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Cândido Mendes

Cândido Mendes

BANCA. Segundo a Delloite, se se excluísse o principal banco público, os malparados do sistema financeiro estariam fixados em 8,2%, em 2016, e 17% em 2017 e não nos níveis registados: 12,7% e 40,2% em 2016 e 2017, respectivamente.

BPC

O Banco Nacional de Angola (BNA) manifestou “alguma preocupação” devido à qualidade dos activos para o crédito dos bancos, face ao agravamento dos “níveis de incumprimentos da carteira de crédito”, segundo o governador José de Lima Massano.

Como notou Massano, estes factores têm estado a contribuir para a degradação do sistema financeiro nacional, o que vem acontecendo desde 2015.

A concessão de crédito pelos bancos baixou ligeiramente, por outro lado, os credores não estão a reembolsar os empréstimos.

No fórum anual “Banca em Análise” da Deloitte, Massano apontou os números “alarmantes” do BNA que dão conta que, nos últimos três anos, o rácio do crédito malparado duplicou, saindo de 11%, registado em 2015, para 26% até Junho do corrente ano. No caso específico do ano passado, os números do estudo da consultora indicam um incremento do rácio do malparado de 12,7% em 2016, para 40,2% em 2017 em 23 bancos analisados.

O BPC, o maior em termos de activos e crédito concedido, arca a ‘parte do leão’ do malparado. De acordo com a Deloitte, se se excluíssem os dados do principal banco estatal, o crédito vencido incrementaria de 8,2% para “apenas” 17%, respectivamente, nos anos 2016 e 2017. “Há aqui, portanto, algum trabalho que vai ter que ser feito por partes das instituições,” disse José Barata, sócio-gerente da Deloitte, referindo-se ao mau crédito no geral, antes de aconselhar: “Os bancos têm de reforçar a análise dos riscos, a análise da qualidade creditícia”.

Como observa José Barata, o ano foi marcado por alguma estagnação da actividade da banca e pela redução do resultado líquido.

O estudo da Delloite não actualiza com números em kwanza a distribuição do malparado, mas analisando a referência mais recente disponível, crê-se que a realidade não se tenha alterado muito.

No ano passado, quando iniciou as negociações com a Recredit para vender 230 mil milhões de kwanzas parte do seu crédito vencido, o BPC registava 500 mil milhões de kwanzas como o total tóxico, de acordo com declarações do então PCA, Ricardo Viegas D’Abreu.

Considerando que o malparado da banca inteira estava avaliado entre os 700 e 800 mil milhões de kwanzas, segundo divulgou a RNA em 2016, afere-se que o BPC representa cerca de 75% do malparado.

CAMBIAIS ALIMENTAM A BANCA

Apesar do pesado volume do crédito por reembolsar, o resultado líquido da banca decresceu apenas 6% em 2017, face ao período anterior. O recuo é influenciado “maioritariamente pelos resultados líquidos negativos avultados” do BPC de acordo com a Deloitte.

A renda dos bancos em Angola não vem, portanto, da concessão de crédito, tal como o é noutros países, embora o BNA trabalhe para a correcção da situação. “A renda da banca comercial deriva essencialmente do aumento de resultados cambiais e de proveitos obtidos de títulos e valores mobiliários, divergindo da concessão de crédito à economia,” notou José Massano.

O governador referiu que o BNA trabalha com a Associação dos Bancos de Angola (Abanc) e “outras instituições” na “busca de melhores caminhos para o aumento do crédito em melhor segurança.” Desde logo, o risco existente no sistema financeiro poderá implicar “o aumento das imparidades com impacto negativo na solvabilidade regulamentar das instituições financeiras”, segundo Massano.

CÂMBIO. Taxa de câmbio da moeda estrangeira, no mercado informal, estabilizou na última semana, depois de uma queda quase abrupta de aproximadamente 12% no espaço de 10 dias. ‘Kínguilas’ foram apanhados desprevenidos.

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O acesso à moeda estrangeira “vem normalizando progressivamente,” como resultado do “impacto das medidas de ajustamento monetário e cambial, no âmbito da implementação do Plano de Estabilização Macroeconómica (PEM)”.

A garantia é do governador Banco Nacional de Angola (BNA). Segundo José de Lima Massano, a reitrodução do PEM é marcada “pela alteração da âncora nominal da política monetária e a consequente adopção de um novo regime de formação da taxa de câmbio”. Massano respondia assim, por e-mail, sobre a queda da taxa de câmbio no mercado paralelo, onde os comerciantes, na semana passada, foram apanhados em contramão.

“Comprámos a nota de 100 USD a 40 mil kwanzas e tivemos de revender a 37 mil kwanzas. Perdemos muito dinheiro”, declarou Mário Lombe, um cambista do mercado da Estalagem, Viana, em Luanda. O mesmo que indicou terem sido apanhandos “desprevenidos”.

Na semana passada, as vendas, no paralelo, estavam cotadas em 420 kwanzas por cada euro, contra os 500 kwanzas da semana anterior. Em relação ao dólar, a cotação estava fixada em 370 kwanzas, contra os 420 kwanzas, nos sete dias imediatamete anteriores.

