César Silveira

César Silveira

Editor Executivo do Valor Económico

SECTOR PETROLÍFERO. Alteração impunha-se pela desactualização dos referenciais em vigor e pela necessidade de tornar o mercado mais atractivo para novos investimentos, segundo o secretário de Estado dos Petróleos, Paulino Jerónimo, que admite também o risco de importação de petróleo bruto.

 segurancas da sonangol ameacam greve 1491684801 b

A obrigatoriedade de as petrolíferas solicitarem à Sonangol a aprovação para adjudicação de prestação de serviço deixa de estar fixada nos contratos de 750 mil e passa para cinco milhões de dólares, segundo o decreto que estabelece as regras para os concursos públicos de prestação de serviço no sector.

Aprovado em Conselho de Ministros, na semana passada, o documento altera também os valores que obrigam a realização de concursos públicos. Na lei em vigor, os contratos de até 250 mil dólares estavam isentos da apreciação da Sonangol e da realização de concurso público e para os que vão de 250 para 750 mil dólares as empresas estão obrigadas a realizar concursos, mas dispensam a autorização da concessionária.

À luz do documento aprovado, as companhias passam a estar obrigadas à realização de concurso público, sem precisarem da aprovação da concessionária para os contratos avaliados entre um e cinco milhões de dólares.

A referida alteração tem estado a provocar preocupação no seio dos prestadores de serviço nacionais por acreditarem que pode causar retrocessos ao conteúdo local. Hilário Fortunato, presidente da associação das empresas geofísicas e de apoio ao sector petrolífero, por exemplo, considera “descabida” e “uma tentativa de usurpação da soberania”.

O secretário de Estado dos Petróleos, Paulino Jerónimo, falando ao VALOR, garantiu que se vai acautelar a protecção do conteúdo local, através de regulamentos que estão a ser trabalhados pela Sonangol, mas defende a necessidade de as empresas nacionais serem “mais eficientes”.

“Vou dar um exemplo, os contratos prevêem que, num concurso público, os preços das empresas nacionais podem estar 10% acima do preço das empresas estrangeiras, mas, infelizmente, quando submetem as propostas, estão acima em 30% a 40%”, critica.

Para Jerónimo, a alteração impunha-se, visto que as referências em vigor foram estabelecidas há mais de três décadas e estão “desactualizadas”. Acrescentou que, na altura, perfurar um poço em águas rasas, em Cabinda, custava entre seis e oito milhões de dólares contra os actuais mais de 100 milhões de dólares.

“Por outro lado, os contratos que entram na Sonangol para pedido de aprovação abaixo de cinco milhões de dólares constituem 75% do número total de contratos, no entanto só correspondem a 8% dos montantes em dólares, o que quer dizer que não há grandes riscos”, explica.  

 Licitações em menos tempo

Outro documento aprovado é sobre a obtenção de qualidade de associada da Concessionária Nacional que reduz os prazos de licitação de concessões de 14 para sete meses. “Um estudo comparativo mostra que, noutros países, como o Brasil e o México, as licitações têm a duração de mais ou menos seis meses”, explicou o governante, perspectivando “maior interesse” por parte das companhias na participação nos concursos de licitação, visto que estas “têm sempre receio de se colocarem em concursos que nunca mais terminam”.

Paulino Jerónimo garante existirem condições técnicas para o cumprimento dos prazos ora propostos. “Foi tudo muito bem analisado. Não há, por exemplo, motivos para solicitar-se 70 dias para casos que podem ser resolvidos em 30. Reduzimos os prazos, principalmente na nossa análise interna, era muito extensiva. Precisamos de fazer um esforço interno, temos de trabalhar mais e foi essencialmente aqui onde ganhamos tempo”, explicou. Referiu, como exemplo, a demora nos processos de licitações dos blocos on-shore, iniciado em 2014 e cancelado em 2016. Um desfecho que tem sido condenado pelas empresas, visto que relançaria a actividade petrolífera e, sequencialmente, dinamizaria as empresas, como defende Horácio Fortunato que acusa a anterior administração da Sonangol de, a determinada altura, desviar o espírito do projecto que visava a introdução de empresas nacionais na actividade de exploração e produção, visto que a Sonangol assumiria o risco de exploração e licitaria às empresas apenas em caso de serem positivos (ver entrevista).

