ANGOLA GROWING
César Silveira

César Silveira

Editor Executivo do Valor Económico

SEGURANÇA ALIMENTAR. Operadores responsáveis pelo controlo da qualidade dos produtos alimentares asseguram que o país está mais protegido. Apontam, no entanto, pontos fracos a corrigir, com destaque para as condições de acondicionamento e de manuseio.

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Colocada na 101.ª posição no Índice Geral de Segurança Alimentar deste ano, Angola intensificou o debate sobre a protecção da saúde pública, por via do controlo de qualidade dos produtos alimentares, sobretudo nos últimos seis anos, com a entrada em vigor de um Decreto Presidencial que tornava obrigatória as análises laboratoriais dos alimentos importados à entrada. Amparado pelos elevados níveis de importação no país e pelas melhores práticas internacionais, o Decreto 275/11, de 28 de Outubro, determinava a obrigatoriedade de análises laboratoriais à entrada, tornando ao mesmo tempo facultativas as análises pré-embarques, ou seja, as realizadas no país de importação.

Na altura e nos anos subsequentes, a alteração desencadeou reacções diversas, com os importadores, sobretudo, a sinalizarem a possibilidade de consequências imediatas nos preços sobre o consumidor final, considerando os custos das análises estabelecidos pelo Governo e cobrados pela Bromangol, o laboratório contratado, na altura, pelo Serviço Nacional das Alfândegas, através de um concurso aberto a empresas nacionais e estrangeiras.

Mas vários observadores consultados agora pelo VALOR analisam que, mais do que os receios sobre a alteração de preços, a resistência de vários operadores se explicava, sobretudo, na perspectiva de redução das margens do negócio de importação. Para observadores, as análises laboratoriais perspectivavam a proibição da entrada de toneladas de produtores alimentares eventualmente contaminados que, em circunstâncias diferentes, poderiam ser comercializadas no país, colocando gravemente em risco a saúde pública.

A leitura converge com os factos mencionados pelo laboratório responsável pelas análises laboratoriais dos produtos importados. Em respostas enviadas ao VALOR, a empresa assinala uma “tendência de diminuição” das amostras contaminadas, tanto por contaminantes, como por contaminantes químicos. “Isso reflecte a preocupação do país e dos importadores em trazerem produtos mais frescos, com prazo de validade maior, origem conhecida, melhores condições de transporte entre outros factores que possam afectar a Segurança Alimentar”, analisa a empresa.

Considerado o laboratório mais avançado e com a acreditação internacional mais elevada no país, a Bromangol assinala também, como garantia da melhoria da segurança alimentar em Angola, as alterações no processo de análises laboratoriais aos produtos importados introduzidas pelo Decreto Presidencial 140/16. Ao contrário da norma anterior, o novo regulamento coloca aos importadores a obrigatoriedade de aguardarem pelos resultados das análises, antes de colocarem os produtos no mercado. “É uma questão ultrapassada”, considerava Carla Martins, directora de Processos e Auditoria da entidade, em entrevista ao VALOR em Abril passado.

Pontos fortes e fracos

A indicação da Bromangol sobre a redução de contaminantes nas análises laboratoriais é confirmado pelo laboratório central do Ministério da Agricultura. “Diminui consideravelmente”, declara Ayrlton Fragoso, técnico do departamento de amostras, referindo-se ao número de amostras contaminadas. “No passado, por não haver muito controlo, as pessoas mandavam tudo e mais alguma coisa para Angola. Ainda existem alguns casos, mas reduziu muito”, argumentou.

Por sua vez, Luiz Matos, director do Alimenta Angola, assegura que sempre foram criteriosos na escolha dos fornecedores pelo que não têm históricos de importação e comercialização de alimentos impróprios para o consumo.

“Para evitar quaisquer problemas desse género, seleccionamos somente fornecedores distintos em qualidade, modernidade e com padrão de industrialização controlados por rígidos sistemas de inspecção, o que garante atendimento das legislações internacionais”.

O armazenamento e manuseamento dos produtos é um dos aspectos que deve melhorar, segundo os especialistas.

“Temos uma grande debilidade interna que tem que ver com a questão do acomodar as mercadorias. Temos muitos problemas ligados à questão do armazenamento, sobretudo para os produtos frescos”, adianta o microbiólogo Alcidis Castro (ver entrevista pag. 9).

No entanto, a bióloga Málwa Chaves, afecta ao INADEC assegura que, “comparando ao que acontecia, os prestadores de serviço melhoraram bastante” no que ao armazenamento e manuseamento dos produtos diz respeito.

