ANGOLA GROWING
JOSÉ CARVALHO DA ROCHA, MINISTRO DAS TELECOMUNICAÇÕES E TECNOLOGIA DE INFORMAÇÃO

“Operadoras gastam 20 milhões/mês de USD em segmento espacial”

Operadoras de telefonia gastam entre 15 e 20 milhões de dólares/mês na compra de segmento espacial que permite utentes falarem aos telefones, segundo o ministro das Telecomunicações e Tecnologias de Informação, José Carvalho da Rocha, que aponta, em entrevista, os benefícios económicos e sociais do satélite angolano. O governante garante que o programa espacial de Angola não se fica pelo AngoSat-1.

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Já é de domínio público que o AngoSat-1 vai ser lançado este ano. Qual é a data concreta?

Temos estado a trabalhar já neste ambiente há mais de 10 anos. Só a construção do satélite levou mais de três anos. Agora, estamos na fase final dos testes. Já fizemos os testes eléctricos todos e foram óptimos. Estamos a simular todas as situações que o AngoSat-1 encontrará enquanto estiver na atmosfera, porque, em órbita, o satélite vai sofrer alteração do sol, da terra e de outros astros que vão girar muito próximo dele, ou seja, poderão ocorrer perturbações. O que estamos a fazer é simular todas essas situações prováveis, de modo a que possamos garantir que o satélite, quando estiver em órbita, possa viver o tempo para o qual foi desenhado.

Quanto tempo?

São 15 anos e mais alguma tolerância em função das manobras que fizermos aqui em terra. Portanto, só quando terminarmos isso, e vamos terminar provavelmente estes testes até ao fim do mês, é que vamos poder determinar a data exacta do lançamento. Sem terminarmos efectivamente os testes, não temos uma previsão. O que posso garantir é que este ano temos de colocar o satélite em órbita. Repare que, quando estiver em órbitra, ninguém mais vai lá, então temos de garantir aqui que este objecto que vai servir o nosso país e a todos nós, enquanto utilizadores das ‘tics’, fique lá o tempo para o qual foi desenhado. É um trabalho extremamente complexo.

E como todo esse processo está contratualizado?

Os contratos estamos a geri-los de forma paralela. Temos um contrato para a construção e colocação em órbitra; temos um contrato de aluguer do segmento espacial durante o tempo em que o satélite estiver em órbita, e temos um contrato, que é o segmento terrestre, de construção do Centro Comando do Satélite que já está pronto na Funda.

Paga-se a área espacial onde vai ficar o satélite?

O satélite tem de estar numa posição em órbitra. O nosso satélite vai estar na posição 12.8 graus Este, na órbitra geostacional. Estas posições normalmente são alugadas a aqueles países que as detêm. Por isso, fizemos um contrato de aluguer desta posição durante o tempo de vida do satélite. Neste caso, com a Rússia.

Os 320 milhões de dólares são o valor global para os três contratos?

Sim. É importante verificar que estamos a gerir um projecto, que é chave na mão, e está a ser financiado por um conjunto de bancos russos. Havia, entretanto, algumas questões em terra que eram obrigações do Estado angolano e fizemo-las todas sem constrangimentos. Por exemplo, puxar a água do rio Bengo até ao Centro de Comando que dista cerca de três quilómetros. Precisamos de ter água 24/24 horas para questões de incêndio, para o sistema de refrigeração e outros sistemas que o centro demanda. Tivemos de construir a parte de energia de suporte ao centro e todo o sistema de tratamento de água, não só para incêndios, mas também para que todas as pessoas que forem ao centro possam utilizar água potável. Tivemos ainda - era obrigação de contrato - de fazer uma pequena estrada de um quilómetro e meio, desde o entroncamento da Funda até ao centro. Essas eram as obrigações do Estado angolano e, de facto, cumprimos todas essas responsabilidades. Pode parecer, à partida, muito dinheiro e, de facto, é muito dinheiro, mas também devo dizer que é dinheiro recuperável.

Quanto custa o aluguer de segmento espacial?

As nossas operadoras gastam bastante. Em média, entre 15 e 20 milhões de dólares/mês só para comprarem segmento espacial que nos permite falar nos telemóveis, ver televisão, enfim. Mas também para fazermos a transmissão de comunicação em alguns pontos, naqueles onde não conseguimos pôr fibra óptica ou micro-ondas. Portanto, trata-se, de facto, de um valor muito grande. Mas, feitas contas rápidas, em dois ou três anos, nesta óptica, é possível pensarmos em recuperação.

