ANGOLA GROWING
Carlos Cambuta, director-geral da ADRA e conselheiro do Presidente da República

“Quanto mais atraso se verificar na implementação das autarquias, mais atrasos vamos verificar na solução de problemas locais”

01 May. 2024 Grande Entrevista

Defensor acérrimo de que todos os organismos do Estado deveriam explicar, desde já, o que são e para que servem as autarquias, Carlos Cambuta lamenta que os cidadãos não sejam ouvidos durante a elaboração das leis autárquicas e haja muita falta de informação, inclusive, nas administrações públicas. Considera que o debate está muito circunscrito nos actores políticos e que a as autarquias deveriam ser implementadas de imediato. Director-geral da Acção para o Desenvolvimento Rural e Ambiente e conselheiro do Presidente da República para a área social e económica, sublinha também diferença entre a execução das despesas da defesa e do sector social.

 

“Quanto mais atraso se verificar na implementação das autarquias, mais atrasos vamos verificar na  solução de problemas locais”

Angola vive uma profunda crise económica com impacto no aspecto social. O modelo de governação é dos factores que contribui para isso?

A crise deve servir de oportunidade para podermos avaliar a nossa capacidade de actuação enquanto país e actor de desenvolvimento. O país tem várias potencialidades que, devidamente utilizadas, permitem que Angola seja auto-suficiente em diferentes matérias. As crises que nos afectam são globais. Vivemos tempos de incertezas. Os países que têm um sistema de governação mais proactivo têm tido a capacidade de gerir melhor a crise. Angola vive, sem sombra de dúvidas, uma situação preocupante A fome é um fenómeno notável tanto no campo quanto na cidade. Angola apresenta este triste quadro. Só a partir de 2017, com a entrada de João Lourenço, começamos a verificar algum rigor na gestão do erário público. Não estou a dizer que a gestão é mais rigorosa. Pelo menos desde 2017, começamos a verificar, na administração pública, algum rigor e respeito na utilização do erário. Hoje, quando contactamos algumas administrações municipais, conseguimos perceber que fazem uso do erário com cautela, porque sabem, a qualquer momento, que podem ser interpeladas pelo IGAE, por um órgão da administração central do Estado. Hoje, percebemos que nenhum administrador municipal, governador, ministro ou agente público, de que nível for, gostaria de ver o seu nome manchado pela utilização indevida do erário. É este cuidado na utilização do erário que vai contribuir para que o país possa assegurar a distribuição equitativa do erário.

O país tem um modelo de desenvolvimento excessivamente concentrado. Desde 1975 que continua a ser gerido a partir da Mutamba, da Cidade Alta. O cidadão, do município dos Bundas, no Moxico, seja em que município estiver, tem de depender da estrutura central para decidir para onde que deve ir para o seu município. Isso é absolutamente inaceitável. Vários estudos, sobre implementação de políticas públicas, provam que, sobretudo as políticas de natureza social e económica, falham, porque são pensadas e executadas a partir de Luanda. Há pessoas que estão a desenhar projectos a pensar em municípios que não conhecem. Se conhecem, é através da internet que não disponibiliza informação sobre opiniões, sentimentos e percepções dos munícipes em relação a um conjunto de
 
situações que afligem a população. O Executivo tem noção disso. É, por esta razão, que desde 2018 tem vindo a implementar aquilo que chama de plano de desconcentração e descentralização administrativa.


A diferença entre a execução das despesas sociais e a da defesa é substancial. Que rigor existe aqui?

Hoje, nas administrações municipais, há este cuidado quando comparado o período que antecede a 2017, porque nas administrações públicas, a corrupção e a sobrefacturação eram praticamente visíveis a olho nu. Hoje pode estar a acontecer, mas de forma tímida.

 


Temos o caso de Malanje em que o próprio governador denunciou actos de corrupção por parte de administradores…

Antes de 2017, havia governadores a fazer denúncias? Pode ter havido um caso isolado, mas hoje temos governadores que fazem denúncias, tomando conhecimento de que o administrador municipal não teve uma conduta aceitável o exonera na hora. Hoje, governador, director provincial e administrador têm medo de mexer no erário, até porque a consciência crítica do cidadão está elevada. É sinal de mudança no paradigma de governação, mas ainda não tem efeito na vida do cidadão. É um passo importante, as mudanças sociais são paulatinas. O importante é que se está a verificar esta nova postura na administração pública, à medida que vai sendo uma cultura de governação, vai concorrer para as medidas terem efeito na vida do cidadão.

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