Paulino Jerónimo garante que o documento aprovado também vai permitir o lançamento do concurso público para os blocos reclamados e ainda que se vai manter o espírito do projecto cancelado, lembrando que em apenas cinco dos 15 blocos a Sonangol assumiria os riscos por conta das empresas nacionais.

 Liberados poços nas zonas de desenvolvimentos

O Conselho de Ministro analisou e aprovou ainda a exploração, dentro das áreas de desenvolvimento, que vai permitir que as operadoras façam novos furos em zonas que já estejam em desenvolvimentos, o que é proibido actualmente. Uma alteração que, segundo Paulino Jerónimo, poderá proporcionar novas descobertas.

“Há um grande potencial e acreditamos que as empresas vão começar a apresentar as propostas de prospecção destes poços”, referiu, sublinhando que os custos destes investimentos só serão recuperáveis em caso de a descoberta for positiva. Ou seja, as operadoras farão os furos por sua conta e risco e apenas em caso de sucesso recuperam o investimento.

“As operadoras queriam que os custos fossem recuperáveis, mas nós não cedemos porque senão ficariam a furar e nós a pagar”, argumentou para depois usar o caso como prova de que não têm estado apenas a ceder às exigências das operadoras, como determinadas correntes defendem.

“Aconteceram discussões calorosas e o que as operadoras queriam não é o que foi aprovado. Há aqueles casos de menos monta em que cedemos, mas o que está aprovado é o que achamos que seja melhor para o país”, argumentou, acrescentando que grande parte das medidas já estavam a ser trabalhadas, há mais de três anos, e seriam aprovadas mais tarde ou mais cedo.

Também foi aprovado o procedimento de incentivo para as descobertas marginais e o governante acredita estarem as condições criadas para se relançar a actividade de exploração paralisada desde 2011. E admite haver o risco de importação de petróleo bruto para sustentar as refinarias.

“Há este risco, por isso mãos à obra. Os incentivos fiscais e as descobertas marginais vão permitir que mais de 30 ou 40 projectos entrem em desenvolvimento, o que vai significar mais petróleo dentro de três ou cinco anos para evitar esta situação”, prevê.

O secretário de Estado defende que estas alterações se impunham para melhorar a actratividade do mercado, sobretudo devido ao surgimento de outros players no continente. “Se olharmos para o mapa de óleo de África, vamos ver as grandes diferenças. Há 20 anos, éramos nós, Congo Brazzaville, Gabão e Nigéria, mas hoje, ao longo de toda costa, há produtores. Inclusive a África do Sul está a fazer grandes prospecções. Na prática, grande parte das empresas não abandonariam o país porque fizeram grandes investimentos que só são recuperáveis ao longo do tempo, mas deixariam de fazer novos investimentos.” Além dos documentos com impacto directo na exploração e produção foi ainda aprovado o regime jurídico de abandono de poços e desmantelamento de instalações de petróleo e gás.

SECTOR PETROLÍFERO. Alteração impunha-se pela desactualização dos referenciais em vigor e pela necessidade de tornar o mercado mais atractivo para novos investimentos, segundo o secretário de Estado dos Petróleos, Paulino Jerónimo, que admite também o risco de importação de petróleo bruto.

Sonangol

A obrigatoriedade de as petrolíferas solicitarem à Sonangol a aprovação para adjudicação de prestação de serviço deixa de estar fixada nos contratos de 750 mil e passa para cinco milhões de dólares, segundo o decreto que estabelece as regras para os concursos públicos de prestação de serviço no sector.

Aprovado em Conselho de Ministros, na semana passada, o documento altera também os valores que obrigam a realização de concursos públicos. Na lei em vigor, os contratos de até 250 mil dólares estavam isentos da apreciação da Sonangol e da realização de concurso público e para os que vão de 250 para 750 mil dólares as empresas estão obrigadas a realizar concursos, mas dispensam a autorização da concessionária.

À luz do documento aprovado, as companhias passam a estar obrigadas à realização de concurso público, sem precisarem da aprovação da concessionária para os contratos avaliados entre um e cinco milhões de dólares. A referida alteração tem estado a provocar preocupação no seio dos prestadores de serviço nacionais por acreditarem que pode causar retrocessos ao conteúdo local. Hilário Fortunato, presidente da associação das empresas geofísicas e de apoio ao sector petrolífero, por exemplo, considera “descabida” e “uma tentativa de usurpação da soberania”.

