ANGOLA GROWING
César Silveira

César Silveira

Editor Executivo do Valor Económico

DIAMANTES. Multinacional russa é detentora, actualmente, de 32,8%, tal como a Endiama. Com reforço da posição, poderá passar a accionista maioritária, caso a Endiama não faça o mesmo investimento.

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A diamantífera russa Alrosa assegura que terminará o ano com uma participação de 41% na Sociedade Mineira de Catoca (SMC), o que representará um aumento 8,2 pontos percentuais, face à parcela actual de 32,8%.

A garantia está expressa num texto publicado no site oficial da empresa, no entanto, esta não é a primeira vez que a multinacional menciona o referido aumento. No início deste segundo semestre, o presidente da companhia, o russo Sergey Ivanov, na sequência da realização da assembleia-geral extraordinária, referiu a intenção de ver a sua empresa crescer na estrutura da SMC. “A Alrosa também planeia aumentar sua participação na Catoca Ltd Mining Co até 41%”, adiantou, na altura. Desta vez, o anúncio dos russos passa da intenção para a concretização do controlo de quase metade da sociedade até ao fim do ano.

Tal como nas ocasiões anteriores, a empresa não avança detalhes sobre o negócio que deverá proporcionar o anunciado aumento da participação na estrutura accionista da mina, mas observadores do sector admitem estar em cima da mesa a aquisição de metade dos 16% detidos pela brasileira Odebrecht, possibilidade, entretanto, rejeitada por fonte da sociedade. “Este aumento deve resultar de um outro movimento e não da compra da participação da Odebrecht, porque esta será distribuída pelos vários parceiros”, declarou. A mesma que avança que o dossier da distribuição da participação da Odebrecht “encontra-se bem encaminhado e deverá ser concluído em Dezembro, altura em que está marcada a assembleia-geral”, afiança.

A concretizar-se o referido aumento, a diamantífera russa poderá passar para a posição de accionista maioritário da sociedade, caso a Endiama não faça um investimento na mesma proporção, visto que, neste momento, cada uma das empresas é detentora de 32,8% da sociedade, enquanto os chineses da LLI possuem 18%.

A Odebrecht acertou com a sociedade a venda da sua participação no passado mês de Agosto, altura em que a Catoca explicou que a parcela dos brasileiros seria distribuída pelos restantes parceiros sem, no entanto, adiantar as proporções nem o valor que a brasileira receberá pelos 16,4% da mina.

Em 2016, Catoca representou cerca de 86% da produção nacional, em termos de volume, e cerca de 60,3% em termos de valor, tendo registado aumento nas vendas de cerca de 11,7 milhões de dólares face aos 581,87 milhões de dólares do ano anterior. Para este ano, a empresa perspectiva vendas no valor de 138 milhões de dólares, segundo recente entrevista à Angop de Sergei Amelin, presidente do conselho de gerência da SMC.

A Alrosa opera em nove países e em 10 regiões na Rússia. É líder mundial na produção diamantífera com 95% da produção russa e 28% da extracção global de diamantes. Nos primeiros nove meses do ano em curso, obteve receitas de 3,7 mil milhões de dólares e lucro líquido de 1,06 mil milhões.

Destacado empresário, entre outros, no sector da logística, Leonel da Rocha Pinto tem a convicção de que os problemas de Angola devem ser resolvidos pelos angolanos. E rotula de fantasiosa a ‘importação’ de estrangeiros para as soluções que impõe. Sobre a economia, alerta para novas possibilidades de criação de monopólios e desafia a banca a ser mais transparente.

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O que fez o LIDE Angola desde a sua implementação, em 2011?

O LIDE é uma organização de líderes empresariais e, em princípio, para se ser membro, tem de se ser um empresário com boa conduta, com os compromissos tanto sociais como de impostos e com a Nação alinhados, porque devemos pautar pelo exemplo. Dedicamo-nos à organização de eventos com temáticas que possam contribuir para o desenvolvimento económico do país, na criação de emprego e de mais-valias em termos de posicionamento empresarial local no mapa empresarial internacional.

Refere propositadamente a particularidade da “boa conduta” para se ser membro. Porquê? É uma qualidade rara?

