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António Miguel

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ROCHAS ORNAMENTAIS. Governos provinciais proíbem transporte por via rodoviária, abrindo caminho para a empresa ferroviária do Namibe.

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O Caminho de Ferro de Moçâmedes (CFM) prevê transportar 100 mil toneladas de granito e minérios por mês, no decorrer de 2018. A previsão da empresa ferroviária do Namibe ‘ganhou corpo’ na sequência de medidas conjuntas dos governos do Namibe, Huíla e Kuando-Kubango, que proíbem o transporte de rochas ornamentais via rodoviária. As autoridades provinciais justificam a posição com a degradação de estradas provocada por camiões carregados de granitos.

No entanto, de acordo com o administrador da empresa, António Cabral, o CFM precisa de 100 novos vagões para concretizar o desafio de transportar as 100 mil toneladas de rochas ornamentais por mês. “O transporte de granito configura-se numa “luz no fundo do túnel para tirar a empresa dos maus resultados financeiros em que se encontra há anos”, garante o administrador.

Com 1.530 trabalhadores, o CFM teve menos 12% das receitas em 2017 em relação a 2016. Aliás, o administrador António Cabral reconheceu que transportar apenas passageiros com os bilhetes de passagem a 50 kwanzas “não é rentável”. “Por isso, temos de apostar também no transporte de mercadoria, principalmente o granito.”

O transporte de granito não dá resultados apenas ao CFM, mas também ao Porto do Namibe. De acordo com o presidente do conselho de administração (PCA) do Porto, António Samuel, o tráfego de rochas ornamentais constitui uma das principais fontes de receitas da empresa portuária.

Recentemente, correram informações de que o Governo pretendia proibir a exportação de rochas em estado bruto, com o intuito de fomentar a indústria transformadora local. No entanto, em declarações exclusivas ao VALOR, o secretário de Estado de Minas, Jânio Correia Victor, desmentiu a informação, avançado apenas que haverá novas regras de exportação, incluindo a sujeição das rochas às análises laboratoriais.

Ainda assim, António Samuel receia que as novas regras de exportação afectem negativamente os resultados da empresa. “Oficialmente, ainda não nos chegaram os documentos das novas regras. Esperamos, entretanto, que não prejudiquem as receitas portuárias”, calcula o gestor, indicando que o Porto do Namibe se prepara para concorrer com os portos vizinhos do Lobito e Walvis Bay, na Namíbia, que “estão de olho no tráfego de granito”. Ainda este mês, deverão arrancar as obras da segunda fase de ampliação do porto namibense. Tal como na primeira fase, a empreitada está avaliada em 20 milhões de dólares, que serão doados pelo governo do Japão.

Só a Huíla regista uma produção mensal de 2.500 metros cúbicos de granito, prevendo-se aumentar para cinco mil metros cúbicos, caso o CFM comece a fazer transportações diárias. Estão empregados no ramo das rochas ornamentais 824 trabalhadores, dos quais 753 nacionais e 71 expatriados. Os postos de trabalho estão essencialmente na Huíla, Namibe e Kwanza-Sul.

AVIAÇÃO. Companhia aérea nacional mostra-se surpreendida com valor do imposto e pede explicação à autoridade tributária brasileira. Administração da empresa ainda se queixa do elevado valor da dívida e admite dispensar quase 600 trabalhadores.

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A TAAG pagou, em 2017, 20 milhões de dólares em impostos ao Brasil, informou o presidente do conselho de administração (PCA) da companhia aérea, José Kuvingua, durante o conselho consultivo do Ministério dos Transportes, que teve lugar no Lobito.

O pagamento desses 20 milhões de dólares foi apontado como a principal causa de a operadora ter fechado 2017 com resultados negativos. José Kuvingua afirmou ainda que a sua administração foi “apanhada de surpresa” com os valores taxados pelas autoridades tributárias brasileiras, já que a companhia calculava pagar menos. “Estávamos muito próximo de ter resultados positivos, mas, infelizmente, mais uma vez, não conseguimos. Já escrevemos para as autoridades brasileiras para nos explicar as razões de nos terem cobrado esses valores tão altos”, explicou o PCA da operadora do Estado.

Nos maus resultados da TAAG, de 2017, pesam também os custos com o combustível dos aviões. Embora não tenha avançado o valor gasto em fuel, José Kuvingua afirmou que o combustível é o mais caro da região da SADC. “O preço praticado pela Sonangol está entre 40 e 54% acima da média praticada pelas gasolineiras internacionais”, compara o PCA da operadora.

