José Zangui

José Zangui

INVESTIMENTOS. Mais de mil projectos de investimentos entre angolanos e chineses deram entrada na Câmara de Comércio Angola-China, entre 2016 e Janeiro deste ano. Responsáveis queixam-se, no entanto, de muitas barreiras, como burocracia, corrupção e burlas.

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A Câmara de Comércio Angola-China (CCAC) recebeu o dobro de projectos, em dois anos, mas considera o resultado “insuficiente”. Deram entrada na organização, até 2016, 500 projectos, e daí a Janeiro deste ano, foram mais de mil. Apesar destes números, o presidente de direcção, Arnaldo Calado, considera o “balanço negativo”, acreditando que “deveria ter sido feito mais”.

A meta da organização era tirar da pobreza, pelo menos, 100 pessoas por ano, através dos projectos de investimentos, objectivo que ficou por alcançar. Pelos cálculos de Arnaldo Calado, apenas entre 20 e 30 pessoas saíram da pobreza, graças à CCAC. Calado confessa-se, por isso, “frustrado”, ao perceber que, por cada 20 pessoas fora da pobreza, outras 50 “mantêm-se pobres, por causa do mau ambiente político-económico”.

Todas as províncias, sem excepção, apresentam, regularmente, projectos em diferentes ramos, mas a sua materialização “não acompanha a velocidade desejada”. Arnaldo Calado atira as culpas às “muitas barreiras que travam os investidores”, entre as quais a exigência de garantias, “a corrupção, a burla e fulanização”.

O líder da Câmara de Comércio recorre mesmo a um exemplo: “há empresários angolanos que fazem parceria com chineses, entram com 20%, mas, depois de realizar o investimento, o angolano que tinha 20% fica com 80% e corre com o estrangeiro”. Uma atitude, sublinha Arnaldo Calado, que encontra, na sua maioria, nos políticos/empresários. Outro caso que considera ser “insólito” é de um advogado que, chamado por um investidor chinês para ajudar a constituir uma sociedade, passou a empresa para o seu nome. Este último caso já foi entregue às autoridades. Além disso, considera que se deve acabar com a “fulanização”. “O estrangeiro, quando chega ao aeroporto, já é alertado que, se não falar com o ‘fulano’, o projecto não vai andar”, justifica. Foi, assegura, “uma prática de muitos anos, que abafava os honestos e promovia os burladores que chegavam rapidamente à riqueza. Temos lutado para ter investidores estrangeiros, mas não está fácil, porque o ambiente económico não facilita.”

SINAIS POSITIVOS

O presidente CCAC afirma depositar esperanças na liderança de João Lourenço, defendendo ser “imperativa” a mudança de quadro. “Se João Lourenço falha, os empresários não têm outra salvação”, conclui.

A prioridade da concretização dos muitos projectos recai sobre os jovens e antigos combatentes desde que “sejam viáveis”. Arnaldo Calado prefere não quantificar o volume total de investimentos dos projectos aprovados, justificando que apresentar números é “coisa dos políticos que querem promoção pessoal”. “Para a Câmara, o mais importante é tirar as pessoas da pobreza”.

Para um melhor ambiente de negócios, Arnaldo Calado propõe a criação de um instrumento que proteja o investidor, designado Fundo de Protecção do Investidor, que funciona em outros países, além da alteração da lei do investimento. “Todas as províncias estão a precisar de investidores e de financiamento, portanto temos de facilitar os investimentos, porque Angola continua ainda a ser o país apetecível para os chineses, apesar das barreiras. Há também outros países africanos interessados no investimento chinês”, alerta o líder da organização.

A Câmara de Comércio tem vários projectos em diferentes províncias. Em Março, será testada, em Catete, Luanda, a primeira safra da produção agrícola de jinguba. No Uíge, vai ser desenvolvido um projecto de turismo na Lagoa do Feitiço. Enquanto a industrialização da mandioca vai ser desenvolvida em Cabinda, Kwanza-Sul e Lunda-Sul. São apenas alguns exemplos de empresas que estão em negociação com o Ministério da Energia e Águas, e “disponíveis para montar projectos em zonas recônditas”.

COMÉRCIO. Direcção Provincial do Comércio está a proceder ao cadastramento de estabelecimentos comerciais. Saber quantos existem, entre os de pequena, média e de grande dimensões, por município, é um dos objectivos. O outro passa por legalizá-los.