Sobre esta temática, Luiz Matos assegura que o Alimenta Angola opta pelas melhores práticas, possuindo “instalações adequadas para armazenamento de acordo com padrões internacionais, com áreas específicas para cada tipo de mercadoria, com câmaras individuais de temperatura controlada de 4ºC a 8ºC, outra 12ºC a 16ºC e ainda uma congelada de -18ºC a -22ºC, além do armazém seco para alimentos não perecíveis”. Continuando, admitiu que “o manuseio é, sim, um ponto de controlo, visto que pode alterar as condições dos produtos se houver quebra da cadeia de frio. Para que isso não ocorra, os funcionários são treinados no trato destas mercadorias, cuidando inclusive da temperatura dos expositores”.

Por outro lado, a empresária Elizabete Dias dos Santos que opera no sector avícula e pesca aponta como uma das fraquezas do sistema a não uniformização dos processos de produção.

“Temos debatido muito quer com o Ministério da Agricultura, quer com associação dos produtores nacionais relativamente à necessidade de uma padronização das unidades. Infelizmente, a estrutura que nós usamos para a protecção, quer das espécies animais, como da matéria-prima é diferenciada de outros produtores. Cada um de nós utiliza os seus critérios e sem esta padronização cada um tem a sua realidade e não está em condições de falar das práticas do sector com propriedade. Ainda bem que existem estas situações para que cada um de nós começar a reflectir se não há necessidade desta padronização da nossa actividade.”

Continuando, garantiu que as unidades que dirigem cumprem com os procedimentos exigidos. “Temos laboratórios de análises internos, paralelamente os ministérios que controlam as nossas actividades como é o caso do da Agricultura.

Depois, há uma serie de parceiros estratégicos, temos acordos com laboratórios internacionais que fazem o controlo da nossa actividade. Todos os animais que utilizamos são credenciados, trabalhamos com grupos que têm sempre em atenção a segurança higiene e os cuidados alimentares e temos de estar sempre com os procedimentos que nos são exigidos. Depois, a nível nacional, temos os ministérios de tutelas”.

A fraca cultura do consumidor é outro dos pontos fracos do país, segundo a bióloga Málwa Chaves, sublinhando que os consumidores não têm o hábito de reclamar pelos produtos alimentares e, sequencialmente, o INADEC recebe muito poucas denúncias.

ENTREVISTA. Assegurando que a questão das análises melhorou consideravelmente, nos últimos cinco anos, o técnico afecto ao laboratório do Ministério da Agricultura aponta como maiores fraquezas a questão do transporte, armazenamento e manuseio dos produtos.

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A questão do controlo dos produtos é determinante para a segurança alimentar. Que percepção tem sobre o nível de controlo dos produtos que entram no país?

Hoje em dia, existe um maior controlo a nível dos fornecedores, os importadores têm maiores precauções em termos de solucionar os seus fornecedores. Nos últimos cinco e ou sete anos, a situação melhorou muito, mas agora é necessário percebermos que a questão da segurança alimentar é transversal, ou seja, envolve uma série de sectores. Nós temos laboratórios, apenas a componente analítica, depois temos relação com as entidades que vão tomar decisões no sentido de darem o destino aos produtos que são tidos como impróprios. Em função do maior controlo, temos vindo a registar uma redução drástica dos produtos impróprios. Temos, no entanto, uma grande debilidade interna que tem que ver com a questão do acomodar estas mercadorias. Temos muitos problemas ligados à questão do armazenamento, sobretudo para os produtos frescos. Temos problemas dos choques térmicos, os produtos requerem que sejam conservados a uma determinada temperatura mas depois há alterações.

E qual é a avaliação que faz do desempenho das demais entidades da cadeia?

O facto de os laboratórios darem como próprio à entrada não significa que depois ele não possa estar sujeito a outras contaminações. É preciso que outros intervenham, como é o caso do comércio, para fazer as inspecções sanitárias. É preciso elevar também a cultura do próprio consumidor, não estamos preocupados em adquirir os produtos por itens de qualidade. O desafio do país passa, agora, por implementar aquelas que são as boas práticas tanto para conservar como para manusear conforme acontece noutros países, estaríamos a falar da implantação dos HCCP onde se fazem os controlos dos riscos em todas as etapas a que o elemento está sujeito, desde a produção até à mesa do consumidor.

A produção nacional também tem estado a acompanhar esta evolução a que se referiu?

