António Miguel

António Miguel

COOPERAÇÃO. Angola até cumpre com os pagamentos de quotas, mas de forma irregular. Vários países acumulam dívidas. Ainda assim, CPLP quer reforçar as ligações económicas.

CPLP

A ngola figura na lista dos países que mais pagam quotas na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), no entanto, é o menos regular quando comparado a Portugal e ao Brasil, principais financiadores da organização.

Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste têm pagamentos por regularizar. Não está feito o ponto de situação da Guiné-Equatorial, o mais recente membro da organização admitido em 2014.

O valor da quota anda à volta dos 500 mil euros/ano. Feitas as contas, a arrecadação da CPLP anual não atinge os cinco milhões de euros/ano, via pagamentos de quotas. No entanto, o embaixador angolano na CPLP, Oliveira Encoge, que evitou abordar a quotização, avança que “Angola paga um pouquinho acima dos 500 mil euros”.

Para o analista em relações internacionais Francisco Ramos da Cruz, as dificuldades financeiras, no seio da organização, também constituem bloqueios à integração económica dos países, “adiando os anseios dos povos”.

Com parcos recursos financeiros, a organização tem limitações na implementação dos seus projectos, ficando refém de doações adicionais. Há Estados-membros, como a Guiné-Bissau, que não têm orçamentos estáveis e sobrevivem de doações internacionais.

“Muitas vezes, é Angola que disponibiliza um avião para ir buscar a delegação de Cabo-Verde ao mais alto nível, como o presidente da República ou o primeiro-ministro”, revela o especialista, defendendo que o Governo devia criar uma plataforma de maior aproximação e exploração do potencial da organização em todos os aspectos.

A livre circulação de pessoas e o reforço da cooperação económica entre os países da CPLP foi praticamente o tema ‘forte’ da 12.º conferência dos chefes de Estados e de governos da CPLP, em Cabo Verde. Reiteraram-se vontades, mas os desequilíbrios entre as economias também se apresentam como um ‘grande desafio’, que a Confederação de Empresários da CPLP quer ver resolvido com urgência.

“Enquanto uns pensam em estabilidade política, social e económica, outros, por ser um dado adquirido, já pensam em desenvolvimento sustentado e não se revêem em golpes de Estado”, afirma Francisco Ramos da Cruz.

PACTO DE FINANCIAMENTO EM NOVEMBRO

Face à necessidade de impulsionar a economia da CPLP, principalmente dos membros africanos, a organização vai assinar, em Novembro, um acordo com o Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), designado Pacto de Financiamento para o Desenvolvimento dos Países de Lusófonos em África.

Segundo um comunicado da secretária executiva da CPLP, Maria do Carmo Silveira, e do presidente do BAD, Akinwumi Adesina, o objectivo do pacto é o de “fortalecer o papel do sector privado na promoção do desenvolvimento sustentável e inclusivo nos países beneficiários, atraindo investimentos para ajudar a agregar valor aos produtos de consumo e recursos naturais locais, bem como impulsionar a industrialização e criar empregos”.

O pacto, que deverá ser assinado durante o Fórum de Investimento para África, marcado para o início de Novembro, em Joanesburgo, África do Sul, é um dos principais resultados da conferência dos chefes de Estado e de governos da CPLP, em Cabo Verde, onde o presidente de Timor-Leste, Francisco Guterres Lu-Olo, foi o ‘grande’ ausente, pelo facto de a sua participação não ter sido aprovada pelo parlamento timorense.

REESTRUTURAÇÃO. Carlos Fernandes não vê razões para incluir a Sodepac na lista de empresas que vão ser intervencionadas. Gestor acredita que se trata de um “equívoco”.

SODEPAC

O presidente do conselho de administração (PCA) da Sociedade de Desenvolvimento do Pólo Agroindustrial de Capanda (Sodepac), Carlos Fernandes, garante que a empresa se encontra de “boa saúde financeira e técnica-operacional”, afirmando ter sido um “equívoco” a sua inclusão no grupo de empresas que precisam de ser monotorizadas por alegada incapacidade de desenvolver negócios.