O secretário de Estado dos Petróleos, Paulino Jerónimo, falando ao VALOR, garantiu que se vai acautelar a protecção do conteúdo local, através de regulamentos que estão a ser trabalhados pela Sonangol, mas defende a necessidade de as empresas nacionais serem “mais eficientes”. “Vou dar um exemplo, os contratos prevêem que, num concurso público, os preços das empresas nacionais podem estar 10% acima do preço das empresas estrangeiras, mas, infelizmente, quando submetem as propostas, estão acima em 30% a 40%”, critica.

Para Jerónimo, a alteração impunha-se, visto que as referências em vigor foram estabelecidas há mais de três décadas e estão “desactualizadas”. Acrescentou que, na altura, perfurar um poço em águas rasas, em Cabinda, custava entre seis e oito milhões de dólares contra os actuais mais de 100 milhões de dólares.

“Por outro lado, os contratos que entram na Sonangol para pedido de aprovação abaixo de cinco milhões de dólares constituem 75% do número total de contratos, no entanto só correspondem a 8% dos montantes em dólares, o que quer dizer que não há grandes riscos”, explica.

LICITAÇÕES EM MENOS TEMPO

Outro documento aprovado é sobre a obtenção de qualidade de associada da Concessionária Nacional que reduz os prazos de licitação de concessões de 14 para sete meses. “Um estudo comparativo mostra que, noutros países, como o Brasil e o México, as licitações têm a duração de mais ou menos seis meses”, explicou o governante, perspectivando “maior interesse” por parte das companhias na participação nos concursos de licitação, visto que estas “têm sempre receio de se colocarem em concursos que nunca mais terminam”.

Paulino Jerónimo garante existirem condições técnicas para o cumprimento dos prazos ora propostos. “Foi tudo muito bem analisado. Não há, por exemplo, motivos para solicitar-se 70 dias para casos que podem ser resolvidos em 30. Reduzimos os prazos, principalmente na nossa análise interna, era muito extensiva. Precisamos de fazer um esforço interno, temos de trabalhar mais e foi essencialmente aqui onde ganhamos tempo”, explicou.

Referiu, como exemplo, a demora nos processos de licitações dos blocos on-shore, iniciado em 2014 e cancelado em 2016. Um desfecho que tem sido condenado pelas empresas, visto que relançaria a actividade petrolífera e, sequencialmente, dinamizaria as empresas, como defende Horácio Fortunato que acusa a anterior administração da Sonangol de, a determinada altura, desviar o espírito do projecto que visava a introdução de empresas nacionais na actividade de exploração e produção, visto que a Sonangol assumiria o risco de exploração e licitaria às empresas apenas em caso de serem positivos (ver entrevista).

Paulino Jerónimo garante que o documento aprovado também vai permitir o lançamento do concurso público para os blocos reclamados e ainda que se vai manter o espírito do projecto cancelado, lembrando que em apenas cinco dos 15 blocos a Sonangol assumiria os riscos por conta das empresas nacionais.

LIBERADOS POÇOS NAS ZONAS DE DESENVOLVIMENTOS

O Conselho de Ministro analisou e aprovou ainda a exploração, dentro das áreas de desenvolvimento, que vai permitir que as operadoras façam novos furos em zonas que já estejam em desenvolvimentos, o que é proibido actualmente. Uma alteração que, segundo Paulino Jerónimo, poderá proporcionar novas descobertas.

“Há um grande potencial e acreditamos que as empresas vão começar a apresentar as propostas de prospecção destes poços”, referiu, sublinhando que os custos destes investimentos só serão recuperáveis em caso de a descoberta for positiva. Ou seja, as operadoras farão os furos por sua conta e risco e apenas em caso de sucesso recuperam o investimento.