Esta é uma questão muito importante. Temos estado a ouvir, desde o mais alto nível, a falar-se sobre a necessidade de diversificar a economia o que passa muito pelo investimento a nível da agricultura. Temos estado a assistir a grandes incentivos que vão desde o acompanhamento dos produtores agrícolas, com o melhoramento dos solos, o fornecimento de sementes controladas e fertilizantes. Verificamos que a produção nacional tem estado a crescer. No entanto, é preciso crescer, mas acompanhado com a qualidade. Esta qualidade passa pela implementação das boas práticas de laboração em todas as etapas, como eu dizia, desde as sementes, melhoramento dos solos, água da rega e conservação dos produtos. Nós fazemos análises de legumes, frutas, farinha de milho que já têm sido exportadas. Estamos a caminhar, são alguns passos significativos, mas é um processo. Os desafios ainda são muitos, mas os passos estão a ser dados e já estamos a recolher alguns frutos porque alguns produtos já têm estado a ser exportados para países onde o controlo é maior. Se continuam a ser feitas estas exportações é porque estão dentro dos padrões e é também o nosso trabalho, enquanto parceiros destes produtores a ser reconhecido porque estes produtos, antes de exportados, são analisados cá.

E já têm registos de produtos nacionais impróprios para o consumo?

Prendem-se sobretudo com a questão do acondicionamento porque, em princípio, temos solos favoráveis. Se tivermos sementes seleccionadas e qualitativas, acrescidas ao solo que temos, não temos como os produtos não serem bons. A questão é a logística. É aqui onde temos de nos focalizar. Nesta perspectiva, ainda temos estado a pecar. Ou seja, o nosso problema está na questão das infra-estruturas, do escoamento, por exemplo. Sabemos que, muitas vezes, se produz muito mas há, depois, o problema de como fazer chegar aos consumidores por falta destas infra-estruturas.

Outra preocupação com a produção nacional tem que ver com o uso das sementes geneticamente melhoradas?

O acompanhamento que tem sido feito passa também por controlar as sementes e o tipo de fertilizante. Temos um instituto que trata desta questão das sementes, inclusive as geneticamente modificadas, o Instituto Fitogenético, que está agregado à Universidade Agostinho Neto. Mas as sementes geneticamente melhoradas são um processo normal porque também têm o seu valor nutricional. Mas é necessário olhar-se para os alimentos transgénicos com maior atenção porque estão mais associados aos problemas de saúde, sobretudo a doenças cancerígenas porque, muitas vezes, os produtores estão mais preocupados com o lucro.

Em termos gerais, o que se ouve de técnicos de laboratórios sugere a ideia de que está quase tudo bem. No entanto, volta e meia surgem notícias de produtos impróprios para o consumo no país.

Como disse, é uma questão transversal. Os laboratórios tratam do controlo por via das fronteiras, nem tudo passa via alfandegária. É preciso que se faça também alguma melhoria a nível das fronteiras. Outra questão é do contrabando. É preciso que os outros sectores afins também melhorem, mas não se pode descartar esta possibilidade de entrada de produtos. Todo o cuidado é pouco. O mínimo relaxamento, o produto entra. Importa frisarmos também que, quando o laboratório diz que este produto é próprio ou improprio é em função do lote analisado. Devemos olhar para a dimensão de uma indústria, a produção de lote pode variar. Somos obrigados a fazer análise destes lotes, a princípio, mas, no contrabando, há a questão do adulterado. Pode fazer a mesma embalagem, mas lote diferente, então pode chegar-se a conclusão de ser contrabando devido a esta.

PARCERIA. É o segundo acordo de manutenção entre as duas empresas, depois do assinado em 2010. Administrador da companhia não avança detalhes, mas fala em “acordo normal”.

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A TAAG assinou um acordo válido para cinco anos com a General Electric Aviation para a manutenção, reparação e revisão dos motores CFM56-7B, usados pelas cinco aeronaves do tipo Boeing 737-700 da sua frota, segundo noticiou a GE Aviation no seu portal de internet no passado dia 5.

O acordo é o denominado True Choice e, segundo explicação da companhia, fornece revisões pontuais e material com trabalhos específicos, bem como disponibiliza peças novas e usadas de “alta qualidade, reparos avançados e actualizações tecnológicas para melhorar o desempenho do motor e suportar um maior valor residual do mesmo”.

Sem adiantar o valor do contrato, o documento indica que o responsável pela área de manutenção da TAAG, Robert Bryant, apresenta uma combinação de argumentos para justificar a escolha da GE Aviation que incluem razões técnicas, económicas e históricas.

“Todos os motores das aeronaves Boeing 777 e 737 da TAAG são True Engine, qualificados nos programas GE e CFM. Portanto, é uma progressão lógica para garantir que eles mantêm esse ‘status’ com este acordo de revisão True Choice. A proposta muito competitiva apresentada pela GE Aviation para os motores CFM56, adicionado ao contrato existente entre as duas empresas de manutenção dos motores GE90, combinados com o excelente pacote económico da GE para os próximos cinco anos foram determinantes”, explicou.