Temos [empresários com boa conduta], mas é preciso continuar a melhorar e a incentivar outros a enveredarem para o pagamento de impostos e da segurança social. Mas também para estarem comprometidos com a parte social participativa, porque a responsabilidade social não pode ser só do Estado. As empresas também devem ser participativas e nós devemos dar exemplos. Hoje, por exemplo, temos patrocinadores que ajudam o comité paralímpico, temos empresas que estão qualificadas, pela AGT, como de perfil de responsabilidade, temos membros que já ganharam os prémios Sirius. Há uma série de incentivos enormes que devem ser postos a circular para que aqueles empresários que ainda não estão nesta conduta passem a estar. Quando determinada empresa quer ser membro, nós recomendamos o que deve ser feito de uma forma orientadora.

Neste momento, contam com mais de 100 membros. Qual é a média anual de adesão de novos associados?

Na verdade, são 110 membros além de associações que fazem parte da organização. Todos os anos há acréscimos. Começámos com 25 membros, mas os eventos vão-nos promovendo a nível nacional e as pessoas começam a rever-se, mesmo o próprio Estado. Hoje, temos assento no conselho de concertação social da República, que é a LIDEA. Portanto, a LIDEA, que é a Liga dos Empresários Angolanos, é parte do LIDE, é a costela nacional do LIDE.

E qual tem sido a mensagem do LIDE para os membros, nesta fase de crise?

É uma mensagem no sentido de aposta numa gestão rigorosa. Aconselhamos a olharem para tudo o que é negócio e a cumprirem com todos os procedimentos. Não podem pensar no lucro a curto prazo. Hoje, os investimentos são feitos à base do longo prazo e com muita estratégia. Esta é a nossa visão. Quem quer investir a sério tem de definir em que ramo quer ficar, olhando para o negócio de continuidade. Temos de evitar negócios com pessoas que chegam, vão directamente a um hotel, vendem uma ‘commodity’ e vão embora. Não têm uma estrutura e deixam o problema com o cidadão que comprou, porque não encontra nem manutenção nem garantias. O empresário angolano deve ser respeitado em qualquer parte do mundo.

Como se deve melhorar, na sua opinião, a distribuição de divisas?

Temos de trabalhar, em primeiro lugar, com os ministérios de tutela, identificando as nossas necessidades, para depois estes ministérios trabalharem com o das Finanças e a banca para definirem as prioridades. Creio que, se, para alguns sectores a importação, é necessária, também é verdade que devemos olhar para a produção nacional. Temos de apostar em tudo o que podemos produzir localmente e só importarmos o que o país, efectivamente, não pode produzir. Estes anos todos, andamos a desperdiçar divisas com a importação de produtos que podem ser produzidas localmente. Para os hotéis, por exemplo, podemos aproveitar a matéria-prima que temos, que é a madeira, para fazermos as camas, janelas e outros produtos. Podemos incentivar a cultura do algodão para fazermos os lençóis. É preciso olharmos de uma forma estratégica para que, dentro dos próximos anos, Angola passe a depender menos da importação como acontece com outros países mesmo a nível de África. Este é o nosso grande desafio: começarmos a depender menos das divisas e produzirmos mais divisas com as exportações.

Nas condições actuais do país, a diversificação económica exige um grande esforço financeiro. Acha que a banca nacional está à altura do desafio?

Temos todos de reflectir o momento e aproveitar, porque esta crise, até certa forma, veio ajudar a criar momentos. Tanto a banca como os empresários devem sentar e definir uma estratégia, porque os bancos trabalham com o nosso dinheiro. Deveriam ser mais transparentes para com os seus depositantes para podermos criar a banca que nós pretendemos e não aquela que, quando alguém precisa de x milhões, o banco diz que não tem, mas o depositante tem o seu dinheiro lá. O banco tem de nos dar resposta. Hoje, muitos dos bancos não têm essa capacidade de resposta, alegam falta de sistema e uma série de problemas que não correspondem à realidade. E o que pensa das taxas de juro do mercado? É preciso que sejam revistas, porque não há investimento nenhum que resista a essas taxas. Hoje, estamos a trabalhar, praticamente, apenas para os bancos porque não há negócio nenhum que rentabilize e que justifique. Mas também os bancos têm medo porque não há garantias da parte dos empresários. As taxas são agravadas devido ao risco, além de que temos muito crédito malparado. Por isso há necessidade de nos sentarmos com a banca e reflectirmos no sentido de corrigirmos os problemas todos identificados. Só se deve dar crédito a quem tem direito, mas os bancos, durante algum tempo, passaram a caçar créditos sem o real levantamento da capacidade das pessoas, criou-se um círculo vicioso que hoje tem de ser corrigido.

