Isabel Dinis

Isabel Dinis

JUSTIÇA. Causídico brasileiro revela meandros da recuperação de activos desviados que resultaram só graças ao método da ‘delação’ e à colaboração. Puxando no exemplo do Brasil de combate à corrupção, alerta que Angola “vai conhecer lobos com cara de ovelhas”.

 

ALIENAÇÕES. Nova lei prevê a oferta em bolsa e a participação de pequenos subscritores de até 20% no capital social das empresas a privatizar. Diploma trava a participação de entidades que estejam envolvidas nas privatizações.

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A nova lei das privatizações impede que cônjuges, ascendentes e descendentes, directos ou indirectos, de funcionários ou agentes administrativos envolvidos na privatização adquiram empresas. A lei de iniciativa do Executivo, aprovada na semana passada na generalidade pela Assembleia Nacional, impede ainda a participação de qualquer entidade que, pelo cargo que ocupa, esteja numa posição de conflito de interesses ou em que a referida aquisição constitua um acto de improbidade pública.

A lei, aprovada com 134 votos a favor, 44 contra e oito abstenções, prevê algumas novidades, entre as quais o facto de permitir a pequenos subscritores uma participação de até 20% no capital social das empresas a vender e a introdução da oferta em bolsa.

Na apresentação do documento, o ministro das Finanças afirmou que a nova lei “visa ajustar o regime de privatizações ao novo contexto constitucional, político e socioeconómico prevalecente”.

Archer Mangueira realça também que o ajustamento à lei em vigor, aprovada em 1994, tem ainda como objectivo acolher novas modalidades de privatizações consentâneas com uma maior participação de investidores particulares e com a maior arrecadação de receitas para o Estado, sem prejudicar a transparência e a eficiência do processo, como é o caso das privatizações, por via dos mercados de valores mobiliários. Segundo o ministro, as empresas com potencial a privatizar ainda estão em diagnóstico.

Oposição reticente…

Antes da aprovação da lei, a oposição mostrou-se inconformada e chamou a atenção para a possível futura má gestão das empresas a privatizar.

O presidente do grupo parlamentar da Unita, Adalberto da Costa Júnior, defendeu a criação de um instituto para fomentar a igualdade de oportunidades, com o argumento de que “não se pode fazer privatizações em circunstâncias de desigualdades”. Apesar de reconhecer a iniciativa “boa”, Adalberto da Costa Júnior lembrou que é preciso preparar adequadamente as instituições para promover a igualdade de oportunidades.

O presidente do Partido de Renovação Social (PRS), Benedito Daniel, afirmou temer uma futura má gestão das empresas que forem privatizadas, lembrando que “os angolanos que ontem foram gestores de empresas públicas e que faliram as mesmas empresas públicas se tornaram ricos e as empresas faliram, sendo os mesmos que fazem parte da bolsa de valores e voltarão a comprar as empresas do Estado que eles já prejudicaram para serem privatizadas”.

O deputado David Mendes causou maior polémica ao afirmar que os “únicos beneficiários serão os estrangeiros”, com realce para os portugueses, que “querem tomar a nossa economia”. Eleito pela Unita, David Mendes sublinhou “estar farto dos portugueses em Angola”. “O que valeu os anos de luta de libertação. Para devolver tudo de novo a Portugal? Vamos devolver tudo a quem já nos esteve a colonizar? Quem é o angolano que tem dinheiro? Os empresários estão falidos”, reforçou a ideia.

De acordo com metas estabelecidas, do prospecto da emissão de ‘eurobonds’, o Governo pretende privatizar 74 empresas públicas a médio prazo, sobretudo industrias.

Travões da lei

-Impede a participação de qualquer entidade que, pelo cargo que ocupa, esteja numa posição de conflito de interesses ou em que a referida aquisição constitua um acto de improbidade pública.

- Vedada a participação de todas as entidades impedidas de participar em procedimentos de contratação pública, nos termos da Lei dos Contratos Públicos.

- Veta a participação de entidades que se encontrem em estado de insolvência ou falência, declarada por sentença judicial, em fase de liquidação, dissolução ou cessação de actividade.

- Veta a presença de entidades condenadas por sentença ou que sejam objecto de boicote por parte de organizações internacionais e regionais de que Angola seja parte.