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O Governo Provincial de Luanda (GPL) iniciou um processo de cadastramento de todas as superfícies comerciais. A ideia é “actualizar os dados e poder melhorar a fiscalização”, explicou, ao VALOR, o director provincial do Comércio, José Moreno.

O processo abrange todos os estabelecimentos, sejam eles de pequena ou grande superfície. Segundo o responsável, “é necessário fazer este exercício para se saber quantos estabelecimentos existem, de facto, já que alguns se encontram encerrados e outros foram abertos”.

O GPL não consegue determinar o número exacto de estabelecimentos comerciais existentes no território, porque tem apenas a competência de licenciar as pequenas superfícies. As grandes são da responsabilidade do Ministério do Comércio.

Actualmente, o GPL tem registados 26.841 estabelecimentos de comércio a retalho e 24.622 de prestação de serviço, perfazendo um total de 51.463.

O cadastramento vai incluir até as grandes superfícies, porque, de acordo com José Moreno, todos, independentemente da dimensão, exercem actividade no território num determinado município.

Kilamba Kiaxi, que conta com mais de mil estabelecimentos de diferentes categorias, foi o primeiro município a iniciar o cadastramento.

Durante o processo, vai ser aferida também a situação legal dos estabelecimentos comerciais. A ideia, de acordo com José Moreno, “não é encerrar quem se encontre na ilegalidade, mas, numa primeira fase, fazer um papel pedagógico” para que seja legalizado.

PESCAS. Novo centro de piscicultura vai ser edificado na localidade de Missombo, Kuando-Kubango pela empresa Aquafish, subsidiária do grupo Mitrelli, um investimento orçado em perto de 15 milhões de dólares. As obras começam no próximo mês.

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O novo projecto de pesca aquícola começa a ser erguido, em Missombo, Kuando-Kubango, em Fevereiro, e está orçado em mais de 14 milhões de dólares, um investimento da Aquafish financiado por um banco israelita.

A construção, com o acordo firmado com o Ministério das Pescas e do Mar, deve estar concluída no prazo de 18 meses, mas a produção de peixe, de 500 toneladas por ano, inicia-se apenas seis meses após a conclusão da construção. O peixe poderá ser comercializado inteiro ou em filetes.

O projecto prevê a construção de 16 tanques para a criação e engorda do cacusso, de um centro logístico, de uma fábrica de ração para a alimentação do cacusso e 30 residências para alojar 65 trabalhadores, numa primeira fase.

A ministra das Pescas e do Mar, Vitória de Barros Neto, e o governador do Kuando-Kubango, Pedro Mutindi, lançaram a primeira pedra da futura infra-estrutura. Vitória de Barros Neto enfatizou a possibilidade de o projecto contemplar a “criação de emprego, contribuir para a melhoria da dieta alimentar e para a diversificação da economia, reduzindo assim as exportações”. A ministra reconhece que a produção aquícola “ainda não é a desejável”, por isso, “deve ser incentivada”.

Segundo em Angola

O Centro de Piscicultura do Kuando-Kubango, depois de concluído, será o segundo maior projecto do género em Angola, depois do Centro de Larvicultura do Dondo, no Kwanza-Norte, igualmente montado pela Aquafish, em 2015, onde actualmente são produzidas 340 toneladas de cacusso por ano.

O do Kuando-Kubango chegou a estar previsto no programa de investimento público de 2014, mas, de acordo com o director Nacional da Aquicultura, António da Silva, devido às dificuldades financeiras, “não foi implementado”. Vai acontecer agora através de uma entidade privada.

Face ainda às dificuldades que os investidores na aquicultura enfrentam, sobretudo na aquisição de ração, a produção tem baixado, com excepção em 2017, que registou um crescimento.

A administração da Pescangola, que tomou posse em 2016, revelou ter encontrado a empresa portuária numa “desordem”.

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O presidente do conselho da administração revela que, “entre outras irregularidades, quando chegasse um barco, todo o mundo entrava e não havia controlo”. Sebastião Macunge não tem dúvidas de como era feita a contabilidade: “Era falsa. A empresa recebia informação de que uma embarcação carregava 250 toneladas quando, na verdade, eram 300 e a Pescangola recebia apenas as receitas correspondentes às toneladas declaradas”.

Apesar de não hesitar em descrever essa desordem, Sebastião Macunge salvaguarda que “não pretende criar a ideia de estar a criticar a anterior administração”, mas reforça que “se fizer uma comparação de números, 2017 foi para a Pescangola um ano melhor em comparação ao de 2016”. “Havia uma imagem de desorganização e desordem que tivemos de mudar”, sublinha o PCA, acrescentando que, no entanto, “ainda há muita coisa por mudar, como a descarga que ainda contém fraquezas”.

