José Zangui

José Zangui

REVELAÇÃO. Antiga gestão de Matos Cardoso arrisca o segundo processo em tribunal, meses depois de a comissão de trabalhadores da empresa ter feito o mesmo.

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A antiga gestão da Feira Internacional de Luanda (FIL), entidade que até 2015 realizava a FILDA, deixou um passivo calculado em 160 milhões de dólares, soube o VALOR de fonte governamental.

O montante decorre de dívidas com expositores que já haviam pago as respectivas participações na abortada edição de 2016, pagamentos de 15 meses de salários dos trabalhadores, entre outros compromissos. A fonte referiu que o Estado, por via do Ministério da Economia, está a gerir a situação para depois chamar à responsabilidade os gestores da FIL, liderada, até aquele ano, por Matos Cardoso.

Para já, a questão dos salários em atraso de centenas dos antigos trabalhadores é das mais preocupantes para as autoridades. Há alguns meses, um grupo deles endereçou cartas à várias instâncias, como o Ministério da Economia, Casa Civil do PR, Assembleia Nacional e MAPTSS, apelando a sua intervenção para a solução do problema, mas sem sucesso de momento.

“O Governo assumiu já muitos dos compromissos e promete, a qualquer altura, dar uma resposta positiva aos funcionários da FIL. Eles não estão abandonados”, assegurou a fonte.

A mesma salienta que o Estado não descarta a possibilidade de processar os antigos gestores da FIL, considerando que estes deixaram um “fardo pesado para o Estado”. Desde Outubro do ano passado que o presidente do conselho da administração aparece de forma intermitente nas instalações da FILDA e os trabalhadores acusam o antigo gestor de evitar dar satisfações sobre a sua situação salarial ou o destino laboral.

Matos Cardoso tem evitado falar da questão desde a falência declarada da FIL. Ocupa-se actualmente da gestão de outros projectos, como é o caso de uma empresa do ramo têxtil, denominada SATEC, no Kwanza-Norte, onde desempenha as funções de presidente do conselho de administração.

INDÚSTRIA SEGURADORA. Regulador defende a necessidade de crédito agrícola para impulsionar a diversificação da economia. Operadoras receiam os altos riscos, mas o Executivo garante que está a trabalhar numa nova lei para “operacionalizar” este produto específico.

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A Agência Angolana de Regulação e Supervisão de Seguros (ARSEG) trabalha actualmente com o Governo para a institucionalização do seguro agrícola no país, disse ao VALOR o seu presidente, Aguinaldo Jaime. Para já, os contactos incluem os Ministérios da Economia, da Agricultura, das Finanças e as seguradoras do país.

Falando no decurso de um ‘workshop’ sobre os “Os desafios do sector do seguro”, que a ARSEG promoveu no passado dia 5 de Agosto, Aguinaldo Jaime referiu que a agricultura é, nesta fase, a “grande prioridade que o país deve ter para a diversificação da economia”.

A criação do seguro agrícola, de importação de mercadorias e de uma agência nacional de resseguros (Ango Re), assim como os programas que estão a ser desenvolvidos pela ARSEG, tornarão o mercado de seguros mais atractivo, segundo o responsável.

A ENSA possui quatro projectos-pilotos no sector agrícola. O PCA da empresa, Manuel Gonçalves, reconhece que se trata de um segmento de muitos riscos, devido, nomeadamente, a factores climáticos, como a seca ou a abundância de chuvas. Por isso, o gestor sugere a comparticipação do Estado neste tipo de seguros, com vista a atrair investimentos estrangeiros na agricultura. “Com a participação do Estado, teríamos não apenas atracção de investimento, mas também uma ajuda dos investidores no pagamento dos prémios”.

Ou seja, defende que o Estado apareça como ressegurador. A maior do país, a estatal ENSA lidera os seguros voltados para o cultivo, nomeadamente quatro projectos-pilotos nas províncias do Huambo e do Bengo, para pequenos agricultores, e no Kwanza-Sul e Malanje, para grandes fazendas.

A intenção é replicar depois a experiência pelo resto do país. Presente no encontro, o ministro das Finanças, Archer Mangueira, anunciou a criação, “nos próximos anos”, de uma nova lei de seguros que deverá “operacionalizar o seguro agrícola”. Sublinhou que o instrumento garantirá, também, um novo dinamismo ao sector, tornará obrigatório o seguro de importação e permitirá reestruturar o seguro das actividades petrolíferas.