- Impede entidades que tenham, a qualquer título, prestado, directa ou indirectamente, assessoria ou apoio técnico na preparação e elaboração das peças do procedimento, susceptíveis de falsear as condições normais de concorrência e que constem de lista elaborada pelo órgão responsável pela regulação e supervisão da contratação pública.

COMPENSAÇÃO. Lei foi revista no final do ano passado. Abate pode permitir que empresários regularizem dívida com a AGT quando o Estado também é devedor. Associações querem maior divulgação por parte da autoridade tributária.

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Muitas empresas com dívidas ao fisco e a quem o Estado também deve desconhecem as alterações que foram feitas no código geral tributário no final do ano passado e que passaram a permitir a compensação da dívida pela dívida.

O reparo foi feito por Adilson Sequeira, técnico da AGT, num encontro com empresários da hotelaria e restauração, quando estes insistiam no perdão fiscal e reclamavam o pagamento de dívidas do Estado. O técnico tributário atribui parte da culpa aos contabilistas que, no seu entender, não comunicam aos empresários. Conforme explicou, a compensação da “dívida pela dívida” também vai ser aplicada quando o imposto sobre o valor acrescentando (IVA) estiver em vigor. “Mesmo com o IVA, quando a empresa solicitar um reembolso a título de crédito fiscal, se verificar que tem uma dívida de outro imposto, como por exemplo, o industrial, será apenas reembolsada a diferença e liquidar a dívida com outros impostos”.

Ramiro Barreiro, secretário-geral da Associação dos Hotéis e Resorts de Angola (AHRA), diz ser uma “pena” a falta de conhecimento desta garantia da lei. E garante que a associação vai sensibilizar e informar os associados. “A compensação da dívida pode facilitar e aligeirar muitas dívidas com a AGT. Tem faltado informação”, reconhece.

Ramiro Barreiro garante que a associação desconhece quanto os hoteleiros devem ao fisco e o que o Estado deve aos empresários do sector, por isso está a fazer-se um levantamento para apurar as dívidas. Um processo que, entretanto, não tem sido fácil, já que muitas empresas não querem revelar as suas dívidas. “Os associados também não facilitam o nosso trabalho. Mas entendemos. Há um associado que, há dias, revelou que o Estado lhe devia cerca de 300 milhões de kwanzas. É muito dinheiro. O Estado tem de pagar. Vamos aguardar. Começámos recentemente a trabalhar com o Ministério das Finanças para tratar desta dívida. Tem havido uma abertura de diálogo por parte do Governo”, refere.

AIA culpa AGT

Por sua vez, o presidente da Associação dos Industriais de Angola, José Severino, também admite que muitos empresários desconhecem “essa facilidade”. Defende que, para a informação fluir, a AGT tem de deixar de achar que Angola é Luanda. “As informações não fluem, o ‘Jornal de Angola’ não circula, e o Diário da República também não. Esse é o problema. A AGT tem de anunciar mais rigorosamente. Devia fazer circular a informação. O fisco tem mais propensão à cobrança do que a reconhecer direitos dos contribuintes. Isso é um problema de sensibilidade.”

A lei 18/17 altera a 21/14 e determina que a compensação de créditos tributários por dívidas não tributárias pode efectuar-se no âmbito do procedimento tributário, a título oficioso ou mediante solicitação do contribuinte. A compensação só tem lugar após o reconhecimento da dívida a favor do contribuinte pela Unidade de Gestão da Dívida Pública.

O Ministério das Finanças anunciou, em Março, uma nova estratégia de regularização da dívida. Estava previsto regularizarem-se os passivos do Estado com os prestadores de serviço através da compensação com créditos em bancos públicos, por muitas empresas que reclamam dívidas ao Estado serem simultaneamente devedoras de bancos públicos.

A secretária de Estado do Tesouro, Vera Daves, acredita que era uma “oportunidade para diminuir créditos malparados junto destes bancos”, mediante o pagamento da dívida das empresas em contas domiciliadas dos mesmos. “Há muitos credores a pagarem juros de mora nalguns bancos. O objectivo são os fundos ou títulos a serem pagos caírem na conta onde o credor estiver domiciliado ou carregado o crédito para se abater directamente”, referiu na altura.

A dívida governamental está avaliada em 69,5 mil milhões de dólares, sendo 40% interna, o que corresponde a 30 mil milhões de dólares.