Carlos Fernandes reage, desde modo, à publicação do despacho conjunto dos ministérios das Finanças e da Agricultura e Florestas que cria uma comissão para monitorizar as empresas públicas agrícolas, nomeadamente a Sociedade de Desenvolvimento de Perímetros Irrigados (Sopir), Empresa de Mecanização Agrícola (Mecanagro), Empresa de Recebimento e Exportação do Café (Cafangol) e a Sodepac.

“A qualquer momento tudo será esclarecido entre o Ministério da Agricultura e o das Finanças, porque não entendo por que razão a Sodepac foi incluída nesse grupo de empresas. Mas vamos aguardar”, acalma-se o engenheiro agrónomo, que dirige a instituição desde a sua fundação, em 2008.

No Pólo Agro-industrial de Capanda (em Malanje), gerido pela Sodepac, existem três fazendas do Estado (Pungo Andongo, Pedras Negras e Quizenga) que se encontram em falência, mas não estão incluídas ‘no raio de acção’ da comissão monitora.

De acordo com o despacho, a comissão, que integra técnicos dos dois ministérios, tem a missão de apurar as causas que originam a incapacidade das referidas empresas em conceber planos sustentáveis de negócios. Os resultados do ‘inquérito’ devem ser apresentados já esta semana. As empresas enfrentam problemas de ordem financeira, há algum tempo, deixando trabalhadores vários meses sem salários. Estes, por sua vez, reagem com greves.

No caso da Mecanagro, por exemplo, o ministro da agricultura, Marcos Nhunga, já assumiu estar em curso um processo de extinção, enquanto para a Sodepac se projecta uma reestruturação. Mais privatizações O economista Josué Chilundulo defende a privatização de mais de 70% das empresas públicas devido à baixa rentabilidade, lamentado que estas, ao invés de serem grandes contribuintes, “representem mais passivos para o Tesouro Nacional”.

Em 2017, por exemplo, o Governo previa injectar 70 mil milhões de kwanzas, equivalente a 324,8 milhões de dólares, na capitalização de empresas públicas.

O professor universitário reconhece, no entanto, que o processo de refundação e privatização implica também uma redução da mão-de-obra, sugerindo, por isso, que esse problem pode ser resolvido com medidas que estimulem o surgimento de mais empresas privadas a prestarem os mesmos serviços”. “De outra forma, as empresas continuarão a representar um grande peso negativo na economia nacional.”

Apesar de estar próximo das margens do Rio Kwanza, o Pólo Agro-industrial de Capanda, criado há mais de 10 anos, em Malanje, ainda não tem água e depende da chuva. Em período de seca, regista perdas de milhões de dólares. O projecto de abastecimento hídrico está orçado em 200 milhões de dólares, mas espera, há oito anos, por aprovação do Governo. O gestor da Sodepac lembra que este é um projecto raro no mundo e que pode colher muitos frutos.

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Dez anos depois da sua criação, o Pólo Agro-industrial de Capanda (PAC) está a cumprir os objectivos?

Sim. Os desafios são, em primeiro lugar, o crescimento e a diversificação da economia, a segurança alimentar e, naturalmente, a criação de emprego e distribuição do rendimento nacional. Um outro aspecto que tem sido esquecido é a redução do êxodo rural. Reduz-se, criando condições locais para que os camponeses não migrem para as cidades. Estando nas cidades, a probabilidade de regressarem para o campo é muito menor.

O PAC já está infra-estruturado para que se desenvolva o agro-negócio em Malanje?

Temos um plano director, que, no fundo, é uma orientação do ponto de vista estratégico da maneira como se deve gerir e ocupar o Pólo Agro-industrial de Capanda. A principal condição necessária para o desenvolvimento do PAC é a criação das infra-estruturas. Estamos a falar, em primeiro lugar, da água e energia. O plano de abastecimento hídrico foi solicitado ao Executivo em 2011 e, por razões que são alheias à Sodepac, este programa aguarda a sua inserção no programa de investimentos públicos há cerca de oito anos. E é uma infra-estrutura básica fundamental.

Isso significa que não há água no pólo?

Isto quer dizer que o PAC, ao contrário do que deveria acontecer, dispõe naturalmente das chuvas, da pluviosidade normal e sabe-se que a pluviosidade nem sempre é segura. Há anos de seca e naturalmente os projectos precisam de ter calendários seguros para a irrigação.

E quando não chove?

