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BANCO PÚBLICO A CAMINHO DA SEGUNDA RECAPITALIZAÇÃO

Paixão Júnior deixa BPC com ?96 “insuficiências” por esclarecer

BANCA. Direcção de auditoria e controlo interno do banco detectou 147 insuficiências de gestão, 96 das quais ainda em fase de resolução, além da redução de 6,9% nos lucros. Irregularidades abrangem áreas de crédito, depósitos e informação financeira. Créditos a clientes levam maior reserva.

Um relatório interno do Banco de Poupança e Crédito (BPC) revela que, durante os últimos meses da gestão de Paixão Júnior, foram detectadas 147 insuficiências no controlo interno do banco, abrangendo as áreas de crédito, depósitos, mercado monetário e a divulgação e preparação de informação financeira.

Denominado ‘Relatório Anual sobre Governação Corporativa e Sistema de Controlo Interno’, o documento separa as insuficiências em áreas de actividades e grau de risco, classificando-as em “reduzido”, “médio” e “elevado”.

Do grupo de insuficiências identificadas, 12 integram o grupo de risco reduzido, 46 de grau médio e 89 de grau elevado, sendo que 34,6% do total das irregularidades observadas já foram concluídas. As restantes insuficiências estão em fase de resolução, conforme o grau de risco identificado (ver quadro ao lado).

Desenvolvido pela direcção de auditoria e controlo interno do banco com a data de Dezembro 2015, o relatório foi colocado no site da instituição antes da exoneração de Paixão Júnior, que desempenhou as funções de presidente do conselho de administração, ao lado de João Freire, Maria de Fátima da Silveira, Rosa Corrêa Victor e Rosário simão Jacinto.

“O presente relatório procura descrever, de forma fiel e verdadeira, as deficiências entendidas como o conjunto das insuficiências existentes, potenciais ou reais, ou das oportunidades de introdução das melhorias que permitam fortalecer o sistema de controlo interno identificadas pelo conselho de administração”, lê-se no relatório assinado pelos membros do anterior conselho de administração.

Paixão Júnior foi afastado por decreto presidencial numa altura em que as contas de balanço de 2015 do BPC revelam uma redução nos lucros de 6,9%, menos 618,1 milhões de kwanzas do que no período anterior, quando entraram para os cofres do banco 8.907 milhões de kwanzas.

Aliás, neste mesmo ano, um grupo de colaboradores do maior banco estatal foi levado a julgamento por alegadamente ter subtraído, das contas da instituição, acima de 30 mil milhões de kwanzas, entre 2012 e 2014, roubo que só terá sido descoberto no primeiro trimestre do ano passado.

À queda nos lucros e aos desfalques de tesouraria, somam-se os processos de reestruturação e de recapitalização do banco anunciados há um ano pelo Governo, com um desembolso de 800 milhões de dólares, cobertos por uma linha de crédito do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD). Até ao final do ano, aguarda-se uma próxima intervenção do Estado, para manter os níveis de liquidez do banco.

AGENDA DE PAIXÃO JÚNIOR

O mesmo relatório assinala a estratégia de reestruturação do sistema operacional do banco, desenhada por Paixão Júnior. Segundo o documento, o ex-‘chairman’ do mais antigo banco comercial angolano programava aperfeiçoar, no quadriénio 2015-2018, os mecanismos para a captação de recursos, melhorando os níveis de liquidez da instituição.

A par da liquidez, a antiga administração do BPC pretendia ainda promover a criação de produtos, serviços e canais inovadores e orientados para as necessidades dos clientes, além de garantir a melhoria da eficiência operacional e da qualidade dos serviços.

Paixão Júnior incluiu igualmente, na sua estratégia 2015-2018, o reforço dos mecanismos de gestão de riscos e de controlo interno, o desenvolvimento de políticas que “permitam a valorização dos recursos humanos, baseadas na ética” e o apoio de materialização dos projectos de desenvolvimento económico e social do Executivo.

POSIÇÃO NO MERCADO

Assim, e para tornar funcional a estratégia, o anterior conselho de administração do banco definiu três principais eixos de actuação no mercado: o sector empresarial, os particulares e o Estado. Politicas que terão de passar para a nova gestão, já que Paixão Júnior já não ‘distribui jogos’ no maior banco angolano em carteira de clientes.

Para os grupos empresariais, será necessário “criar valor para o país através da sua política de financiamento”, porque “são motor dinamizador de projectos estruturantes, transversais a toda a economia nacional”, segundo o relatório do banco.

Aos particulares, “serão prestados um serviço com melhor qualidade, potenciar o produto de crédito à habitação, que constitui um produto fundamental para a fidelização de clientes”, sendo que, para o Estado, a estratégia passa por “apoiar a concretização da política económica e social e conservar e manter a boa execução dos pagamentos provenientes do OGE (Orçamento Geral do Estado).

O BANCO POR DENTRO

Actualmente, o quadro de funcionários do Banco de Poupança e Crédito é composto por um total de 5.339 colaboradores, mais 122 colaboradores, comparativamente ao ano de 2014. O conselho de administração liderado na altura por Paixão Júnior era composto por 60 trabalhadores.

 

As ‘mordomias’ da administração

Os membros afastados do conselho de administração do BPC foram ‘donos’ de um conjunto de privilégios que ultrapassam os dedos da mão. Ou seja, além do salário e do 13.º mês, os administradores executivos tinham direito a subsídio fixo de representação, subsídio de renda de casa e viatura de serviço e de apoio à residência.

No comando do BPC, os gestores tiveram ainda direitos a pessoal de apoio, assistência médica e medicamentosa, para os próprios e para cônjuges e filhos a cargo (documento não limita número de assistidos), além de empréstimos à habitação até determinado valor, regalias atribuídas pelo exercício de funções no conselho de administração e por terem tido, sob sua supervisão, direcções-chave.

Paixão Júnior, por exemplo, supervisionava, até ao seu afastamento do posto de PCA, as direcções de Recursos Humanos, Auditoria Interna (DAI), Direcção Internacional (DIN), Marketing e Imagem (DMI) e a Direcção de Tesouraria e Mercados (DTM). As acções estendiam-se ainda às direcções Regionais (DR), de Coordenação Comercial (DCC) e a de Participações do BPC no Instituto de Formação Bancária de Angola (IFBA) e do BPC.