Em comunicado publicado em Agosto de 2017, a TAAG já admitia impactos da redução na atribuição do subsídio de combustível pelo Governo, considerando que, se não fosse a redução no subsídio e a provisão para o passivo fiscal, a companhia teria sido lucrativa.

Só no primeiro semestre de 2017, por exemplo, a empresa tinha já declarado perdas de 12 milhões de dólares, considerando, no entanto, menos mal em relação aos prejuízos anteriores fixados em 150 milhões de dólares.

Prejuízos acumulados

A companhia pública é ‘famosa’ pelos prejuízos financeiros que vem registando ao longo de décadas. Já passou por vários processos de reestruturação, sendo o mais mediático o acordo assinado, em finais de 2014, com a Emirates, que assumiu a gestão da empresa. Assinado pelo ministro dos Transportes, Augusto Tomás, o contrato previa a introdução de uma “gestão profissional de nível internacional”, “melhoria substancial da qualidade do serviço prestado” e a “inversão da situação financeira da TAAG” que, até 2014, tinha registado um prejuízo de 99 milhões de dólares.

Dois anos depois da assinatura do acordo, e quando a administração liderada pelos árabes tinha já anunciado que a TAAG conseguira economizar 120 milhões de dólares graças à nova gestão, a Emirates abandonava a congénere angolana, por enfrentar dificuldades no repatriamento das divisas, resultantes da venda dos seus bilhetes em Luanda.

Excesso de trabalhadores é também um dos problemas apontados por José Kuvingua, que prevê reduzir o número de 3.176 para os 2.500 funcionários. “O actual número de trabalhadores é três vezes mais do que o necessário”, admite o PCA da TAAG. Devido aos maus resultados, vários observadores têm defendido a privatização da transportadora aérea pública.

PROBIDADE PÚBLICA. Seis meses depois de o novo Governo iniciar funções, a Procuradoria-Geral da República (PGR) continua à espera que titulares de cargos públicos declarem os bens. Cobrança coerciva é o próximo passo, mas analistas explicam que a ameça é ilegal.

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A Procuradoria -Geral da República (PGR) prepara um plano de cobranças coercivas das declarações de rendimento a gestores públicos que deverá arrancar a partir do último trimestre, deste ano. 

De acordo com o vice-procurador-geral da República, Mota Liz, ainda não foram realizadas quaisquer cobranças devido à falta de condições de recepção e armazenamento dos documentos. A instituição está a trabalhar na criação de ficheiros em suportes digitais e físicos para cada agente público, facilitando a actualização dos dados de dois em dois anos, como determina a lei. “Queremos ter ficheiros com segurança apropriada e estamos a trabalhar nisso. Ainda este ano, as condições estarão criadas e começaremos a cobrança coerciva. Isto mais para o final do ano”, pormenoriza o magistrado, acrescentando que, com a mudança, na próxima semana, para as novas instalações (prédio que pertencia à seguradora AAA) a PGR terá “melhores condições de trabalho”.

No entanto, o jurista Pedro Kaparakata alerta que o plano de cobrança coerciva da PGR se encontra numa situação de “inconsonância com o previsto na lei”, que determina, como sanção, a demissão ou destituição de titulares de cargos públicos que não tenham declarado bens, 30 dias depois da sua nomeação. “Se se fizer a cobrança coerciva, estar-se-ia diante de uma medida sancionatória, que não está prevista na Lei de Probidade Pública. A PGR tem apenas de promover a demissão de agentes públicos que não declarem os bens no prazo estipulado por lei”, afirma o jurista que, como exemplo, cita o pagamento da taxa de circulação. “Findo o prazo, a polícia deve aplicar multa aos incumpridores e não fazer cobrança coerciva”.

Pedro Kaparakata defende ainda que o procurador-geral da República, Hélder Pitta Grós, deveria propor a alteração da Lei de Probidade para permitir que os bens declarados sejam publicamente divulgados. “A declaração não resolve o problema. Os cidadãos ficariam satisfeitos em saber qual é o património ou riqueza dos governantes. E, quando estivessem num determinado local, já saberia quem é o dono”, argumenta o jurista.

