O MPLA e as “Agendas Escondidas”
Mais uma semana de Outubro se encerra, a última por sinal, e em Angola, a sensação é que estamos sempre a preparar um grande evento. Seja uma cimeira internacional, a inauguração de uma mina histórica, ou a apresentação de um plano de vários anos para a próxima geração de líderes resolver. Mas já lá vamos… Prioridade para mais um encontro dos camaradas…
A primeira nota de realce é que, ao que tudo indica, passados oito anos, o arquitecto da paz deixou de ser persona non grata no seio do partido. O próprio presidente já o menciona naturalmente e os seus súbditos aplaudem efusivamente… José Eduardo dos Santos foi lembrado, na nona sessão ordinária do Comité Central do MPLA, como aquele que abriu as portas à reconciliação nacional. No entanto, segundo João Lourenço, passados 23 anos alguns angolanos insistem em manter um “comportamento de permanente vitimização e autoexclusão do direito inalienável ao exercício e benefício da sua cidadania”. O líder dos camaradas fez um alerta de meter medo aos mais distraídos: há uma "agenda política escondida e de mau agouro" a tentar subverter a sacrossanta Reconciliação Nacional. Para os que não entenderam, eu traduzo: Reclamar de uma cidadania que não funciona a 100% não é um grito por justiça, é na verdade, uma "agenda política escondida"! É uma conspiração disfarçada de barriga vazia ou de falta de emprego. Portanto caro “vitimizado”, se você se sente excluído, a culpa é tão somente sua, por não enaltecer os grandes feitos do maioritário nestes 50 anos e apegar-se à simples falta de hospitais, escolas, estradas, saneamento básico, emprego, entre outros… Vitimização em Angola é agora o eufemismo oficial para ter a ousadia de criticar. E, qual o melhor exemplo prático para ilustrar a luta contra essa "agenda de mau agouro"? Claro! A expulsão do, agora ex-membro do MPLA, Valdir Cónego. O valente Cónego, que um dia teve a audácia de sugerir a existência de problemas sociais e que, pior ainda, usou os estatutos do partido para tentar candidatar-se à Presidência e tentar suspender o líder... bem, ele descobriu na prática o que significa a "tolerância zero" do MPLA à alternância.
Mudemos de assunto… O grande acontecimento da semana foi a inauguração da Mina de Cobre, no Uige, a primeira subterrânea em mais de 50 anos. O Ministro Diamantino Azevedo chamou-lhe um "acto de visão estratégica". E como não chamar? Numa época em que o petróleo tosse e engasga, finalmente voltamos à terra para desenterrar a nossa próxima salvação. Parabéns, Angola! Depois de 50 anos, finalmente descobrimos que a nossa riqueza está lá, subterrada, e só a alcançamos depois de um esforço hercúleo, enquanto na superfície o povo vive de promessas de infraestruturas que só se materializarão lá para 2050. O verdadeiro campeão de audiências é o Corredor do Lobito. Angola está, desesperadamente, a tentar captar uns simpáticos 4,5 mil milhões de dólares para ligar o caminho de ferro à Zâmbia. O Ministro dos Transportes avisa que precisamos investir 2,5% do PIB em infraestruturas nos próximos 25 anos. O plano de investimento 2,5% do PIB por 25 anos é, na verdade, um excelente plano para a reforma do Ministro. Ele apresenta a solução agora, garante que não estará cá para a supervisão e, quando o povo reclamar láaa em 2050, quem lá estiver que se vire. Vamos agora a Cabinda, onde funcionárias do Ministério da Justiça foram detidas por facilitar a obtenção de documentos falsos a estrangeiros. Chega a ser reconfortante ver que a corrupção é inclusiva. Afinal, por que dificultar a vida de quem quer ser angolano, quando as nossas ‘malambas’ deviam ser suficientes para afastar qualquer um, não é mesmo? Como se não bastasse os Oficiais de Justiça iniciaram uma nova greve para exigir melhores salários e condições. Quanta audácia? A resposta do Governo? A clássica: ameaças de descontos salariais e perda de subsídios. Segundo a lógica do Ministério da justiça e dos direitos humanos ou os oficiais trabalham por pouco, ou não trabalham e ficam sem o pouco que tinham. Enquanto isso o BNA promoveu a Semana da Poupança, sob o lema inspirador: "Pequenas Poupanças, Grandes Conquistas". Não sei se é para rir ou para chorar… O timing não poderia ter sido mais preciso. Enquanto o BNA, na sua infinita sabedoria, nos exorta a guardar "cada moeda economizada" para um "futuro mais seguro", o Governo, confirma no OGE para 2026 o seu próprio plano de estímulo à poupança: um aumento salarial de 10% para a Função Pública. De acordo com um inquérito do próprio BNA mais de 70% da população angolana não faz poupança. E não faz porquê? Falta de rendimentos suficientes, ou seja, a grande maioria não poupa porque, simplesmente, não tem de onde tirar. Agora, misturemos este empurrão edificante do BNA com a realidade da função pública. O Executivo, no seu exercício de caridade orçamental, prevê um aumento de apenas 10% nos salários da Função Pública. Resumindo, o Governo destrói qualquer possibilidade de sucesso nas "pequenas poupanças" que o BNA tão arduamente tenta promover. Numa semana em que a Justiça vai à greve por salários e funcionários são detidos por falsificação... O Governo espera que os 10% sirvam para comprar o silêncio dos grevistas, ou para pagar a próxima fiança dos empreendedores do Ministério?
*Crónica do programa ‘Dias Andados’, referente ao dia 31 de Outubro de 2025





E o Óscar de melhor ilusão turística vai para... Angola!