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Como ajudar ‘a taça de pó africana’

16 Jan. 2017 Sem Autor Opinião

A Imagine uma pequena fazenda sob um céu ardente e quente. Uma intensa seca afecta a região, as perspectivas para a próxima colheita são sombrias e o sistema financeiro não tem capacidade de fornecer empréstimos de que os agricultores precisam para superar. Este cenário descreve o sul de África hoje, que está submetido a uma seca épica. Também descreve o leste de Nebraska os anos do ‘Dust Bowl’ (‘Taça de Pó’) do início dos anos 1930 - um período através do qual a minha própria família viveu.

O meu pai, Ralph Raikes, foi o primeiro na família a formar-se numa faculdade. Depois de trabalhar para a Standard Oil na Califórnia, dedicou-se à fazenda dos pais antes de chegar a Cambridge, Massachusetts, onde planeava prosseguir os estudos de pós-graduação no MIT. Mas nunca o fez . Foi obrigado a ficar em Nebraska a ajudar o meu avô a salvar a fazenda familiar dos bancos, que já haviam recuperado um terço da terra.

A mudança mais importante que o meu pai fez foi pensar na fazenda, não como uma operação de subsistência, mas como uma empresa familiar. Voltou-se para a Universidade de Nebraska, onde havia recebido o diploma, e adquiriu milho híbrido e outras sementes melhoradas que a universidade estava a desenvolver. Em seguida, monitorou entradas e condições meteorológicas, o que raramente era feito.

O meu pai percebeu que não poderia caminhar sozinho e que precisaria de um melhor acesso a financiamentos. Assim, associou-se - primeiro como cliente e depois como conselheiro e director – à Farm Credit, uma rede nacional de cooperativas bancárias, que ajudou os agricultores a enfrentarem a ‘Dust Bowl’. Ajudou também a fundar a Nebraska Farm Business Association, que agregava dados que ele e os colegas recolheram, para que pudessem determinar as melhores práticas. E trabalhou com minha mãe, Alice, que dirigia o negócio familiar de aves domésticas.

A Farm Credit e os laboratórios e estufas da Universidade de Nebraska surgiram através dos programas do governo dos EUA criados para melhorar o desempenho agrícola. O sector estava submerso em 1933. Com um quarto da população a viver em fazendas, eram necessários mais investimentos. Naquele ano, o Congresso norte-americano aprovou a primeira ‘lei agrícola’, a Lei de Ajuste Agrícola, que impulsionou o investimento na economia rural e ajudou a levantar os rendimentos agrícolas em 50% em dois anos. Os programas agrícolas federais tratavam a agricultura como uma empresa, permitindo que homens de negócios, como o meu pai, prosperassem.

80 anos depois, os agricultores africanos precisam de fazer a mesma mudança, tratando as operações de subsistência como empresas familiares. Tal como o pai durante os anos da ‘Dust Bowl’, os africanos têm novos meios à sua disposição: uma ampla gama de novas sementes e outras tecnologias foram desenvolvidas para as fazendas familiares - aquelas com 4-5 hectares ou menos - para usar no campo. Em Outubro, um grupo de cientistas recebeu o Prémio Mundial de Alimentos para produzir e disseminar uma variedade de batata-doce que adiciona vitamina A às dietas da população subsaariana e outras novas variedades de sementes ajudam os agricultores a sobreviver à seca.

Mas, como um relatório recente da Aliança para uma Revolução Verde em África (AGRA) deixa claro, o investimento estatal deve acompanhar a ciência. A agricultura compreende quase dois terços da mão-de-obra da África Subsaariana e, em 2003, a União Africana apelou para que os países aumentassem os investimentos no sector para uns ambiciosos 10%, relativos a todos os gastos governamentais. Apenas 13 países responderam a essa chamada, mas os seus investimentos - em pesquisa e desenvolvimento, serviços que ajudam os agricultores a tirar proveito dos resultados de estudo, iniciativas de crédito e financiamento, bolsas para mercadorias e outros esforços de marketing - já pagaram esses dividendos. Esses 13 países já sentem melhorias significativas na produção agrícola, no PIB ‘per capita’ e na nutrição.

O investimento governamental abre o caminho para o investimento do sector privado e poderia ser uma mudança para os agricultores africanos, que têm operado, durante muito tempo, em níveis de subsistência. Apenas cerca de 6% das famílias rurais na África Subsaariana recebem empréstimos de instituições financeiras. Além disso, quase dois terços dos terrenos agrícolas africanos não possuem nutrientes essenciais e muitos agricultores não têm conhecimentos técnicos e recursos necessários para restaurar a fertilidade da sua terra, deixando-as incapazes de tirar pleno partido das novas tecnologias. Os agricultores africanos, que cultivam novas variedades de culturas, estão a aumentar os rendimentos em apenas 28%, em comparação, por exemplo, com os 88% dos agricultores da Ásia.

Os meus pais asseguraram que os cinco filhos se formassem na faculdade. Como eles, os agricultores, em todo o lado, querem garantir aos filhos uma vida saudável e próspera. Todos reconhecem a importância da educação. Os agricultores que conheci em todo o mundo, muitas vezes, só querem vender produtos extra o suficiente para pagar as contas de saúde e colocar os filhos na escola. Aproveitam as oportunidades quando surgem e posicionam os filhos para colher maiores lucros no futuro.

Espera-se que uma história americana de progresso económico, como a de minha família, também seja uma história africana. Com tantas inovações, tornando-se disponíveis, os agricultores familiares da África precisam dos seus governos para investir. Se o fizerem, o futuro vai parecer muito melhor do que a realidade empoeirada e desesperada de hoje.

 

Jeff Raikes é co-fundador da Fundação Raikes, ex-CEO da Fundação Bill & Melinda Gates e ex-presidente da Divisão de Negócios da Microsoft. Membro do conselho da Aliança para uma Revolução Verde em África (AGRA).