FCKS, UM À PARTE OPACO
A Fábrica de Cimento do Kwanza-Sul (FCKS) é um dos bons exemplos da opacidade da controversa agenda de recuperação de activos. Os factos falam por si. A Fábrica foi financiada inteiramente pela Sonangol, pelo que, por alguns anos, este valor constava das contas a receber nos relatórios da petrolífera pública. Em 2014, numa decisão nunca compreendida, a Sonangol transferiu a dívida para o Estado, deixando de a referir nas suas contas. Até que Isabel dos Santos chega ao comando da estatal e volta a lembrar aos donos da FCKS que deviam mais de 750 milhões de dólares à Sonangol, respeitante ao financiamento, e 54 milhões de dólares de juros. Isabel dos Santos não duraria, entretanto, mais tempo na Sonangol e o tema voltou a desaparecer da agenda mediática.
Em 2019, surgem então vários factos curiosos. A Procuradoria-Geral da República anuncia processos de negociação, de recuperação e arrestos de vários activos e empresas. Empresas alegadamente financiadas pelo Estado ou com garantias do Estado foram obrigadas a pagar as respectivas dívidas de forma, mais ou menos, imediata. Foi o que sucedeu, por exemplo, com alguns dos activos nas mãos de Leopoldino do Nascimento, entre os quais a Geni, que detém parte do capital do Banco Económico. Outras passaram a totalidade dos activos para o Estado, como foi o caso de várias empresas associadas a Manuel Vicente e a Hélder Vieira Dias Júnior ‘Kopelipa’, incluindo a Lektron Capital, que transferiu a participação que detinha no Banco Económico à Sonangol. Diga-se o mesmo em relação às três fábricas têxteis (Satec, Alassola e a Nova Textang II) ou a vários activos de Isabel dos Santos. Estes com a particularidade de possuírem valor de mercado muito superior às dívidas que o Estado então reclamava.
No meio de tudo isso, a Fábrica de Cimento do Kwanza-Sul, entretanto, fica de fora. Não é obrigada a pagar de forma imediata, não é arrestada, nem é transferida para o Estado.
E, só a título de comparação, está em causa uma dívida quase 10 vezes superior aos 75 milhões de euros que Isabel dos Santos terá tomado de empréstimo da Sonangol na constituição da Esperaza Holding, que detém uma participação de 45% na Amorim Energia. E, pelo menos, mais de 15 vezes acima dos 53,2 milhões de dólares que a PGR exigiu a Leopoldino do Nascimento para este manter a participação de 19,9% no Banco Económico, através da Geni. Ou quase quatro vezes acima dos 210 milhões de dólares da garantia soberana que o Estado concedeu para o financiamento da Biocom, e pelos quais ameaça tomar a empresa. A lista de exemplos que denunciam a opacidade na recuperação de activos, partindo do caso FCKS, é extensa. E são casos como estes que legitimam todas as dúvidas.
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