“ZEE são dos grandes desafios do Governo”

Que sectores aconselharia a um potencial investidor no país?

A minha primeira preocupação, enquanto nacional, é ver uma Angola industrializada. Seria esta, portanto, a primeira aposta, na indústria. Olhar para a transformação das matérias-primas. Nesta altura, estamos a olhar para a agricultura, mas temos de olhar também para a transformação dos produtos da agricultura. Se estamos a olhar para a produção da madeira, temos de olhar para a transformação desta madeira. O mesmo vale para os mineiros. Ao invés de importamos os mosaicos e azulejos, temos de investir no potencial em termos de recursos humanos no sentido de transformar estes recursos minerais em produtos acabados. Também indicaria o turismo, que é um sector em que estou, agora, a apostar. Se olharmos para o mundo, muitos dos roteiros turísticos estão muitosexplorados e os turistas estão à procura de outras rotas. Angola pode ser uma destas rotas.

Considera satisfatório o investimento que já vai sendo feito na transformação?

Já há algumas empresas, mas há que criar políticas compulsórias para direccionar o investidor nacional a fazer investimentos na produção local no sentido de passarmos a importar apenas o que é necessário como a maquinaria, por exemplo. Mesmo no que diz respeito aos quadros, podemos criar condições para deixarmos de importar. Quando se fizer qualquer tipo de fábrica, este projecto deve ser acompanhado da formação, porque o que tem estado a acontecer é que temos estado a crescer em betão mas não em recursos humanos com capacidade para depois executar ou cuidar dos equipamentos. Temos um outro grande problema que é a importação de equipamentos com manuais de operação em chinês, por exemplo. É necessário que se revejam estas estratégias. Temos, por exemplo, um monstro adormecido que é a Zona Económica Especial [ZEE]. Foi muito bem pensada, mas muitas das fábricas não estão a produzir para satisfazer o mercado nacional por falta de conhecimento e quadros que possam pegar nestas fábricas. É preciso rever esta situação, é necessário fazer uma avaliação do grande investimento que foi feito porque temos de aproveitar. Muitas das fabricas já estão obsoletas, não servem porque já estão ultrapassadas e será necessário fazer um ‘upgrade’.

Está a sugerir uma intervenção urgente na ZEE? O que se deve fazer em termos práticos?

Em primeiro lugar, deve fazer-se um diagnóstico do que existe. Depois, fazer um levantamento dos potenciais investidores, começando pelos nacionais e dando-lhes prazos para porem as fábricas a funcionar. Creio que estão ali mais de 60 fábricas e menos de 20 estão a trabalhar e a meio-gás. Penso que ter a Zona Económica [Especial] a funcionar em pleno é um dos grandes desafios do Governo.

No ano passado, iniciou-se o processo de privatização dessas unidades. Não lhe pareceu correcto?

Tem de haver vontade política. Sei que foi feito um levantamento, mas tem de haver uma política e uma estratégia muito bem definida para não cair no descrédito. Uma coisa é a vontade de fazer e outra é o empresário ter compromisso de fazer. De boa vontade o mundo está cheio. Precisamos de pessoas empreendedoras que queiram investir e que não estão preocupadas com o lucro imediato. Depois, a banca tem de ter condições de dar o financiamento, mas olhando para o financiamento sem estar preocupado para os riscos e aí, mais uma vez, vem a credibilidade do empresário. A banca tem de acreditar no empresário e o empresário tem de mostrar que tem capacidade.

“O porto seco está a ser vítima de concorrência desleal”

Como se define enquanto empresário?

Sou um empresário que gosta de desafios e muito ousado. Gosto de ver as coisas serem realizadas. O meu grande desafio é fazer com que as coisas aconteçam e estou muito comprometido com o país. Estou em vários sectores e em todos tenho batalhado de modo a servir como um empresário de exemplo e referência positiva. Tento fazer o meu melhor. No meio de tantos problemas, sou pequenino, mas vou fazendo a minha parte.

Com que sector gosta mais de ser identificado?

