INDÚSTRIA TÊXTIL. Governo pretendia alimentar, até 2017, as três fábricas têxteis, com algodão nacional, mas o projecto não foi concretizado. Estava prevista a produção de 25 mil toneladas, mas a meta falhou.
A produção de algodão em Angola “continua praticamente paralisada” com “as metas da estratégia que não foram concretizadas”, revela, ao VALOR, o coordenador do programa nacional do algodão, do Ministério da Agricultura, Carlos Canza.
Não obstante, o Prodesi (Programa de Apoio à Produção de Diversificação das Exportações e Substituição das Importações) prevê exportar produtos têxteis através da produção de algodão nacional. No ano passado, estava previsto fazer a primeira colheita de algodão de 242 toneladas, mas só foram colhidas cinco.
Já em 2015, a ‘Estratégia de Implementação de Operacionalização da Cadeia de Valor do Algodão’ previa relançar a produção até 2017. Os planos apontavam para 25 mil toneladas que alimentariam as três fábricas de tecidos (África Têxtil, Satec e Textang). O Governo, desta vez, através do Prodesi, volta a colocar os têxteis nos produtos prioritários com potencial para serem exportados, mas não quantifica. No Prodesi, pode ler-se que a intenção é “actualizar a cadeia de valor dos têxteis (produção de algodão e fibra, tecelagem e confecção)”.
Antes de 2015, havia pequenas iniciativas de camponeses e apenas uma única empresa, a África Sementes, que produzia duas mil toneladas de algodão caroço (o produzido em Angola) por ano. Além da estratégia para o algodão, o Governo criou um outro programa, denominado ‘Relançamento da Cultura do Algodão’, que teve início em 2005, com um financiamento de 31,4 milhões de dólares da Coreia do Sul. O projecto envolveria a construção de um perímetro com uma área de cinco mil hectares e a construção de infra-estruturas de irrigação e a prestação de assistência técnica que terminaria em 2013.
Longe do previsto
Em 2013, o plano não foi concluído, ficando apenas a 63% do previsto, segundo o director do projecto de cultivo do algodão, Abel Kinzeca. O técnico tinha apontado, como dificuldades para o cumprimento dos prazos, durante uma visita do antigo secretário de Estado da Agricultura, José Amaro Tati, às instalações, “a fraca capacidade de produção de corrente eléctrica para alimentar o sistema de água a partir do centro de captação instalado no rio Keve”. O Governo pretendia produzir, a longo prazo, até 300 mil toneladas de algodão com o programa de revitalização da cultura, anunciava o antigo responsável do projecto, Domingos Nazaré, em 2013, num fórum sobre o sector produtivo no Kwanza-Sul.
Na altura, Nazaré reafirmava a aposta do Governo em atingir a auto-suficiência nas necessidades da indústria têxtil, com o restabelecimento da cadeia de valores algodoeiros. Previsto para funcionar numa parceria público-privada, com a única empresa que produzia algodão, a África Sementes, ficou projectada a produção das 300 mil toneladas. Desta cifra, 100 mil toneladas de fibra de algodão seriam destinadas à indústria têxtil e 200 mil toneladas de semente para a indústria de óleo alimentar, farinha de bagaço e ração animal.
Subida de 75%
O relançamento do algodão surge no orçamento do Ministério da Agricultura com uma verba alocada, de 2015 até ao ano passado, o programa beneficiou de 788,7 milhões de kwanzas.
Em 2017, a verba disparou quase 75% para 530,2 milhões de kwanzas, face aos 129,2 milhões do exercício anterior. O dinheiro para a campanha de 2017/2018 vai ser destinado a uma plantação de 1.500 hectares, com uma colheita prevista de 500 toneladas em Malanje e no Kwanza-Sul.
Para a concretização deste projecto, foram adquiridas 30 toneladas de sementes, que serão lançadas este mês.O Governo tem ainda, em carteira, um projecto que pretende produzir anualmente 50 mil toneladas de algodão, que deve ser financiado pelo governo do Japão.
“Menos ambição”
O agrónomo e consultor Fernando Pacheco afirma, ao VE, que o macroprojecto de relançamento do algodão, com o apoio da Coreia do Sul, está a “apanhar chuva e sol”, devido ao facto de “o Governo ter implementado a técnica de regadio que é apenas usada nos países ricos”.
Fernando Pacheco entende que o Governo precisa de ser “mais realista” e “não demasiado ambicioso” nas metas, referindo-se à intenção das autoridades em exportar têxteis com o Prodesi. Para o agrónomo, o Governo devia, antes de pensar em exportar algodão, criar condições para um bom ambiente de negócios. “É muito ambicioso pensar que, em poucos anos, Angola vai ter capacidade de exportar algodão”, observa sem pôr de lado a possibilidade de isso vir a acontecer no futuro.
Fernando Pacheco lembra que, em 2016, se criou muita expectativa numa reunião na Baixa de Cassanje, em Malanje, promovida pelo Ministério da Agricultura, para discutir a cultura com entidades internacionais, e que contou inclusive com uma baronesa do Reino Unido Lindsay Northover, dando a ideia de que estavam prontas as condições para produzir algodão “quando não era verdade”. “Para quê fazer mega eventos quando precisávamos primeiro de discutir o assunto internamente?”, questiona-se.
JLo do lado errado da história