Já o jurista Vicente Pongolola entende que a falta de condições, como arquivos, não colhe como justificação para a PGR, enquanto promotora da legalidade, deixar de fazer o trabalho. “Teve tempo suficiente para criar as condições de armazenamento das declarações de rendimento, até porque a Lei de Probidade Pública tem já oito anos de vigência.”

Nomes escondidos

Seis meses depois de o novo Governo entrar em funções, a PGR recusa-se a adiantar números relativos ao cumprimento da lei por parte dos governantes. Mota Liz, por exemplo, limitou-se a avançar que a Casa Civil do Presidente da República tem estado a tratar do assunto e “vários governantes já declararam”.

O cenário actual contrasta com apresentado pelo Presidente da República, João Lourenço, em Janeiro. “Da informação que tenho é que os membros do Governo já deram a entrada da sua declaração de bens”, respondeu aos jornalistas na conferência de imprensa colectiva.

Por força da lei, titulares de cargos públicos devem declarar títulos, acções ou qualquer outra espécie de bens e valores, localizados no país ou no estrangeiro. A informação é entregue em envelope lacrado ao Presidente da República, que, por sua vez, a submete ao procurador-geral da República.

Além de ministros e governadores provinciais, deputados, juízes, presidentes de conselhos de administração de empresas e institutos públicos são também obrigados a apresentar à PGR os seus bens. A lei abrange ainda todos os funcionários da administração pública com cargos de chefia. Em 2010, quando a lei entrou em vigor, a PGR, na voz do ex-procurador-geral da República, João Maria de Sousa, anunciou o nome dos governantes que, na altura, apresentaram declaração de bens.

O que diz a lei

A Lei de Probidade Pública diz, no número 4 do artigo 27, que “é punido com pena de demissão ou destituição, sem prejuízo de outras sanções previstas por lei, o agente público que se recuse a prestar declarações de bens, no prazo determinado por lei”. Já no número 5 do mesmo artigo, lê-se que “a declaração de bens é apresentada em envelope fechado e lacrado, até 30 dias após a tomada de posse, junto da entidade que exerce o poder de direcção, de superintendência ou tutela, que remete, no prazo de oito dias úteis, ao procurador-geral da República”. “As falsas declarações por dolo ou negligência, as omissões e falta de declaração de bens equivalem a falsas declarações perante autoridade pública, susceptíveis de responsabilização política, disciplinar e criminal”, diz o artigo número três.

Clientes da Jefran, que se queixam, desde 2016, de incumprimento de prazos por parte da imobiliária, deverão receber as casas em Julho, garante o director-geral da empresa, Gerson Silva. “Temos solução, o que pedimos apenas aos nossos clientes é tempo”, apela o empresário, avançando que, nessa altura, mais de mil habitações estarão construídas. Silva admite que a empresa está numa situação de incumprimento, mas “não de burla”, justificando os atrasos com “a crise económica” em que o país mergulhou em 2014. “É um problema que afectou praticamente todas as empresas angolanas e a Jefran não foi excepção”, defende-se.

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O director da imobiliária explicou ainda que já tinha 500 clientes que não tinham recebido casas nos prazos acordados, tendo sido solucionada metade das reclamações. Em alguns casos, a empresa “fez o reembolso dos valores, enquanto noutros se fez mesmo a entrega das moradias”. A Jefran, empresa de construção e comercialização de habitações sociais, tem respondido em tribunal a vários processos desencadeados por clientes, motivados por incumprimentos da imobiliária em relação aos prazos de entrega. O Instituto Nacional de Defesa do Consumidores (INADEC), afecto ao Ministério do Comércio, também comunicou a recepção de, pelo menos, 70 reclamações contra a empresa. A directora do INADEC, Paulina Semedo, reuniu-se com clientes lesados, tendo anunciado a criação de uma comissão para trabalhar em soluções amigáveis. Parte dos queixosos exige devolução dos valores com juros de mora.

No entanto, Gerson Silva queixa-se também de vários clientes que, há um ano, receberam moradias, mas não pagam as mensalidades da renda resolúvel. “Infelizmente, fizemos entrega de muitas casas. Mais de 1.500 entregues em sistema de renda resolúvel e nos deparamos com incumprimentos de pagamento de mensalidades por parte dos clientes”, lamenta.

“Esse é também um dos problemas que tem estado a impedir-nos de concretizar outros projectos. Somos a primeira empresa privada a comercializar habitações sociais, por via da renda resolúvel. Portanto, o não pagamento das mensalidades está a criar grandes problemas à empresa”, acrescenta.