“As operadoras queriam que os custos fossem recuperáveis, mas nós não cedemos porque senão ficariam a furar e nós a pagar”, argumentou para depois usar o caso como prova de que não têm estado apenas a ceder às exigências das operadoras, como determinadas correntes defendem. “Aconteceram discussões calorosas e o que as operadoras queriam não é o que foi aprovado. Há aqueles casos de menos monta em que cedemos, mas o que está aprovado é o que achamos que seja melhor para o país”, argumentou, acrescentando que grande parte das medidas já estavam a ser trabalhadas, há mais de três anos, e seriam aprovadas mais tarde ou mais cedo.

Também foi aprovado o procedimento de incentivo para as descobertas marginais e o governante acredita estarem as condições criadas para se relançar a actividade de exploração paralisada desde 2011. E admite haver o risco de importação de petróleo bruto para sustentar as refinarias. “Há este risco, por isso mãos à obra. Os incentivos fiscais e as descobertas marginais vão permitir que mais de 30 ou 40 projectos entrem em desenvolvimento, o que vai significar mais petróleo dentro de três ou cinco anos para evitar esta situação”, prevê.

O secretário de Estado defende que estas alterações se impunham para melhorar a actratividade do mercado, sobretudo devido ao surgimento de outros players no continente. “Se olharmos para o mapa de óleo de África, vamos ver as grandes diferenças. Há 20 anos, éramos nós, Congo Brazzaville, Gabão e Nigéria, mas hoje, ao longo de toda costa, há produtores. Inclusive a África do Sul está a fazer grandes prospecções. Na prática, grande parte das empresas não abandonariam o país porque fizeram grandes investimentos que só são recuperáveis ao longo do tempo, mas deixariam de fazer novos investimentos.”

Além dos documentos com impacto directo na exploração e produção foi ainda aprovado o regime jurídico de abandono de poços e desmantelamento de instalações de petróleo e gás.

NEGÓCIOS. Seguradora Saham e a Sociedade Mineira de Catoca também fazem parte da lista das 500 melhores empresas do continente. Ausência de destaque vai para a Total Angola, considerando a presença de algumas das suas congéneres.

IMG 2301

A Sonangol passou de segunda para a terceira maior empresa de África, no ‘ranking’ de 2018 das 500 maiores empresas do continente da revista África Report, publicado recentemente, com base no desempenho de 2016.

O estudo que se baseia, entre outros itens, no volume de negócio, acções de responsabilidade social, número de empregos e importância das empresas para a economia dos respectivos países, destaca os vários investimentos que a petrolífera tem noutros sectores e fixa em mais de 14 mil milhões de dólares o seu volume de negócios.

“É principalmente responsável pela exploração, produção, fabrico, transporte e comercialização de hidrocarbonetos, mas possui mais de 30 subsidiárias, que basicamente trabalham para ajudar a Sonangol a atingir as suas necessidades. Estas incluem empresas de telecomunicações, ferrovias, sistemas de transporte e instalações de refinaria localizadas em todo o mundo. Também é um importante patrocinador das artes, desportos e humanidades em Angola e em África”, descreve o estudo.

A liderar o Top500 está a Sonatrach, a congénere argelina da petrolífera nacional, com negócios avaliados em 30,2 mil milhões de dólares, ao passo que a segunda posição é da sul-africana Steinhoff International Holdings, que opera na madeira e papel, com um volume de negócios avaliado em mais de 17 mil milhões de dólares.

Sobre a Sonarach, o relatório destaca que “é a maior empresa argelina e africana e o 11.º maior consórcio de petróleo do mundo”, assim como as concessões que possui na Líbia, Mauritânia, Peru, Iémen e Venezuela.

Entre as características, destaca-se a concentração dos negócios no segmento do petróleo e gás. “A empresa, que emprega mais de 120 mil trabalhadores, produz 30% do PNB da Argélia. As suas actividades diversificadas abrangem todos os aspectos da produção: exploração, extracção, transporte e refinação. Diversificou-se em petroquímica e dessalinização de água do mar. A Sonatrach está actualmente a expandir o oleoduto Hassi Messaoud-Azrew, o mais longo do país”, sublinha o relatório.

Nos próximos anos, de resto, a Sonangol também deverá ter o seu negócio concentrado no petróleo e gás, segundo as informações preliminares sobre o projecto de reformulação do sector que está em elaboração e, sobretudo, pelo consenso existente de ser o melhor modelo.

