EXCLUSIVO. Ministério das Finanças comunicou, em carta, à TCUL, o fim dos subsídios aos bilhetes de passagem e que não vai pagar a dívida que contraiu com todas as operadoras de transportes públicos, nos últimos meses. Transportadoras reagem dizendo que o Governo deve reabrir o debate sobre a alteração da tarifa e propõem um mínimo de 150 kwanzas.
O Governo, através do Ministério das Finanças, decretou o fim imediato do subsídio aos transportes, tendo já comunicado à operadora pública da decisão.
O VALOR sabe de fonte oficial que a TCUL recebeu, recentemente, uma carta do Ministério das Finanças em que este comunica, de forma expressa, o fim do subsídio do Estado, medida que se estende às operadoras privadas, designadamente à Macon, Angoaustral, Tura e à SGO, que se têm queixado dos pesados custos operacionais.
Na carta à TCUL, o Ministério das Finanças descarta-se dos atrasados de oito meses que a operadora reclama do Governo em subsídios e determina que as empresas têm de começar a andar por meios próprios. “Não vai pagar [o atrasado] e doravante todas as empresas têm de viver com as suas receitas. Este é mais ou menos o teor da carta que a TCUL recebeu”, esclarece a fonte, admitindo estar reaberto o debate sobre a revisão da tarifa actual fixada em 110 kwanzas e alvo de críticas recorrentes das operadoras.
Luís Máquina, director-geral da Macon, diz que os preços actuais não compensam. “Mesmo com os subsídios, as operadoras não rendem com os autocarros urbanos, devido ao mau estado das vias. Recorrerem, por isso, às receitas dos interprovinciais para se manterem vivas e, além do custo das peças, o Estado não paga os subsídios há oito meses”, lamenta o responsável da empresa que tem 100 autocarros fora de serviço e 650 em actividade, três dos quais baseados na Namíbia.
Luís Máquina contabiliza em 60 milhões de kwanzas os custos semanais com o combustível e em mais de um milhão de dólares (250 milhões de kwanzas) as despesas com salários, estando, para o próximo mês, a reabertura da rota da Namíbia, interrompida em 2013, e para o próximo ano a abertura das rotas da Zâmbia e do Congo.
Na Angoastral, o quadro não é diferente e o responsável do património da empresa, António Malengue, confirma que as vias mais rentáveis são as interprovinciais, Luanda/Huambo, com o bilhete de passagem a custar cinco mil kwanzas, num autocarro de 46 lugares, fazendo uma frequência por semana.
Já a TCUL, em consequência do mau estado das vias, até 2016, trabalhava apenas com 50 viaturas, mas, este ano, o número de autocarros a funcionar cresceu para 240, 145 dois quais urbanos, 25 interprovinciais, 30 mini-urbanos e 40 comerciais (para serviço de aluguer).
Com essa frota, e aproveitando o tempo seco, reactivou as rotas para Catete, Quiçama, barra do Kwanza, Funda (passando por Catete), Maria Teresa, Cacuaco/São Paulo, Bom Jesus, Sequele, Quilómetro 44.
Em termos de custos, a TCUL gasta, mensalmente, só de salários 160 milhões de kwanzas e, tal como as demais operadoras, tem defendido a actualização da tarifa, por considerar “injusto” o preço de 50 kwanzas.
Entre as operadoras, que transportam em média oito milhões de passageiros por mês, reina o consenso de que 150 kwanzas é o preço é mínimo que o Governo deve considerar na discussão das novas tarifas.
Sobre a reclamação dos oito meses de atrasados do Estado, Cruz Lima, director do Instituto de Preços e Concorrência (IPREC), refere que as informações sobre o número de meses que as empresas evocam não correspondem com a verdade, além de não fazerem sentido. “Elas é que sabem, e se existe dívida de Julho ou Agosto, o Instituto de Preço e Concorrência não pode revelar por ser assunto confidencial”, declarou, ironizando que “os taxistas também exercem actividade de transporte público, mas não vão ao Ministério das Finanças pedir subsídios”.
Tarifas revistas passam para 126 kwanzas
Enquanto as operadoras aguardam pela revisão do preço do bilhete dos transportes colectivos, fonte ministerial avança que a tarifa máxima deverá subir 152% para os 126 kwanzas, com a revisão, pela terceira vez, do documento que propõe a alteração das tarifas.
O aumento é justificado com a inflação e com o novo regime cambial em vigor desde Janeiro. E, pelas contas oficiais, o tarifário estará de acordo com a distância da viagem, com as necessidades e condições dos usuários, diferente do actual regime em que são cobrados 50 kwanzas por viagem, em todas as rotas.
Denominado ‘abono multimodal de transportes - potenciação dos subsídios a preços para os transportes públicos de passageiros’’, o documento que propõe a alteração das tarifas estabelece a adopção de um passe modal e define, para Luanda, cinco zonas tarifárias, que compreendem os nove municípios. “A ideia é corrigir algumas imprecisões”, explica a fonte, justificando a terceira revisão do documento, após ter sido finalizado em Dezembro e revisto duas vezes.
Elaborado pelo Instituto de Preços e Concorrência (IPREC), com a participação do Instituto Nacional de Transportes Rodoviários (INTR), o documento propõe abonos mensais e anuais, com viagens ilimitadas. E prevê títulos instransmissíveis para zonas limítrofes específicas e outros com cobertura total. Os títulos poderão, no entanto, ser adquiridos por terceiros, como encarregados de educação, empregadores e o Estado.
Já na posse do ministro dos Transportes, Ricardo d’ Abreu, a proposta vai ser submetida ao conselho técnico dos transportes e, apesar de “algumas divergências”, como assinala fonte ministerial, deve ser aprovada durante este trimestre.
Em finais do ano passado, algumas empresas de transporte rodoviário, incluindo a pública TCUL, consideraram que a tarifa actual não cobria os custos operacionais. Muitas debateram-se com greves dos trabalhadores, por falta de pagamento dos salários. E o director-geral da TURA, José Junça, chegou a atribuir a responsabilidade ao Governo pelo atraso no pagamento dos subsídios.
Nova empresa à vista
O IPREC, segundo o documento, acredita que, para a administração do sistema integrado de transportes, é necessária a criação de uma entidade gestora independente e participada pelas empresas de transportes, sem descartar representantes do INTR e do próprio IPREC nos órgãos sociais. Ao que está sugerido, a empresa de Gestão e Compensação do Abono (EGCA) terá a responsabilidade de arrecadar e distribuir as receitas, além do controlo e prestação de serviços. O EGCA pode ainda integrar um banco como parceiro operacional.
Caso o sistema proposto venha a vigorar, o IPREC prevê que o volume de negócios nos transportes possa ter um aumento de 62,38 mil milhões de kwanzas. No actual modelo, os valores rondam os 25,87 mil milhões de kwanzas, com os autocarros a representarem 64% do volume total.
Os números actuais do sistema de transportes de Luanda indicam que, em média, 31 mil pessoas utilizam os transportes rodoviários, ferroviário e marítimos, representando apenas 4,9% da população. Estima-se que, com a implementação do abono, haja uma subida para os 15% da população.
Por Isabel Dinis
JLo do lado errado da história