Na altura em que é previsto irrigar, se não chover, naturalmente, há problemas e perdas enormes. Daí a necessidade do plano de abastecimento hídrico. Aguardamos a aprovação deste plano para irrigar em todas as áreas do pólo, cerca de 37 mil hectares. Hoje, há uma maior sensibilidade do Executivo em encontrar fontes de financiamento para a execução deste plano.

Em quanto está orçado o plano de abastecimento hídrico?

A primeira fase está em cerca de 200 milhões de dólares. Fazemos votos de que, a partir desde ano, ou, o mais tardar, em 2019, tenhamos a possibilidade de arrancar com o plano de abastecimento hídrico.

Em termos de infra-estruturas, o que já foi feito?

As infra-estruturas rodoviárias, que foram concluídas em 2015. Foram cerca de 173 quilómetros de estradas secundárias no interior do pólo. Também já estão criadas as condições de abastecimento de energia. Estes dois projectos, a rede rodoviária e a eléctrica, orçaram em 140 milhões de dólares. A rede de distribuição de energia tem uma extensão de 164 quilómetros e a sua conclusão verificou-se em 2016, tendo sido introduzida a potência em 2017. Estamos em negociações com diversas operadoras de telefonia para que sejamos agentes no PAC. De um modo geral, na região do PAC, há uma cobertura média de entre 60 e 70% da área, mas essa cobertura precisa de ser total, por um lado, e precisa de melhorar a qualidade. Para isso, tem de haver um agente centralizador, que somos nós, e estamos a negociar com as operadoras.

O pólo tem uma área de 411 mil hectares. Em termos percentuais, qual é o espaço já ocupado?

Tem 411 mil hectares brutos, mas tem apenas 293 mil hectares de terras aráveis. O restante é área de preservação ambiental e de ocupação humana. Até ao mês passado, verificou-se uma ocupação de cerca de 182.705 hectares, portanto, cerca de 60% de espaço arável. Esta ocupação foi feita com cerca de 36 contratos de direito de exploração de terras, com uma previsão de criação de cerca de 8.803 empregos directos e com uma produção média anual de cerca de 5.437.000 toneladas, correspondente a 203.783.000 kwanzas.

São previsões ou resultados ‘palpáveis’?

São resultados até agora. Apesar de não termos tido as infra-estruturas, que são a principal condição potenciadora para o investimento privado, construídas a tempo, já conseguimos obter esses resultados. Se a infra-estrutura de abastecimento hídrico estivesse construída, estaríamos muito mais longe. Os projectos de grande envergadura não podem sujeitar-se aos caprichos de ‘São Pedro’ (chuvas). É preciso que a água seja retirada da albufeira de Capanda e seja distribuída pelas três zonas agroindustriais de Capanda.

Quantas empresas estão aí instaladas?

Temos, em funcionamento, por volta de 20 empresas. Estão em fase de arranque e é preciso verificar que há uma serie de factores inibidores. Em primeiro lugar, a conjuntura económica e financeira que o país atravessa desde 2014. Esta conjuntura caracteriza-se, sobretudo, pela escassez de recursos por parte da banca, ou seja, para o crédito bancário aos investidores. Por outro lado, tendo em vista os níveis de inflação alcançados e as restrições que temos na obtenção de divisas, muitas das empresas têm dificuldades em arrancar por causa das dificuldades de importar os ‘inputs’. O Pólo Agro-industrial de Capanda não está livre da conjuntura que o país atravessa mas, apesar disso, os resultados são extremamente positivos.

Por estarem no PAC, as empresas beneficiam de atenção especial, em termos fiscais?

É um trabalho em curso. Estamos a trabalhar com a Administração Geral Tributária e o Ministério das Finanças no sentido de encontrar um quadro especial fiscal para aquela área, tendo em conta as suas características especiais. Mas ainda estamos longe de atingir o objectivo. Estamos mais próximos é nas negociações que temos com Banco de Desenvolvimento de Angola e outros bancos, precisamente para que possamos, por um lado, fazer com que os estudos de viabilidade que os bancos precisam para financiar os projectos, ou melhor, os encargos decorrentes desses estudos, feitos pelos consultores, possam ser incorporados no valor do crédito e a pagar posteriormente. Por outro lado, negociar, no sentido de que as obras de infra-estruturas serem financiadas fora do quadro central do projecto em causa. Isto é, há ‘core business’ da empresa que será financiada, em determinadas condições de taxas de juros e período de mora, mas este conjunto de infra-estruturas será financiada à parte com condições especiais, precisamente para não encarecer a estrutura de custos e com isto provocar a falta de competitividade dos produtos que serão produzidos no PAC.

