Crise de valores na administração pública
A administração pública deveria ser, antes de tudo, um espelho dos valores mais nobres que uma sociedade pode cultivar: honestidade, ética, compromisso com o bem comum, eficiência e transparência. São esses os princípios que deveriam orientar cada acto dos gestores públicos no exercicio das suas funções, cada decisão, cada esforço em prol da colectividade. No entanto, o que assistimos nos dias actuais é uma crise de valores que põe tudo isso em xeque, uma sombra que parece se consolidar como norma, e não excepção!

Essa crise, que parece se aprofundar a cada escândalo revelado a título de exemplo "há dias, o jornal expansão noticiou que a cidadania Angolana, estava a ser comercializada por até um milhão e duzentos mil kwanzas em esquemas fraudulentos envolvendo agentes públicos afectos ao ministério da justiça e direitos humanos e os chamados micheiros ou intermediários que facilitam o contacto entre as partes", tendo por eleição os, cidadãos estrangeiros oriundos da República Democrática do Congo. Este escândalo tem raízes complexas e interligadas. Um dos factores mais evidentes é a presença constante da corrupção, que destrói a moralidade institucional e mina a confiança da sociedade nas suas próprias instituições. Quando recursos essenciais para saúde, educação, segurança e infraestruturas desaparecem por vias ilícitas, não há como imaginar uma administração pública saudável. A corrupção é, de facto, uma ferida aberta que prejudica toda a estrutura do Estado.
Paralelamente, encontramos o despreparo de muitos funcionários públicos, muitas vezes formados com pouca qualificação técnica, sem a devida actualização ou formação contínua. Essa deficiência impede que a administração seja ágil, eficiente e inovadora. Às vezes, a própria cultura do funcionalismo, onde o cargo é visto como uma garantia de estabilidade e não como uma missão de serviço, alimenta essa ociosidade e descompasso com as necessidades reais da sociedade.
Outro elemento crucial na crise de valores é a influência da elite política, que frequentemente direciona a administração pública para atender interesses particulares ao invés do interesse colectivo. Transforma a gestão pública numa arena de poder, onde decisões são tomadas com base em favores e privilégios, e não no mérito ou na busca por soluções que beneficiem toda a população. Essa lógica de interesses revela uma fragilidade profunda na governança, deixando o povo à mercê de uma elite que prioriza seus próprios interesses em detrimento do bem comum "a necessidade de satisfação das necessidades da colectividade".
Max Weber, um dos maiores teóricos da administração, já alertava para a importância da ética e da impessoalidade na gestão pública, destacando que a administração eficiente depende de uma conduta moralizada. E essa moralidade, que deve estar na base de qualquer actuação pública, parece cada vez mais distante na realidade actual.
Para superar esses obstáculos, especialistas e estudiosos apontam caminhos claros. A modernização da administração pública, por exemplo, é uma necessidade urgente. Modernizar não significa apenas usar tecnologia, mas repensar processos, simplificar trâmites, ampliar a transparência e promover a participação social. Ferramentas tecnológicas, como sistemas de governo eletrónico, podem diminuir as possibilidades de corrupção, facilitar o acesso à informação e ampliar o controle social, tornando os gestores mais responsáveis por seus actos.
Outra estratégia fundamental é investir na formação contínua dos servidores públicos. Um funcionário bem preparado, atualizado e motivado é a base de uma administração ética e eficiente. Além disso, é imprescindível que a alocação de recursos seja feita de maneira inteligente, com prioridade para áreas que garantam o bem-estar social e o desenvolvimento sustentável.
Por fim, nenhuma dessas medidas terá efeito duradouro se não colocarmos o interesse público acima de interesses pessoais e partidários. Todo o esforço deve convergir para a construção de uma cultura de integridade, onde a moralidade, a responsabilidade e o compromisso com a sociedade sejam valores compartilhados por todos os que actuam na gestão pública.
A crise de valores na administração pública não é uma fatalidade. Ela é um horizonte que pode ser reformulado, transformado por uma nova ética, por uma gestão moderna, por uma sociedade que exige e cobra mudança. O caminho é difícil, mas não impossível. Reconhecer o problema é o primeiro passo; o mais importante, de facto, é agir. Para que a administração pública deixe de ser palco de corrupção, despreparo e interesses pessoais, e se torne, de uma vez por todas, um verdadeiro guardião do interesse público.
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