Kwanza “esperto” ou “burro”, o que é melhor?
O kwanza já se apreciou 5,1% em 2022 – se em 31 de Dezembro de 2021 eram necessários kz 554,981 para comprar uma Dólar, no dia 8 de Fevereiro de 2022 bastavam kz 527,863.
A moeda nacional ampliou os ganhos de 17,1% registados em 2021 – o custo de um Dólar desceu de kz 649,911 em 31 de Dezembro de 2020 para os referidos kz 554,981 no final do ano passado.
Face ao máximo de sempre de kz 561,875, registado no final de Outubro princípios de Novembro de 2020, o kwanza aprecia-se 26,1%.
Ganhos que estão muito longe de anular as perdas registadas depois da liberalização. Comparando com os kz 165,924 de 8 de Janeiro de 2018, último dia antes da liberalização, o kwanza ainda deprecia 68,6%.
Escrevi apreciação/depreciação e não valorização/desvalorização porque a utilização de um ou outro termo depende do regime cambial. Em regime de cambios livres, em que o valor de uma moeda depende do jogo entre a oferta e a procura, usa-se apreciação/depreciação. Já no regime de câmbios fixos, em que a alteração da taxa de câmbio depende da decisão da autoridade cambial, diz-se valorização/desvalorização.
O kwanza está actualmente em máximos desde o início de Abril de 2020, para gáudio de muitos.
Como escrevi aqui no 100 makas de 9 de Novembro nada que surpreenda o governador do Banco Nacional de Angola. A taxa de câmbio do kwanza encontrou o seu “equilíbrio” num mercado “normalizado” na sequência da liberalização iniciada em Janeiro de 2018. Com as operações “em dia” e as “reservas a crescer”, é “natural” que haja uma apreciação da taxa de câmbio, explicou José de Lima Massano em várias ocasiões.
No essencial, até estou de acordo com o guardião do valor da moeda nacional. Só não estou totalmente de acordo porque inicialmente a fortaleza do kwanza contou com a ajuda da autoridade cambial, limitando os valores a que os bancos comerciais compram os dólares na plataforma da Bloomberg. Mais recentemente o BNA voltou a intervir mas em sentido oposto, comprando dólares ao Tesouro Nacional para evitar uma maior apreciação do kwanza.
Mas não são as causas da apreciação do kwanza que me levam a regressar ao tema cambial. O assunto hoje é se o kwanza forte é bom ou mau para a economia nacional.
O tema não é pacífico nem novo. Há cerca de nove anos, a simples estabilidade da moeda nacional foi objecto de considerações diametralmente opostas no Relatório & Contas (R&C) de 2012 do BNA, então também liderado por Massano, e do Angola Economic Update do Banco Mundial de Junho de 2013.
“A estabilidade da taxa kwanza em 2012 proporcionou um ambiente favorável à actividade económica, em particular para a importação de bens de capital e para o investimento interno, tendo em perspectiva um crescimento mais robusto da economia nacional. Este facto (...), permitiu a regularidade da execução cambial e da importação de bens para o país”, lia-se no R&C do BNA.
Se o BNA elogiava a estabilidade do kwanza, o BM garantia que “a política de estabilidade da taxa de câmbio nominal do BNA contribuiu para a apreciação da taxa de câmbio real efectiva (TCRE) do kwanza”. O que não é bom para a diversificação da economia. “A TCRE real do kwanza pode estar desalinhada com os fundamentais da economia angolana, penalizando a competitividade do sector não petrolífero”, alertava a instituição multilateral.
Como o próprio nome indica, a taxa de câmbio real efectiva do kwanza tem em conta os diferenciais de inflação entre Angola e os seus principais parceiros comerciais.
Agora, como então, a taxa de inflação média angolana é muito mais elevada do que nos países que mais mais trocas fazem com Angola — actuamente o diferencial chega a ser superior a 20 pontos percentuais.
Ou seja, agora, como então, o kwanza precisaria de se depreciar para que se mantivesse a competitividade dos produtos nacionais face aos estrangeiros.
Traduzindo do economês, o BNA defendia que a estabilidade nominal do kwanza era boa para a economia porque favorecia o investimento, maioritariamente com recurso a bens importados. Já o BM alertava que tendo em conta que a inflação em Angola era mais alta do que nos seus parceiros comercais, a estabilidade nominal do kwanza correspondia, na prática, à sua apreciação em termos reais, penalizando o sector não petrolífero, isto é a diversificação da economia.
Como agora estamos a falar de apreciação, quer real, quer nominal, e não de estabilidade, o cenário ainda é pior para a diversificação.
A apreciação de uma moeda torna os produtos estrangeiros mais baratos em moeda nacional e os produtos nacionais mais caros em moeda estrangeira. Isso favorece as importações e prejudica as exportações.
No caso de Angola, alguns analistas não dão importância aos efeitos nocivos da apreciação do kwanza nas exportações. O raciocínio é simples. Angola exporta praticamente um único produto, o petróleo, cujo preço é fixado internacionalmente. Assim sendo, eventuais apreciações do kwanza não aquecem nem arrefecem as exportações angolanas.
Como exporta um único produto cujo preço não depende do valor do kwanza, Angola não fica a perder no mercado externo. Contudo o mesmo não acontece no mercado interno. Os produtos feitos em Angola concorrem com os produtos estrangeiros no mercado nacional. O que quer dizer que quando o kwanza se aprecia, tornando os produtos estrangeiros mais baratos em kwanzas, os consumidores angolanos prefrem comprar produtos estrangeiros em vez de nacionais por questões de preço.
Daí o alerta sobre as consequências nefastas da apreciação real do kwanza sobre o sector não petrolífero.
Um facto ao qual o BNA não parecia dar muita importância no R&C de 2012. Também percebo porquê. E não é para favorecer a importação de bens de capital e o investimento interno potenciadores do crescimento económico a prazo. É porque, o banco central estava totalmente focado no controlo da inflação. Num país como Angola, que importa a maioria dos produtos que consome, um kwanza forte favorece a estabilidade dos preços.
Resumindo para concluir, a política do kwanza forte é mais adequada para combater a inflação, enquanto a do kwanza fraco é mais amiga da diversificação da economia.
*Por razões de agenda pessoal, reduzi a periodicidade do ‘Economia 100 Makas’ para quinzenal em vez de semanal. Até daqui a 15 dias.
JLo do lado errado da história