César Silveira

César Silveira

Editor Executivo do Valor Económico

CONTROLO DOS FLUXOS FINANCEIROS. Indicação do ministro do Interior para dar posse ao director-geral adjunto da entidade responsável pela prevenção do crime de branqueamento de capitais pode não ser um acto inocente. Unidade de Informação Financeira poderá mudar de carácter.

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A Unidade de Informação Financeira (UIF) pode estar a sofrer uma transformação, deixando de ser uma unidade de carácter puramente administrativa e passar a uma entidade policial e/ou mista.

Esta é, pelo menos, a leitura que se pode fazer por ter sido o ministro do Interior, Ângelo da Veiga, a empossar o director-geral adjunto, Sebastião Manuel Adão, e ainda por este ser um quadro do ministério.

Apesar de considerar uma questão “pertinente”, a directora-geral da UIF, Francisca de Brito, garante, no entanto, que a instituição “continua a ser administrativa”. O VALOR também tentou, por email, um esclarecimento do ministro Ângelo Veiga, mas não obteve resposta.

A leitura do VALOR encontra ainda suporte em acontecimentos anteriores à nomeação e tomada de posse do director-geral adjunto. Por exemplo, na alteração ao artigo sobre a nomeação do director-geral da UIF no estatuto aprovado em Janeiro, revogando o de 2013. Até então, o director era nomeado pelo Presidente da República “sob proposta do ministro das Finanças, ouvido o Conselho Nacional de Estabilidade Financeira”, condição que desaparece na lei em vigor, que define apenas que o Presidente da República elege “entre pessoas com notória idoneidade e comprovada experiência técnica para a função”.

Ou seja, está omisso o órgão de consulta do Presidente para a nomeação da direcção dos responsáveis da UIF, mas a indigitação feita pelo ministro do Interior, Ângelo Veiga, é indiciadora de que a instituição deixou de ser totalmente administrativa.

Segundo os conceitos, as unidades de informação financeira podem ser divididas em três tipos principais: as do tipo administrativo, policial e uma terceira que resulta da mistura entre as duas primeiras.

As diferenças têm que ver basicamente com a integração. Normalmente, as unidades estão assimiladas numa instituição. Quando são de polícia, integram órgãos policiais (como é o caso de Portugal) e ou até procuradorias-gerais (como acontece em Cabo Verde).

As administrativas são, normalmente, parte de um banco central, ministério das finanças e ou dos serviços de impostos. Por outro lado, as de cariz administrativo, normalmente, têm um gestor com escola não-policial e mais proximidade com as instituições financeiras.

Menos independente?

A posse do director-geral adjunto da UIF pelo ministro do Interior motiva discussões sobre a possibilidade de o organismo perder o carácter independente e autónomo exigido pelas instituições internacionais. Um debate que tem, como base, o histórico da criação e, sequencialmente, da conformidade às exigências internacionais. Segundo se sabe, as autoridades internacionais rejeitaram a primeira versão da natureza da instituição que definia uma UIF totalmente integrada no Banco Nacional de Angola. A rejeição das instituições internacionais levou a que se definisse como “uma pessoa colectiva pública dotada de autonomia administrativa, financeira e patrimonial, exercendo as suas competências com independência operacional e autonomia técnica e funcional”.

No entanto, na prática, nunca foi bem assim. A gestão financeira, por exemplo, foi sempre da responsabilidade do BNA. Este ano, será o último com o referido figurino, fazendo fé na lei que determina que, a partir de 2019, a UIF passe a fazer a gestão dos recursos disponibilizados, sendo que, este ano, o BNA continua transitoriamente a garantir essa gestão.

A manutenção do carácter independente da UIF é, de resto, um dos desafios, visto que o contrário pode representar o regresso de Angola à lista ‘cinzenta’ de onde saiu em Fevereiro de 2016 como resultado de seis anos de trabalho, num percurso que conheceu avanços, estagnação e retrocessos. Mais recentemente, o país conseguiu outro ganho ao sair do processo de monotorização e avaliação do período do ESAAMLG, representante regional do Grupo de Acção Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e Combate ao Terrorismo (GAFI). Aguarda pela avaliação, em 2021, do GAFI, que estará essencialmente focada na aplicação nos vários normativos e que permitiram a saída da lista ‘cinzenta’. Um resultado negativo representará um retrocesso.

Passado a preservar e um futuro a conquistar

Em Fevereiro de 2010, o GAFI incluiu Angola na ‘lista negra’ devido às fragilidades de então para o combate aos crimes de branqueamento de capitais, uma realidade condenada pela instituição para países cujo activo da banca supera os cinco mil milhões de dólares. “Angola não se comprometeu com as normas internacionais nem respondeu ao pedido do GAFI para o envolvimento nestas questões”, sublinhou o organismo, acrescentando que a falta de um regime global de combate ao branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo de Angola constituía “um risco para o sistema financeiro internacional” e que, por isso, “Angola deve trabalhar com o GAFI para desenvolver um regime viável em linha com os padrões internacionais”.

