Isabel Dinis

Isabel Dinis

SECTOR PETROLÍFERO. Depois de passar de 10% para 7%, o percentual a que a petrolífera tem direito, enquanto concessionária, passa para 5%. As opiniões divergem, havendo quem defenda a extinção definitiva da taxa.

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A Sonangol volta a ver reduzido o percentual a que tem direito pela actividade de concessionária, passando de 7% para 5%, segundo as recomendações decorrentes da apreciação do Orçamento Geral do Estado para 2018.

Assim, a petrolífera sofre a segunda redução nas receitas a que tem direito, depois de, em 2013, passar de 10% para 7%. A redução tem diversas opiniões com uma corrente a defender ser prejudicial para a empresa e uma segunda a considerá-la justa.

“Os 5%, ao contrário do que pensa a maioria das pessoas, são somente para a gestão da função concessionária que são cerca de 650 pessoas. A Sonangol tem cerca de 8.500 trabalhadores dos quais somente 650 são da concessionária”, explica um alto funcionário da Sonangol que se coloca a favor da corrente que considera “justa” a posição.

Esta corrente entende que as pessoas que defendem a continuidade dos 7% acreditam que a Sonangol continuará a acumular as várias actividades que desempenha actualmente. Ou seja, não acredita na reestruturação que se perspectiva e que deverá separar a actividade da concessionária.

“É natural esta forma de pensar porque esta percentagem que inicialmente era de 10% e depois 7% e agora 5% foi utilizada não só para a gestão da função concessionária como para investir noutras áreas e até mesmo cobrir as ineficiências da empresa. No universo empresarial da Sonangol, existem muitas empresas deficitárias e, infelizmente, essa taxa cobre também estes buracos.”

Existe, entretanto, uma terceira corrente que defende a extinção deste percentual.

“Num sistema ideal a Sonangol ou a concessionária deveria apresentar, anualmente, quanto o custo da gestão da concessionária e submeter ao Executivo que, por sua vez, disponibilizaria a verba, em vez, de uma percentagem fixa.

Seria mais transparente, daí a grande importância da separação entre os negócios da Sonangol e a função concessionária, o Estado só ganharia. Mas claramente é necessário que se tenha coragem para avançar para a reestruturação do sector”, observa um analista do sector petrolífero.

Segundo o acordo de partilha, a Sonangol, enquanto concessionária, reparte com os grupos empreiteiros 50% da produção.

INDÚSTRIA TÊXTIL. Governo pretendia alimentar, até 2017, as três fábricas têxteis, com algodão nacional, mas o projecto não foi concretizado. Estava prevista a produção de 25 mil toneladas, mas a meta falhou.

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A produção de algodão em Angola “continua praticamente paralisada” com “as metas da estratégia que não foram concretizadas”, revela, ao VALOR, o coordenador do programa nacional do algodão, do Ministério da Agricultura, Carlos Canza.

Não obstante, o Prodesi (Programa de Apoio à Produção de Diversificação das Exportações e Substituição das Importações) prevê exportar produtos têxteis através da produção de algodão nacional. No ano passado, estava previsto fazer a primeira colheita de algodão de 242 toneladas, mas só foram colhidas cinco.

Já em 2015, a ‘Estratégia de Implementação de Operacionalização da Cadeia de Valor do Algodão’ previa relançar a produção até 2017. Os planos apontavam para 25 mil toneladas que alimentariam as três fábricas de tecidos (África Têxtil, Satec e Textang). O Governo, desta vez, através do Prodesi, volta a colocar os têxteis nos produtos prioritários com potencial para serem exportados, mas não quantifica. No Prodesi, pode ler-se que a intenção é “actualizar a cadeia de valor dos têxteis (produção de algodão e fibra, tecelagem e confecção)”.

Antes de 2015, havia pequenas iniciativas de camponeses e apenas uma única empresa, a África Sementes, que produzia duas mil toneladas de algodão caroço (o produzido em Angola) por ano. Além da estratégia para o algodão, o Governo criou um outro programa, denominado ‘Relançamento da Cultura do Algodão’, que teve início em 2005, com um financiamento de 31,4 milhões de dólares da Coreia do Sul. O projecto envolveria a construção de um perímetro com uma área de cinco mil hectares e a construção de infra-estruturas de irrigação e a prestação de assistência técnica que terminaria em 2013.

