Manual para um novo OGE
Quem acompanha as matérias sobre o histórico da planificação financeira do Estado sabe que o quadro já foi muito mais sombrio. Os processos de elaboração do Orçamento Geral do Estado evoluíram de uma situação de opacidade total para um cenário de alguma transparência. E os sinais do início dessa evolução que reconhecemos hoje começaram a ocorrer na segunda metade da década antepassada. Foi nessa altura que o Governo começou a dar-se ao trabalho de apresentar um documento com as despesas e receitas mais discriminadas, ainda que, em termos de definição de prioridades e de execução, a conversa sempre fosse outra. Todavia, para todos os efeitos, passou a ser o início de qualquer coisa que teria de evoluir no sentido positivo.
Passada década e meia, tem de haver o reconhecimento de que o Orçamento Geral do Estado é um documento cada vez mais bem apresentado e, sobretudo, mais detalhado. Os desafios da transparência estão, entretanto, longe de estarem estabilizados e a questão que o VALOR levanta esta semana é um exemplo terminado disso mesmo.
Pelas contas do jornal, o Presidente da República aprovou, em apenas quatro meses, projectos não orçamentados acima de 2,8 mil milhões de dólares. É preciso prevenir que o jornal até pode ter sido condescendente por omissão, uma vez que menciona outros projectos aprovados e não previstos, cujos custos não aparecem determinados nos decretos presidenciais.
Mas, voltando à questão, o Presidente da República autorizou os projectos e não cometeu qualquer ilegalidade, porque a aprovação de novas despesas a meio do caminho é uma prerrogativa que lhe está reservada na própria lei orçamental. Ora, é precisamente isto que, no futuro, tem de ser alterado em nome do aprofundamento da transparência.
É certo que o Presidente tem de ter a possibilidade legal de autorizar despesas extraordinárias, porque a lógica dos imprevistos assim o exige. Situações inesperadas como o surgimento da pandemia podem exigir custos que, no nosso caso, nem as reservas orçamentais suportariam e não haveria outra forma, senão o recurso a outras fontes, incluindo o endividamento. O que não é aceitável muito menos transparente é a hipótese que a Lei dá ao Presidente de inscrever novos projectos no decurso da execução orçamental, sem quaisquer limites. Bastando apenas que os justifique como sendo de “significativa importância” para o alcance dos seus objectivos. Mais controversa é ainda essa facilidade, se tivermos em conta que, ao contrário do Orçamento, estas despesas extras acabam autorizadas, sem a confirmação do Parlamento.
Sendo o OGE teoricamente um instrumento de compromisso, o alcance da sua transparência deve ser circunscrito aos limites fixados na fase de negociação e de aprovação políticas. Quando o Presidente se reserva a prerrogativa de fazer acréscimos de forma discricionária, mina-se a transparência e abre-se espaço para todo o tipo de aproveitamentos. Sobretudo os eleitoralistas, claro. Precisamente por isso é que, mesmo havendo dezenas de angolanos que morrem de fome todos os dias, o MPLA pensa ser mais prioritária a construção de centralidades.
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