Sublinhou ainda que, para a “TAAG atingir o seu objectivo de se tornar a companhia aérea mais proeminente e respeitada em África, é essencial seleccionar parceiros que criem respeito e confiança da indústria”.

Por sua vez, Jean Lydon-Rodgers, presidente e director executivo da organização de serviços da GE Aviation, salienta que o acordo “demonstra que a TAAG continua a confiar nas ofertas de serviços da GE Aviation”. No entanto, o administrador da TAAG, Rui Carreira, evitou entrar em detalhes sobre o acordo, por razões confidenciais. “Não há muitos detalhes para avançar porque são acordos que exigem confidencialidade, mas também são acordos normais. Rescindiu-se com um prestador e foi-se em busca de outro”, respondeu. Com este acordo, a GE Aviation será o fornecedor de serviços para todos os motores GE da TAAG.

Segundo o histórico da relação entre as duas empresas, em Julho de 2010, assinaram um acordo, avaliado em 50 milhões de dólares e válido para um período de 10 anos, para a manutenção, reparação e revisão dos 10 motores GE90 das aeronaves Boeing 777-200ER e 300ER.

Em Dezembro do mesmo ano, as duas empresas viram-se forçadas a trabalhar no terreno na sequência da avaria técnica de duas das cinco aeronaves do tipo Boeing 777-200ER. Num intervalo de 17 dias, ambas foram obrigadas a aterrar de emergência, depois da descolagem em Lisboa, devido à perda de algumas peças do motor do tipo GE90-94B.

Na sequência, a TAAG suspendeu a utilização das outras três aeronaves que usavam o mesmo tipo de motor e as partes trabalharam no sentido de identificar as causas.

Segundo um comunicado feito pela TAAG, na altura, as investigações levadas a cabo pela fabricante dos motores concluíram que “um desgaste anormal dos injectores” estava na base dos problemas, acrescentando que “a solução encontrada foi a remoção dos motores e a colocação de novos injectores, inclusive nos que não haviam sido afectados por aquela anomalia”. As aeronaves ficaram paradas cerca de quatro meses.

PESQUISA. Participantes da conferência internacional sobre água apelam para a necessidade de se investir para evitar cenários piores, e estimam em cerca de 255 mil milhões de euros o investimento anual necessário em infra-estruturas hídricas.

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A manter-se o actual cenário de desperdício de água potável e de alteração climáticas, o mundo poderá enfrentar, em 2030, um défice de cerca de 40% de água, concluiram os participantes da 2.ª conferência internacional sobre água e clima, que decorreu em Marselha, França, entre os dias 3 e 4 de Outubro de 2017.

“Dado que são necessários cerca de 255 mil milhões de euros por ano para o desenvolvimento de infra-estruturas hídricas a nível mundial e a erradicação da fome até 2030 exigirá um investimento de 17,4 mil milhões de euros, o financiamento é uma questão crucial na agenda política dos líderes mundiais. Construir cidades sustentáveis resistentes às alterações climáticas e a diminuição da fome, são cruciais para cumprir os objectivos da COP21 e reafirmados na COP22, onde foram prometidos 100 mil milhões de dólares anuais até 2020 para lidar com os impactos das alterações climáticas e reduzir as emissões”, lê-se no comunicado final do evento.

Os participantes destacaram ainda que 63% das cidades prevêem risco de abastecimento de água devido às alterações climáticas.

Discutiram a “Iniciativa Água para África”, considerando que a “conferência marca uma oportunidade histórica para redireccionar a atenção da comunidade global sobre a necessidade de ajudar as nações em desenvolvimento a adaptarem-se às alterações climáticas. Em nenhumas outras áreas isto poderia ser tão evidente como África, Ásia e América Latina, onde proteger a segurança alimentar e erradicar a fome, para as quais a água é essencial, representa um imperativo urgente”, escreveram no comunicado final.

“Sem água, seríamos um planeta estéril sem vida. Uma verdade básica sobre a água e a sua ligação a toda a vida é que a sua administração imprudente se torna cada vez mais um obstáculo para enfrentar as alterações climáticas. E enfrentar as alterações climáticas é um pré-requisito para a paz”, declarou Sindra Sharma-Khushal, membro da presidência da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC) para a COP23 (23ª sessão da Conferência das Partes sobre mudanças climáticas).

Os membros lembraram a importância da água para alcançar as metas do desenvolvimento sustentável. “A água é um facilitador e um conector, um fio condutor comum essencial que liga os diversos aspectos abordados pelas Metas de Desenvolvimento Sustentável (MDS). Acredito firmemente que, longe de ser um problema, a água é uma solução, um factor determinante para tornar o mundo um lugar melhor”, explica o vice-presidente do Conselho Mundial da Água, Dogan Altinbilek. As conversações geraram um debate permanente sobre os desafios globais levantados pela segurança hídrica e ficou claro que a água será um dos principais temas da COP23, que decorrerá em Novembro de 2017 em Bona, Alemanha.