O Estado comprometeu-se a elaborar um plano de acção com vista a superar as debilidades. Como resultado, o país passaria da ‘negra’ para a lista ‘cinzenta’ com o compromisso de cumprir com o plano de acção elaborado pela GAFI. “Angola assumiu o compromisso político de alto nível para trabalhar com o GAFI para tratar as deficiências estratégicas e tem demonstrado alguns progressos na melhoria do regime contra o branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo”, sublinhou, em Junho de 2010, num comunicado que também apontava deficiências. Entre estas, fazia referência à necessidade de uma “adequada criminalização da lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo”, bem como o funcionamento eficaz da UIF (que veio a ser criada em 2011). Exigia ainda “estabelecer e implementar um quadro jurídico adequado para identificar, localizar e congelar os bens dos terroristas”, assim como a “ratificação da Convenção das Nações Unidas para a Supressão do Financiamento do Terrorismo e da Convenção das Nações Unidas sobre o Crime Organizado Transnacional”.

Em Fevereiro de 2011, no entanto, regista-se uma estagnação. Angola é apresentada, numa das três reuniões anuais, como um dos países que pouco tinha evoluído, “apesar do alto nível de comprometimento político para trabalhar”. O GAFI “ainda não está convencido de que Angola fez progressos suficientes na execução do seu plano de acção e certas deficiências estratégicas permanecem”, lê-se no relatório da primeira das três reuniões de 2011. Na última das três reuniões deste ano, no entanto, o país voltou a dar sinais de comprometimento, como se pode testemunhar no relatório elaborado na primeira reunião de Fevereiro de 2012.

Em 2013, é reformulado o plano de acção inicial. “Angola foi sujeita a uma avaliação mútua. Destacou deficiências estratégicas adicionais e estas foram incluídas no plano de acção revisto, ao qual foi fornecido um compromisso político renovado”, lê-se no relatório do encontro de Fevereiro. Entre as propostas, destaca-se a necessidade de assegurar que “as leis e procedimentos locais asseguram assistências jurídicas mútuas” com os demais membros. Em suma, era necessária a criação de uma lei que permitisse a extradição por crimes de branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo. A mesma deveria estar feita até Fevereiro de 2014, o que não aconteceu. Foi a última a ser aprovada e, sequencialmente, permitiu a saída de Angola da lista ‘cinzenta’.

PETRÓLEO. Tendência da produção interna é de redução e é contrária aos sinais de crescimento acelerado do preço do petróleo que, na semana passada, atingiu um recorde dos últimos três anos.

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Cerca de sete mil milhões de dólares seria o valor que o país deixaria de ganhar devido à quebra na produção, caso o barril de petróleo continue a subir e o preço médio, em 2018, termine em 75 dólares, como perspectivam especialistas internacionais.

Os cálculos são do VALOR (considerando uma taxa de rentabilidade interna que atribui à concessionária 60% do petróleo lucro) e fixam em cerca de 41 mil milhões de dólares as receitas brutas em caso de a produção manter-se nos níveis actuais (cerca de 1,5 milhões de barris por dia).

Esse valor passaria para cerca de 46 milhões se a produção interna permanecesse em 1,673 milhões de barris/dia, que é a produção imposta pelos acordos entre os países produtores de petróleo para pressionar a subida do preço e que entrou em vigor em Janeiro de 2017.

No entanto, considerando a possibilidade de se terminar o acordo na sequência das sanções contra o Irão, Angola poderia voltar a produzir a quantidade anterior ao acordo, 1,751 milhões. Assim, as receitas brutas passariam para 48 mil milhões de dólares. Ou seja, registar-se-iam perdas de cerca sete mil milhões de dólares, cerca de 19% face ao máximo possível estimado.

Areceita do Estado, no cenário actual, seria de 15,7 mil milhões de dólares face aos potenciais 18,4 mil milhões, o que representaria uma perda de cerca de 14,6%.

Com o referido quadro, Angola estaria fora do grupo dos produtores petrolíferos que melhor aproveitariam a subida do preço de petróleo que seria proporcionada pelo eventual retorno das sanções contra o Irão, que produz cerca de 3,8 milhões de barris/dia.

A decisão deve ser conhecida a 12 de Maio. Enquanto isso, especialistas sugerem que a Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos e o petróleo norte-americano estarão em condições de compensar a saída do Irão. Angola dificilmente conseguiria manter-se no grupo dos que, pelo menos, vão garantir a mesma quantidade que têm estado a fornecer.

Pela tendência decrescente da produção, o país será apanhado em contramão pela maior procura do petróleo e, consequentemente, estará entre os que não vão aproveitar convenientemente o momento.

Apesar de concordar com a leitura, José Oliveira considera “exagerado” considerar que Angola “estaria fora dos maiores beneficiados”. Fixa em cerca de 10% a perda de Angola face ao potencial de ganhos com a subida do preço. “Qualquer aumento de preços beneficia Angola e todos os exportadores. Perdemos cerca de 10% do máximo que poderíamos beneficiar se estivéssemos a produzir ao nível da nossa quota actual, que é de cerca de 1.670.000 b/d. Estamos pouco acima dos 1.500.000 b/d”, explica o especialista em questões energéticas para depois lembrar que “o facto de Angola estar a produzir abaixo da sua quota há mais de um ano, tem contribuído para o regresso ao equilíbrio do mercado que só será atingido lá para o final deste ano”.