Quanto custou a construção do Centro de Controlo da Funda?

Estamos a construir um centro moderno que deve estar à volta dos 25 milhões de dólares. Um centro moderno que não deve ter paralelo aqui na nossa região e muito menos em África. Um centro equipado com condições propícias para depois não só servir o AngoSat-1. É importante que se diga isso: vai servir o AngoSat-1 como centro principal, mas também este centro poderá ser uma alternativa a outros centros que existem no mundo. Imagine que há países que têm iniciativas dessas e não querem ter um centro, podem contratar-nos para fazer o trabalho de gestão ou, pelo menos, para sermos um ‘back up’. O nosso centro está preparado para isso. Para servir os nossos objectivos , como também dar apoio e servir outros objectos que possam surgir na nossa região.

Como é que se vai desenrolar o ‘plano de recuperação’ dos 320 milhões de dólares investidos?

O AngoSat-1 vai promover o emprego, portanto, vamos poder criar micro empresas direccionadas a jovens para cobrir muitas zonas cinzentas que temos no país. Tem a parte naturalmente económica de recuperação do investimento. Vamos dedicar 80% das capacidades do AngoSat-1 à disposição dos diferentes operadores. Assim que anunciamos as vendas, estamos com uma concorrência muito grande.

As reservas de capacidade ja começaram. Como funcionam os preços?

Nesta fase, discutem-se preços, depois chega-se à fase em que os clientes têm de dar um sinal. A TPA, por exemplo, deu um grande passo, prestou um grande serviço ao projecto. Tivemos já aqui também uma operadora da nossa vizinha RDC que veio já fazer reserva de capacidade. Hoje, o que assistimos é que muitos outros países e empresas estão a solicitar reservas de capacidade do AngoSat-1.

Pode estimar o volume de negócio já assegurado com as reservas?

Não. Mas estamos com muito boas reservas. Estamos felizes com o que está a acontecer. O que vai surgir aqui é um satélite angolano e as nossas operadoras vão poder comprar em kwanza, ao invés de comprarem as capacidades em divisas. Vamos poder levar o sinal das comunicações e os serviços ligados às telecomunicações de informação a todo o território nacional, porque ainda não o fazemos pelos condicionalismos que temos.

O satélite vai fazer baixar o preço das telecomunicações?

Temos de desenvolver um conjunto de acções que concorram para que as comunicações sejam cada vez mais acessíveis e uma delas é construirmos as infra-estruturas. Estamos a construí-las com muito sacrifício. Mobilizar esses montantes todos não é fácil. Hoje, as comunicações não são reservas absolutas do Estado. Já estão abertas à concorrência. Ou seja, abrimos o sector. Vamos ter, num futuro muito breve, três operadores globais, aqueles que vão poder prestar toda a gama de serviços. Quer dizer que vamos aumentar a concorrência em cada uma dessas áreas e vamos ter os operadores multisserviços, para aumentar a concorrência em diferentes áreas. Com todas essas condições que estamos a criar (infra-estruturas, abertura de mercado), estamos, de facto, a criar um ambiente propício para que o mercado em si se realinhe. A concorrência tem os seus efeitos positivos para clientes finais. É todo este ambiente que estamos a criar.

O próximo operador de telefonia móvel será a Angola Telecom. Ainda há espaço para mais operadoras?

Tudo depende do mercado, mas temos de olhar também para o equilíbrio. As próprias operadoras, fruto dos seus rendimentos, realizam investimentos. Por isso, há aqui um exercício que temos de olhar de forma equilibrada em termos de mercado. A ideia de móvel (telefonia), por exemplo, é um conceito que vai acabando. Temos de ter um serviço global, em que eu, por exemplo, se for a uma operadora contratar um serviço, ela fornece-me voz, dados, internet e televisão. Para isso, a operadora terá de ter uma licença. Portanto, o que vai ocorrer, no nosso país, é que vamos ter três operadoras que vão poder prestar todo esse tipo de serviço.

Há pedido de licenças para novas operadoras?

Isso vai ocorrer diante do regulador. Houve um anúncio no jornal público, sobre a emissão de novos títulos habilitadores. Vamos inclusive fazer leilão de frequências para que essas empresas que tenham os títulos possam ter direito à frequência.Só que é importante verificar que esse recurso de frequência é escasso.

Depois de o satélite estar em órbita, qual será o papel dos russos?