A conferência foi realizada pelo Conselho Mundial da Água, em cooperação com a Presidência da COP22, assim como outros parceiros internacionais. O encontro desenrolou-se no seguimento da Primeira Conferência Internacional sobre Água e Clima realizada em Rabat, em Julho de 2016. Foi apoiado pela Presidência da COP23, reuniu mais de 150 especialistas internacionais e líderes políticos na vanguarda do debate sobre clima e água, assim como diversos ministros do ambiente, entre os quais Charafat Afailal, secretária de estado da água e ambiente de Marrocos, Istiaque Ahmad, secretário do ministério do Ambiente e Florestas do Bangladesh e Sindra Sharma-Khushal, do grupo da presidência de Fiji do UNFCCC da COP23 e presidido pelo presidente honorário do conselho mundial da água, Loïc Fauchon e o vice-presidente, Dogan Altinbilek.

A missão é mapear o caminho a seguir e fomentar a consciência mundial sobre assuntos críticos relacionados com os recursos hídricos como preparação da COP23 que se realizará em Bona.

Os constrangimentos da gestão das centralidades, a caracterização e os desafios do sector imobiliário foram os temas de conversa com o PCA da Imogestin que defende a necessidade de investimento no mercado de arrendamento.

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A Imogesin é gestora das centralidades desde 2015. Qual é o balanço que faz desta empreitada?

Este desafio, pelo qual o Governo contratou a Imogestin, em Dezembro de 2014, com início em Janeiro de 2015, ocorreu num período em que houve o aprofundamento da crise económica e financeira. Entretanto, procurámos assegurar a continuidade dos projectos porque, com excepção do Kilamaba e Sequele que estavam concluídos, todos os outros estavam em execução. Tínhamos também de dar início aos projectos habitacionais que ainda não tinham tido início. Em relação aos que já tinham sido iniciados, correram no ciclo previsto, apesar de ajustados com algum atraso, devido às condições financeiras que o país viveu. As empresas chinesas, mesmo com os atrasos nos pagamentos por parte do Estado, foram concluindo. A construção das habitações está praticamente concluída em Luanda, Benguela, Huila, Namibe e Bengo (porque Kapari antes estava em Luanda mas agora é Bengo). Registou-se, entretanto, um ligeiro atraso nas infra-estruturas externas. No primeiro modelo, estava previsto que esta actividade seria feita pelos próprios empreiteiros, mas, mais tarde, o Estado chamou para si esta responsabilidade e aí voltou a sentir-se os efeitos da crise. Assim sendo, ainda não se pode fazer a comercialização das habitações destes projectos, apesar de estarem concluídas em termos de construção, devido a este constrangimento das infra-estruturas externas, que são basicamente a energia, água, o saneamento e os acessos.

E qual é o nível actual de execução destas infra-estruturas?

Estão em execução, é um trabalho coordenado pelo Ministério do Ordenamento do Território e Habitação (antes ministério do Urbanismo e Habitação). Há algum atraso na disponibilidade dos fundos por parte do sindicato bancário que organizou este financiamento ao Estado. A disponibilização das verbas iniciou há cerca de quatro semanas e teremos mais alguns meses. Esperamos que as soluções definitivas estejam concluídas entre quatro e seis meses. Devem estar todas terminadas entre Novembro e Março à excepção da Huíla, que tem o problema mais difícil do ponto de vista da energia e da água.

E em relação aos projectos que não tinham iniciado. Qual é a realidade?

São basicamente em seis províncias. A centralidade do Bengo, uma vez que Kapari tinha sido construído como parte de Luanda. As da Lunda-sul, Zaire, Malanje, Kwanza-Norte, Kuando-Kubango e Cunene. Os projectos iniciaram num formato mais reduzido. Inicialmente, estavam previstas entre duas e três mil habitações, mas o Executivo aprovou um reajustamento para entre mil e 1.500. Iniciou-se a primeira fase de construção entre Junho e Agosto, executando assim as orientações do Executivo. Quanto às vendas, houve atrasos, só as iniciámos em Luanda.

Também fazem a gestão das rendas nas unidades que já tinham sido negociadas. Como tem sido este processo e como gerem os litígios que herdaram?

É realmente um quadro que não é fácil. Temos procurado manter um diálogo com os moradores, através das respectivas comissões. Uma boa parte das pessoas que estão nestas centralidades, particularmente, no Kilamba e Sequele, cumpria com o compromisso de pagar pontualmente as prestações. Em 2016, entretanto, notou-se algum abrandamento. Registámos também uma componente, sobretudo no Kilamba, de habitações que tinham algum litígio em termos de atribuição de titularidade. Procurámos ajudar a resolver, mas é uma matéria cuja solução completa nos foge. Estes litígios acabam por ir parar aos tribunais porque são direitos de pessoas que reivindicam sobre um activo.