Por sua vez, o secretário de Estado dos Petróleos, Paulino Jerónimo, admite possíveis perdas a curto prazo. “Depende do que vocês estão a ver como horizonte temporal, porque novos projectos entrarão em produção. Por exemplo, este ano já entrou em produção o Ochingufo do bloco 15/06 e, em Agosto, entrará em produção o Kaombo do bloco 32 e, a partir do próximo ano, entrarão outros projectos como o Zínia fase 2, Clov fase 2 e Dalia fase 3 e outros.”

O governante concorda que os frutos destes novos projectos “não terão impacto” entre 2017 e 2020. “Não exactamente, mas próximo. Houve alguns atrasos na aprovação de algumas medidas bem como de alguns projectos. Por exemplo, em campos marginais, temos cerca de quatro mil milhões de reservas, serão muitos projectos a terem início. O futuro é promissor.”

Petróleo, preço máximo

A tendência do preço do petróleo é de crescimento a nível acelerado e existe um, consenso que não é tanto pelo equilíbrio do mercado petrolífero proporcionado pela decisão da OPEP de reduzir a oferta. É, sobretudo, pela questão geopolítica. Na passada semana, o preço atingiu o máximo histórico dos últimos três anos: 74 dólares.

DIAMANTES. Nos primeiros três meses de 2018, foi encontrado o mesmo número de unidades raras que o primeiro semestre de 2017. Empresa continua os trabalhos para descobrir a origem destas preciosidades.

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A Sociedade Mineira do Lulo manteve, no primeiro trimestre de 2018, a tendência crescente de descoberta de diamantes especiais ao encontrar 58 pedras, o que representa um crescimento de 53% face ao mesmo período de 2017, quando foram encontradas 38.

Segundo o relatório da Lucapa Diamond Company, operadora e detentora de 40% da sociedade, entre as pedras especiais encontradas estão “dois diamantes de mais de 100 quilates (116 quilates e 103 quilates), elevando para 10 o total de diamantes desta categoria recuperados na mina desde o início da produção.

“O diamante mais valioso recuperado durante o trimestre foi uma jóia de D-cor Tipo IIa de 85 quilates, enquanto um diamante amarelo de 43 quilates foi o de maior qualidade de gema colorido recuperado até hoje”, anunciam no relatório trimestral.

A quantidade de diamantes especiais encontrados nos primeiros três meses é igual aos recuperados nos primeiros seis meses de 2017, o que permite aos parceiros acreditar que 2018 será melhor que o ano passado em termos de descobertas de diamantes especiais.

Os sinais de se estar perante uma mina valiosa começaram a ser dados ainda na fase de prospecção. No primeiro semestre de 2014, por exemplo, 50% dos diamantes descobertos tinham sido classificados como de “qualidade rara”. “Dos 12 diamantes do kimberlito recuperados até à data, seis foram confirmados como pedras de Tipo 2A. Os diamantes tipo 2A estão entre os mais raros do mundo, representando menos de 1% da produção do diamante global”, lê-se no relatório apresentado, na altura, pela Lucapa Diamond Company.

A empresa informava ainda que os geólogos internos acreditavam que estavam em presença de “uma fonte provável de diamantes aluviais de tipo 2A grandes e valiosos de até 131,4 quilates”.

Seguiram-se outras descobertas preciosas como o diamante mais valioso do país, em Fevereiro de 2016, uma pedra de 404 quilates e ainda a pedra de 227 quilates descoberta no primeiro semestre de 2017, enquanto em Setembro de 2016 foi encontrada um diamante de 172,67 quilates.

No relatório dos primeiros três meses do ano, a operadora australiana informa que a SML está a fazer um trabalho de prospecção em diversos kimberlitos com o objectivo de encontrar a origem dos diamantes raros que têm sido encontrados na produção aluvial. “Este programa de perfuração tem como objectivo identificar as fontes primárias da excepcional qualidade e tamanho dos diamantes recuperados pela SML na Lulo na produção aluvial.” Os alvos são os kimberlitos definidos após o levantamento electromagnético realizado pela sociedade no último semestre de 2017.

Aumento de vendas e produção

Por outro lado, a empresa informa que as vendas do primeiro trimestre da Sociedade Mineira do Lulo registaram, em termos de valor, um crescimento de 1% comparativamente ao período homólogo, passando de 10,7 para 10,8 milhões de dólares.

Segundo o relatório da Lucapa Diamond Company, operadora e detentora de 40% da sociedade, com as referidas vendas, terminaram o período em análise com um ‘stock’ financeiro de 13,1 milhões de dólares.

Dá conta, por outro lado, que, em termos de peso, registaram um aumento de 39% para 6,242 quilates, comparativamente aos 4,498 do mesmo período de 2017. O preço médio por quilate, entretanto, registou uma redução de 27%, passando de 2,370 para 1,731 dólares.

O ‘stock’ de diamantes também aumentou, passando para 3,047 quilates, um crescimento de 20%, face aos 2,545 dos primeiros três meses de 2017.

O projecto Lulo cobre uma área de 3.000 km2 e está localizado na bacia do rio Cuango na Lunda-Norte. Está localizado a 150 km do projecto diamantífero de Catoca e conta no seu interior com um importante campo de kimberlito identificado dentro da concessão e aluviais extensivos de diamantes. Depois de cerca de quatro anos de exploração e amostragem, a Lucapa Diamond Company iniciou, em finais de 2012, uma exploração mais crítica. Desde esta altura, foram sendo encontrados diamantes raros.