Saham entra, Catocamelhora posição

Pela primeira vez, desde 2007, três empresas angolanas constam do ‘ranking’ das 500 maiores empresas do continente. Depois de, nos anos anteriores, a Sociedade Mineira de Catoca passar a fazer companhia à Sonangol, no último ‘ranking’, a seguradora Saham juntou-se às duas. Aparece na posição 496 com um volume de negócios avaliado em 173 milhões de dólares.

Por sua vez, a diamantífera surge na posição 208 com um volume de negócio de 593,6 milhões de dólares. E, contrariamente à Sonangol, tem melhorado a posição, visto que, em 2014, apareceu na posição 243.ª, depois de ter estado na 261.ª em 2013.

Total Angola superadapelas congéneres

Entre as 500 maiores empresas do continente, é notória a ausência da Total Angola, considerando a presença de algumas das suas congéneres. E, sobretudo, por ter, no país, um dos seus maiores activos a nível mundial, o bloco 17 com uma produção diária de cerca de 700 mil barris por dia. Encontram-se no ‘ranking’ as filiais da empresa francesa na Nigéria, Quénia, Marrocos, Senegal, Gana e Costa do Marfim.

Metodologia

A revista África Report, proprietária do grupo de média tunisino Jeune Afrique, apresenta, anualmente, em Fevereiro, o relatório, baseando-se nos resultados das empresas do ano que antecede ao imediatamente findo. Ou seja, o ‘ranking’ de 2018 considera os dados de 2016. A revista tem uma base de dados com mais de 12 mil empresas e envia questionários para todas ou perto disso. Cruzam as informações e estabelecem um ‘ranking’ com as principais 1.995 empresas africanas e as primeiras 500 são publicadas. Para permitir a comparação, aplicam as mesmas regras no tratamento das informações.

Os dados financeiros devem ter uma fonte claramente definida, geralmente comunicada pelas próprias empresas. Se os resultados forem apresentados na moeda local, são convertidos em dólares com a taxa vigente a 31 de Dezembro do ano em análise. As empresas que fazem parte do ‘ranking’, se ficarem dois anos sem responder aos questionários, são eliminadas da base de dados.

TRANSPARÊNCIA. País alcança mais um ponto em direcção aos menos corruptos do mundo, mas ainda está longe de deixar o grupo dos menos transparentes. Está com 19 pontos dos 100 possíveis, enquanto Cabo Verde, o melhor dos PALOP, está com 55 pontos.

branqueamento capitais201607158721

 

Angola continua em situação procária no ‘ranking’ dos países mais corruptos do mundo, mas registou uma ligeira melhoria na lista da Transparência Internacional sobre corrupção, passando dos 18 para os 19 pontos, numa escala até 100.

A pontuação do ‘ranking’ varia de zero a 100, sendo zero a atribuição para os países mais corruptos e 100 para os menos, o que demonstra que a situação no país ainda impõe inúmeros desafios quando comparado, por exemplo, aos 89 da Nova Zelândia, considerado o menos corrupto do mundo. Ao mais corrupto do mundo, a Somália, o ‘ranking’ atribui nove pontos.

Desde 2012, a melhor pontuação de Angola foi a de 23, alcançada em 2013, seguindo-se 22 em 2012. A pior foi 15, de 2015, e 18, de 2016, enquanto a pontuação de 2017 iguala a de 2014 de 19. Cabo Verde, que é o PALOP mais bem posicionado (48ª), tem 55 pontos, enquanto São Tomé e Príncipe tem 46 e Moçambique 25. A Guiné-Bissau é o pior com 17 pontos.

A melhoria de pontuação de Angola é destaque, sobretudo pelo facto de grande parte dos países registar uma retracção. Por exemplo, entre os 10 países menos corruptos, apenas o Reino Unido e Luxemburgo melhoraram as respectivas pontuações, ambos passaram de 81 para 82 pontos. Por sua vez, Canadá, Singapura e Noruega mantiveram as pontuações de 82, 84 e 85.

Outra melhoria do país nota-se ao contar o ‘ranking’ de baixo para cima, ou seja, do país mais corrupto para o menos transparente. Melhorou um lugar, ao passar de 13.ª para 14.ª posição dos mais corruptos do mundo. Uma melhoria considerável se comparado à posição de sexto país mais corrupto do mundo de 2015.

