Venda de animais vivos na via pública ‘salva’ barrigas da miséria
Comércio. Prática proibida continua a ganhar espaço em Luanda, fiscais tentam controlar, mas não conseguem travar o negócio.
A falta de oportunidades e emprego é a justificação apresentada por jovens comerciantes que, todos dias, se fazem à rua, principalmente na estrada de Catete, no Morro Bento, e na zona denominada Ponte Molhada, no Patriota, em Luanda, onde vendem a automobilistas e transeuntes várias crias de animais, com maior destaque para porcos, coelhos, macacos, porcos-da-índia, galinhas de Angola, patos, diversos tipos de aves e diversas raças de cães, desafiando as autoridades e a lei, por ter, no negócio, o único meio de sustento.
José Figueiredo Ngalanga faz o negócio há mais de 12 anos e ele próprio é que cria a maior parte dos animais que vende. “Criamos em casa e temos muitos problemas com os gatunos e com os vizinhos, porque, por exemplo, o pássaro e a galinha de Angola fazem muito barulho que chega a perturbar a vizinhança”, conta. Além dos animais que cria em casa, compra, na Chibia, na Huíla, a galinha de Angola e porcos de raça. Para a viagem até Luanda, gasta mais de 20 mil kwanzas dependendo da quantidade que transporta.
O negócio é concorrido e, quase todos os dias, os vendedores são visitados por quem gosta de ter animais de estimação em casa e por quem se alimenta deles. “Os que compram mais para o consumo são os chineses, temos poucos angolanos, porque muitos deles compram apenas para estimação”, adianta o vendedor, admitindo, por outro lado, que os preços variam de acordo com a oferta e com o período de reprodução.
Por exemplo, quando uma galinha de Angola põe ovos, ninguém os vende, têm de esperar a reprodução e assim fazem o preço disparar. Os periquitos aparecem com facilidade quando há escassez de água, ou seja, quando não há chuva, “porque com a chuva já têm muitos sítios para beber água e fica difícil encontrá-los”, revela um dos segredos do negócio.
Para quem quer animais de estimação, aconselha a que sejam adquiridos ainda pequenos “para facilitar a convivência enquanto crescem”. Muitos compram casais para possibilitar a reprodução. Um casal de porcos de raça custa 70 mil kwanzas, enquanto o porco normal 27 mil kwanzas. Os casais de porcos-da-índia custam sete mil kwanzas, o casal de periquitos australianos 12 mil e os republicanos 15 mil kwanzas. Já os preços dos cães de raça variam entre os 150 e os 400 mil kwanzas na via do Patriota.
Estes vendedores ambulantes, que deambulam pelas ruas de Luanda, até gostariam de ter lugar, onde pudessem garantir melhor conservação e venda dos animais e, desta forma, também contribuírem com encargos fiscais. Consideram que o negócio é mais rentável no final do mês quando os funcionários públicos recebem o salário. Neste período, de aproximadamente 10 dias, conseguem encaixar lucros, em média diária, de 30 mil kwanzas, mas depois disso passam dias “em seco”. “A partir do dia 15, a venda é muito baixa e com muita sorte porque há dias que saímos sem nada”, afirma José Figueiredo Ngalanga
Quem cria tem de suportar despesas, com a compra de ração nos mercados e de alguns restos de comidas caseiras, como arroz e massa. A ração só serve para porcos e aves e, os vendedores calculam que, com cinco mil kwanzas conseguem alimentá-los. Quem vende cães de raça compra a ração entre os 40 a 90 mil kwanzas ou mais dependendo da raça.
CAIXA
Venda de animais em locais públicos contra a lei
A venda de animais vivos em locais públicos é proibida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) que indica que “os animais selvagens são a causa de mais de 70% das doenças infecciosas emergentes em humanos”. Num apelo feito em 2020, a autoridade mundial da Saúde aconselhava a que se acabasse com estas práticas para prevenir a propagação de doenças.
Por cá, a directora geral do Instituto Nacional da Biodiversidade considera a prática tráfico de animais, “porque as espécies são retiradas ilegalmente do seu habitat natural para posterior negociação no mercado interno e/ou externo, incluindo também a caça furtiva (morte ou captura de animais selvagens)”. “A captura excessiva ou insustentável de animais faz com que se reduza a quantidade destas espécies no seu habitat natural, causando danos aos ecossistemas e comprometendo o seu equilíbrio e manutenção”, reforça Albertina Nzunzi.
Os vendedores reconhecem os riscos que correm. “A venda é ilegal, isso também entendemos, mas não temos alternativas e enquanto não tivermos um bom sítio vamos continuar aqui”, admite um jovem, transformado em 'porta-voz' de um grupo oito vendedores, que se juntam no viaduto do km 25, na Via Expresso. Apesar da ilegalidade, garante que os animais não são maltratados. “Por serem domésticos, talvez as pombas, dizem que a pomba tem de voar, mas a barriga não permite por isso é que arriscamos”, justifica-se.
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