A logística. Como sabe, fui director da NDS, por muitos anos. Comecei em 1984 com a Global, que é uma empresa que trabalhava para o projecto Gamek. Depois, passei para a NDS, que era um ‘outsider’ com um navio apenas e passámos para centenas de navios. Hoje é uma das maiores operadoras no país. Atendendo às dificuldades que o país vivia, na altura, com o recondicionamento no Porto de Luanda, enveredei para o meu próprio negócio que foi criar espaços de armazenamentos de cargas. Comecei assim com os portos secos e logísticos, que são o meu forte. Pretendo continuar a investir nesta área, criar uma plataforma logística de referência a nível do país. Tem sido esta a minha grande aposta, estou a fazer um investimento no porto seco de Luanda, temos uma grande aposta de trabalhar com o caminho-de-ferro. Estamos, agora, na exploração do porto seco de Santa-Clara; quero apostar, seriamente, na plataforma logística a nível das províncias fronteiriças com alguns países, como é o Congo, a Namíbia e Zâmbia. Tenho, hoje, o maior centro de frio no porto seco; queremos também criar uma área de alojamento para os camionistas que vêm das outras províncias.

Está satisfeito?

Há passos por marcar, mas estão criadas as principais bases para uma plataforma logística. Temos as alfândegas, os bancos, as balanças, as áreas de inspecções, os parques, as máquinas e energia 24/24. Temos uma área de transporte com oficina para atender aos problemas das viaturas. Falta criar outras mais-valias que complementam esta plataforma logística. O que gostaria de ver é um porto seco, onde as cargas fossem posicionadas e de lá os grandes importadores fizessem as suas distribuições para deixarmos de ter a circulação de camiões com contentores na cidade. Apareceriam os camiões apropriados para a distribuição como é em qualquer parte do mundo.

É um sector que sofreu muito com a redução das importações.

Sofreu muito com a redução das importações, mas também com a criação de outros portos secos pelos próprios terminais, copiando aquilo que era a grande intenção do porto seco. Os terminais, por direito, quiseram criar os seus próprios parques. Creio que é uma prática que deveria ser revista porque os portos têm a responsabilidade de fazer as descargas e não criarem portos secos para matarem outros negócios conforme foi com o porto seco. Hoje, estamos a ser vítimas, mas continuamos a trabalhar e tenho a certeza de que o processo será invertido. Nós investimos aí cerca de 95 milhões de dólares entre máquinas e outros equipamentos e estamos a enfrentar esta situação. Mas continuamos a gerir numa gestão de crise, não morremos.

Estamos em presença de uma concorrência desleal?

Até certa forma, sim, porque quem deveria decidir onde é que a carga vai é o importador, mediante a qualidade de serviço. Mas nós tivemos uma situação com um dos terminais onde o próprio armador queria trabalhar connosco e o terminal não aceitou. São estas coisas que têm de acabar. Precisamos de acautelar estas situações, porque temos de olhar para um país onde todos sentimos que temos os nossos espaços conquistados por mérito. O discurso do Presidente João Lourenço incentiva-nos, porque ele é um grande motivador e quer incentivar a livre concorrência que faz parte de qualquer economia aberta.

Acredita numa livre concorrência no verdadeiro sentido a curto espaço de tempo?

Creio que Angola tem de ir para este caminho, de outra forma, vamos correr os riscos do passado, vão criar-se monopólios. Tem de se deixar os empresários conquistarem os seus espaços e os negócios através das suas estratégias. A concorrência é salutar, ajuda a regulamentar os preços, a qualidade e o próprio Estado a definir quem é quem. Ajuda a deixarmos de ter empresários oportunistas e de especulação. Temos de ter empresários comprometidos com o país e não aqueles que vêm para fazer dinheiro e ter os dinheiros fora do país sem estar a servir nem a nossa banca, nem a nossa economia, mas sim a banca estrangeira.

Em que sector novo gostaria de investir?

Já comecei a investir. No turismo e também na reciclagem de lixo. Tenho uma empresa, a Greentech, que é especializada na limpeza de praias, mas, mais uma vez, sofremos porque se criaram alguns monopólios para fazer as limpezas. Nós fizemos investimentos nesta área e, hoje, somos chamados a abandonar porque apareceram outras empresas que não sabemos de que formas foram lá postas. São estas situações que, se não estivermos preparados para outros mercados e enquanto houver essa indefinição da estratégia de protecção do empresário nacional, comprometem vários projectos empresariais.

E o que tem projectado para o turismo?

