"No fim da próxima legislatura não teremos petróleo para sustentar uma parte significativa do nosso consumo"
Lança críticas aos cálculos do Instituto Nacional de Estatística sobre o PIB, inflação e produção nacional, e alerta o Executivo de que não se pode fazer 'festa' com a subida do preço do petróleo porque o país pode ficar sem reservas depois do mandato do próximo Governo. Heitor de Carvalho, economista e director do Centro de Investigação Económica da Universidade Lusíada de Angola (Cinvestec), defende a fixação de uma taxa de câmbio estável com base na produção e produtividade nacional e não no mercado internacional.
Que avaliação faz às políticas económicas, de uma forma geral, desta legislatura que termina?
A medida mais tradicional que nos permite medir a eficácia das políticas económicas é o Produto Interno Bruto, mas não é assim tão simples em países como o nosso. Infelizmente, temos uma medida do PIB, que é dada pelo INE, que não tem em conta, além de outros problemas, a variação do valor do preço do petróleo. Ou seja, para o INE o que conta são as medidas em quantidade. Ora, porque o PIB mede essencialmente os rendimentos reais e não a produção, tem que ter em conta a variação do preço do petróleo. O INE, por influência das organizações internacionais, nomeadamente o FMI, calcula em medidas de volume, isto é, a variação das quantidades. Esta forma de medir distorce aquilo que são os rendimentos disponíveis para a economia nacional funcionar. Prefiro medir os rendimentos pelo valor nominal deflacionado. Dito de outra forma, a quantidade de produtos finais de que podemos dispor é muito maior quando o preço do petróleo está alto. É isso que é importante medir, não as quantidades de produtos que produzimos, mas as de produtos finais a que podemos ter acesso com aquilo que produzimos: são coisas diferentes.
É essencialmente um problema de cálculos?
Aí temos outro problema. Quando medimos em dólares ou kwanzas deflacionados temos de saber qual é a inflação? E aqui temos mais um grande problema nos números do INE. Temos hoje os preços da generalidade dos produtos a baixar muito (e tem que ser assim porque a taxa de câmbio baixou muito), mas o INE diz que os preços estão a subir 22% relativamente ao ano passado. Se não temos preço nenhum, que esteja 22% acima do ano passado e temos muitos produtos abaixo do ano passado, como estão a dizer que a média dos preços, relativamente ao ano passado, é de 22%? Temos aqui um problema de cálculo da inflação que nos dificulta o cálculo do PIB real. Um cálculo correcto da inflação é fundamental para calcular os agregados económicos. O certo é que qualquer que seja a medida, o PIB baixa ou estagna. Em medidas encadeadas de volume, do INE, o PIB em 2021 corresponde apenas a 93%, do que era em 2017. Medindo pelo PIB nominal deflacionado, há uma ligeira subida de 1%. Mas esta subida é resultante das exportações. O consumo interno dos nossos produtos representa apenas 79% do valor de 2017! As exportações é que sobem relativamente a 2017. Esta ideia de que houve uma descida muito grande nos preços do petróleo e, por isso, é que a economia funcionou mal, não é bem assim, porque as exportações, em 2018, são quase 60% superiores a 2017, em 2019 são 30% superiores a 2017, e em 2021 são novamente 60% superiores a 2017. Só em 2020 é que as exportações são 25% inferiores ao que eram em 2017. O preço do petróleo baixou muito, mas relativamente a 2014, não a 2017, no início da legislatura. Resumindo, de acordo com o INE, o PIB total baixou 7% na legislatura; de acordo com a nossa perspectiva, o PIB manteve-se, mas à custa de uma subida de 60% das exportações e uma descida de quase 20% da produção consumida internamente.
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