O governante referiu que o mercado angolano apresenta “perspectivas saudáveis” para os próximos anos, decorrentes da estabilidade dos principais indicadores macroeconómicos, entrada em funcionamento da bolsa de valores e, em particular, da importância da diversificação da actividade económica. Para Mangueira, os desafios do sector poderão ser vencidos através de uma “aliança estreita” entre os sectores, nomeadamente o Executivo, as seguradoras e os consumidores, e recordou que o acto de viver sempre foi arriscado.

“Há riscos de todos os escalões, aqueles que atingem apenas as pessoas singulares, as famílias e os que atingem as empresas”. Com 26 operadoras licenciadas no país, Aguinaldo Jaime considera que o sector está em crescimento, mas notou que, apesar dos resultados positivos, tem desafios por vencer.

Entre estes, destaca a necessidade de criação de um mercado de seguros eficiente que garanta a solvabilidade de todos os operadores, existência de um mercado idóneo e sustentável com métodos de governança modernos, redução dos riscos de contágios do sistema bancário, criação de produtos que correspondam às necessidades dos clientes e à unificação dos sistemas contabilísticos aos padrões internacionais.

A protecção do consumidor em caso de falência e o aumento da penetração de seguros constituem outros desafios, segundo o antigo ministro das Finanças e governador do BNA. Para já, a ARSEG não prevê licenciar novas operadoras este ano, devido, como considerou, ao período de transição política com a realização das eleições.

Contudo, sublinha que o mercado segurador nacional conhecerá novos desafios e oportunidades com a entrada de novas seguradoras “nos próximos tempos”. O volume de activos do sector de seguro no país está actualmente avaliado em mais de um bilião de dólares, segundo Aguinaldo Jaime.

Também convidado ao workshop, o director da Autoridade de Seguro e Fundos de Pensões de Portugal, José Almaça, declarou que o sector dos seguros no seu país foi o pilar da estabilidade da economia durante a crise financeira internacional, resgatando bancos que se encontravam em dificuldades e ajudando o Estado a financiar-se.

BOLSA DE NEGÓCIOS. Quatro das cinco empresas convidadas pelo Ministério da Economia para a realização da FILDA/2017 mostraram-se indisponíveis. Eventos Arena ‘salvou’ a 33.ª edição, assumindo 100% dos custos.

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A Eventos Arena assumiu todos os “riscos financeiros e sociais” relacionados com a realização da última edição da FILDA, tendo contado apenas com o apoio institucional do Estado, que facilitou a concessão do espaço, vistos e serviços alfandegários, declarou, ao VALOR, a presidente do conselho de administraçao (PCA) do Instituto de Fomento Empresarial (IFE).

Dalva Ringote não avançou que outras empresas foram sondadas para assegurar a realização do evento, mas deu “nota positiva” à 33.ª edição da FILDA, montada em apenas oito dias pela Eventos Arena. “Não há comparação possível com as outras feiras, porque o contexto é diferente, marcado pela redução das ‘gorduras’”, assinalou Ringote, antes de acrescentar que “o importante foi a pré disposição dos empresários de ainda assim participarem”.

A PCA do IFE classificou o evento como “a feira possível” e indicou que, brevemente, os custos da 33.ª edição serão conhecidos, assim que a empresa organizadora os submeter à apreciação ao Ministério da Economia. Referindo-se à Baía de Luanda, onde decorreu o certame, Ringote considerou o espaço “pequeno”, mas justificou que a previsão era de apenas 200 expositores de cinco países, números que, entretanto, foram ultrapassados.

A escolha da Baía de Luanda para acolher a edição deste ano, segundo explicou, decorreu da ideia de se associar ao evento a fotografia do mar, uma vez que a actividade pesqueira representa um dos principais sectores económicos, além do Porto de Luanda, por onde passam as exportações e importações. O clima da Baía também entrou nas contas da decisão.

FILDA FORA DE LUANDA

O IFE já pensa na realização da FILDA fora de Luanda, mas não tem competência para tomar a decisão, estando a depender de orientações do Governo.

Dalva Ringote considera haver condições para se realizar a FILDA em qualquer província e mostra-se confiante que a decisão possa ser tomada pela sautoridades já para a edição do próximo ano, porque a única condicionante é a “disposição política e empresarial”. Às várias reclamações de expositores e potenciais expositores, entre espaços reduzidos e dificuldades na concessão de vistos, Ringote respondeu que a realização da feira obedece a um calendário que é divulgado para que os interessados se inscrevam e cumpram todos os requisitos exigidos. “Muitos não conseguiram vistos porque não cumpriram com os prazos estipulados”, insistiu Ringote, referindo o envolvimento de vários organismos visados no processo, nomeadamente os Ministérios das Relações Exteriores, Comércio, Interior, Economia, além das embaixadas, todos interessados em “facilitar” os expositores. “Muitos dos participantes até entraram para o país com visto de fronteiras, outros ficaram a saber da FILDA muito tarde, sem tempo para cumprir com a documentação necessária.”