Estamos num mundo de alta tecnologia e estamos a caminhar numa área nova da ciência para nós. Somos crianças e, normalmente, se a criança está a começar a engatinhar, para andar a andar, alguém tem de a apoiar. É esta a trajectória que queremos fazer com humildade, formando bem os nossos jovens especialistas, colocando-os a trabalhar em situações reais e não só em simulação. É o que estamos a fazer com aqueles especialistas e, no contrato, prevê-se também que, durante pelo menos um ano, vamos trabalhar em redundância tanto aqui como em Moscovo. Os nossos técnicos vão trabalhar nesse ambiente com especialistas russos, depois vamos decidir se temos de os contratar mais ou se os largamos. O país vai fazer uma caminhada para um mundo de ciência nova.

Quantos técnicos estão a ser formados?

Nesse momento, dedicados ao centro, temos 47 engenheiros. E temos outros em áreas de apoio. No total, no Gabinete de Gestão do Programa Espacial Nacional, temos 60.

O programa espacial do Governo não se resume ao AngoSat-1?

Hoje, estamos a falar do AngoSat-1, que vai ter 15 anos de vida. Depois, vamos tentar falar de um AngoSat 2,3… Esse crescimento exponencial que estamos a verificar no país vai continuar. No AngoSat-1, estamos a fazer com cooperação, mas no quarto ou quinto - estamos a imaginar um país daqui a 30 ou 40 anos - tem de haver no mínimo um parafuso ‘made in Angola’. Isso para demonstrar até que estamos a crescer tecnologicamente. Ou seja, o projecto vai desafiar a própria indústria e outras áreas. Vamos colocar um objecto em órbitra que não vai atender apenas às necessidades sociais do Estado. Precisamos de promover, por exemplo, a telemedicina; precisamos de ligar hospitais de referência em Luanda com centros naquelas regiões onde temos dificuldades de médicos; precisamos de levar internet às escolas, por via do AngoSat-1, até para aquelas escolas longínquas para que os alunos acedam a diferentes bancos de dados. Devo dizer que, na área da tecnologia, vamos continuar a formar as pessoas. Temos de actuar sobre a educação; temos de fazer interessar o mundo académico a trazer cursos ligados a estas áreas, ou especialização, pós-graduação ou mestrados, quiçá doutoramentos ligados a esta área.

Modernização do INAMET orçada em 180 milhões de dólares

Há um plano de modernização do Instituto Nacional de Meteorologia (INAMET)?

Naturalmente. Há um plano de desenvolvimento estratégico já aprovado em Conselho de Ministros. Agora, estamos à procura de financiamentos. Temos estado a negociar com as várias propostas para desenvolvermos o plano do INAMET. Aqui temos vários desafios, tanto para as estações meteorológicas como para as estações sísmicas. Mas também para outros sistemas que nos ligam à nossa região e que nos ligam ao mundo, de modo a que toda a informação meteorológica, que é colhida no nosso território, fique disponível para utilizadores internos e externos.

Em quanto está orçado esse plano?

Temos um projecto de modernização avaliado em cerca de 180 milhões de dólares. Trata-se de uma modernização profunda, sendo que já começamos com a formação das pessoas. Não adianta ter tecnologia se as pessoas não a usarem. Estamos a formar já há mais de seis anos. Enviámos um grupo de 11 jovens ao Brasil. Também estamos com a Faculdade de Ciências da Universidade Agostinho Neto a formar mais seis meteorologistas. Estes até já estão a trabalhar e a garantir algumas operações aqui.

A ideia é tornar o INAMET rentável?

É um dos grandes desafios. Para ser um instituto público, tem de ter a capacidade (a lei assim o obriga) de suportar, pelo menos, 25% das suas despesas. Esse é um desafio que temos. O INAMET tem estado a dar um grande apoio à aviação civil. Não é possível realizar um voo, ou aterrizagem ou descolagem, sem informação meteorológica. Na TPA, no fim do noticiário, há uma informação que o INAMET presta a todos nós sobre o estado do tempo.

Mas não transita para uma empresa?

Não tem de ser uma empresa pública para ser rentável. Rentável, pelo menos, no sentido de suportar parte das suas despesas, porque o que queremos do instituto é que seja um verdadeiro centro de investigação científica, de modo a que esse trabalho que desenvolve em termos de ciência possa ser transferido para a sociedade como serviços. E daí, eventualmente, receber alguns rendimentos. Mas o INAMET, sendo um centro de investigação, vai continuar a requerer uma atenção especial do Estado.