Estou no investimento, porque acredito que é o futuro. Estou a trabalhar para um grande projecto, que é o instituto de formação do turismo, porque acredito que não se pode fazer turismo sem a formação dos quadros. O que mais o preocupa enquanto empresário? Enquanto empresário, estou muito preocupado com a mudança de mentalidade do cidadão angolano que ainda não sabe interpretar o valor daquilo que tem em mão. Nós continuamos a dar espaço para que os estrangeiros nos venham indicar o que é melhor para nós. Continuamos a estar distraídos e a não desenvolver o que está à nossa frente, precisamos de despertar para transformarmos o potencial que temos. Outra questão que precisamos de mudar é o facto de as pessoas pensarem muito nelas, ao invés do país. As pessoas têm também de aprender a lidar com o sucesso dos outros, solicitar conselhos e não terem dificuldades de perguntar a quem tenha sucesso como é que fez, ao invés de guerrearem estas pessoas. Temos de nos unir, ser patriotas e solidários. Entre as características do gestor ,há a necessidade de desenvolvermos a humildade. Aceitar quando estamos errados e saber ouvir as pessoas que estão ao nosso lado. Temos de estar focados em formar líderes e não ‘bosses’. Mas, quando digo isto, não estou a dizer que o país não tenha bons líderes. Temos, mas poucos e o desafio deve ser o de multiplicar esses poucos.

Há uma solução mágica para isso?

Hoje, estamos todos a dizer que o crime continua a aumentar, precisamos de fazer leituras das razões. Tudo passa por uma avaliação do contexto actual desde a crise ao problema da falta de emprego, educação e o problema das famílias destruturadas por causa da guerra. Temos de olhar seriamente para estas questões porque a solução cabe a nós e não aos estrangeiros. Devemos deixar a fantasia de trazer pessoas que sabemos terem experiências para o país deles, mas desconhecem a nossa realidade. Precisamos de identificar o nosso potencial porque Angola tem quadros, pessoas capazes para tirar o país desta situação. Temos o exemplo da guerra. Quem terminou com a guerra foram os próprios angolanos.

BALANÇO. Receita de 15,6 mil milhões de dólares é um dos números avançados por Isabel dos Santos entre muitos que constariam do relatório e contas do seu primeiro ano económico em frente da petrolífera.

Isabel dos Santos Administradora Sonangol

Ao ser exonerada quando faltam pouco menos de dois meses para do final do ano, Isabel dos Santos vê interrompido aquele que seria o seu primeiro ano económico completo na liderança da Sonangol e, como tal, digno de avaliação dos resultados da sua gestão.

Ainda assim, a gestora revelou, em comunicado, alguns números do ano em curso numa iniciativa que, segundo algumas vozes, tem como objectivo deixar a sua marca na gestão da petrolífera, visto que os méritos e fracassos do exercício de 2016 serão sempre repartidos com a administração de Francisco de Lemos que liderou o primeiro semestre daquele ano.

Entre os números revelados, destaca-se os 15,6 mil milhões de dólares atribuídos à receita que resultará de um ligeiro crescimento, quando comparada aos 14,8 mil milhões de 2016. A gestora garante ainda que a redução da dívida de mais de 50%, passando de 13 mil milhões de dólares para sete mil milhões.

Outro número de realce tem que ver com o resultado operacional positivo de 100 milhões de dólares da Sonangol Pesquisa e Produção para o ano em curso. No comunicado, Isabel dos Santos lembra que, em 2015, esta empresa (de onde exonerou o actual PCA da Sonangol, em Dezembro de 2016) “tinha um resultado operacional negativo de 859 milhões USD” que foi reduzido “para 256 milhões de USD em 2016”. De resto, os resultados negativos foram apresentados como a razão da exoneração de Carlos Saturnino até então CEO da empresa.

“A Sonangol P&P é a empresa do grupo Sonangol que, durante a avaliação efectuada, apresentou as maiores debilidades de gestão e consequentemente de desvios financeiros”, referia o comunicado.

No entanto, o agora PCA da Sonangol reagiu, na altura, manifestando-se “surpreendido pela redacção” do comunicado de exoneração que, segundo ele, poderia dar a entender que todos os erros do passado, cometidos na empresa, tinham sido cometidos pela sua equipa. Disse ainda que o conselho de administração da Soangol EP tinha “conhecimento e documentos”, apresentados pela sua equipa sobre o estado da empresa nos anos anteriores.

À sua saída, Isabel dos Santos deixa a garantia de um financiamento de dois mil milhões de dólares “com a assinatura prevista para os próximos dias, que garantirá o pagamento de todos os ‘cash calls’ relativos a 2017, permitindo, assim, chegar ao final do ano sem dívidas aos nossos parceiros”.

