É agora ou nunca para a liderança mundial contra o COVID-19
Na semana passada, peritos nas áreas de medicina, economia, política e sociedade civil uniram-se para exigir uma acção internacional imediata e coordenada para mobilizar os recursos necessários para enfrentar a crise da covid-19, impedir que a actual catástrofe da saúde se torne uma das piores da história e evitar uma depressão mundial. Tal como salienta uma carta dirigida aos líderes mundiais, tendo em conta que estamos tão distantes na curva da covid-19, muitas vidas estão a perder-se desnecessariamente, outros problemas de saúde estão a ser ignorados e as sociedades e as economias estão a ser devastadas.
Durante a crise financeira mundial de 2008, os líderes do G20 trabalharam para coordenarem uma resposta global. E noutras emergências anteriores – como tsunamis, guerras civis ou epidemias – as coligações de países convocaram conferências de doadores para gerarem recursos necessários. Hoje, precisamos das duas acções: uma força-tarefa do G20 para coordenar o apoio internacional e uma conferência de doadores para tornar esse apoio eficaz.
Há dez anos, a crise económica imediata pôde ser superada quando a subcapitalização do sistema bancário global ficou resolvida. Desta vez, a crise económica não terminará até que a emergência de saúde seja resolvida e a emergência de saúde não terminará se a doença for tratada apenas num país. Só pode terminar quando todos os países recuperarem da covid-19 e o vírus for impedido de regressar regularmente.
Todos os sistemas de cuidados de saúde e sociedades – mesmo os mais sofisticados e ricos – estão a vergar sob a pressão causada pelo coronavírus. Mas se não fizermos nada, enquanto o vírus se espalha nas cidades e comunidades mais pequenas africanas, asiáticas e latino-americanas – que têm poucos equipamentos de testes e sistemas de saúde frágeis e onde o distanciamento social será impossível de alcançar – causará devastação, perdurará e talvez fomentará outros surtos em todo o mundo de forma inevitável.
A única forma de acabar com a crise mais cedo, em vez de mais tarde, é fazer o que deixámos de fazer há anos: financiar as agências de saúde pública, científicas e económicas que fazem a barreira entre nós e o desastre mundial. Os líderes mundiais deveriam acordar de imediato um compromisso inicial de oito mil milhões de dólares para a Organização Mundial da Saúde continuar o seu trabalho vital em 2020 e o restante para apoiar a Coligação para as Inovações e a Preparação para Epidemias, no sentido de coordenar esforços para desenvolver, produzir e distribuir diagnósticos, terapêuticas e vacinas eficazes. Estes avanços, com acesso equitativo para todos os países, são vitais se quisermos acabar com esta pandemia e evitar futuras tragédias.
Também deve ser fornecido financiamento para satisfazer a necessidade mundial de ventiladores e equipamentos de protecção individual. Em vez de cada país, estado ou província lutar por uma fatia da produção da capacidade, com toda a concorrência inflacionária que isso traria, deveríamos aumentar bastante a capacidade coordenando a produção e a aquisição mundiais desses produtos médicos. E, se uma vacina estiver disponível, tem de se atribuir financiamento suficiente para distribui-la, através de organizações como a Gavi, A Aliança da Vacina, nos países mais pobres.
De acordo com as estimativas mais optimistas do Imperial College, Londres, haverá 900 mil mortes na Ásia e 300 mil em África. Os países em desenvolvimento não carecem apenas de sistemas de saúde modernos; também dispõem de redes de segurança social totalmente inadequadas. São necessários, pelo menos, 35 mil milhões de dólares para fornecer produtos médicos vitais, recrutar pessoal e fortalecer a resiliência nacional.
No entanto, apesar do perigo iminente, quase 30% dos países não possui planos nacionais de preparação e resposta ao COVID-19, segundo a OMS, e apenas metade possui um programa nacional de prevenção e controlo de infecções. Muitos carecem de padrões adequados em matéria de água, saneamento e higiene nas respectivas unidades de saúde. E, embora se calcule que os países mais ricos apenas terão um sétimo das camas hospitalares de que necessitam para os cuidados intensivos, os países pobres terão muito menos e muitos não terão nenhuma.
Os governos nacionais também estão a tentar combater a curva descendente das suas economias. Mas, para impedir que uma crise de liquidez se transforme numa crise de solvência e que a recessão global de hoje se transforme na depressão de amanhã, são urgentemente necessárias medidas fiscais, monetárias e comerciais melhor coordenadas.
Os pacotes de estímulo fiscal que estão a ser implementados em alguns países vão ser muito mais eficazes se todos os países com condições de fazê-lo se juntarem. Mas, se quisermos limitar os despedimentos em massa (que já estão a ocorrer a uma escala assustadora), também é vital que os bancos cumpram rapidamente as garantias de empréstimo dos governos e forneçam o apoio financeiro de que as empresas e os seus trabalhadores necessitam.
Os países mais pobres precisam de assistência económica especial. A comunidade internacional deveria começar por renunciar ao pagamento das dívidas deste ano dos países em desenvolvimento, inclusive a dívida de 44 mil milhões de dólares de África. Mas a realidade é que serão necessários pelo menos 150 mil milhões de dólares em novos financiamentos para proteger as economias em desenvolvimento.
O Banco Mundial pode aumentar o apoio aos países mantendo-se simultaneamente dentro do seu limite máximo de empréstimos. Mas isso não será suficiente. Em 2009, durante a Grande Recessão, os gastos do Banco Mundial passaram de 16 mil milhões de dólares para 46 mil milhões de dólares. Actualmente, deveria ser garantido um alargamento semelhante dos recursos disponíveis. O Fundo Monetário Internacional prometeu mobilizar todos os recursos disponíveis. O FMI deveria conceder cerca de 500 a 600 mil milhões de dólares em Direitos de Saque Especiais (DSE)).
O tempo é limitado. De preferência, tudo isto deveria ser acordado e anunciado formalmente pelo FMI e pelo Comité de Desenvolvimento do Banco Mundial quando se reunirem de 17 a 19 de Abril. Esta pode ser a estratégia de saída mais viável que está disponível para o mundo. Se por um lado o preço parece ser elevado, por outro lado, as consequências de não pagá-lo poderão ser catastróficas.
Gordon Brown,
Ex-primeiro-ministro do Reino Unido, enviado especial da ONU na Comissão Internacional do Financiamento Global da Educação.
Erik Berglof,
Economista-chefe do Banco Europeu para a Reconstrução e Desenvolvimento, director do Instituto de Assuntos Globais da Escola de Economia e Ciências Políticas de Londres.
Jeremy Farrar,
Director do Wellcome Trust, uma fundação a nível mundial dedicada à saúde.
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