O DESENHO DA FRAUDE: OS FACTOS
Aconteça o que acontecer no pós-24 de Agosto, os angolanos votaram numa eleição rotundamente fraudulenta. E o desenho da fraude começou a ser exposto cedo, com a escolha criteriosa dos concorrentes. A inviabilização do projecto de Abel Chivukuvuku foi a primeira demonstração dos limites que o poder estava disposto a ultrapassar. Seguiu-se a tentativa de expurgo de Adalberto Costa Júnior que acabou entalada na garganta do MPLA. Tudo o resto, em matéria de sucessão de irregularidades, não foi menos expressivo.
Na discussão da Lei eleitoral, em 2021, João Lourenço, enquanto Presidente da República, recomendou aos deputados que ajustassem aspectos que conferissem maior transparência e que garantissem mais equilíbrio entre os concorrentes.
A recomendação tinha como destinatário sobretudo os deputados do seu partido que não cediam um palmo em questões de ruptura, como a centralização do apuramento dos votos. Os deputados do MPLA decidiram ignorar os recados do seu presidente e a Lei acabou aprovada. João Lourenço teve, entretanto, a última palavra para corrigir o tiro, recusando-se a promulgar a Lei, mas não foi o que sucedeu. Optou por contrariar-se, promulgando-a, ao arrepio da contestação geral da oposição e da sociedade.
As queixas não acabariam. A suspeita INDRA, acusada reiteradamente de ajudar o MPLA a roubar os votos, foi mantida a ferro e fogo como fornecedora da solução tecnológica. A ela juntam-se várias outras estruturas consideradas paralelas e denunciadas oportunamente, mas quem se beneficia das irregularidades manteve-se hirto. Nem um sinal de recuo e, mais uma vez, todos os gritos de contestação caíram em saco roto.
Veio também a polémica dos mortos. Tema ignorado pela oposição e pela sociedade nos anteriores processos eleitorais, desta vez o poder foi encostado à parede para eliminar os falecidos no ficheiro dos cidadãos maiores. Particularmente os que já lá contam há vários anos. O Governo respondeu que sim, consciente de que estava a dizer não, ou seja, mentindo descaradamente, mais uma vez. Qual canino fiel ao dono, a CNE teria a última oportunidade de auditar o ficheiro e exigir a expurgação dos mortos, mas decidiu seguir o guião do partido-Estado e submeter os dados à certificação do Tribunal Constitucional. Ainda assim, simulando obediência aos formalismos legais, a CNE acabou por aprovar à margem dos prazos um relatório de auditoria, contestado pela oposição de ponta a ponta.
Adiante. As reclamações contra as irregularidades do processo prosseguiram e juntaram a deslocação geográfica de eleitores e a replicação de nomes em assembleias de voto. Em Luanda, denúncias públicas nunca desmentidas não só colocam eleitores do Camama a votarem em Viana, sem qualquer fundamento, como mostram eleitores com nomes em duas assembleias de províncias diferentes.
Há mais. Ao conjunto deste rol de irregularidades, soma-se o trabalho escandalosamente desequilibrado dos órgãos de comunicação a favor do MPLA. Não menos importantes, os discursos e certas acções das forças de defesa e segurança que sugerem dissimuladamente que votar contra o MPLA é votar contra e paz e contra a estabilidade.
E como se os angolanos já não estivessem suficientemente insultados, lá chegam alguns observadores ‘primos, amigos, comparsas e candongueiros’ do poder, com a conversa fiada de um processo globalmente transparente.
É claro. Voltamos onde tudo começou. O somatório dos factos, alguns dos quais até omitidos aqui, é inquestionável. Suceda o que suceder no ‘day after’, as eleições foram cozinhadas e temperadas com batota por obra do poder. Mas os angolanos não devem vergar-se apenas perante o muro das lamentações. Podem e devem fazer mais. Apesar de tudo, os angolanos devem votar. Ou para honrar a vitória nas urnas ou para envergonhar a derrota fabricada nos computadores. Não há meio-termo.
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