Solução dinástica? A curva apertada do Presidente e a (in)esperada resposta do MPLA

10 Apr. 2024 V E Editorial

Apesar do aparente controlo absoluto que mantém sobre o partido-Estado, João Lourenço já se encontra no percurso da mais apertada curva na gestão do poder. As certezas anteriores sobre o futuro imediato do partido e sobre o seu próprio futuro dão lugar agora a um mar de dúvidas e angústia. Nos corredores palacianos da Cidade Alta e do ‘Kremlin’, admite-se o desenho de vários cenários, mas o controlo do processo de uma cada vez mais inevitável sucessão deixou de ser um dado adquirido. Ao que se comenta, todos os cenários passaram a estar em cima da mesa.

Solução dinástica? A curva apertada do Presidente e a (in)esperada resposta do MPLA

Para este mês, projecta-se uma reunião do comité central para debater a viabilidade de um congresso extraordinário no próximo ano. Enquanto isso, João Lourenço perde-se em cálculos matemáticos difíceis. Estando cada vez mais afastada a hipótese de se manter na chefia do Estado, sobretudo por limitação constitucional, há comentários em círculos restritos da política de que Lourenço esteja a considerar uma potencial sucessão dinástica, apresentando a mulher como a próxima concorrente do MPLA a Presidente da República. Há quem ateste inclusive a existência de uma força-tarefa que já trabalha na estratégia da candidatura de Ana Dias Lourenço, o que faz da indução ao debate sobre o terceiro mandado uma manobra de diversão. Ou melhor, de distracção. Neste cenário, João Lourenço cogitaria, num primeiro momento, manter-se na liderança do partido, impondo uma revisão dos estatutos para que se possa apresentar no próximo congresso ordinário de 2026 como candidato. Trocado em miúdos, o marido ficaria a mandar no partido e a mulher avançaria para a disputa contra a oposição útil nas eleições gerais. Todavia, a concretização deste projecto encontra sérios obstáculos...

Como recorda esta edição do Valor Económico, João Lourenço não pode promover um congresso extraordinário para alterar os estatutos, por se tratar de uma competência exclusiva do congresso ordinário. Ou seja, salvo alguma violação grosseira e impugnável dos estatutos, Lourenço chegaria a 2026 a presidir ao congresso, mas sem poder apresentar-se como candidato. Isto porque o próximo congresso ordinário deverá reger-se ainda pelos actuais estatutos que foram reescritos por ordens directas do próprio presidente do MPLA, em 2021. A saída passaria por colocar a primeira-dama, primeiro, como candidata a presidente do partido e, posteriormente, como concorrente à Presidência da República. Aqui coloca-se, entretanto, outro problema.

Vozes nada ignoráveis do MPLA asseveram que, desta vez, certos tubarões do partido vão extirpar a crónica cobardia das entranhas e ‘oferecer o peito às
 
balas’ contra João Lourenço. Oportunamente inspirados pelos ventos do índico que devem lançar o inqualificável presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, ao tapete, certas figuras de peso vão antecipando nos bastidores que, desta vez, ‘não há cá pão para malucos nem pente para carecas’. Descartam qualquer apoio a aventureiras manobras para um terceiro mandato e admitem desafiar, alternativamente, qualquer candidato que venha a ser proposto por João Lourenço. Em suma, nem terceiros mandatos, nem congressos de fachada, nem lideranças impostas. Será? Compremos pipocas e assistamos ao filme.