A Endiama tem 32% da Sociedade Mineira do Lulo e a Rosas e Pétalas 8%.

Governador faz o balanço dos primeiros seis meses de mandato, lembrando que foi num surto de cólera e malária que se concentraram as primeiras iniciativas. Além dos desafios para aumentar os níveis de arrecadação de receitas, lamenta o endividamento da província. Defende que os bancos deveriam facilitar financiamentos, mas reconhece que o crédito malparado é uma ‘dor de cabeça’.

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Que balanço faz dos primeiros seis meses como governador do Uíge?

Encontrámos a província com algumas realizações e procurámos dar continuidade às que estavam em curso. Entre Outubro e Abril, pensámos num programa intercalar que incidiria sobre as condições de saúde. Quando chegámos, cerca de dois meses depois, surgiu um surto de cólera e de malária e era preciso dar uma atenção especial. Tomámos medidas com o Ministério da Saúde para reverter a situação. Os casos eram significativos, mas há uma grande evolução. No caso da cólera, iniciámos com ocorrências à volta de 32 doentes por dia e, agora, a média varia entre os zero e os três. A nível da malária, embora se mantenha, também porque estamos numa zona endémica, os casos vão diminuindo. O importante é que o nível de letalidade continue a baixar, estamos com níveis que não constituem preocupação, pelo menos, em termos de gestão do sistema sanitário.

Quais foram os passos dados para alcançar estes números?

Procurámos orientar as diferentes estruturas que intervêm na saúde. Era preciso assegurar o mínimo possível em assistência médica e medicamentosa. Orientámos os municípios no sentido de melhorar os mecanismos de aquisição dos medicamentos. Na Direcção Provincial da Saúde, melhorar a gestão da central de armazenamento e distribuição de medicamentos e melhorámos também a nossa relação com a central de aquisição e distribuição de medicamentos do Ministério da Saúde com a qual temos informações permanentes. Procurámos também incentivar o pessoal da saúde a ter uma relação humana com os doentes.

Nestes seis meses, o que foi feito ou o que está em carteira para melhorar as infra-estruturas rodoviárias?

A província tem uma rede rodoviária significativa, mas a maior parte sem asfalto. Felizmente, o Ministério da Construção tem algumas acções em curso, embora estejam a ser executadas a um ritmo lento por causa das implicações financeiras. Temos a via que deve ir para Ambuila que, em princípio, deverá continuar, de acordo com a disponibilidade financeira, até Kipedro. Temos a linha que vai para Kimbele, que está asfaltada, mas tem problemas de ravinas. Intercedemos junto do Ministério da Construção para que haja alguma intervenção nestas vias primárias. O ministro anuiu à nossa preocupação e algumas intervenções estão a ser feitas. As ravinas na via Uíge/Kimbele estão a ser intervencionadas progressivamente, outras estão identificadas e, a qualquer momento, através do fundo rodoviário, far-se-á a intervenção. Temos a preocupação de melhorar as vias de circulação, que vão servir de base para impulsionar a vida económica.

O aeroporto também ajudaria. No entanto, foi inaugurado, mas a província continua sem voos comerciais...

A grande questão que se coloca, de acordo com a nossa preocupação de acompanhamento deste grande equipamento, é que não há uma companhia que possa operar com uma certa rentabilidade. O aeroporto foi inaugurado, há uma companhia que esteve a operar, mas não tinha um nível de clientela suficiente para assegurar a viabilidade económica do projecto. Há uma companhia que opera uma vez por semana, entre o Uíge e Cabinda. Intercedemos junto do ministro dos Transportes e acredito que esteja a procurar soluções. Aguardamos que possa encontrar uma alternativa que concilie o interesse da população, dos operadores e dos que gostariam de investir e de não se sujeitarem a uma viagem de carro que leva, no mínimo, cinco horas. É importante ter a possibilidade de poder chegar a Luanda depois de 40 minutos de viagem. Podermos trabalhar em Luanda e voltar no mesmo dia. Mas a realidade é esta. Poderá ser ultrapassada, no futuro, se melhorarmos um outro sector que é importante, o turismo, com a expansão hoteleira que está em curso.

Além dos hotéis, há projectos concretos que visam a dinamização do turismo?

Há instrução nesta direcção. O Instituto de Geologia e Cartografia está a concluir um roteiro turístico da cidade e da província para, primeiro, vendermos a imagem da província, mostrar quais são as ocorrências turísticas. O Uíge tem a 7.ª maravilha, as Grutas do Nzenzo. Também há muitas quedas, tem a Lagoa do Feitiço, os marcos da batalha da Mbuila, uma zona histórica onde decorreu a guerra entre os autóctones e o poder colonial português. Há muita coisa para mostrar. Só a simples paisagem do Uíge é atraente. Há uma possibilidade de se explorar este sector. Do início do ano até agora, passaram pela província mais de dois mil turistas, já é alguma expressão, mas queremos que seja mais.

Outro sector com potencial reconhecido é o agrícola. Qual é a situação actual?

A província é grande produtora de mandioca e há uma virose que afecta este produto. Orientámos no sentido de se desenvolver um programa de prevenção para que esta virose não venha a afectar a produção. A Direcção Provincial da Agricultura tomou disposições, está a desenvolver este programa, alguns recursos já foram disponibilizados.

