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TRÊS TEORIAS: O CASO SONANGOL

18 Aug. 2020 V E Editorial

Há essencialmente três teorias. Há quem entenda haver interesse genuíno do poder em combater a corrupção. Há quem veja um plano maquiavélico que visa exclusivamente a salvação do MPLA do desgaste que se vem acentuando particularmente nos últimos seis anos. E há quem esteja certo de que o que se passa no país é a efectivação de agendas pessoais dos novos rostos do poder contra pessoas concretas. Das três, é a última que se vai tornando cada vez mais descarada e as provas não deixam de se acumular. E mais: são precisamente os argumentos da terceira teoria que anulam o que se diz sobre as demais.

Vejamos, mais uma vez, o caso Sonangol. Qualquer angolano médio sabe da convicção generalizada de que foi essencialmente da principal empresa pública que irradiou a grande corrupção que prosperou no país especialmente nos últimos 20 anos. No imaginário colectivo, mora a firmeza de que tudo o que sabe hoje, por obra da imprensa, é uma gota no que seria o oceano de escândalos, caso toda a verdade sobre a Sonangol viesse para fora. Mas quiseram as coincidências que, num momento em que os holofotes do poder se viraram contra Isabel dos Santos, sobre a Sonangol saíssem exclusivamente informações relacionadas com a gestão da empresária. Que, recorde-se, esteve no comando da petrolífera por menos de um ano e meio. Todo o histórico anterior a Isabel dos Santos, por mera coincidência, manteve-se fora das habilidades do ‘hacker’ que trouxe à tona o Luanda Leaks. Mas esta semana, outra vez pela teimosa coincidência, veio mais um porquê de o verdadeiro histórico da gestão da grande Sonangol manter-se selado.

Depois de ter começado mais uma rixa na Unitel para ver a gestão dos últimos 10 anos sob o pente fino de uma auditoria forense, a Sonangol decidiu recuar. Mas não o fez para deixar descansada Isabel dos Santos e quem a acompanhou na gestão da telefónica. A desistência ter-se-á devido, como escreve o Expresso, a receios de que a auditoria à Unitel seria o ponto de partida para se chegar a tão solicitada auditoria à própria Sonangol. Na verdade, na semana passada, o VALOR antecipou, a propósito, as divergências dentro da petrolífera quanto ao tema da revisão das contas que queria impor à Unitel. E a explicação desse desassossego não poderia ser mais óbvia. Uma auditoria externa e independente à gestão da Sonagol não deixaria pedra sobre pedra. Seria o tsunami perfeito que só a (in)justiça selectiva seria capaz de travar.

Deixando a Sonangol de lado, os atropelos descarados da justiça são outra prova de que a teoria das agendas pessoais é mais sólida. Mais do que a tese do interesse nacional ou da conspiração a favor do MPLA. Só isso explica que um Tribunal se dê ao luxo de proferir sentenças, ignorando todas as provas que desmontam toda uma acusação. E, mais do que isso, chegar ao ponto de contradizer-se na valorização de uma mesma prova, considerando-o simultaneamente fundamental para o esclarecimento da verdade e desnecessária para o esclarecimento da verdade. É o tal duplo pensamento de George Orwell aplicado de forma fria na justiça. Esta, a justiça definitivamente não mudou.