Em relação à redução no cumprimento do pagamento das prestações o que têm feito para evitar o agravamento da situação?

Temos procurado transmitir aos moradores que o Estado fez um esforço muito grande para a construção destas habitações e está a ser a entidade financiadora, porque, quando se vende uma propriedade no regime de propriedade resolúvel, no fundo, a entidade que o faz está a financiar, substituindo-se ao banco. A taxa de remuneração de capital que o Estado estipulou é de 3% ao ano, não tem nada que ver com as taxas dos bancos que andavam à volta dos 20%. A princípio, previa-se que os valores das prestações estariam indexados ao dólar, mas foi desindexado. Previa-se também que o valor das prestações pudesse ser actualizado com base no índice do preço ao consumidor, também o Executivo aprovou, por nossa proposta, que fosse retirado porque, senão, neste momento, as prestações anuais passavam para mais de 30%.

Que outras mecanismos podem ser accionados, além da sensibilização?

É uma questão que vai ser equacionada a curto prazo. Há a necessidade de assegurar que haja um compromisso maior por parte dos compradores em honrar os pagamentos. O Ministério do Urbanismo, com a nossa colaboração e de outras entidades, preparou um projecto de diploma que define qual é o atraso máximo permitido, findo o qual o Estado pode fazer a rescisão do contrato e reaver a habitação. O normal e o que se passa em todo o mundo quando há o regime de propriedade resolúvel é fazer o pagamento através de uma consignação directa do seu rendimento. É compreensível que assim seja em Angola em que o Estado está a vender a casa abaixo do custo de construção. Têm de ser criados mecanismos legais para que se possa reter os valores directamente da remuneração das pessoas.

Em relação a esses prazos, qual lhe parece que deve ser a proposta?

A nível internacional, normalmente, nunca passa de 10 a 12 meses. Esta é a prática internacional e acredito que será dentro destes padrões que este pacote legislativo vai ser equacionado.

Actualmente, quais são os níveis de incumprimento?

Podemos dizer que esta margem andava, em projectos como o Kilamba, à volta de 40%. No Sequele, a média também anda à volta disso. O que notamos também é que, neste período eleitoral, algumas pessoas criaram a ideia de que eventualmente as casas lhes poderiam ser entregues sem pagamento. Terá havido alguns políticos que passaram esta mensagem, que é irresponsável.

Quais são as receitas dos pagamentos?

Tínhamos uma média à volta de doismil milhões de kwanzas num trimestre. Ou seja, cerca de 700 milhões de kwanzas por mês, mas houve uma redução.

E qual é a percentagem da Imogestin?

O quadro é o seguinte: esta receita é do Estado, vai para o fundo de activos para o desenvolvimento habitacional. A nossa forma de remuneração está no diploma, estão definidas duas formas. Uma corresponde a uma percentagem sobre o valor do investimento, esta percentagem é de 2%. A outra é uma remuneração variável. É um prémio no caso de a Imogestin reduzir os custos destes projectos.

E têm conseguido esta redução?

Sim. Temos provas de como é que reduzimos os custos em 2015 e 2016. Renegociámos contratos com empreiteiros, empresas de fiscalização e com projectistas, o que conduziu a economia de dezenas de milhões de dólares. Vamos demonstrá-las ao Executivo o que estava no contrato e o que conseguimos reduzir. Em alguns casos, em empresas de fiscalização, conseguimos reduções na ordem dos 50%. Em obras com os empreiteiros, nos trabalhos extracontratuais, conseguimos reduzir os custos unitários em 30% e 40%, face ao custo do contrato.

É fácil renegociar com as empresas chinesas?

Damo-nos com as empresas chinesas desde 2010, quando passamos para o Nova Vida, temos sete anos de experiência. Não é fácil, mas os tempos ajudaram a mudar a atitude destas empresas. No início, era muito difícil, porque a cultura das empresas chinesas era de obras do Estado e não estavam muito habituadas que alguém lhes dissesse que não quer determinado projecto ou que devem reduzir os custos. Ainda é um diálogo difícil, mas, comparando a 2010, houve uma mudança significativa de atitude, mentalidade e de compreensão da nossa realidade. Por uma questão de justiça, devo dizer que as empresas chinesas, como na sua maioria são do estado, fazem uma coisa que outras empresas de qualquer outra parte do mundo não fazem: com ou sem pagamento, concluem a obra. Houve empresas que fizeram projectos com o primeiro pagamento apenas. Esta é uma atitude que nunca encontraremos em outra empresa.