Longe do previsto

Em 2013, o plano não foi concluído, ficando apenas a 63% do previsto, segundo o director do projecto de cultivo do algodão, Abel Kinzeca. O técnico tinha apontado, como dificuldades para o cumprimento dos prazos, durante uma visita do antigo secretário de Estado da Agricultura, José Amaro Tati, às instalações, “a fraca capacidade de produção de corrente eléctrica para alimentar o sistema de água a partir do centro de captação instalado no rio Keve”. O Governo pretendia produzir, a longo prazo, até 300 mil toneladas de algodão com o programa de revitalização da cultura, anunciava o antigo responsável do projecto, Domingos Nazaré, em 2013, num fórum sobre o sector produtivo no Kwanza-Sul.

Na altura, Nazaré reafirmava a aposta do Governo em atingir a auto-suficiência nas necessidades da indústria têxtil, com o restabelecimento da cadeia de valores algodoeiros. Previsto para funcionar numa parceria público-privada, com a única empresa que produzia algodão, a África Sementes, ficou projectada a produção das 300 mil toneladas. Desta cifra, 100 mil toneladas de fibra de algodão seriam destinadas à indústria têxtil e 200 mil toneladas de semente para a indústria de óleo alimentar, farinha de bagaço e ração animal.

Subida de 75%

O relançamento do algodão surge no orçamento do Ministério da Agricultura com uma verba alocada, de 2015 até ao ano passado, o programa beneficiou de 788,7 milhões de kwanzas.

Em 2017, a verba disparou quase 75% para 530,2 milhões de kwanzas, face aos 129,2 milhões do exercício anterior. O dinheiro para a campanha de 2017/2018 vai ser destinado a uma plantação de 1.500 hectares, com uma colheita prevista de 500 toneladas em Malanje e no Kwanza-Sul.

Para a concretização deste projecto, foram adquiridas 30 toneladas de sementes, que serão lançadas este mês.O Governo tem ainda, em carteira, um projecto que pretende produzir anualmente 50 mil toneladas de algodão, que deve ser financiado pelo governo do Japão.

“Menos ambição”

O agrónomo e consultor Fernando Pacheco afirma, ao VE, que o macroprojecto de relançamento do algodão, com o apoio da Coreia do Sul, está a “apanhar chuva e sol”, devido ao facto de “o Governo ter implementado a técnica de regadio que é apenas usada nos países ricos”.

Fernando Pacheco entende que o Governo precisa de ser “mais realista” e “não demasiado ambicioso” nas metas, referindo-se à intenção das autoridades em exportar têxteis com o Prodesi. Para o agrónomo, o Governo devia, antes de pensar em exportar algodão, criar condições para um bom ambiente de negócios. “É muito ambicioso pensar que, em poucos anos, Angola vai ter capacidade de exportar algodão”, observa sem pôr de lado a possibilidade de isso vir a acontecer no futuro.

Fernando Pacheco lembra que, em 2016, se criou muita expectativa numa reunião na Baixa de Cassanje, em Malanje, promovida pelo Ministério da Agricultura, para discutir a cultura com entidades internacionais, e que contou inclusive com uma baronesa do Reino Unido Lindsay Northover, dando a ideia de que estavam prontas as condições para produzir algodão “quando não era verdade”. “Para quê fazer mega eventos quando precisávamos primeiro de discutir o assunto internamente?”, questiona-se.

OGE. Acção para o Desenvolvimento Rural e Ambiente considera “incompreensível” a redução em cerca de 85% das verbas destinadas ao programa de massificação do registo civil e defende a conciliação entre o investimento nas infra-estruturas e serviços.