Angola alcançou, em 2013, a melhor posição dos últimos cinco anos quando foi classificado como 25.º mais corrupto do mundo. Situava-se, inclusive, melhor que a República Democrática do Congo que, nos últimos anos, aparece sempre numa condição de menos corrupto. O actual quadro mantém, entretanto, Angola como o mais corrupto da SADC.

Se a contagem começar do país menos corrupto do mundo, a posição de Angola piora, entretanto, já que se afasta três posições dos países menos corruptos ao passar da 164 de um total de 176 países para 167 de um total de 180. A posição que colocou Angola mais próximo dos menos corruptos foi a 153, alcançada em 2013.

Diversos especialistas acreditam que Angola pode alcançar níveis melhores no próximo ‘ranking’, considerando as decisões do Executivo de combater a corrupção e outras práticas similares. Depois de eleito, João Lourenço deu sinais de pretender efectivar uma das promessas de bandeira da campanha eleitoral do MPLA: o combate à corrupção.

Alguns sinais são a criação da proposta de lei para o repatriamento de capitais no estrangeiro, aprovadana generalidade na semana passada, pela Assembleia Nacional, assim como a exoneração de Carlos Panzo, alguns dias depois de ter sido nomeado para o cargo de secretário para os Assuntos Económicos, por estar a ser investigado.

A estes factos ainda se pode juntar a realização pelo MPLA de um seminário sobre os desafios do combate à corrupção e ao nepotismo, assim como a rescisão de contratos que o Estado detinha com várias empresas privadas por considerar que não respeitaram a Lei da Contratação Pública.

No entanto, existe consenso de que ainda faltam muitos passos como é, por exemplo, a criação de condições à altura dos desafios para as instituições como a Procuradoria-geral da República e os Serviços de Investigação Criminal. Existe, por outro lado, uma expectativa à volta da efetivação da Alta Autoridade contra a Corrupção, órgão criado em 1996, mas que nunca passou do papel.

Todos fizeram pouco

O estudo concluiu que a maioria dos países está a fazer pouco ou nenhum progresso para combater a corrupção e ainda que existe um maior perigo de vida dos jornalistas e activistas que se dedicam a denunciar actos de corrupção. Globalmente, a região de melhor desempenho é a Europa Ocidental, com uma pontuação média de 66. As regiões com pior desempenho são a África Subsaariana (pontuação média de 32) e Europa Oriental e Ásia Central (pontuação média de 34).

DIPLOMACIA. Assim como os números que caracterizam as trocas comerciais entre os dois países, a confiança e a solidariedade devem ser postas na balança quando analisada a relação bilateral. Só com os emigrantes, os sistemas financeiros movimentam anualmente mais de 200 milhões de euros por ano.

28235777 1882389378438827 1559190358 n

Apesar da impossibilidade de se sustentar com números, é consenso que muitos angolanos e portugueses acompanham, com ansiedade, o julgamento do conhecido ‘caso Manuel Vicente’, em Portugal, cujo desfecho poderá hipoteticamente determinar o futuro das relações entre os dois países.

Não faltam estatísticas nem factos que justifiquem a elevada expectativa e a razão de este interesse não se limita aos meios políticos, diplomáticos e empresariais.

Os motivos vão para além das estatísticas correspondentes às trocas comerciais. Suportam-se também nos factos intangíveis, “como a confiança e a solidariedade, que não se conquistam com os acordos de financiamento entre os estados”, como explica um analista em declarações ao VALOR.

A intervenção de Portugal para que a TAAG fosse autorizada a retomar os voos parcialmente para a Europa, em 2009, depois de ter sido posta na lista negra europeia, em 2007, é para este analista “uma prova” desta confiança e solidariedade.

“O acordo de cooperação e assistência assinado entre as autoridades da aviação civil de Angola e Portugal permitiu à transportadora [TAAG] voar novamente para Portugal apenas com certos aparelhos e segundo condições muito estritas”, anunciava, na altura, a Comissão Europeia.

Reciprocamente, alguns analistas citam operações em que o capital angolano teve de intervir para “salvar” instituições de sectores estratégicos em Portugal. A compra do BPN pelo BIC Portugal, há mais de cinco anos, é mencionada como exemplo disso mesmo, numa altura em que a economia portuguesa era devastada por uma crise sem precedentes e nenhuma outra oferta para o BPN se mostrava “generosa”, como a do BIC, que dava a garantia de preservação de mais de 900 postos de trabalho.