E qual é a realidade da produção do café, que é visto como o símbolo económico da província?

Está a ser reactivada, há alguns interventores, sobretudo na zona de Quitexe. Estão a procurar alargar a capacidade de produção. Nós, enquanto governo, tomamos medidas no sentido de se criar um acervo de mudas que possam ser postas à disposição dos promotores para expandir a rede. O Instituto Nacional do Café tem um centro onde se faz a plantação de mudas e que são postas à disposição. Há promotores de Malanje que vêm buscar as mudas no Uíge. É também um segmento importante que estamos a privilegiar. Queremos que a superfície de produção seja aumentada para poder responder às necessidades de desenvolvimento da província. Estamos a trabalhar também no sentido de melhorar a saúde dos animais. A nossa preocupação é que o Uíge, segundo as informações, tem cerca de 15 mil cabeças de gado. É muito pouco para uma província como a nossa. O objectivo é aumentar consideravelmente. O Estado vai assumir a responsabilidade de fazer a cobertura de vacinas.

Como em quase todo país, o que predomina aqui é a agricultura familiar. O que se está a fazer para a captação de investidores?

É verdade, os uigenses são grandes agricultores ao nível da agricultura familiar, mas a esta produção é preciso associar a mecanizada de grandes extensões e com promotores especializados. Estamos a trabalhar no sentido de atrair investidores que tragam também mais-valias na transformação. Orientámos as estruturas competentes para criar um ambiente favorável e melhorar os procedimentos administrativos para a aquisição de terras. Em cada município, existem 30 mil hectares de terras aráveis que podem ser utilizadas para a promoção da agricultura. As administrações municipais foram orientadas no sentido de facilitar, claro que reunindo as condições que são requeridas para que tenham acesso a estas terras. Temos alguns promotores que estão a envidar esforços para produzir na fruticultura e na madeira. Estamos a aconselhar para que esta madeira possa ser transformada localmente.

Há projectos concretos para a exploração do potencial mineiro?

Temos alguns processos de pedidos de licenciamento para a produção diamantífera junto do Ministério dos Recursos Minerais e Petróleos. Há uma delegação do Ministério que vem à província para trabalharmos no sentido de finalizar os processos daqueles que poderão ser legalizados para fazerem esta exploração de forma legalizada. É também uma forma de conter a tendência de exploração desenfreada e, sobretudo, evitar o garimpo.

O garimpo já atingiu níveis preocupantes?

Não tem grande expressão, embora existam algumas ocorrências, sobretudo na zona fronteiriça. Temos uma longa fronteira com a RDC e do outro lado também há ocorrências mineiras. Há quem possa saltar a linha e vir para o lado de Angola fazer exploração, sobretudo nas zonas de Milunga ou de Kimbele.

E em relação ao cobre, qual é o estado actual do projecto de exploração da mina Mavoio?

É um projecto que deve ser desenvolvido e que foi impulsionado pelo Presidente José Eduardo dos Santos. Consistia no relançamento da mina. Os promotores vêm desenvolvendo este trabalho, já há bastante tempo. Achamos que era demasiado tempo, exprimimos a nossa preocupação junto deste promotor. Programámos uma visita para, ‘in loco’, fazermos o balanço da situação e, naquilo que nos cabe, poder informar a quem de direito. É uma área que gostaríamos que fosse dinamizada porque seria um grande subsídio para impulsionar o desenvolvimento económico da região. À volta deste projecto sairá um pólo que terá algum impacto no desenvolvimento da província e do país. Os promotores apresentaram as suas preocupações no acesso aos recursos financeiros. Já desenvolveram o projecto de prospecção a um nível de 85%. E o que falta, pensam concluir dentro de seis meses e, nessa altura, terão uma informação mais exacta sobre a viabilidade económica e financeira do projecto.

Ainda existem dúvidas sobre essa viabilidade?

O facto de se continuar a trabalhar demonstra que haverá alguma viabilidade de implementação. Mas aguardamos que os promotores nos digam, eles é que têm as informações técnicas. Acreditamos que se vão pronunciar no devido momento. A percepção que temos, através dos discursos deles, é que há viabilidade. Não podemos perder de vista que já se produziu cobre naquela zona pelos japoneses. A mina existe, tem um túnel que, parece-me, vai até cerca de 700 metros de profundidade e terá fechado com o surgimento da guerra. O que queremos é que o projecto leve menos tempo porque há uma grande expectativa.

Os empresários locais acreditam que têm tido mais dificuldades de acesso ao crédito bancário, face aos empresários do resto do país. Tem conhecimento desta convicção dos empresários?

É verdade. Foram das primeiras medidas que tomámos, interceder junto dos bancos. Escrevemos (também porque em determinados pontos da província nem há agências bancárias) para as direcções dos bancos que actuam na província e também interpelámos os responsáveis dos bancos para disponibilizarem meios para financiar a economia na província. A vice-governadora teve contactos com os empresários, estamos a prever uma reunião, já com a participação do governador, para corrigir esta situação. O que temos feito é passar algumas declarações para as agências bancárias concederem financiamentos. Fizemos junto do Ministério da Economia, do BPC, BFA e do Banco Económico. As informações que recebemos são da necessidade de os empresários melhorarem os processos. O sistema bancário apresenta outra preocupação. Os financiamentos concedidos anteriormente não terão sido bons exemplos com o reembolso. Fala-se em cerca de 70% de crédito mal- parado na província.