O que se produz no PAC?

O primeiro critério para a selecção das culturas a desenvolver no PAC é precisamente aquilo que o mercado precisa, os produtos que concorrem para a segurança alimentar e para a substituição das importações. O outro critério é saber que condições é que o Pólo tem para criar produtos, que correspondam a essas necessidades. Aqui tem que ver com as condições do próprio solo. Juntando estes dois critérios, as principais culturas que seleccionamos, ou seja, que recomendamos que sejam produzidas no PAC são o milho, soja, massambala, cana-de-açúcar, mandioca, arroz, pastagens e a florestas.

E a pecuária?

Só temos em funcionamento a pecuária de corte e essa cadeia ainda não está completa. Naturalmente, temos áreas vocacionadas para a bovinicultura que é constituída pelas forragens. Temos um matadouro e, provavelmente, uma área oficinal e depois promover a venda do produto final no mercado.

Quantas empresas que gestoras cadeias produtivas estão no PAC?

Antigamente, havia seis empresas âncoras. Três eram geridas pela Gesterra. Estas empresas do Estado ocupam cerca de 60 mil hectares (cerca de 26% da área) e atingiram insolvência financeira e falência técnica. Trata-se da Pungo Ndongo, Fazenda Pedras Negras e a Fazenda Quizenga, que eram geridas pela Gesterra e foram entregues ao Fundo Soberano. Há uma confusão à volta disso, esperemos que o Governo resolva este problema. Actualmente, as empresas âncoras que temos são a Companhia de Alimentos de Malanje, que controla a cadeia produtiva da mandioca; a Biocom, da cana-de-açúcar, e a Socamia, dos grãos. A Socamia é uma empresa do grupo Castel e vai produzir milho e soja para a matéria-prima de produção de cerveja, que é componente industrial. Outras estão agora em fase de implementação.

Dívidas a subir

Estas empresas estão inoperantes há quanto tempo?

Estão paradas há, pelo menos, três anos. E queríamos cobrar uma taxa de ocupação dos terrenos. Não tenho dados de quantas pessoas ficaram no desemprego, mas sei que a dívida do conjunto dessas empresas para com a Sodepac atingiu entre 2015 e 2017 mais de 435 milhões de kwanzas.

Sobre quem recai a responsabilidade pela falência das empresas?

Tenho esperança de que o Executivo tenha em mão esse processo e seja recuperado o mais rápido possível. Do nosso ponto de vista, para nós que gerimos o PAC, era necessário agir e propusemos uma metodologia que passava, em primeiro lugar, por um saneamento técnico e financeiro das empresas, precisamente para separar o activo do passivo. O segundo passo seria abordá-la na base do capital de risco promocional. Ter-se-ia de abrir a estrutura accionista das empresas a entidades com capacidade financeira comprovada e capazes de financiar um projecto de reestruturação, criando uma entidade gestora, que formaria os quadros necessários ao longo de todo o processo. Naturalmente, esta entidade financeira tomaria a maior parte da estrutura accionista da empresa. O Estado ficava com a menor parte. Temos a responsabilidade de gerir o PAC e não podemos aceitar que estas áreas sejam ocupadas sem rentabilidade nenhuma.

Além dessas empresas, há outras no PAC que têm dívidas para com a Sodepac?

É evidente. A partir do momento em que ocupam terras, mas não têm os créditos para iniciarem a produção, não têm resultados para pagar as obrigações. Mas isso nós compreendemos. Vamos negociando. São 10 a 20% das empresas nesta situação, mas não é nada de grave. Estamos a dar uma ajuda no sentido de, o mais rápido possível, arrancarem com as suas actividades.

O PAC está preparado para os eventuais efeitos da concorrência que se espera estimulada pelos acordos de comércio livre em África?