Para a segunda fase, empresas angolanas estão a participar na construção. Qual é o balanço que faz do desempenho destas empresas?

Estão no início das obras, mas conhecemos as empresas e precisamos de assegurar que os pagamentos tenham alguma regularidade. Nem sempre o contexto do país permite que se pague pontualmente ou a totalidade do valor, mas, desde que haja o compromisso do Estado e das instituições financeiras envolvidas, estas empresas estão disponíveis para a execução das obras e estou convencido de que os prazos serão cumpridos. Poderemos ter pequenas derrapagens mas o que será normal, sobretudo agora que estamos com grandes problemas de importações.

A gestão das centralidades teve um grande impacto nas receitas da Imogestin. Até então quais eram os principais negócios da empresa?

A Imogestin tem projectos próprios, não temos só projectos do Estado. Fazemos 20 anos no próximo ano. O Estado convidou a Imogestin, porque já tínhamos sido convidados para corrigir os problemas que aconteceram no Nova Vida. O projecto é de 2000 e fomos convidados pelo Ministério das Obras Públicas e Habitação, na altura, para fazer a mediação. Em 2009, o Executivo convidou-nos para fazer a gestão da construção e posso dizer que, a partir de 2009, o Estado só disponibilizou cerca de 40 milhões de dólares para a segunda fase, enquanto foram gastos 350 milhões de dólares na construção com o dinheiro dos próprios compradores. Foi este modelo que levou o Executivo a convidar a Imogestin na perspectiva de reduzir os custos.

Quais são os principais projectos da Imogestin?

Aqui, em Luanda, temos projectos como as torres Kianda que estão na marginal. É um projecto de cerca de 350 milhões de dólares em parceria com outros accionistas. Nós e a ENSA temos mais de 50% e trata-se de um projecto de mais de 100 mil metros quadrados da área de construção. Temos outros projectos como o Muxima Plaza, projectos como os hotéis Terminus que são propriedade da Imogestin. Temos projectos noutras províncias, quer terrenos para a construção, quer de projectos. Gerimos este património, somos uma empresa privada com capital social maioritário do BAI com 50%. É inquestionável que a centralidade representou uma receita significativa, mas é uma receita que está ligada a um processo quer de investimento, quer de desempenho.

Nunca ouviu comentários de que a Imogestin beneficiou de alguma facilidade para ser a escolhida?

As razões que levaram o Executivo a convidar-nos foram esplanadas e transmitidas pelo anterior presidente e Titular do Poder Executivo. Foi a experiência que tínhamos do projecto Nova Vida, a demonstração de que era possível fazer estes projectos com menos gastos do Orçamento Geral do Estado. Foi essa razão, não foram outras, não foi por razões de simpatia. Fomos convidados num contexto em que não tínhamos recursos humanos e tivemos de fazer uma adaptação rápida e penso que o desempenho está aí para ser avaliado. Pelo menos, da parte do promotor, fomos recebendo indicações de que teremos alcançado os objectivos.

As centralidades impactaram no imobiliário. Actualmente, qual é a caracterização que faz do sector?

As centralidades tiveram os seus efeitos no sector imobiliário. Houve um aumento significativo de oferta de habitação, o que conduziu a uma procura menor no sector privado e a uma redução dos preços. O Estado colocou, no mercado, habitações a preços bastante inferiores àqueles que o sector privado colocava e houve este efeito de redução de preço. Pode dizer-se também que a colocação desta oferta criou alguma pressão no sector bancário no sentido de financiar, mas, como o Executivo depois optou pela venda da maioria das habitações no regime de propriedade resolúvel, o Estado passou a ser a entidade financiadora. O sector bancário não foi tão envolvido como se desejava e como é normal no mercado imobiliário. Mas também, com a conjuntura económica e financeira que Angola atravessou, o sector bancário não seria capaz de responder e as casas estariam aí por se vender.

O Estado acertou na decisão então?

A política do Estado foi dirigida a um segmento da classe média e média baixa. Este nicho de pessoas acabara por ser o principal beneficiário, o que é normal. Mas, em termos de habitação social, o que se deseja é que os grandes beneficiários sejam pessoas de baixa-renda. Mesmo para os de média renda é preciso encontrar soluções para elas. Há outra componente que acho que precisamos de corrigir.

Como quais?