O incumprimento do ‘cash calls’ foi um dos constrangimentos da gestão de Isabel dos Santos. Segundo apurou o VALOR, a dívida acumulada do ano em curso estava avaliada, até há três semanas, coincidentemente, em cerca de dois mil milhões de dólares.

A garantia do financiamento é, no entanto, um dos destaques, se se tiver em conta que, durante 2016, a empresa teve dificuldade de adquirir financiamentos devido aos incumprimentos.

“A Sonangol tem vindo a honrar o pagamento das prestações mensais referentes à sua dívida financeira aos bancos. No entanto, o incumprimento por parte da Sonangol em 2015 dos convénios financeiros (outras condições contratuais) com os bancos resultou num conjunto de constrangimentos, sobretudo limitando o acesso ao financiamento que estava programado para 2016. A dívida financeira da empresa para 2016 está estimada em 9.851 milhões USD (nove mil oitocentos e cinquenta e um milhões)”, informou a administração de Isabel dos Santos.

O primeiro ano de Isabel dos Santos na Sonangol

O conselho de administração da Sonangol, liderado por Isabel dos Santos, foi nomeado em Junho de 2016, num clima de incertezas sobre a legalização e ou não na nomeação da empresária para desempenhar o cargo de PCA, bem como sobre a sua (in)capacidade de emprestar à petrolífera a robustez económica de outrora.

Era assim impossível atribuir-lhes todos os méritos e fracassos de 2016 pelo que se aguardavam pelos resultados de 2017 para a sua avaliação efectiva. No entanto, os primeiros meses de actividade deram sinais de vitória aos que apostavam todas as cartas a favor de Isabel dos Santos. Muitos acreditavam ser a pessoa certa para desbloquear alguns dossiers que se entendiam urgentes.

A autorização do Executivo, em despacho presidencial de 5 de Julho de 2016, para a petrolífera alterar o contrato de partilha de dois blocos no sentido de os tornar viáveis foi uma das decisões que serviram como exemplo para mostrar a influência que teria Isabel dos Santos para a resolução dos referidos dossiers. Muitas foram as decisões tomadas nos primeiros dias. Foi também aplaudida ao suspender, em Julho, a venda de todos os activos da empresa.

Em Dezembro de 2016, no seu primeiro balanço sobre o ponto de situação do Programa de Transformação da Sonangol, a administração declarou ter encontrado uma situação “bastante mais grave do que o cenário inicialmente delineado, obrigando a decisões de gestão com carácter de urgência”.

Em termos financeiros, o documento informou que a petrolífera se encontrava em situação de incumprimento, o que dificultava o acesso a novos financiamentos.

Portanto, Isabel dos Santos teve o mérito de assumir o cenário de quase falência técnica da empresa, desmentido pela anterior administração, depois de lhe ser atribuída a autoria de um relatório que dava conta de um cenário semelhante ao que a actual administração tornou oficial.

O relatório e contas da empresa referente ao exercício e 2016, de resto, mostra que, nesse ano, a perolífera não beneficiou de qualquer financiamento bancário internacional.

Uma aposta resolvida pelo anterior Ca

Reduzir para menos de 10 dólares o custo de produção do barril de petróleo no país foi uma das principais apostas assumidas pela administração de Isabel dos Santos, aquando da tomada de posse. Desafio ambicioso, considerando os 14,75 dólares por barril que era a referência, desde a apresentação do relatório e contas de 2014. Entretanto, a proeza de diminuir para 8,08 dólares coube, ainda, à administração de Francisco de Lemos, segundo relatório e contas da empresa referente ao exercício de 2015. À administração de Isabel dos Santos baixou, posteriormente, para sete dólares.

Cancelamento ?de negócios… E os ricos

Outra decisão que pode servir para reforçar a ideia de existir ainda indecisão sobre a gestão da administração liderada por Isabel dos Santos tem que ver com a suspensão do contrato que visava a compra de dois activos petrolíferos à americana Coblat. Assinado em Agosto de 2015, o negócio estava avaliado em cerca de 1,75 mil milhões de dólares. Entretanto, em Agosto de 2016, as partes anunciaram a desistência da Sonangol e a possibilidade de os 40% dos blocos 20 e 21 serem comercializados a uma terceira entidade. Faltavam poucos dias para o terminar o prazo de vigência do referido contrato. Muitos acreditavam que a Cobalt não conseguiria efectuar a venda no referido prazo tal como veio a acontecer, cenário semelhante aos dias de hoje. Sequencialmente, a Cobalt Internacional recorreu à arbitragem da Câmara de Comércio Internacional (ICC na sigla inglesa), reclamando uma compensação de dois mil milhões de dólares à petrolífera nacional, devido à anulação de um negócio de 1,75 mil milhões de dólares. O referido cenário comprometeu ou pelo menos deixou em ‘stand by’ os aplausos que a decisão de desistência do negócio mereceu na altura face à avaliação do mesmo no actual cenário económico.