Os impactos são vários. Criadas as condições de infra-estruturas, estabilizando a situação macroeconómica do país e estando as infraestruturas a funcionar em pleno, o PAC poderá alimentar mais de três milhões de pessoas, pode criar 100 mil empregos directos e 200 mil indirectos. Pode contribuir em 436 milhões de dólares para a substituição anual das importações, produzir um valor de cerca 892 milhões de dólares, na produção agro-pastoril, ou seja, agricultura, floresta e pecuária. O volume de negócios da produção agro-industrial pode estar em cerca de 600 milhões de dólares. O valor de investimento nessas áreas pode estar em 1,4 mil milhões de dólares em 16 anos. Isto é uma série de impacto que não é de negligenciar. É uma área pequena do país que pode contribuir, por exemplo, com o óleo alimentar em cerca de 25% das necessidades do consumo, com 11% do consumo nacional de frango, em cerca de 80% das necessidade do açúcar e em cerca de 6,5% das necessidades da carne bovina. Portanto, uma área com todo esse potencial merece uma atenção especial por parte do Executivo.

Não estando as condições criadas, os produtos serão competitivos?

Quanto menor for o custo de produção, mais competitivo é o produto. Queremos ir à estrutura de custo, baixar a estrutura de custo e aumentar a qualidade para que o produto nacional seja mais competitivo do que o importado. Fazemos isso, baixando as taxas das infra-estruturas, baixando o custo das taxas dos juros, baixando os impostos e naturalmente, aumentando o apoio aos empresários locais. Isto faz com que a sua estrutura de custos seja baixa, o que vai redundar em produtos extremamente competitivos e, neste caso, podemos integrar a zona livre de comércio no continente, porque temos produtos que podem competir com os que vêm de fora.

Algum país tem um projecto como o PAC?

Existe na Califórnia (EUA), na Argentina, Brasil e está agora em desenvolvimento um na África do Sul. José Eduardo dos Santos convidou-me para criar este pólo, precisamente porque tenho uma tese académica que se baseou num pólo desta natureza e o desafio que o ex-Presidente me fez foi precisamente o de implantar isso no país. Estou a tentar fazer com o apoio da Sociedade de Desenvolvimento do Pólo Agro-industrial de Capanda. Portanto, é um projecto inovador.

O Governo prevê que o sector não-petrolífero cresça 5,1%, com a agricultura a registar uma taxa média anual de 8,9%. Estas previsões são realistas?

É uma meta, uma previsão... Mas, se nos forem dadas as condições que potenciem o apoio decisivo ao investidor privado, podemos contribuir muito significativamente para estas metas.

Há queixas de empresários e investidores sobre governantes que dificultam processos, com exigências de integrar estruturas accionistas de empresas a custo zero. O que pensa sobre isso?

De facto, é um problema muito sério. Este problema tem um melhor ambiente de ser encarado agora com a nova visão do Presidente João Lourenço, que abriu uma nova era de expressão, manifestação de vontades e de abertura do debate com base no contraditório. E, mais do que isso, o Presidente está a fazer um combate à corrupção, à impunidade e ao nepotismo. Esta é uma condição que o novo Presidente transmitiu aos compatriotas e à comunidade internacional, mas não é suficiente. É necessário que o aparelho judiciário esteja preparado para receber e tratar no sentido de corrigir essas situações. Portanto, são erros graves, são crimes e têm de ser combatidos.

Em que pé está o projecto Agrovilas?

Tem uma componente social que fará com que, no futuro, não sejam as 196 aldeias dispersas, mas sim 12 agrovilas com condições necessárias para manter as populações rurais no campo. Poderá educar-se os filhos de camponeses, quer na instrução básica, quer na instrução técnica, para que, ao invés de migrarem para as cidades, frequentem escolas agrárias e se transformem em pequenos e médios produtores agrícolas. A nossa visão é esta. Este projecto vai contribuir para o estancamento do êxodo rural para as cidades. Por muito que se gaste nestes projectos, é muito mais barato do que requalificar cidades que recebem todos os dias gente vinda do campo. Estamos empenhados neste pólo para que o seu sucesso seja replicado noutros pontos do país.

PERFIL

Carlos Fernandes, formado em agronomia, é presidente do conselho de administração da Sociedade de Desenvolvimento do Pólo Agroindustrial de Capanda (em Malanje), desde 2008, altura da sua constituição. O engenheiro já exerceu vários cargos no aparelho executivo do Estado, como o de ministro da Agricultura e dos Transportes, tendo sido do também, nos anos 2000, presidente do conselho de administração da já extinta Agência Nacional para o Investimento Privado (ANIP).