Testemunhas dessa operação, concretizada em 2012, revelam que o accionista Américo Amorim até teria reprovada o negócio, mas acabou convencido pelos seus pares com ligações a Isabel dos Santos e a Fernando Teles e que encaravam o capital angolano “com bons olhos”.

Há mais factos. Embora não existam números concretos, é certeza que os portugueses têm uma presença significativa em quase todos os sectores de actividade no país. Encontram-se nas estruturas operacionais e executivas do ‘top 5’ da banca; comandam os cargos executivos na distribuição, como acontece no Candando, Kero e Maxi, principais ‘players’ do sector, e comandam os gabinetes de engenharia na generalidade da indústria.

As estimativas mais recentes estimam entre 100 e 150 mil portugueses a viver e a trabalhar em Angola e cerca de 20 mil angolanos em Portugal (número que peca por defeito, uma vez que muitos angolanos optaram por adquirir a nacionalidade lusa. Esses números ajudam a explicar a diferença nas remessas enviadas de cada lado.

Em 2016, os portugueses que estão Angola transferiram o correspondente a 205,89 milhões de euros, enquanto os angolanos enviaram 17,54 milhões. Um movimento financeiro de 223,43 milhões de euros, o menor dos últimos três anos, em que a média se situou nos 239,28 milhões de euros. Ou seja, uma ruptura político-diplomática, com consequências nas relações económicas e financeiras, levaria a que os sistemas financeiros dos dois países perderiam um fluxo de mais de 220 milhões de euros relacionados exclusivamente com remessas, com impacto não apenas nos depósitos, mas também nos lucros com os serviços financeiros de transferência. Mas a balança de pagamento entre os dois países aponta para números mais relevantes.

Em 2016, o total corrente fixou-se em 4,1 mil milhões de euros, com a Angola a exportar pouco mais de três mil milhões de euros. A média da balança corrente de pagamento dos últimos três anos está fixada, entretanto, em cerca de 5,6 mil milhões de euros. Desse valor, 195,87 milhões correspondem aos rendimentos de investimento, dos quais 170,15 milhões de portugueses em Angola.

Os dados mais recentes do Banco de Portugal (BdP) revelam que o investimento directo estrangeiro (IDE), de Portugal é quase 7% do IDE feito em Angola. Já o investimento angolano representa pouco mais de 1% dos capitais estrangeiros investidos em Portugal. Os angolanos, entretanto, investem cada vez mais em Portugal. No final do primeiro semestre do ano passado, os números ultrapassavam os 1.757 milhões de euros, mais 3,2% do que no final de 2015.

Entretanto, existem cada vez menos empresas portuguesas a exportar para Angola e também os portugueses investem menos no país. No final do primeiro semestre, Portugal tinha investido 3.693 milhões de euros em Angola, uma quebra de 20,5% face ao final de 2014, quando o investimento em Angola estava em máximos.

‘Portos seguros’

As estatísticas relativas à contribuição que cada um dos países tem para o crescimento do comércio internacional do outro mostram que as duas economias já foram mais dependentes uma da outra. E que, nos últimos anos, Angola vai perdendo a sua importância para o mercado português. O inverso também é verdadeiro, mas de forma menos acentuada.

Por exemplo, depois de ser o quarto maior comprador de Portugal entre 2012 e 2014, Angola passou para a oitava posição em 2016, mantendo-a entre Janeiro e Outubro de 2017. Em termos percentuais passou de uma taxa de 6,61% em 2012 para 3% em 2016 e, nos primeiros d10 meses de 2017, para 3,28%. Como fornecedor, passou da sexta (3,16%) para a 12ª (1,32%), em 2016, e 35ª (0,38%), nos primeiros 10 meses de 2017.

Em relação a Portugal para Angola, enquanto comprador passou de sexto maior (3,02%), em 2012, para oitavo, em 2016, mas viu a sua quota aumentar para 3,27%. Pelo meio, teve anos com maior importância, como foi 2013 em que foi o quinto maior comprador, representando uma taxa de 4,78%. Em 2015, Portugal foi o sétimo maior comprador com uma quota de 3,55%.