PASSIVO DA FIL

A FIL, que até 2015 realizava a FILDA, deixou um passivo ‘pesado’ ao Governo, relacionado sobretudo com os empregados. Mas o Estado “é um ente de bem”, como assinala Ringote, para quem o Governo assumiu muitos dos compromissos e, a qualquer altura, dará uma resposta “positiva” aos funcionários da FIL, “que não estão abandonados”.

COMÉRCIO. Entre as falhas, chefe da ACOM destaca o facto de a interligação do circuito comercial ser “incipiente”, além de a rede comercial de proximidade estar “pouco desenvolvida”.

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Há cerca de um ano a trabalhar na reestruturação do comércio angolano, com o foco na assistência técnica e na formação, a equipa da ACOM, composta por três estrangeiros e um angolano, constatou “graves erros” no funcionamento do circuito comercial angolano.

Entre as falhas, Diana Biet, a chefe da equipa, aponta que a rede comercial de proximidade “está pouco desenvolvida”, a interligação do circuito comercial “é incipiente” e que muitos projectos desenvolvidos pelo Governo falharam, “muito por falta de estudos de viabilidade profundos e não comparados com os países da região”.

À margem do encontro Angola/ Portugal, promovido pela Câmara de Comércio Portugal/Angola e a Comunidade de Empresas Exportadoras e Internacionalizadas de Angola (CEEIA), a chefe da equipa da ACOM afirmou que Angola assinou um conjunto de acordos bilaterais e multilaterais de desenvolvimento da política comercial, num total de 43, entretanto, peca na sua fraca implementação.

Diana Biet avançou, contudo, que a ACOM vai trabalhar na reestruturação das infra-estruturas comerciais, porque entende que Angola já teve muitos projectos que falharam. O trabalho inclui a elaboração de um estudo de cadeias de valor regional, para analisar Angola e outros países.Biet anunciou também a realização, em breve, de um estudo técnico e financeiro para analisar a viabilidade das lojas de campo que o Governo pretende implementar. Estas lojas, de acordo com Biet, ajudariam na produção, com a venda de insumos, e no escoamento. A ideia é que sejam criadas na base de parcerias público-privadas.

PORTUGAL CHAMADO A FAZER MAIS

Portugal ocupa a sétima posição, quer nas importações, quer nas exportações para Angola, representado apenas 4% do total. Já a China lidera largamente as importações angolanas, reclamando cerca de 45% do mercado, um desnível que preocupa Nádia Cruz, a representante da CEEIA no encontro Angola/Portugal, na última semana, em Luanda. A gestora reconhece que Portugal não tem estrutura financeira igual à da China, mas, “sendo o país que começou todo o investimento em Angola, poderia fazer mais, o que seria uma mais-valia para os dois países”.

Nádia Cruz defendeu a necessidade de se mudar a política de negociação entre empresários nacionais e portugueses, sugerindo um novo figurino que deve passar por parcerias de investimentos em Angola para as exportações e “não saírem contentores de Portugal cheios para Angola e o inverso vazio”.

O presidente da Câmara de Comércio Portugal/Angola, João Luís Traça, concorda com a tese de Nádia Cruz. Entente que Portugal pode ser a “janela de oportunidade” de que Angola precisa para exportar os seus produtos para outros países europeus.

Traça sublinha que os produtos angolanos são “bem recebidos em Portugal” e que as empresas portuguesas são “importantes” para a diversificação e para o reforço da capacidade produtiva de Angola.

Para Traça, Angola encontra-se numa região estratégica do continente africano que facilita as exportações dos seus produtos para Portugal e vice-versa. Dados da CEEIA indicam que a madeira, o peixe e as rochas ornamentais representam 60% das exportações não-petrolíferas e não-diamantíferas. Há outras exportações tímidas, como bebidas e banana.

Portugal, entretanto, continua a ser um dos principais fornecedores de mercadorias de Angola. Não obstante a crise que dificulta o acesso às divisas, em Janeiro de 2017, Angola importou mercadorias avaliadas em 449, 2 milhões de euros, contra 302,9 milhões de euros nos últimos dois meses de 2016.

A lista de produtos é encabeçada pelos materiais agrícolas, alimentos, madeira e cortiça, de acordo com o Instituto Nacional de Estatística (INE). O encontro Angola/ Portugal teve como objectivo olhar para as potencialidades que Angola pode explorar para exportar.