Mas não é tudo. A Sonangol poderá ter de pagar à petrolífera norte-americana outros 174 milhões de dólares, acrescido dos devidos juros relativos a dividendos da exploração com a Sonangol Pesquisa e Produção do bloco 21.

Outra suspensão perigosa que tem estado a embaraçar a Sonangol tem que ver com a com o cancelamento dos concursos públicos para a licitação de Blocos da Zona Terrestre das Bacias do Kwanza (KON 5, KON 6, KON 8, KON 9 e KON 17) e do Baixo Congo (CON 1, CON 5 e CON 6). Um processo iniciado em 2007 e visava proporcionar aos empresários e empresas angolanas, oportunidades para se desenvolverem com a actividade do Upstream. No entanto, fontes familiares ao processo garantem que a suspensão do processo é compreensível, visto que o mesmo foi elaborado com o preço de referência de 80 dólares e a baixa do preço do petróleo exigia a revisão dos acordos que careciam também da aprovação do Ministério das Finanças que, no entanto, não respondeu a tempo a solicitação da Sonangol.

FINANCIAMENTO. É o segundo relatório, em menos de um mês, a adiantar números do financiamento chinês para África. Ambos colocam Luanda entre os principais destinos, mas pecam por defeito quando comparados aos 50 mil milhões USD adiantados pelo embaixador chinês em Angola.

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O valor acumulado do financiamento chines a Angola, entre 2000 e 2017, está avaliado em cerca de 19,3 mil milhões de dólares, segundo cálculos do VALOR com base nos dados do relatório ‘China-África: O Casamento da Conveniência Vai Durar?’ da FOCAC (Fórum sobre Cooperação China-África), publicado recentemente.

“De acordo com os números compilados pela SAIS-CARI (Iniciativa de Pesquisa em África da China da Escola de Estudos Internacionais Avançados da Universidade Johns Hopkins), Angola foi o maior beneficiário do empréstimo destinado para o petróleo, entre 2000 e 2017. Mas representa 21% do empréstimo acumulado de 92 mil milhões de dólares entre 2000 e 2017”, lê-se no documento.

O valor passa, desta feita, a fazer parte dos vários números disponíveis e utilizados, entre oficiais e oficiosos, para estimar o financiamento chinês e, sequencialmente, a dívida de Angola para com o gigante asiático. No entanto, os números do relatório pecam, por defeito, se comparados aos 50 mil milhões de dólares, adiantandos recentemente pelo embaixador chinês em Angola, Cuim Aimim, numa entrevista à TPA.

Os cerca de 19,3 mil milhões de dólares estão, entretanto, muito próximos dos 16,6 mil milhões de dólares fixados pela unidade de investigação AidData, da universidade norte-americana de William & Mary, num trabalho tornado público em Outubro último. O mesmo coloca Angola como o terceiro destino do financiamento chinês no mundo, superado apenas pela Rússia e Paquistão no período entre 2000 e 2014. Os acordos tornados públicos oficialmente mostram que as duas investigações pecam, no entanto, por defeito.

Um dos maiores destinos do dinheiro chinês

A investigação da FOCAC coloca, por sua vez, Angola como o principal beneficiado do financiamento chinês na África Subsaariana (objecto de estudo do relatório), seguindo-se a Etiópia com 14,2% e o Quénia com 7,4%. Sudão com 7,0%, Camarões com 4,0% e a Nigéria com 3,8% colocam-se nas posições imediatas.

“A ajuda da China a África abrange uma ampla gama de campos, como agricultura, educação, transportes, energia, comunicações e saúde. Em termos sectoriais, os transportes e os serviços públicos (energia e água) representam a parte do leão (32% e 28%, respectivamente); seguido pela mineração e comunicação”, adianta.

