INCERTEZAS DO PETRÓLEO E DO VÍRUS

30 Apr. 2020 V E Editorial

1. Por enquanto tudo gira em torno de incertezas. O Ministério das Finanças prepara-se para apresentar o Orçamento Geral do Estado revisto, mas o mais provável é que tenha de recuar na referência de 35 dólares que apontou inicialmente para o novo preço fiscal. É que, mesmo tomando os 40 dólares que o Fundo Monetário Internacional estima para o preço médio por barril a partir do próximo trimestre, os 35 dólares continuariam a ser uma referência imprudentemente optimista. Até porque as previsões do FMI não deixam de estar atreladas a cautelas. Além da fartura dos principais consumidores mundiais que se aproveitam dos preços baixíssimos para esgotar a capacidade de reservas, colocam-se muitas dúvidas sobre a evolução da própria crise sanitária no futuro imediato.

Uma tendência expressiva e consistente no recuo de novas infecções implicará alívios mais acentuados nas restrições à actividade económica mundial, o que favorecerá necessariamente a recuperação do preço do petróleo para os níveis que o FMI prevê. O contrário, a persistência da pandemia em números acentuados, deitará por terra não só as previsões de uma recuperação paulatina do preço, mas também os entendimentos que os países produtores de petróleo conseguiram alcançar, em termos de cortes na produção. E é preciso lembrar que a hipótese de uma evolução ainda mais desfavorável da pandemia não é propriamente descartável para vários especialistas, incluindo para a Organização Mundial da Saúde que vai alertando, persistentemente, que o novo coronavírus veio para durar.

Há, por isso, um recado que volta a ser recordado para o Governo: a planificação financeira deve sempre ser assumida com pressupostos realistas. A preocupação de inscrever no Orçamento previsões que dão respaldo à estratégia de consolidação orçamental, apenas para encher o olho e embelezar a narrativa oficial, deve ser abandonada. Porque a realidade, invariavelmente cheia de surpresas, acaba sempre por se impor como soberana.

2. As decisões contraditórias na gestão da crise sanitária explicam o que ainda não sabe sobre a pandemia da covid-19. É o que se passa um pouco por todo o mundo e Angola não é excepção à regra. Nas três etapas já decretadas do estado de emergência, as restrições à actividade económica e social foram sendo desagravadas à medida que os casos confirmados de infecções aumentavam. É um paradoxo com uma explicação aceitável: em certa medida, as autoridades sanitárias começaram a gerir a crise a meio de uma ignorância generalizada. A solução passou por endurecer primeiro para desagravar depois, consoante se foi sabendo mais do comportamento do vírus. É por isso que o Ministério da Saúde começou, por exemplo, por desincentivar o uso das máscaras particularmente por pessoas não infectadas e agora afirma que as máscaras são imprescindíveis. É compreensível, mas é também lamentável que não haja humildade suficiente para se reconhecer isso, que não se sabia. Ao invés disso, muitos preferem mesmo brincar aos heróis.