Enquanto fornecedor, Portugal, em 2016, colocou-se como o segundo maior, tal como em 2012, 2014 e 2015. O melhor registo ocorreu em 2013, quando se colocou na primeira posição. Em termos de taxa, com 15,62%, em 2016, Portugal foi mais importante que em 2014 e 2015 quando as suas vendas representaram 14,94% e 13,78% respectivamente das compras angolanas.

No entanto, apesar de os números mostrarem que Angola está mais dependente do mercado português tanto para venda como para compra, diversos especialistas defendem que a Angola continua a ser um mercado estratégico para Portugal. Sustentam a tese recordando a importância que teve para as exportações portuguesas os anos difíceis da economia portuguesa, depois de 2008.

A relevância de Angola fica ainda mais clara quando se compara a importância que cada um dos mercados tem para o outro no seio dos Países de Língua Oficial Portuguesa (PALOP). As vendas portuguesas para Angola, no primeiro semestre de 2017, representaram 74,3% do total para o grupo de países que falam português (1,2 mil milhões de euros), enquanto as exportações de Angola para Portugal representam 87,1% do total enviado para os PALOP.

“Hoje testemunha-se a um certo abrandamento nas trocas, mas deve-se, essencialmente à dificuldade no acesso às divisas em Angola, porque, em circunstâncias normais, os dois mercados são atractivos, oferecem muitas vantagens para os vários operadores económicos. São estes números que nos interessam e não as questões políticas e diplomáticas que, acreditamos, não serão suficientes para comprometer esta forte relação económica e de negócio”, argumentou um alto funcionário do AICEP que não quis ser identificado por a sua entrevista carecer de aprovação da ‘casa-mãe’.

Quem não nega que os “atritos políticos” podem criar barreiras nas relações económicas entre os dois países é Emídio Pinheiro, português, que durante vários anos liderou o BFA em representação do BPI. “As relações entre os dois países são muito importantes, muito intensas e tem potencial para se intensificarem ainda mais. É evidente que se houver atritos políticos entre os dois países, pode haver consequências impeditivas nas relações económicas”, salientou numa entrevista recente ao VALOR. Na ocasião, manifestou acreditar num “final desejado para todas as partes” e que a relação entre Angola e Portugal iria “continuar como sempre foi, excelente e calorosa”.

Negócios resistem às crises políticas

Não é a primeira vez que Angola e Portugal se interrogam sobre o futuro das relações económicas, devido a questões políticas. Em Outubro de 2013, por exemplo, o então presidente da República, José Eduardo dos Santos, anunciou o fim da parceria estratégica com Portugal. “Só com Portugal, as coisas não estão bem. Têm surgido incompreensões a nível da cúpula e o clima político actual, reinante nessa relação, não aconselha à construção da parceria estratégica antes anunciada”, disse José Eduardo Santos também na sequência da abertura de inquéritos na Procuradoria-Geral da República portuguesa, visando figuras angolanas.

Na sequência, foi cancelada a cimeira Portugal-Angola que estava para Fevereiro de 2014. A parceria em causa tinha sido desenhada em 2010 num encontro, em Luanda, entre os então presidentes Cavaco Silva e José Eduardo dos Santos. Os dois estadistas entenderam, na altura, que não bastava manter as relações históricas e culturais, baseadas na língua, mas era preciso avançar para uma cooperação estratégica. Facto é que as prioridades e o tempo de implementação nunca foram discutidos.

O ex-‘el dorado’

Em Outubro de 2011, o presidente da Mota-Engil Angola, Gilberto Rodrigues, fazia um balanço positivo da aposta do grupo em Angola. No espaço de um ano, a empresa passou a representar 27% do negócio total do grupo.

Por sua vez, a Barbot Angola passava a representar 10% do negócio do Grupo, segundo estimativa apresentada, na altura, pelo CEO, Carlos Barbot, manifestando o compromisso da marca em “consolidar a sua operação” no país. Em 2011, o mercado angolano passou a valer cerca de 20% da facturação total do grupo. Por sua vez, a Galp Energia anunciava investimentos de mil milhões de euros. A construtora Edifer, que tinha uma carteira de encomendas avaliadas em 300 milhões euros, anunciava o mercado angolano como “prioritário”.