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A Acção para o Desenvolvimento Rural e Ambiente (ADRA) considera “preocupante” e de “difícil compreensão” o corte nos programas de ‘Massificação do Registo Civil e Modernização do Bilhete de Identidade de’, respectivamente, 85% e 47%, no Orçamento Geral do Estado (OGE) de 2018. Num relatório de análise ao OGE, a instituição entende ser “indispensável o reforço das verbas alocadas aos serviços de justiça e de registo de nascimento dado que mais de 40% dos angolanos não têm registo de nascimento”.

O orçamento previsto para o ‘Programa de Massificação do Registo Civil’ é de 963 milhões de kwanzas e representa uma redução de cerca de 85%, quando comparado aos cerca de seis mil milhões de kwanzas do ano transacto. Já o valor destinado à ‘Modernização do Bilhete de Identidade e Informatização do Registo Criminal’ foi reduzido em cerca de 47%, passando de nove mil milhões de kwanzas para 4.8 mil milhões.

O programa para a ‘Administração dos Serviços de Justiça’ e as despesas com as delegações de justiça e dos direitos humanos também sofreram uma redução de 11% e de 2%, respectivamente.

A ADRA entende que os cortes “prejudicam bastante o direito à cidadania e à justiça para os cidadãos”, acrescentando que “as administrações dos serviços de justiça e as alocações para as delegações provinciais afectam o progresso”.

Reforço considerável

Apesar dos cortes consideráveis nalguns programas, o Ministério da Justiça viu a sua dotação orçamental crescer, em termos nominais, passando de 57 mil milhões de kwanzas para os 61 mil milhões. Alguns programas vão beneficiar de um reforço financeiro considerável.

A ‘Prestação de Serviços de Consultoria e Fornecimento de Aplicações para os Registos Notariais e Guiché Único’ regista um crescimento de cerca de 230% na receita alocada, passando de 965,2 milhões para 3,1 mil milhões de kwanzas este ano.

O ‘Projecto de Fornecimento de Bens e Instalação e Suporte Técnico do Bilhete de Identidade, Registo Civil e Notariado’ e o ‘Projecto de Construção de Apetrechamento do Tribunal da Relação de Benguela e Luanda’ também tiveram aumentos “consideráveis”.

No entanto, a ADRA considera ser “imperioso” conciliar os investimentos em infra-estruturas com os realizados nos serviços, “pois só assim será possível dar resposta à procura motivada pela tendência de crescimento da população”. E aconselha uma “colaboração permanente e efectiva” entre os Ministérios da Justiça e o da Acção Social, Família e Promoção da Mulher para garantir o “reforço dos programas que mais contribuam para o acesso ao direito e à justiça por parte dos mais vulneráveis e que sofrem reduções consideráveis”.

MERCADOS. Aumento das exportações não-petrolíferas entre as prioridades até 2022. Madeira, café, rochas ornamentais são eleitos para alavancar as vendas no exterior.

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O Governo pretende aumentar e dinamizar as exportações não-petrolíferas e perspectiva vender 1,2 milhões de metros cúbicos de madeira em cinco anos, com o fomento da criação de ‘clusters’ da silvicultura de iniciativa empresarial em províncias estratégicas.

As metas estão previstas no PROPESI que, além da criação de ‘clusters’ empresariais para aumentar as exportações madeireiras, prevê reestruturar o Instituto de Planeamento Florestal e lançar uma iniciativa de levantamento de informação de dados de procura e oferta e ainda a auscultação dos intervenientes no sector.

Pretende também o reforço do controlo para restringir a exportação informal e rever a estratégia de exploração das madeiras tendo em conta a sustentabilidade dos recursos nacionais, podendo obrigar à diversificação dos mercados de destino.

A previsão de aumento das exportações da madeira surge numa altura em que várias vozes da sociedade contestam o abate indiscriminado e ilegal de árvores por estrangeiros. Recentemente, em conferência de imprensa, o secretário de Estado para os Recursos Florestais do Ministério da Agricultura, André Moda, responsabilizou os empresários nacionais pela presença de estrangeiros na produção de madeira, mas também admitia a carência de fiscais para fazer face às irregularidades.

A exportação da madeira, entre Janeiro de 2016 a Junho de 2017, rendeu ao Estado 56,3 milhões de dólares, uma média de três milhões de dólares por mês na exportação de 280.518 toneladas de madeira.