Como pensa inverter o quadro?

É uma dificuldade que deve ser ultrapassada e, pelas razões que foram evocadas, é possível. Será necessário seleccionar melhor as pessoas que vão ter recursos, assistir melhor estas pessoas e interceder junto dos bancos para não só conceder financiamento, mas também acompanhar para melhorar a interacção com o cliente. Os empreendedores, por sua vez, devem ter noção de que o dinheiro não é oferecido, que o banco vende e deve ter rentabilidade da mesma forma que os negócios que venham a montar. No nosso caso, facilitar, criando um ambiente favorável para que estes empresários também possam ter uma acção facilitada para efectivar as iniciativas e ter capacidade de retorno que vai ajudar a reembolsar. Os serviços do INAPEM também foram orientados para ajudar os empresários a melhorar os projectos e formular os pedidos. É uma questão de cultura que se deve corrigir, por isso, temos que persistir e quem não cumprir é penalizado. É uma preocupação que retém a nossa atenção.

E acredita que os empresários estão na disposição para agirem diferente?

Vamos acompanhar numa perspectiva de ‘démarche’ pedagógica e de assistência. Precisamos de delinear um caminho que possa orientar o nosso trabalho. Nós, governo, que devemos regular a situação, e eles, como executores, que devem criar a riqueza da província. O Uíge tem um nível de arrecadação de receitas muito baixo e temos de mudar esta situação. Arrecada recursos inferiores a 10% daquilo que consome para a sua governação.

E o que está na base desta arrecadação tão baixa?

Há uma equipa que fez uma reflexão. É outro campo de intervenção dos primeiros seis meses. Foi definida uma estratégia para reverter a situação para melhor controlar os tributáveis. Não posso confirmar que haja, mas se pode supor que exista fuga ao fisco porque há mais empresas registadas do que aquelas que são tributadas. Também podemos considerar a possibilidade de haver muitos que criam rendimentos sobre o território do Uíge, mas que são tributados noutras províncias. É preciso fazer o levantamento e introduzirmos algumas correcções. Podemos ainda considerar que há um sector informal significante. A preocupação é aumentar a base tributária para depois vermos a expressão real das receitas que possam ser realizadas. Também queremos pensar que, provavelmente, há alguns serviços que são prestados a um custo mais baixo do que deveriam ser. Por exemplo, temos rendas de casas da rede pública de 10 kwanzas. Provavelmente, alguns casos podem significar, individualmente, migalhas, mas, na sua globalidade, representam um volume com alguma significância.

Há uma estratégia definida para alterar o quadro?

A estratégia definida é intervir nos que produzem e nos que gerem a tributação no comércio, indústria, geologia e minas, habitação e das próprias finanças que devem melhorar os serviços na província e na recolha de receitas. Temos poucas agências da AGT.

As autarquias emprestam maior urgência na inversão deste quadro ainda mais desafiante?

A nossa preocupação é mesmo impulsionada pela mudança na organização da gestão do poder do Estado. É preciso que haja fonte para poder financiar todos os programas que vão responder à expectativa da população. A nossa pretensão é melhorar a tributação, diversificando a economia e controlar melhor. Com o que está a ser feito, é possível que tenhamos melhorias. A mudança não será drástica, é um processo que vamos iniciar, enquanto o fundo de equilíbrio nacional também pode apoiar. O mecanismo de financiamento do poder do Estado prevê um instrumento que regula a carência de recursos em determinadas zonas do país. Quando há um grande défice, o todo, que é o país, reforça. Queremos é que a nossa contribuição tenha já uma certa significância na arrecadação de recursos.

Qual é a realidade da província em relação à dívida do Estado para com os empresários?

Temos uma lista de prestadores de serviços que esperam pelos pagamentos. Algumas dívidas foram assumidas como dívida pública e, a qualquer momento, o Ministério das Finanças vai resolver. Outras não chegaram a ser cabimentadas, mas foram executadas. Esta é uma questão que deverá ser tratada de uma outra forma. Trabalhando com o Ministério das Finanças, continuaremos a encontrar alternativas. Se são projectos que estão em execução, tiveram uma parte já executada que não foi paga no quadro do que esta a ser executado vai procurar se compensar. Tivemos uma empresa de limpeza que desistiu, declarou que terminaria o seu trabalho a 31 de Dezembro, pedimos, tendo em conta a importância deste serviço, para continuar até 31 de Março o que fizeram. Desistiu porque tem dívida por receber não só no Uíge, como noutras províncias. Preferiu reduzir a sua intervenção empresarial para poder conter as suas despesas. As dívidas têm de ser pagas senão criam dificuldades, não só à governação, mas também à economia.

Em quanto está avaliada essa dívida?

Infelizmente, não tenho o valor global, mas são milhões de kwanzas. Particularmente, à empresa de limpeza, deve ser mais de 500 milhões de dívida, embora uma parte já tinha sido assumida pelo tesouro como dívida pública.

A burocracia na execução das ordens de saque tem sido das maiores dificuldades dos governadores. Também tem enfrentado?

