Rui Henriques
A disrupção digital e evolução tecnológica impactam profundamente o funcionamento e o modelo de negócio das organizações, e de como estas se relacionam e “conectam” com todos os ‘stakeholders’, quer sejam clientes, parceiros ou colaboradores. Adicionalmente, a disrupção digital sustentada numa regulamentação fiscal mais transparente tem permitido uma forte digitalização das autoridades fiscais na relação e tratamento de dados de contribuintes e com uma tendência generalizada no uso de tecnologias de ‘big data’ e ‘data analytics’ como forma de gerir o ‘compliance’ e detectar fraude contributiva. É neste contexto que a transformação da função fiscal deve ser entendida, e, na nossa visão, o modelo operativo para a função fiscal, com base em novas capacidades digitais e tecnológicas, deve permitir às organizações: 1. Gerir e tratar todos os dados financeiros e fiscais de forma eficiente; 2. Garantir integração estruturada e segura com as autoridades fiscais; 3. Potenciar novas formas de trabalho colaborativo; 4. Organizar processos na função fiscal e de forma interligada com restantes processos empresariais. Desta forma, a transformação da função fiscal implica uma visão holística onde se preconiza a revisão de capacidades tecnológicas, de processos e de organização de suporte à função fiscal, com reflexo sobre todo o ecossistema subjacente, nomeadamente: autoridades fiscais, clientes, prestadores de serviços, fornecedores, colaboradores, entre outros… Esta abordagem passa por transformar e optimizar toda a função fiscal através de tecnologia inovadora e novos modelos operativos com base em 4quatro dimensões: •Nova tecnologia de suporte aos processos de função fiscal; •Nova tecnologia de suporte à gestão e análise de ‘big data’ fiscal; •Novas capacidades de gestão da relação e integração com autoridades fiscais digitalizadas; •Novas capacidades de gestão colaborativas com todos os stakeholders do ecossistema fiscal. A implementação das novas capacidades inerentes à transformação da função fiscal, irá permitir às empresas: •Reduzir custos de incumprimento fiscal e litigância, e assim, mitigar risco reputacional; •Agilizar e reduzir custos dos processos de ‘compliance’; •Identificar oportunidades de otimização fiscal; •Garantir que os colaboradores estão focados em atividades de valor acrescentado. A transformação digital é a oportunidade de pensar a função fiscal de forma diferente. Os processos têm necessariamente de ser pensados de forma diferente da sua execução manual ou com forte intervenção humana. Porque a tecnologia já mudou o paradigma. A função fiscal do futuro vai ser totalmente disruptiva face à actual! E considerando que a velocidade da evolução tecnológica é exponencial, este “futuro” não será daqui a 10 anos…. Já começou! É uma inevitabilidade!
O IVA e a oportunidade da digitalização
Um número crescente de países tem vindo a introduzir o Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), ou regimes similares, para substituir ou reformar o regime de imposto de consumo existente. Angola inclui-se neste grupo de países com a perspectivada entrada em vigor a 1 de Janeiro de 2019. Não há, entre os 54 países de África, uma harmonização real do IVA. Numa perspectiva de ‘compliance’, existem países que exigem pré-impressão de documentos em papel, com facturas anexadas e carimbadas pelos funcionários, enquanto outros exigem que toda a documentação e fluxo de declarações ou informação seja digital. Este será, em princípio, o cenário aplicável em Angola em que todas as declarações fiscais e procedimentos de ‘reporting’ fiscal serão submetidos electronicamente na página da Administração Geral Tributária (AGT). Angola será um exemplo típico das vantagens dos ‘late adopters’: implementam as melhores práticas e as mais recentes abordagens tecnológicas, capitalizando a experiência dos ‘early adopters’ e evitando os erros destes. Com a recepção de toda a informação, por via eletrónica, a AGT passará a deter uma enorme base de dados dos contribuintes, podendo usar os dados para vários fins: análises tempestivas de quem são os cumpridores e de tendências que lhe permitirão ajustes à legislação com o objectivo de potenciar o cumprimento por parte dos contribuintes, o alargamento da base tributária e da receita fiscal e, claro, auditorias fiscais. Mas tudo isto cria desafios enormes para as empresas em Angola, em geral, pois muitas não estão preparadas para esta nova realidade. Uma abordagem estruturada e devidamente planeada será crucial para garantir o pleno cumprimento das obrigações, sem necessidade de correcções permanentes aos sistemas de IT usados para assegurar o ‘compliance’ e para evitar erros na informação partilhada com a AGT, os quais terão impactos negativos óbvios. Em primeiro lugar, é preciso compreender as regras para avaliar em que medida os sistemas tecnológicos (de negócio, ERP, facturação, etc) existentes ou a implementar estão/são adequados a esta nova realidade e às exigências. Este passo é por si só uma grande mudança para a generalidade das empresas angolanas: acabar com o papel e ter toda a informação sobre vendas, contabilidade, apuramento dos impostos e partilha desta informação baseada em sistemas informáticos. É fundamental, por isso, a realização de um diagnóstico por especialistas para compreender as necessidades que cada empresa terá, face ao seu negócio, de investimento em nova tecnologia ou na adaptação da existente. E sendo todo este ambiente inovador em Angola uma inevitabilidade, há que pensar como beneficiar desta nova realidade. É uma enorme oportunidade que as empresas têm de pensar não apenas no ‘compliance’, mas de utilizar todos os dados que partilham com as autoridades fiscais em seu próprio benefício, desde logo assegurando que a informação está correcta e que não existem divergências/erros na informação partilhada (e dessa forma minimizando a litigância fiscal, custos com liquidações adicionais, juros e multas), mas além de tudo isto, que utilizam os dados para optimizar a sua carga fiscal, não pagando impostos que não são exigidos por lei. A digitalização que a entrada em vigor do IVA vai impor às empresas angolanas não deve ser encarada como um ónus, mas sim como uma oportunidade! Rui Henriques,Tax Partner, Digital Tax Leader
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