A Jefran, que já construiu mais de três mil casas, está envolvida em vários projectos habitacionais em mais de cinco províncias, sendo que, só em Luanda, a imobiliária controla 32 condomínios, todos nos arredores do Benfica.

TRANSPORTES PÚBLICOS. Sem lucros, nem estatuto orgânico é a situação das empresas do sector. No conselho consultivo do Ministério dos Transportes, os PCA propuseram saneamentos financeiros e a redução de intervenção do Governo.

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Os presidentes de conselhos de administração (PCA), principalmente das operadoras de transportes, reconheceram a necessidade de as empresas passarem por um processo de saneamento financeiro ou refundação. Aqueles gestores públicos, reunidos no conselho consultivo alargado do Ministério dos Transportes (MINTRANS), que decorreu no Lobito, entendem ainda que, para se inverter o ‘mau quadro’ das empresas, deve-se dar mais autonomia aos gestores, reduzindo a intervenção do Governo nas empresas.

Embora essas reformas propostas possam provocar mais desemprego, o ministro dos Transportes, Augusto da Silva Tomás, reconheceu também a necessidade de reformulação das empresas, tendo avançado que algumas poderão ser privatizadas. O conselho consultivo concluiu ainda que as empresas públicas da alçada do MINTRANS funcionam sem estatutos orgânicos, deixando os membros dos conselhos de administração em situação de ‘ilegalidade’, apesar de, formalmente, terem sido empossados.

O presidente do Conselho de Administração (PCA) da Unicargas, Celso Rosas, lembrou ao ministro dos Transportes “a necessidade urgente” de aprovação dos diplomas que normalizem os conselhos de administração.

De acordo com Celso Rosas, a falta de estatuto orgânico está a “impactar negativamente nas relações institucionais das firmas do Estado com outras empresas, principalmente com a banca”. “Há bancos que querem cortar relações com as empresas por causa dessa situação. Até porque dá a ideia de ilegalidade”, alertou o PCA da Unicargas. O estatuto orgânico define, entre outros aspectos, as responsabilidades dos PCA e dos funcionários, sendo que as empresas carecem do documento. Na mesma situação, estarão também empresas de outros ramos do sector empresarial público.

Durante o conselho consultivo, que teve o lema ‘Mobilidade, Desenvolvimento e Bem-Estar’, os PCA apresentaram as estratégias das firmas. Aliás, o principal tema em discussão foram os planos, programas e projectos das 14 empresas públicas do sector.

Todas com prejuízos

Em 2017, todas as empresas dos transportes tiveram, praticamente, resultados negativos, com destaque para as operadoras TAAG, TCUL, Unicargas (empresa rodoviária de transporte de mercadora) e as três empresas de caminhos-de-ferro (Benguela, Namibe e Luanda), apesar dos investimentos feitos pelo Estado.

Excesso de trabalhadores, fraca rentabilidade, dificuldades de pagar dívidas com fornecedores e atrasos salariais caracterizam a actual situação das empresas tuteladas por Augusto Tomás. A dívida da Unicargas, por exemplo, está fixada em seis mil milhões de kwanzas, dos quais 90% com o Porto de Luanda, empresa do mesmo ramo.

A facturação da empresa de transporte de mercadorias caiu 70% nos últimos quatros anos. Ainda assim, a empresa prevê fazer um investimento de 218 milhões de kwanzas em 2018. Tem cerca de 700 funcionários, prevendo a redução de, pelo menos, 200.

No conselho consultivo, ficou-se a saber que os caminhos-de-ferros e a TCUL dão mais prejuízos do que lucros ao Estado, encontrando-se numa situação financeira que inspira cuidados e, segundo os PCA, “continuarão deficitárias nos próximos cinco anos”. As receitas do Caminho-de-Ferro de Moçâmedes, por exemplo, caíram 12% em 2017, em que se fixou em 321,1 milhões de kwanzas, contra os 363,1 milhões de 2016. A empresa tem 1.530 trabalhadores no Namibe, Huíla e Kuando-Kubango.

Os factores que provocam maus resultados nos ‘caixas’ dessas empresas são basicamente os mesmos. Baixas tarifas dos bilhetes de passagem, atrasos do Governo nos pagamentos dos subsídios dos bilhetes, mau estado das vias (estradas e linhas férreas), que provoca rápida degradação dos meios, preços altos dos combustíveis e custos altos operacionais.