CRISE FORÇOU CORTES NA PRODUÇÃO E DESPEDIMENTOS

Materiais de construção disparam nos mercados formal e paralelo

23 Sep. 2020 Economia / Política

PRODUÇÃO NACIONAL. Deficientes infra-estruturas de distribuição de energia e água, mau estado das estradas, burocracia excessiva no acesso às divisas e escassez de recursos humanos especializados pesam na fixação do preço final.

Materiais de construção disparam nos mercados formal e paralelo
D.R

Os preços dos materiais de construção dispararam significativamente desde o início da pandemia, chegando a atingir, em alguns casos, a fasquia dos 150%, verificou o VALOR em estabelecimentos comerciais e mercados informais de Luanda.

Dos anteriores 200 mil kwanzas necessários para uma tonelada de ferro, por exemplo, quem for a uma loja nos dias que correm deve desembolsar um mínimo de 300 mil kwanzas, num aumento médio de 50%. Mais elevada é a mexida no informal, em que um conjunto de varão de 10 metros passou a custar 50 mil kwanzas, ao contrário dos 20 mil anteriores à pandemia. Ou o conjunto de 12 metros que passou de 30 mil para 70 mil. Se, no segundo caso o aumento foi de 134%, no primeiro atingiu os 150%.

A alteração dos preços é justificada, sobretudo, com a forçada quebra da produção, o que levou também a despedimentos de mão-de-obra, face ao agravamento da crise económica. A Fabrimetal, por exemplo, reduziu a produção de 12 mil para oito mil toneladas por mês, em Fevereiro. Mas, em Maio, voltou a cortar para 6,5 mil toneladas/mês.

Luís Diogo, director-geral da empresa, explica que a maior dificuldade se prende com a escassez de matéria-prima (sucatas), visto que boa parte é proveniente de outras províncias. E, com as limitações impostas pela cerca sanitária, os fornecedores ficaram impossibilitados de acederem a Luanda, além das dificuldades do exterior que garante 60% da produção.

Referindo-se ao quadro geral do sector, José Mangueira, presidente da Associação das Indústrias de Materiais de Construção de Angola (AIMCA), explica que muitas fábricas fecharam, outras conseguiram aguentar-se, mas “estão mais frágeis do que já estavam. “Desde o início de Maio, quando a construção civil voltou a trabalhar, naturalmente nota-se uma melhoria. Contudo, esta melhoria não é ainda suficiente para permitir que as indústrias se aguentem ou possam investir”, observa.

Entre as dificuldades que justificam também a alta de preços, Mangueira aponta algumas já consideradas habituais, como as deficientes infra-estruturas de distribuição de energia e água, o mau estado das estradas, a burocracia excessiva, com realce ao acesso às divisas para a importação de matéria-prima, pagamento de trabalhadores estrangeiros e para assistência técnica especializada. “A subida dos preços não reflecte, ainda assim, a desvalorização da moeda nacional e a taxa de inflação (20,90%) é inferior à da desvalorização cambial”, confere, reparando que “os preços dos materiais de construção vão estabilizar quando, num primeiro momento, houver uma travagem da desvalorização cambial e, num segundo momento, quando a dimensão do mercado e a concorrência aumentarem”.

Para o industrial, é “errado” o argumento de que os materiais de construção fabricados no país são muito caros. “É muitas vezes errado, sobretudo desde finais de 2019 com a acertada actualização da Pauta Aduaneira. E, mesmo que fosse verdadeiro - e às vezes até pode sê-lo –, a única forma de baixar o preço do que se produz no país é através de concorrência”, sublinha, lamentando o facto de muitos empreiteiros “desconhecerem o mercado nacional e optarem por importar materiais de construção com o fito de transferirem lucros em divisas”.

EXPORTAÇÃO DEPENDE DO EXECUTIVO

José Mangueira acredita na possibilidade de exportar os produtos para os países vizinhos desde que os preços estejam ajustados ao mercado internacional. Para o efeito, defende que o Executivo deve tomar “medidas importantes e urgentes” que facilitem o processo, como é o caso do aumento da capacidade de transporte ferroviário, rodoviário e marítimo para os países da região. “Só assim se poderá fazer frente ao comércio fronteiriço informal e fechar acordos com os países limítrofes que defendam os interesses dos produtores nacionais”, explica.