No entanto, é no informal onde ainda a maioria dos cidadãos adquire as notas de forma célere e desburocratizada.

O BNA retomou recentemente a realização regular de leilões de moeda no mercado primário (BNA para bancos comerciais), acabando com a venda directa a clientes e contornando os bancos, uma prática que se tornou a marca do antecessor de Massano, Valter Filipe Duarte.

Entre as operações de normalização no sistema financeiro nacional, destaca-se a regularização das operações cambiais que se encontravam pendentes desde 2015 a 2017.

O diferencial entre as taxas de câmbio do mercado paralelo e do oficial encolhera de 150 para 70%, segundo declarações de José de Lima Massano em Maio. Na altura, reconheceu, entretanto, que a pressão sobre o kwanza continuava.

PARLAMENTO. Assembleia Nacional aprovou, na generalidade, o Orçamento Geral de Estado, cujas receitas e despesas são avaliadas em 9,685 biliões de kwanzas, o primeiro na Era João Lourenço.

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Os maiores partidos na oposição exigem que o Governo contrate uma auditoria à dívida pública. Adalberto da Costa Júnior e André Mendes de Carvalho, presidentes das bancadas parlamentares, respectivamente, da UNITA e da CASA-CE, querem ver respondidas questões como os ganhos reais que a dívida pública trouxe ao país. Pedem explicações sobre a aplicação dos fundos e pretendem saber quem são os credores, além da composição da dívida.

Para os dois dirigentes políticos, a instauração de uma auditoria ajudaria a esclarecer as suspeitas sobre a possibilidade de endividamento público ter servido de “fonte de desvio de dinheiro para afundar as contas públicas”.

No mesmo alinhamento, encontra-se o economista Precioso Domingos para quem “a dívida angolana está desvirtuada, deixou de ser um mecanismo para atrair recursos para o Estado para fazer investimentos e passou a ser um instrumento para certos indivíduos acumularem dinheiro”. O especialista do Centro de Estudos e Investigação Científica (CEIC), da Universidade Católica, entende que “se a auditoria provar que houve muita corrupção, se houve intenção de endividar o Estado para beneficiar certas pessoas”, a solução é lógica: “Quem tem algo que não é seu não tem de devolver?”, pergunta.

Precioso Domingos pensa que, com o actual peso da dívida, a capacidade do Governo em melhorar as condições de vida das populações “fica mais limitada”, ficando “também diminuída a ‘perfomance’ da sua governação”.

Num ano em que o Presidente João Lourenço prometeu vir a ser melhor que o anterior, o que salta à vista nas despesas por realizar é o peso das amortizações da dívida: mais de 52% de todas as despesas. Já no Orçamento Geral de Estado (OGE) passado, mais de 30% das despesas eram reservadas para reembolso da dívida.

Contando que 49% das receitas do OGE para 2018 têm, como fonte de financiamento, endividamento externo e interno, a questão da dívida não vai desaparecer tão cedo.

Por enquanto, o Ministério das Finanças calcula a dívida pública em 38 mil milhões de dólares.

OGE “NÃO É REFORMISTA”

Precioso Domingos confessa ter ficado “surpreendido”, depois de ter analisado o OGE e ouvido o discurso de fim de ano do Presidente da República, em que prometia um 2018 “melhor”. “O Presidente da República tem ideias aparentemente inovadoras, apresentou-se alto, como reformista, mas, quando olhamos para o plano de materialização do Governo, nomeadamente o OGE, vemos que o OGE não é reformista. A grande prioridade do Governo é o pagamento de dívida”, precisou, citando os 53% para o reembolso da dívida.

Para Precioso Domingos, no estado actual da economia, a receita passaria necessariamente por baixar as despesas correntes, “optimizando o Estado”, e aumentar a despesa de capital, “porque isso permitiria resolver os problemas estruturais da economia, como a falta de estradas, água e energia que são necessários para atrair investimento directo estrangeiro e potenciar o investimento nacional”. “A diversificação não depende só do Governo. O Governo tem de melhorar o ambiente de negócios e isso depende dos investimentos em infra-estruturas. Só assim os privados investem em diversas áreas”, defende.

O economista recorda ainda o emagrecimento da estrutura do Estado, criticando, por exemplo, a ampliação dos conselhos de administração das empresas públicas.

CRESCIMENTO DO PIB

O OGE, aprovado na generalidade na Assembleia Nacional, estima um crescimento da economia de 4,9% do PIB. “É um exagero, não faz sentido”, analisa Precioso Domingos. O FMI estima-o a 1,6%, enquanto o Banco Africano de Desenvolvimento coloca-o nos 2,4%.

O OGE apresenta um défice de 2,9% contra os mais de 5% anteriores. O sector petrolífero e do LNG combinados podem crescer a 6% sobre o PIB, enquanto o não-petrolífero deve crescer a 4,4%. A produção média do crude será de 1,7 milhões de barris por dia.