EM CAUSA A LEI DA PROBIDADE PÚBLICA DE 2010

Nomeação na Sonangol divide opiniões

13 Jun. 2016 Isabel Dinis De Jure

CONFLITO. A lei da probidade pública coloca limites nas nomeações para cargos públicos. É nisso que se agarra quem defende a ilegalidade da nomeação de Isabel dos Santos para a Sonangol. Mas há quem tenha uma leitura contrária.

Depois de o Presidente da República ter nomeado Isabel dos Santos para a presidência do Conselho de Administração da Sonangol, a comunicação social e as redes sociais inundaram-se de reacções, sobre uma possível violação da lei da probidade pública. Uns afirmam que “não houve violação da lei”, outros afirmam “categoricamente” que a nomeação é “ilegal”.

A lei da probidade pública, de 29 de Março de 2010, enumera que o agente público deve tratar “de forma imparcial os cidadãos com os quais entra em relação”, a actuação deve “fundar-se em considerações objectivas, orientadas para o interesse comum, a margem de qualquer outro factor que favoreça posições pessoais, familiares, corporativas ou qualquer outra”.

No documento, pode ler-se que o agente público está “impedido de intervir na preparação, na decisão e na execução dos actos e contratos”, “quando por si só ou como representante de outra pessoa, nele tenha interesse seu cônjuge e ou parente na linha recta ou até em segundo grau da linha colateral, bem como com quem viva em comunhão de mesa e habitação”.

Luís de Nascimento não tem dúvidas de que “houve violação da lei da probidade pública” pelo facto do Presidente nomear a filha. Para sustentar o argumento, o advogado cita o artigo 28.º da lei que impede o agente público de intervir na decisão e execução dos actos e contratos. “A nomeação da filha do Presidente, por uma questão de ética, não devia ser feita. O que acontece é que há um aumento do nepotismo e somos capazes de ter os filhos do Presidente como ministros”.

Opinião contrária tem Esteves Hilário que entende que não se deve colocar a questão de haver improbidade pública. O jurista acredita que, para que se configure o “acto improbo”, seria necessário “a ofensa a uma disposição específica da lei da probidade pública”. A questão coloca-se “muito mais no respeito e celebração ao princípio da moralidade que deve governar a administração pública, bem como no princípio da finalidade dos actos da administração pública”.

Esteves Hilario entende que, para que a nomeação “seja ilegal”, devia ter havido a “prática de um acto contrário à lei”. “Entre a legalidade e a ilegalidade da acção ou omissão do poder público está a moralidade como critério”, afirma. “Não parece ter havido afronta directa à lei, porém, parece-nos ser sindicável a possibilidade ou não de ter havido algum desvio da finalidade da nomeação. De qualquer modo compete aos tribunais aferir e conferir respostas a essas perguntas” declarou.

No documento, lê-se ainda no principio da probidade, no artigo 5.º, que o agente público “pauta-se pela observância de valores de boa administração, honestidade no desempenho da sua função, não podendo solicitar ou aceitar, para si ou para terceiro, directa ou indirectamente, quaisquer presentes, empréstimos, ofertas que possam pôr em causa a liberdade da sua acção, a independência do juízo e a credibilidade e autoridade da administração pública”.

Outro dos que defendem a nomeação é o sociólogo João Paulo Ganga que elogiou, num programa na Tv Zimbo, a indicação do novo Conselho de Administração da Sonangol como “uma medida de coragem do Presidente da República e uma estratégia de defesa do interesse nacional”. “Há uma animosidade muito grande, mas penso que o Presidente esteve bem”, reforçou. O sociólogo, que habituou o público com a sua frontalidade nas abordagens, não caiu nas ‘graças do povo’ com essas declarações. Alguns internautas chegaram a dizer que o sociólogo “já tinha sido comprado pelo Governo”.

No programa, João Paulo Ganga defendeu que a nomeação foi uma “reacção àquilo que aconteceu em Portugal” e pediu a empresária para ganhar “juízo” nas suas funções, mas defendendo as alegações de violação à lei eram “infundadas”.

A nomeação fez ainda com que um grupo de juristas se reunisse, em Luanda, para analisar a possibilidade de impugnar judicialmente a nomeação da empresária Isabel dos Santos, confirmou o advogado David Mendes, ao VALOR. O grupo de juristas pretende brevemente enviar à Procuradoria-Geral da República, esse pedido de impugnação.