BOAS PRÁTICAS
É consensual hoje, pelo menos em teoria, que o país carece de um conjunto de reformas que assente, resumidamente, na adopção de boas práticas. Boas práticas precisam-se na produção, gestão e distribuição dos rendimentos públicos nos diferentes níveis da governação e da administração do Estado. Boas práticas requerem-se na administração de empresas públicas e privadas. Na gestão da banca e na regulação dos mercados. Boas práticas exigem-se na administração e gestão do ensino. Nos critérios de acesso às oportunidades, em termos gerais e abstractos. Boas práticas recomendam-se até, a nível mais doméstico, na gestão dos recursos pessoais. O país, no fundo, precisa de boas práticas no seu todo.
Vem essa reflexão, mais uma vez, a propósito de dois factos de relevância política, económica e social que marcaram a última semana. O mais importante está relacionado com o universo das telecomunicações. O Ministério das Telecomunicações e Tecnologias de Informação, sob a liderança de José Carvalho da Rocha, anunciou o início das pré-vendas das capacidades de serviços do Angosat1. A Televisão Pública de Angola e a congolesa democrática Renatelsat adiantaram-se com a assinatura de contratos de reserva. Carvalho da Rocha decidiu, entretanto, juntar ao anúncio das pré-vendas outras iniciativas para assegurar que o primeiro satélite angolano já é, de facto e de jure, uma realidade. Uma dessas iniciativas foi abrir as portas do Centro de Controlo e Missão de Satélite, na Funda, em Luanda, a várias individualidades, incluindo directores de órgãos de comunicação e social e fazedores de opinião. E o que ficou à vista, apesar da necessidade de crescimento dos recursos humanos em termos quantitativos e qualitativos, sinalizou, de forma clara, que há vontade para uma aposta séria nas capacidades angolanas. Basta referir que o Angosat 1, a partir do momento em que estiver em órbita, vai ser operacionalizado exclusivamente por técnicos angolanos formados a propósito. A assistência estrangeira estará reservada apenas à eventualidade de intervenções mais complexas. Ou seja, ao contrário do que se esperaria de um projecto dessa dimensão, na operacionalização do satélite angolano não haverá consultores estrangeiros. Apenas jovens angolanos. E ainda que se tenha tratado de uma imposição do fabricante russo, qualquer um de bom senso percebe que estão em causa apenas benefícios para o país. Porque, ao excluir-se a mão visível dos consultores de costume, entre outras possibilidades, há garantias mais efectivas de transferência de conhecimentos para nacionais, logo para Angola. Está aqui, portanto, um exemplo de boa prática que deve ser destacado e incentivado.
Outro facto relevante da última semana que ressuscita o tema das boas práticas foi o rompimento brusco e unilateral do contrato de gestão da TAAG, por iniciativa da Emirates. Quando, em Outubro de 2016, o demissionário PCA da TAAG defendeu, numa entrevista polémica ao VALOR, que a fase de reestruturação das grandes empresas deveria ser liderada por estrangeiros, escrevemos, na mesma edição, que a tese de Peter Hill só seria simplista se fosse analisada também de forma simplista e abstracta. Dissemos, na altura, que Peter Hill se referia a estrangeiros de culturas empresariais com solidez material suficiente, ao ponto de recusarem acordos de indigência. De estrangeiros que não sucumbiam à promiscuidade e à mediocridade na primeira esquina de Luanda. De estrangeiros obcecados pela cultura das boas práticas. Era a derradeira explicação da diferença entre a gestão da Emirates na TAAG e a ‘gestão’ que nos oferecem os consultores de costume. Alguém não percebeu a diferença fundamental e, claro, a Emirates bazou.
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