EMPREENDEDORISMO. Fórum Angolano de Jovens Empreendedores realiza, esta semana, em Luanda, uma palestra sobre a importância de poupar. Organização prepara, para Outubro, uma feira de ‘dimensão nacional’.

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O Fórum Angolano de Jovens Empreendedores (FAJE) está a preparar uma exposição de negócios denominada Feira de Negócio e do Auto-emprego de Jovens Empreendedores a ter lugar em Outubro, em Luanda. Prevê-se que o evento, que poderá reunir também grandes empresas nacionais e multinacionais, demore três dias. “A ideia é trazermos parte da solução daquilo que são as dificuldades dos jovens empreendedores”, explica o secretário executivo do FAJE, Hélder Cafala.

Durante a exposição, espera-se que micro e pequenos empreendedores consigam assinar contratos com empresas de grande dimensão, podendo ainda jovens desempregados encontrar emprego. Por outro, serão realizadas conferências, salas de aconselhamento e consultoria de gestão de pequenos negócios. “A Zap, por exemplo, estará lá, na feira, e quem quiser ser revendedor dos cartões de recargas poderá contactar o ‘stand’ da operadora, na feira. O mesmo vai acontecer com a Coca-Cola e outras grandes empresas que se farão presentes no evento. Estamos a trabalhar no sentido de ser uma feira de dimensão nacional”, esclarece Hélder Cafala.

O objectivo principal da criação do FAJE é o de “incutir na juventude empreendedora as boas práticas de gestão, capacitando-a com formação”, reforça o dirigente associativo.

Já nesta quinta-feira, no Cazenga, em Luanda, a associação vai realizar uma palestra dirigida a jovens empreendedores e estudantes interessados em empreendedorismo. A participação é com base em inscrições (grátis), que podem ser feitas presencialmente na sede do FAJE ou via internet.

A importância de cooperativas de crédito estará entre os temas a abordar. “Sentimos que o conceito de cooperativa ainda é desconhecido no seio de muitos jovens empreendedores”, afirma o secretário executivo do FAJE, apontando Brasil, EUA e França como exemplos de países, onde os financiamentos de micro e pequenos empreendedores são geralmente garantidos por cooperativas de crédito. “Também queremos trazer essa realidade para Angola e que surjam várias iniciativas de cooperativas para atender as necessidades dos jovens empreendedores.”

De acordo com Hélder Cafala, jovens empreendedores continuam a enfrentar dificuldades de natureza burocrática na obtenção de documentos para a legalização de negócios, terrenos, meios fixos e móveis. Há ainda províncias, aponta, que não dispõem de Guiché Único de Empresas, obrigando a deslocações de requerentes deste serviço para Luanda.

Se, por um lado, uns têm dificuldades em legalizar negócios, por outro, há quem enfrente complicações ligadas a atrasos de instituições públicas, no pagamento de serviços prestados a organismos do Estado e de tarifas aduaneiras. “Mal nasce o negócio, se houver envolvimento com o Estado, infelizmente, o negócio vai falir. Hoje, o Estado já não é um bom parceiro para os pequenos empreendedores. Em 10 pequenas empresas que fazem contratos de prestação de serviço com o Estado, oito morrem por causa de atrasos dos pagamentos”, aponta Hélder Cafala, que não se esquece de apontar o mau estado das vias, que obstaculiza os empreendedores nas pescas e agricultura.

Palestras de empreendedorismo e poupança já foram realizadas no Kwanza-Sul, Benguela, Huíla, Huambo, encontrando-se em preparação a do Bengo e a do Kwanza-Norte. O FAJE, que conta com oito anos, tem cerca de 1.500 membros em todo o território nacional. O Ministério da Administração Pública, Trabalho e Segurança Social e o Instituto Nacional de Micro, Pequenas e Médias Empresas (INAPEM) estão entre os principais colaboradores da associação.

UNIÃO AFRICANA. Dezasseis anos após a criação da maior organização continental, integração e livre circulação de pessoas e bens ainda estão por concretizar.