AUMENTO PARA CIMENTO, CAFÉ E ROCHAS

No leque de produtos previstos para o aumento das exportações até 2022, o programa também prevê um aumento das exportações do cimento, café e rochas ornamentais.

No cimento, o Governo calcula que, até 2022, possam ser exportados três milhões de toneladas. Prevê-se a formalização do comércio fronteiriço derivado do excedente face ao abrandamento das construções, negociar acordos bilaterais e resolver o abastecimento de combustíveis.

Para o café, está prevista, em cinco anos, a exportação de 23.500 toneladas, enquanto para as rochas ornamentais está projectada a exportação, no mesmo período, de 285.931 metros cúbicos. Para estes objectivos, estão previstas acções como a avaliação e a implementação do programa de aumento da produção de café, que almejava produzir 30 mil toneladas de café torrado e exportação de 400 mil sacos no ano passado. O Estado prevê também a promoção do investimento estrangeiro e propor um modelo de concessão de exploração do café à semelhança do petróleo que permita, como alternativa, a recuperação dos custos de desenvolvimento.

MERCADOS. Angola importou no ano passado, 17.731 toneladas de carne, contra as 10.731 em 2016. País foi líder das importações de carne salgada.

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Angola aumentou as suas importações de carne brasileira em 2017 e foi o segundo país africano que mais comprou ao Brasil, apesar das dificuldades de acesso às divisas.

O país gastou, de Janeiro a Dezembro do ano passado, 60 milhões de dólares, na importação de 17.334 toneladas de carne, o que representou um aumento de 62% em relação ao ano passado. Em 2016, importou apenas 39,1 milhões de dólares na compra de 10.731 toneladas, segundo dados da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (ABIEC), a que o VALOR teve acesso.

A carne ‘in natura’, ou não transformada, foi a mais comprada. Angola pagou 23 milhões de dólares para a compra de 5.902 toneladas, ocupando a 22.ª posição na lista dos maiores importadores.

O país lidera a lista dos importadores de carne salgada. Foram gastos 28.2 milhões de dólares para 5.392 toneladas. O restante das compras foi preenchido pela compra de carnes industrializadas.

Angola ocupa o 17.º lugar numa lista de mais de 100 importadores, sendo o segundo maior africano depois do Egipto. A lista dos maiores importadores continua a ser ocupada por Hong-Kong que gastou 1.528 milhões de dólares, seguido da China, com 939 milhões de dólares, apesar do escândalo denominado ‘carne fraca’ que abalou o Brasil no início do ano passado e das reservas levantadas por esses dois territórios.

O crescimento das importações de carne do Brasil revela que Angola não colocou um travão ao produto brasileiro, apesar do escândalo da operação ‘carne fraca’ que visou grandes empresas exportadoras brasileiras que vendiam carne adulterada para vários destinos. O Ministério da Agricultura, na altura, chegou a proibir a compra de carne a 21 estabelecimentos visados no processo cujas irregularidades foram confirmadas pelas autoridades brasileiras. A proibição referia ainda que os laboratórios nacionais de controlo e qualidade alimentar deveriam proceder à análise à certificação de todas as mercadorias à chegada e a necessidade de reforçar a inspecção e fiscalização das carnes provenientes do Brasil.

BNDES “DE VOLTA”

Angola anunciou as negociações oficiais para a linha de financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Económico e Social do Brasil (BNDES) que custeava vários projectos e que foi suspensa no âmbito da operação ‘Lava Jato’, no ano passado.

O anúncio das negociações oficiais, para a etoma dos financiamentos, foi feito na semana passada pelo presidente da República, em Davos, à margem da cimeira dos chefes de Estado e de Governo que decorreu naquela cidade suíça. Depois de acertada a decisão, o ministro das Finanças, Archer Mangueira, deverá seguir, nos próximos dias, para Brasília para retomar as negociações com as autoridades locais”.

Além da retoma das negociações do BNDES, João Lourenço anunciou ainda que prevê realizar uma visita oficial ao Brasil em Maio.