Kingole, uma fonte de sustento para muitas famílias em Luanda
PESCA. Mergulhadores fazem uma a duas horas debaixo do mar sem o devido equipamento. Iguaria já está entre as mais solicitadas nas praças informais nocturnas.
É cada vez maior o número de pessoas e famílias que têm no negócio do kingole (nome informal atribuído a uma das espécies da amêijoa) a principal fonte de rendimento e de sustento. Apesar da importância dos vários participantes do negócio, os mergulhadores ocupam um lugar de destaque desde logo pelo risco que correm. Fazem-se ao mar onde ficam entre duas e três horas para apanharem a espécie que passou a ser um dos petiscos mais solicitados nos mercados nocturnos de Luanda.
Mergulhador na Chicala 1, Vicente Paulo anda a apanhar kingoles há cerca de três anos, fazendo-se ao mar quase diariamente, facturando, em média, 25 mil kwanzas. “Tudo depende da dinâmica do mergulhador", afirma. Por regra, ele e a equipa, ao todo seis elementos, fazem-se ao mar de terça a domingo. "Temos todos os dias clientes à procura dos nossos produtos e fazemos duas a três viagens dependente das encomendas”, revela
Quando a maré está baixa, sentem mais facilidades. Quando está alta, enfrentam muitas dificuldades e o resultado é escasso. "Elas ficam muito distante da área, temos de colocar a mão na área e começar a procurar, por isso usamos luvas para evitar ferimentos”, conta o segredo da apanha dos kingoles.
Grande parte dos mergulhadores, segundo apurou o VALOR, faz-se ao mar sem balões de oxigénio “por serem muito caros”, justificam. “Apenas fazemos o uso da apneia e uma mangueira para mandar o ar para fora”, explica Vicente Paulo.
Os caçadores do famoso kingole enfrentam ainda o desafio das baixas temperaturas no tempo de cacimbo, visto que “a água tem ficado muito gelada”. Uma dificuldade que é ainda maior com a falta de equipamento apropriado”.
“Nem todos mergulham com 'snop', barbatanas e máscaras, muitos mergulham sem o equipamento completo por que dizem ser muito caro nas lojas de mergulhos”, revela estimando que o preço oscila entre 20 e 40 mil kwanzas nas lojas. A opção tem sido a procura de fardos, mas nem sempre aparece.
Por enquanto, ainda não há mulheres a apanhar o kingole. Nenhuma arrisca, por considerar a prática muito arriscada.
VONTADE DE FORMALIZAR
Os mergulhadores queixam-se da falta de respostas das autoridades em relação ao processo de formalização do negócio. “Não temos nenhuma autorização para exercer esta actividade, já fomos até à Polícia Fiscal e pediram para tratar alguns documentos. Tratamos, fizemos chegar à polícia e questionamos também se temos ou não de pagar alguma coisa, mas, até agora, não nos deram nenhuma resposta”, lamenta Vicente Paulo.
Apesar da falta de resposta das autoridades, os mergulhadores garantem que têm colaborado e sido úteis para os bombeiros na busca de corpos, quando há afogamentos. “Temos ajudado os bombeiros, puxamos os corpos até à beira e chamamos o corpo de bombeiros para fazerem o trabalho”, explica um dos mergulhadores ao VALOR.
Os mergulhadores mais antigos, contactados pelo VALOR, estão na apanha das kingoles há pelo menos 10 anos. Mas só nos últimos anos têm sido mais solicitados, o que resulta no crescimento do negócio em Luanda.
UM NEGÓCIO LUCRATIVO
Por outro lado, Elias Bartolomeu (nome fictício), um dos clientes e vendedor dos mergulhadores da Chicala. Morador da Centralidade do Kilamba, é vendedor de kingoles há seis meses. Considera um negócio lucrativo. Compra “o balde de 25 quilos a 7 mil kwanzas, cerca de provavelmente 250 kingoles, para vender a 125 kwanzas durante o dia”. “Posso facturar 35 mil kwanzas por dia se tiver um bom número de clientes, se não tiver um número elevado de clientes posso vender até 16 mil kwanzas.
Por dia, gasta 2.500 kwanzas no táxi com a viagem do Kilamba à Chicala 1. Aqui, compra aos mergulhadores e vende para o Kilamba. Os moradores da Centralidade têm procurado muito esta refeição e dá também para fazer um investimento para quem sabe gerir com o dinheiro do kingole. "Nunca pensei em desistir mesmo quando são aqueles dias ruins que ninguém compra nada e o produto acaba estragando, o melhor é continuar para não ter de ficar sem fazer nada na vida", confessa.
Por seu lado, grande parte dos mergulhadores revelou ao VALOR que investe os valores na família, mas não descarta a existência de colegas que gastam em roupas, festas e bebidas alcoólicas.
BCI fica com edifício do Big One por ordem do Tribunal de...