O país ainda tem problemas na gestão financeira. A realidade é que emitimos ordens de saque para as quotas que nos são atribuídas e não operacionalizadas. O tesouro não tem disponibilidade para tornar efectiva as ordens que são dadas, mas, segundo as informações que temos, é que a situação poderá vir a melhorar a partir deste mês. Temos de ter fé e esperança. Queremos que, quando se determina que temos uma determinada quota financeira, estes recursos sejam mesmo efectivos porque ordenamos para despesas que são importantes e urgentes.

Os edifícios e habitações degradadas são uma das referências da cidade. Há algum plano para alterar este quadro?

É uma preocupação. A direcção provincial da construção recebeu orientações. Primeiro, intervir nos edifícios públicos, como uma medida dissuasiva e também uma intervenção pedagógica para que os proprietários também tenham a missão de fazer uma intervenção e melhorar o figurino da cidade. O que pretendemos, logo que haja recursos, é pintar os edifícios públicos. A acção poderá alargar-se a algumas habitações da cidade. Este edifício está aqui (defronte à casa protocolar) é do banco nacional, está neste estado (totalmente degradado) e, logo no início das nossas funções, intercedemos junto do governador do BNA que nos tinha prometido fazer uma intervenção. Houve uma mudança na liderança do banco. Tirámos imagens do edifício e encaminhámos novamente o processo. É um património, além disso, é um dos edifícios mais bonitos da cidade e está na via principal.

Qual foi a resposta do BNA?

Acredito que estejam a introduzir na sua programação e, certamente, farão a intervenção. Estamos a deixar passar algum tempo. Já o fizemos há cerca de três meses e, quando tivermos a oportunidade de estar em Luanda, este será um dos assuntos da nossa agenda.

Algumas vozes se terão manifestado contra a sua nomeação. Apercebeu-se destas manifestações? Agora é melhor compreendido?

A população é quem deve dizer. Não era uma opinião generalizada. A reticência poderia vir, provavelmente, de uma parte da juventude que terá manifestado alguma preocupação. Uma grande parte da população intelectual está ligada à educação e há uma preocupação, considerada, talvez, não completamente resolvida, que é a questão do ajustamento de carreira. Sendo eu ministro da Educação terão pensando que não terei resolvido, quando não é verdade. Tudo o que foi feito era no sentido de corrigir estas situações nos limites da legislação e da disponibilidade dos recursos. A última experiência (greve dos professores) mostra que este não é um assunto do ministro da Educação, porque o Ministério da Educação ajuda a produzir dinheiro, mas não gere os recursos financeiros do Estado. Quem gere são outros, mas mesmo estes também fazem em função do que todos nós produzimos como riqueza do país que possa ser distribuída. Compreendo que possa haver esta tendência, mas não é generalizada. Além de que muitos não me conheciam, agora conhecem-me melhor e devem ter outra opinião. Eu e a minha família já realizámos acções que mostram que somos servidores e não nos servimos do estatuto que temos. Além de que milhares estão aí, conhecem-me bem e sabem do que terei feito em particular para a província.

Antes de ser governador?

Sim. Dei uma grande contribuição para a expansão da rede escolar, particularmente a do ensino secundário. Fui um dos promotores da implementação do ensino superior na província. As pessoas poderão ter tido uma opinião errada, mas é de meia dúzia e não esqueçam que eu sou filho do Uige. Eu ando a pé, vou à loja, vou onde o povo vai. Não me senti incomodado, porque não podemos agradar a todos e qualquer razão que terão evocado são razões que não dependiam de mim.

Mas o senhor era o ministro?

Os professores hoje falam do estatuto da carreira docente, alguém esteve na base da elaboração deste estatuto e eu sou um dos grandes promotores. Lutam, por exemplo, para melhorar as suas categorias, para melhorar salários, mas alguém esteve na base da concepção, discussão e da promoção daquela base salarial.

É criticado por não ter implementado depois estes projectos que disse ter estado na concepção. O que faltou?

O que se projectou na concepção foi implementado. A maioria dos professores, que estão no sistema, está nas suas categorias normais, não se pode dizer que não se implementou. De 2011 a 2014, atendemos 165 mil professores que apresentaram os seus processos. A realidade é que o sistema educativo angolano funciona de uma forma atípica. O individuo está no sistema, continua a estudar, está a mudar o perfil e permanentemente exige que haja ajustamento do seu perfil. Os outros sistemas educativos não funcionam assim. O professor solicita o emprego para ser enquadrado numa determinada categoria em função de uma formação determinada e depois é gerido de acordo com os preceitos da gestão dos recursos humanos da função pública, na base de uma avaliação que pode evoluir de categorias. Quando o país tem recursos que permite haver melhoria de categorias internamente, isto é feito, mas é de acordo com o mecanismo normal de gestão de recursos humanos.

COMPUTAÇÃO. Docente da Universidade Agostinho Neto (UAN) entende que a classe empresarial tem noção dos ganhos que pode ter de investir nos criadores e inventores, mas admite haver ainda muito caminho a ser feito. E afirma que a crise é uma “boa oportunidade” para se apostar na inovação.

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Em 2017, Angola foi outra vez premiada na feira de inventores da Alemanha. O que tem sido feito com estes projectos?

