionais. A empresa angolana dá a cara, como se diz, mas ainda não desenvolve esses serviços”, observa. O interlocutor esclarece que a prestação de serviços nas áreas de jardinagens e limpeza industrial “não pode ser compreendida como angolanização do sector”.

Embora não tenha avançado números, Brito calcula que, das cerca de 300 empresas prestadoras de serviços, “pouquíssimas” desenvolvem serviços técnicos e específicos à área dos petróleos, a qual se enquadra, de facto, no programa de angolanização. Para o presidente da AECIPA, neste processo, criado pelo Ministério dos Petróleos, a fase de maior sucesso é o processo de formação e enquadramento de técnicos angolanos. Pelo menos, 75% da mão-de-obra da indústria petrolífera já é angolana, em diferentes níveis, segundo Bráulio de Brito.

“Houve uma estratégia muito bem estabelecida de se enviar angolanos para várias partes do mundo em formação. O Governo e a Sonangol fizeram com que as empresas estrangeiras enquadrassem esses técnicos angolanos em programas de desenvolvimento profissional acelerado, o que permitiu que, ao longo desses anos, desde a Independência até à data, pudéssemos ter uma nata de técnicos nossos bem formados”, analisou Bráulio de Brito.