Este conjunto de habitações das centralidades voltou a manter a ideia de que resolver o problema habitacional é comprar casa, não deve ser assim. Os países não podem continuar a ter esta lógica, porque existe um esforço financeiro muito grande. O arrendamento tem de ser a alternativa e a solução principal. A maior parte dos países desenvolvidos não tem o programa que a Europa do Sul tem. Nós copiamos do Sul da Europa, de países como Portugal, Espanha, Itália e da Grécia que tiveram grandes crises imobiliárias e em que muita gente perdeu as casas justamente porque obrigam jovens a uma taxa de esforço financeiro elevadíssima, durante 30 anos, o que não permite que uma família tenha um desenvolvimento normal. Julgo que o Estado, nos próximos anos, terá de esfoçar-se de modo a incentivar e regular o sector privado no sentido de construir para o arrendamento.

Mas haverá iniciativa privada suficiente para dinamizar este segmento?

A experiência diz que o Estado vai ter de promover também isso, ou seja, terá de ser o promotor, mas de uma forma de parceria público privada. É necessário aumentar a oferta de habitação para o arrendamento a custos que estejam ajustados ao nível dos rendimentos das pessoas e em que o Estado não seja o operador principal. Define as regras do jogo, estabelece as parcerias, tem os terrenos, pode fazer infra-estruturas e esperar que promotores privados promovam estes produtos e colocam no mercado. Quando tivermos uma oferta significativa, as pessoas perceberão melhor que o investimento para a compra é prejudicial para a economia porque desvia recursos que poderiam ir para o sector produtivo.

Está difícil a aplicação da lei sobre o arrendamento. O que está em causa?

O Estado também terá contribuído para isso, quando definiu que o objectivo das centralidades é a venda das habitações. Induziu as pessoas a pensar que ninguém quer ter casas arrendadas por causa da instabilidade do mercado de arrendamento. Sabemos que uma boa parte das pessoas de renda baixa é arrendatária. Provavelmente o número de donos já terá aumentado, mas, há uns anos, a maioria era arrendatária e o senhorio se acordasse mal disposto aumentava o preço ou solicitava a casa. Ou seja, há um mercado de arrendamento informal. O mercado formal não recebe, porque toda a gente criou a ideia de que ter casa é comprar casa, é preciso mudar esta maneira de abordagem para o entendimento de que resolver o problema de habitação também é arrendar. Há uma ideia básica que precisa de ser retida: a casa deve estar ligada ao rendimento das pessoas.

Haverá outras razões que dificultam a formalização do mercado de arrendamento?

Actualmente, a economia angolana ainda não tem um dinamismo que leve à circulação das pessoas. O mercado de trabalho ainda é muito rígido, o maior empregador é o Estado e as pessoas não têm este risco de trabalhar em Luanda e depois irem para Benguela ou para Huila, por exemplo. No futuro, acontecerá e as pessoas perceberão que comprar não é o melhor. O que se deseja é que o sector privado associe projectos geradores de empregos a programas habitacionais. Se uma empresa fizer um investimento, imaginemos, no sector mineiro, seja na Huila, no Huambo ou na Lunda, o Estado deve associar a este programa incentivos para esta empresa construir habitação para que os trabalhadores tenham uma habitação e paguem uma renda. Hoje, as centralidades estão a puxar as pessoas para as grandes cidades. Só há hipóteses de se tirarem as pessoas das grandes cidades para o interior se houver emprego no interior, então temos de incentivar as empresas que vão fazer grandes investimentos a associar a habitação.

Qual é a percentagem de casa em arrendamento nas centralidades?

Só agora no Dundo, Lunda-Norte, face à realidade social e económica da província, que é muito diferente da maior parte das províncias, propusemos o arrendamento que poderá ser estendido para as outras províncias. Aquela região não tem um desenvolvimento como tem as outras províncias e os rendimentos dos trabalhadores são baixos. Mesmo colocando preços de venda igual ao das outras províncias, a Lunda-Norte não tem pessoas com poder para comprar.

Então, neste momento, nas centralidades, todos estão no regime de propriedade resolúvel?

Exactamente. Foi concebida assim, por um lado, para o Estado ter o retorno, mas também foi feita na perspectiva de vender casas às pessoas. Se houver arrendamento, estou convencido de que muitos jovens vão preferir o arrendamento porque serão contratos plurianuais e renda é estabilizada. O mercado de arrendamento tem de se desenvolver e o sector privado, hoje ainda não, mas caminhará para tornar apetecível o negócio do mercado de arrendamento.

Actualmente, qual é a receita da Imogestin?

No último ano, tivemos uma receita em kwanzas, equivalente a de cerca de oito milhões de dólares.

PERFIL

Rui António da Cruz nasceu em Ambaca, província de Kwanza-Norte, tem 63 anos e ao longo da vida foi juiz no Tribunal Supremo por 18 anos. Professor universitário durante 30 anos, é membro fundador da Associação Fiscal Angolana. É ainda accionista e presidente do conselho de administração da Imogestin. Tem no ensino a sua maior paixão.