Alguns dos projectos do Departamento de Ciências da Computação da UAN estão a ser utilizados na UAN, como um interpretador de algoritmos, com resultados muito positivos, ou ainda o sistema integrado de gestão dos exames de acesso no período das candidaturas. Posso também salientar o ‘software’ Zwela, que traduz português para línguas nacionais e reproduz a pronúncia das palavras e que foi produzido com o apoio da Sistec. Existem também projectos que estão a ser implementados noutras instituições e organismos públicos. Seria útil que os outros projectos também estivessem em uso. No entanto, isso não depende apenas dos inventores e criadores, mas de outras entidades ou departamentos ministeriais ligados a estas temáticas e ao empreendedorismo.

Estes constantes prémios têm colocado o país na agenda de investidores e indústrias internacionais?

O foco deve ser o investimento nacional. Temos de apostar, cada vez mais, nos projectos que desenvolvemos e que têm qualidade. Se aguardarmos pelo investimento internacional, estaremos a perder oportunidades de desenvolvimento. Perdoem a imodéstia, mas temos recursos, capacidade e competências. Não há pretexto para não se concretizarem os projectos com valor e interesse para Angola.

Criou o ‘Sistema de Apoio Ao Serviço Nacional de Saúde’. É um projecto que está a ser utilizado?

Não ficou engavetado. Foi desenvolvido com o objectivo de auxiliar a obtenção de informação sobre os serviços de saúde disponíveis. Entretanto, evoluiu para outro, denominado ‘SIEMA’ que, além da vertente informativa, pode ser usado por utentes em situação de emergência médica. Temos um outro sistema, o ‘Mwonowaha’, que teve um reconhecimento internacional, recebendo uma medalha de prata, em 2017. Acrescenta um componente para a gestão de bancos de doadores de sangue e informação sobre medicamentos e farmácias. Este tipo de sistemas é uma das utilizações das TIC que tem recebido mais atenção na comunidade científica nos últimos anos.

A sociedade angolana e os agentes económicos compreendem melhor a importância da informática?

A economia mundial é baseada na informação e os agentes económicos compreendem isso. No entanto, não basta compreender a importância. Será necessário planear e efectivar essa noção em aplicações e tecnologias concretas e utilizadas nas empresas. Tem de ser feita uma utilização adequada dos recursos das TIC, utilizando sistemas, ferramentas e outros meios que dêem aos agentes económicos um diferencial competitivo. Isto não quer necessariamente dizer que seja obrigatório fazer grandes investimentos financeiros dentro das empresas, mas é indispensável ter uma visão abrangente e um objectivo estratégico, colocando a tecnologia ao serviço da empresa e não o contrário.

A classe empresarial tem noção dos ganhos que pode ter a investir em invenções e criações?

A noção existe, mas a um nível mais abstracto. Ainda existe trabalho a ser feito, mas, à medida que o país for diversificando a economia, é indispensável que as empresas se afirmem no mercado de formas distintas, agreguem valor e apresentem produtos e serviços inovadores. A classe empresarial tem a oportunidade de desempenhar um papel importante na criação e apoio a núcleos de empreendedorismo que unam empresários, gestores, universidades e laboratórios de investigação.

Já vai havendo muitas iniciativas empreendedoras com recurso às TIC. Está satisfeito com o nível ou poderia existir mais?

Não são tantas quanto as que podem e devem existir. O país carece de profissionais na área das TIC, apesar de todo o esforço e aumento na quantidade de jovens formados. Podemos ter iniciativas com impacto em inúmeros sectores da sociedade e da economia. A crise é favorável à aposta no talento e na criatividade e no sucesso dos novos empreendedores.

Como avalia a coabitação em Angola entre sociedade industrial e as TIC?

Não tem sido fácil porque a mudança de paradigma gera receios e frustrações. Os receios geram-se, essencialmente, porque as pessoas podem julgar que vão perder o posto de trabalho, quer por inadaptação à tecnologia e à mudança, quer por extinção do posto de trabalho. Existe uma resistência à mudança, observável em quase todas as empresas e instituições, só que já não existe outra opção a não ser evoluir. Esta necessidade obriga a um processo de aprendizagem contínua e à responsabilização individual. As lideranças têm um papel fundamental na criação de uma visão e cultura de inovação e mudança.

O maior contacto com as TIC é, em princípio, uma garantia de um futuro melhor?

O interesse dos jovens possibilita a existência de mais candidatos a cursos destas áreas e que se possam seleccionar os melhores. Uma preocupação que temos é o interesse particularmente das raparigas pelas TIC, um aspecto que necessita de ser trabalhado em conjunto com várias estruturas. Não podemos confundir interesse e contacto com as TIC com o uso das redes sociais e da internet. De facto, a utilização das TIC por parte dos jovens é facilitadora de maior à vontade, maior predisposição para aceitar estas tecnologias num contexto profissional e menor resistência à mudança. Estes factores aumentarão o ritmo a que os sistemas serão implementados e também a produtividade.

PERFIL

Mateus Padoca Calado é professor auxiliar na UAN e investigador no BioSystems & Integrative Sciences Institute da Universidade de Lisboa. É doutorado em Informática pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. É docente na Faculdade de Ciências da UAN desde 2008 e docente convidado na Faculdade de Economia da mesma Universidade desde 2010.