Uma das medidas previstas é munir a empresa de recursos para se montar um sistema de balança na entrada do cais, o que vai permitir saber as quantidades exactas que as viaturas carregam.

A montagem de um sistema de vídeo-vigilância é outra das medidas que pretende acabar “com práticas antigas”. Mas o PCA faz depender a aplicação das medidas do orçamento disponível.

Mesmo com mudanças, a empresa não escapa às notícias negativas. Em Dezembro, alguma imprensa dava conta de uma sindicância, por alegado desvio de mais de mil milhões de kwanzas. Sebastião Macunge “nega” essas denúncias e acusa um grupo de trabalhadores “inconformados com as mudanças operadas, alguns exonerados, que tentaram passar essa ideia”. O PCA garante que uma equipa de inspecção do Ministério das Pescas analisou as contas e não encontrou irregularidades.

No ano passado, a Pescangola investiu mais dois milhões de dólares na recuperação de uma doca e na parte de um cais destinado à atracagem. Para 2018, prevê iniciar a reparação naval, taxar o lixo produzido pelas embarcações e aproveitar o espaço, cobrando o parqueamento de viaturas. A Pescangola gere todos os portos pesqueiros, entre eles, o da Boavista. Em breve, será inaugurado o do Tômbua e um outro está projectado para o Kwanza-Sul.

A empresa tem três embarcações, um petroleiro, que compra à Sonangol combustível para vender aos armadores de pesca, um rebocador e um de cabotagem.

AGRICULTURA. Plano Intercalar, proposto pelo Governo, é visto como “exequível”, mas “escasso”, pelos operadores agrícolas. Uns sugerem mais medidas, além das preconizadas. Outros ‘torcem o nariz’ aos prazos.

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As medidas destinadas à agricultura, previstas no Plano Intercalar, “são as necessárias, mas precisam de sair do papel e o período previsto para a implementação é irreal”, concluem diversos operadores ouvidos pelo Valor.

O director da ADRA (Acção para o Desenvolvimento Rural e Ambiente), Belarmino Jelembi, entende que “a situação da agricultura é muito crítica e precisa de uma intervenção em outras variáveis” como na “facilidade de financiamento de longo prazo porque não apresenta resultados imediatos” e no seguro agrícola.

Por sua vez, José Maria Dumbo, presidente da cooperativa dos agricultores do Huambo, propõe um “rigoroso controlo” para se identificar quem na verdade é agricultor ou pescador. Sugere, por isso, que ambos os ministérios credenciem quem tem máquinas que justifiquem a subvenção ao combustível “para que não apareçam oportunistas”. Para este líder associativo, “sem combustíveis, não há agricultura mecanizada e, sem essa, os resultados serão apenas virados ao consumo e não para a comercialização”.

O empresário José Macedo, administrador da Agrolider, defende mais medidas para que reflictam as necessidades do sector, mas alerta ser preciso “sair do papel e passar a acções concretas”.

O gestor do ramo agro-industrial gostava que a agricultura fosse olhada “com mais importância”, lembrando que, em Angola, ainda há muita agricultura de subsistência. Daí que proponha que se aposte na agricultura empresarial. “A agricultura deve ser vista com outros olhos, talvez com um orçamento mais gordo, contrariamente aos anos anteriores”, defende.

Os operadores lembram ainda que algumas das medidas propostas no plano “são velhas”. O plano preconiza, entre outras medidas, implementar um sistema de crédito fiscal pós-produção, um modelo de subsídio ao combustível orientado para a agricultura, pesca e alguma indústria transformadora, o aumento da produção e o reforço da capacidade institucional e técnica dos órgãos de fomento agrícola. Além disso, prevê a revisão de todo o sistema de gestão de infra-estruturas de irrigação, de forma a optimizar o seu rendimento.

Acelerar a produção de sementes e actualizar o estudo sobre o seguro agrícola e estimular as seguradoras a terem em carteira uma percentagem mínima alocada a este seguro também constam do plano.

Outras medidas passam pela dinamização da produção do algodão, cana-de-açúcar, girassol, café, palmar e cacau, promovendo a sua articulação com a indústria, pela revisão do sistema de gestão e pelo redimensionamento das fazendas de média e grande escalas e a melhoria dos acordos de partilha da produção das pescas, privilegiando os interesses nacionais.

O Plano Intercalar foi apresentado em Outubro com a previsão de concluir a implementação destas medidas até Março.