Portugal antecipa retaliações por parte de Angola
CONFLITO.Empresária angolana vê desvalorizada a sua posição no BPI e BFA com a aprovação de um decreto-lei de desblindagem de estatutos accionistas na banca portuguesa, que lhe retira o poder de veto entre os sócios. Tendo em conta outros interesses de Angola em Portugal e o facto de o BFA ser um banco angolano, aguarda-se uma reacção de Angola.
A intervenção do Banco Nacional de Angola (BNA) e do Governo angolano pode pesar na resolução do caso que envolve os bancos BPI, BFA e CaixaBank, em que estão em causa centenas de milhões de dólares da empresária Isabel dos Santos, de acordo com perspectivas de especialistas ouvidos pelo VALOR.
De Angola, não saiu ainda nenhuma reacção oficial do caso de ‘redução de exposição do BPI a Angola’, nem por via do Governo, nem do BNA. O consultor financeiro Galvão Branco defende que o banco central tem um “papel determinante” e que tem “instrumentos de natureza jurídica e administrativa que permitem conviver com estas situações, sem fazer recurso a medidas tão extremas como seria o caso da nacionalização do BFA”.
O governo português teve uma intervenção directa na negociação entre a empresária angolana e os espanhóis do CaixaBank, com a aprovação de um decreto que determina o fim da desblindagem accionista na banca portuguesa. O presidente da Associação de Bancos de Angola, Amílcar Silva, entende que o BNA deve “ter uma intervenção” para preservar os interesses do banco em Angola.
Quase todos os envolvidos no processo de ‘redução de exposição do BPI a Angola’ já emitiram parecer. Desde accionistas do banco, ao CaixaBank, Unitel e a Santoro, o Banco Central Europeu (BCE), a Comissão de Mercado de Valores Mobiliários de Lisboa (CMVM) e o governo de Portugal e banqueiros como Nuno Amado, PCA do Millenium BCP, que criticou o decreto que afecta as relações accionistas de todos os bancos, desrespeitando contratos pré-assumidos internamente.
O decreto pode afectar outros interesses angolanos em Portugal, nomeadamente da Sonangol que é accionista maioritária de um banco português, o Millenium BCP, e também os interesses na banca em Angola. O primeiro ministro português está a preparar uma viagem a Luanda numa tentativa de apaziguar possíveis represálias de Angola.
Isabel dos Santos é accionista do BFA, por via da Unitel, com 49,9%, do banco angolano controlado em 50,1% pelo BPI. A empresária detém também 18,58% do capital do BPI, pela Holding Santro Finace. Com a provação do decreto que retira o poder de veto, a posição de Isabel dos Santos no negócio passou de ‘estável’ para ‘de risco’
CRONOLOGIA
DEZEMBRO DE 2014 – Com o último balanço financeiro do BPI, em que o BFA respondia por mais de 50% dos proveitos, o Banco Central Europeu impõe aos bancos europeus com exposição a África um prazo – 10 Abril de 2016 – para a resolução da exposição ao sistema financeiro africano. Angola e Moçambique são os mais visados, dada a presença considerável de capital português. Estão associados factores de “supervisão”, que para o BCE, “não está ao nível da supervisão europeia”.
FEVEREIRO 2015 – Início das ‘hostilidades’ entre os espanhóis do CaixaBank e Isabel dos Santos, com a primeira tentativa de OPA dos espanhóis ao BPI, em oferta a valer 1,329 euros por acção.
JUNHO 2015 – Isabel dos Santos ‘chumba’ a oferta do Grupo La Caixa, fazendo valer os seus 18,58% e o direito de veto. A lei favorece-a. Ninguém vota com mais de 20%, mesmo que tenha 44,1%.
JANEIRO DE 2016 – A Unitel faz uma oferta ao BPI de 140 milhões de euros para comprar 10% do BFA, o que resolveria a questão da exposição do BPI a Angola. A proposta é recusada pelo BPI.
MARÇO 2016 – Com o aproximar do prazo, os sócios retomam diálogo. CaixaBank toma a participação da Santoro no BPI e este compra parte da posição do BPI no BFA. Espanhóis recuam.
ABRIL 2016 – O primeiro-ministro português, António Costa, põe ‘mão’ no processo, empenhando-se num possível acordo. O limite de cumprimento das exigências do BPI está a uma semana do prazo.
10 DE ABRIL – A CMVM anuncia o acordo entre Isabel dos Santos e os espanhóis do CaixaBank no BPI.
17 E 18 ABRIL – Caixabank anuncia ruptura, acusando Isabel dos Santos de “desrespeito”. No mesmo dia, a empresária reage: “O acordo entre Santoro e CaixaBank nunca foi finalizado. É falso ter existido qualquer quebra do acordo da parte da Santoro.”
19 DE ABRIL – Portugal promulga a lei que ‘desblinda’ estatutos das instituições de crédito e deixa de limitar os direitos de votos dos accionistas. A Santoro de Isabel dos Santos reage, em comunicado, e acusa Lisboa de “favorecer” uma das partes, CaixaBank e o BPI.
REACÇÕES
Galvão Branco, Consultor financeiro
"Face ao posicionamento do BFA, é desaconselhável a perda de identidade dobanco. O BNA tem um papel determinante no desfecho desta operação, tendo presente o interesse nacional."
Amílcar Silva, "Presidente da Associação de Bancos de Angola (ABANC) Angola está livre de criar uma legislação que obrigue a que, um banco estrangeiro que queira deter 30% aqui tenha de ter um certo capital mínimo. Pode acontecer o inverso. O BNA pode obrigar que o BFA aumente o capital e eles [BPI e La Caixa] também".
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