COMÉRCIO. Lei das actividades comerciais vai sofrer alterações, ainda este ano, ou no princípio do próximo. Pretende-se com a medida flexibilizar alguns processos, mas também dar igualdade de tratamento aos estrangeiros na obtenção de alvarás.

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Uma das novidades que a futura lei das actividades comerciais poderá trazer é a igualdade de tratamento na obtenção de alvarás, entre nacionais e estrangeiros, segundo revelou, ao VALOR, o consultor do gabinete jurídico do ministro do Comércio, Guilhermino Paulo.

No diploma em vigor, o estrangeiro só pode ter o alvará comercial se tiver estabelecimento construído ou arrendado acima dos 300 metros quadrados, o que lhe limita o exercício da actividade.

Segundo Guilhermino Paulo, os estrangeiros estão a pedir os mesmos direitos que os nacionais, desde que tenham o cartão de residente, pedido “atendível” na futura lei a ser aprovada ainda este ano, ou no princípio do próximo, considerando que “são os estrangeiros que dominam o circuito comercial, por um lado e, por outro, para evitar o trespasse dos alvarás como hoje é prática. Guilhermino Paulo pensa que a lei em vigor, de 2007, ainda é actual, mas, segundo defende, há preceitos que estão desajustados face à realidade, “pois cada dia que passa há desenvolvimento”. O trespasse de alvarás de nacionais para estrangeiros, por exemplo, segundo o consultor do ministro do Comércio, é promovido por cidadãos nacionais. “Há pessoas hoje que partem os seus quintais, fazem lojas e arrendam ao estrangeiro, a quem passam também o alvará em troca de alguma quantia monetária”, denunciou Paulo, que, sem avançar números, estimou como “grande” a quantidade de trespasses, apesar de os comerciantes terem conhecimento de que o alvará é intransmissível. “É por essa razão que os estrangeiros querem que sejam eles próprios a obterem directamente o documento”, insiste o consultor.

Quadro do Ministério do Comércio há 40 anos, Guilhermino Paulo alerta que, juridicamente, quem faz o trespasse incorre em situações graves, exemplificando que, caso o estrangeiro a quem se passou o alvará incorra num ilícito económico “gravoso”, quem responde pelo alvará e pelo estabelecimento é o cidadão angolano. Paulo destacou também as mudanças operadas no sector que, segundo observa, estão a resultar na celeridade dos processos. A reforma e reorganização do comércio foram os primeiros desafios deste ano que culminaram com a aprovação, em Fevereiro, do novo estatuto orgânico.

O novo estatuto permitiu reduzir o número de direcções nacionais que compunham o Ministério. Das anteriores cinco, passou-se para as actuais duas, nomeadamente a do Comércio Interno e a do Comércio Externo. No passado, segundo o responsável, eram necessários oito documentos para a obtenção do alvará, mas, actualmente, são necessários apenas três: a certidão comercial, o DAR (Documento de Arrecadação de Receitas) e o Bilhete de Identidade do solicitante. Já o preço a pagar pelos alvarás difere em função das categorias.

Para as grandes superfícies, acima dos dois metros quadrados, são 350 mil kwanzas, no caso do comércio, e 250 mil para a prestação de serviço. Para as superfícies médias, cobra-se 35 mil kwanzas para o comércio e 30 mil para a prestação de serviço. Na última categoria, para as pequenas superfícies, os requerentes pagam 15 mil kwanzas para o comércio e 10 mil para a prestação de serviço.

MERCADO COM ALVARÁS CADUCADOS

Guilhermino Paulo admitiu haver ainda alguns casos de coabitação do alvará caducado com o novo modelo. “Há comerciantes que não tiveram conhecimento do processo de renovação”, justifica, antes de esclarecer que o prazo de renovação terminou no ano passado. “Todos os que não renovaram estão expirados”, avisa.

Entretanto, o consultor do ministro esclareceu que os que operam com alvarás caducados continuarão a exercer a actividade. “Não vamos por isso encerrar os estabelecimentos, mas estamos a chamá-los e a dar um prazo limite, caso não o façam, temos as multas.” O quadro sénior do MINCO admitiu também que o circuito comercial em Angola não obedece à lei. De acordo com o diploma que regula a actividade comercial, tudo deveria funcionar em cadeia: o produtor, o grossista e o consumidor final. “Acontece, porém, que alguns comerciantes desonestos violam as regras.” Guilhermino Paulo aponta os casos de grossistas que também fazem venda a retalho. Para ele, essa realidade fura de certa forma o circuito estabelecido na lei.

O fenómeno é conhecido, mas justifica que o corpo inspectivo é diminuto, pelo que não consegue satisfazer as necessidades. “Mas aqueles casos em que são detectados os comerciantes têm sentido a força da lei”, declara.