No que diz respeito à relação entre Angola e a China, o documento lembra que, apesar de Angola ser um dos principais fornecedores da China mesmo antes de 2002, “a relação transcendeu os fluxos comerciais alguns meses depois de Beijing aprovar um empréstimo de dois mil milhões para Angola”.

Lembra que, na sequência do referido acordo, a Sonangol e a Sinopec (um dos produtores chineses de petróleo e gás) rubricaram uma parceria no sentido de facilitar “a estrutura de negócios”, também conhecida como “recursos por infra-estrutura”, no qual o reembolso de empréstimos para desenvolvimento de infra-estrutura concedido pela China é feito em termos de exportações de petróleo bruto.

O relatório sublinha que o referido modelo se tornou “uma referência para outros mercados emergentes em África e não só”, sublinhando que “a queda nos preços do petróleo em 2014 atingiu o relacionamento bilateral com dureza”, viso que “o comércio entre os dois países foi mais do que reduzido pela metade” em termos financeiros, apesar de as exportações em volume se manterem com tendência de aumento.

“O petróleo mais barato levou a um aumento nas exportações angolanas para a China para um recorde de 872 mil bpd em 2016. Os dados mensais da China Customs indicam que Angola está preparada para superar esse recorde em 2017, visto que exportou uma média de 1 milhão bpd entre Janeiro e Agosto de 2017. No entanto, o aumento dos volumes de exportação não compensou a queda nos preços do petróleo em relação ao seu pico de 2014. Este aumento também pode ser de curta duração, especialmente se o governo chinês decidir restringir as importações para enfrentar o excesso de capacidade no sector de refinação.”

Entre as várias conclusões, o relatório sublinha que as exportações angolanas têm uma forte dependência do mercado chinês, atribuindo ao país um índice de dependência de 0,8 numa escala de 0 a 1 onde 1, representa uma dependência completa.

FINANCIAMENTO. É uma das possíveis soluções para a liquidação da dívida resultante do financiamento do projecto.

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A entrada do Estado na estrutura acionista da Fabrica de Cimento do Kwanza-Sul é uma das possíveis vias para a resolução da dívida da empresa para com o Estado, segundo resposta do ministério das Finanças ao pedido de esclarecimento do Valor sobre o estágio da liquidação do valor do financiamento do projecto. Esta é uma das três possibilidades aprovadas em Conselho de Ministro, no passado mês de Fevereiro, segundo o Ministério das Finanças.

“Sobre este assunto, incube-nos assinalar que foi aprovado, em Conselho de Ministro, em Fevereiro último, um relatório sobre a análise do quadro actuação e condições de viabilidade da fábrica de ciumento do Kwanza-Sul onde se sugere alguns cenários para a revisão da componente de financiamento”.

Segundo o Ministério das Finanças, além da “participação qualificada do Estado na estrutura accionista da empresa” consta das possibilidades o “reforço de capital dos actuais accionistas privados”, bem como “o Estado assumir a participação total no capital da empresa”.

“Assim, o Conselho de Ministro recomendou que o Estado assume formalmente as suas participações e coloque parte destas (50%) à disposição de investidores privados para assegurar o normal funcionamento e viabilidade da fábrica”, informa o ministério das Finanças.

A dívida em causa tem que ver com o financiamento para a construção da fábrica de cimento do Kwanza Sul que terá sido assegurado pela Sonangol junto do consórcio internacional que foi financiador do projecto. “O projecto de construção da Fábrica de Cimento do Kwanza-Sul beneficiou de um financiamento internacional, que foi intermediado pela Sonangol.

Em respeito à confidencialidade contratual este facto não foi pela empresa divulgado, porém a Sonangol informou à FCKS, em 2014 que havia passado a dívida para o Estado. Por conseguinte, a Sonangol não mais é credora da FCKS, o que é facilmente constatável através nos seus relatórios de análise de contas”, reagiu, no dia 3 de Novembro, a direcção da empresa a um comunicado da Sonangol onde a petrolífera reclamava o direito de entidade credora.

“É de ter em conta que a FCKS é uma unidade fabril que produz cimento, construída em 2010 e cuja totalidade da obra, que ascendeu ao valor de 750 milhões USD, foi financiada na íntegra pela Sonangol.

Este valor encontra-se totalmente em dívida para com a petrolífera nacional, acrescido ainda de juros no valor de 54 milhões USD, não tendo sido reembolsada, até a data, nenhuma das prestações já vencidas”, reclamara a Sonangol.