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A integração efectiva do continente, nos mais variados domínios, continua a ser o maior desafio da União Africana (UA), 16 anos depois da sua criação. A UA, criada a 9 de Julho de 2002, completa, hoje, mais um ano da sua existência.

Na avaliação de vários observadores, a sua predecessora, a Organização da Unidade Africana (OUA), criada a 25 de Maio de 1963, terá cumprido melhor o seu objectivo que passava, primeiramente, pela libertação e descolonização do continente.

A OUA teve ainda sucesso na luta contra o apartheid, incluindo a nível da Organização das Nações Unidas (ONU), onde foram declaradas sanções contra os governos da África do Sul e da Rodésia, tendo conseguido ainda que aquele regime fosse internacionalmente condenado por crimes contra a Humanidade na Conferência de Teerão de 1968.

Alcançado o principal objectivo (descolonização), a OUA foi extinta para dar lugar à União Africana, vocacionada para o desenvolvimento do chamado continente berço da Humanidade. A maior organização africana até tem políticas ‘visionárias’ que vão até 2063, mas a questão continua a ser a exequibilidade.

A Zona de Livre Comércio Continental, por exemplo, que é um dos principais desafios da UA, embora tenha já sido declarada em Março, na cimeira extraordinária da União Africana, que teve lugar em Kigali (Ruanda), mantém-se em ‘banho-maria’, até porque não conta com o apoio de todos os Estado-membros. Dos 55 Estados-membros, 11 não assinaram o documento, estando a Nigéria e a África do Sul entre os países cépticos e ao mesmo tempo ‘gigantes’ económicos do continente.

Angola faz parte dos 44 países que assinaram e acreditam no comércio intra-africano. Estes Estados entendem que o acordo poderá aumentar o comércio na região na ordem dos 60%, no mercado de 1,2 mil milhões de pessoas. As transacções comerciais deverão rondar mais de três mil milhões de dólares.

Em termos de produtos alimentares, Angola produz apenas 2% do que consome, segundo dados do Ministério do Comércio. Analisando estes dados, Angola não estará em condições competitivas, no que toca a exportações, já que mais 98% dos alimentos que consome são importados.

Entretanto, o presidente do conselho de administração da Sociedade de Desenvolvimento do Pólo Ago-industrial de Capanda (SODEPAC), Carlos Fernandes, entende que, se o Governo der uma “maior atenção não só ao Pólo Agro-industrial de Capanda como em outros projectos agrícolas”, Angola estará, num espaço de 10 anos, à altura dos desafios da Zona Livre de Comércio de África, não apenas como importador, mas como também exportador de produtos agro-alimentares.

Uma outra iniciativa importante é a Nova Parceria para o Desenvolvimento de África (NEPAD), que, apesar de lançada em 2001, ainda não teve a efectivação necessária para melhorar os indicadores de boa governança e promover o desenvolvimento sustentável do continente, que procura gerir as suas relações estratégicas com potências mundiais (Estados Unidos da América, China, União Europeia e Rússia). Enquanto as trocas comerciais intra-continental não acontecem e ‘fugindo do ocidente’, África mantém-se dependente de parceiros como China e a Índia, que vêm investindo recursos significativos na criação de infra-estrutura e no aumento de novas parcerias comerciais. No ano passado, o comércio entre a China e África atingiu os 150 mil milhões de dólares. Um outro desafio, dos mais esperados pelos africanos, é o passaporte continental. Recentemente, o presidente em exercício da UA, Moussa Faki Mahamat, apelou aos chefes de Estado do continente para desburocratizarem o processo que vai facilitar a liberdade de movimento.

O passaporte africano é um tema que já é discutido há vários anos na agenda da UA e, quando entrar em vigor, permitirá aos cidadãos dos 55 países africanos viajar por todo o continente sem necessitarem de visto. O passaporte africano é visto como um passo vital para se dar início à ‘Agenda 2063’, um plano que pretende impulsionar o desenvolvimento económico e social de África, melhorar a integração continental e estimular o comércio intra-africano.

A União Africana tem ainda o problema da fuga dos ‘cérebros africanos’, que, por falta de condições laborais, são captados pelas grandes economias mundiais, sem esquecer de doenças, como o VIH/Sida, malária e doenças tropicais, bem como a resolução de conflitos políticos militares em Estados-membros.