Mercado de Capitais em Angola: implementação de uma cultura de compliance nas instituições financeiras

14 Sep. 2022 Opinião
Mercado de Capitais em Angola: implementação de uma cultura de compliance nas instituições financeiras

Estamos já a assistir à semana em que se realiza 100% online o 1º Fórum de Cultura de Compliance, com mais de 30 oradores de mais de 10 países. Eu serei orador na Quarta-feira, 14 de Setembro, pelas 14 horas. A minha abordagem será sobre os canais de denúncias e investigação interna.

O tema do compliance está instalado nas nossas vidas e a tendência é para crescer ao nível do aprofundamento e democratização da “conformidade” nas empresas. As empresas que querem aderir ao um mercado de capitais, mas também os intermediários financeiros (“brokers”), o regulador e outras entidades.

A implementação de política de compliance no mercado financeiro é capaz de garantir segurança no sector e gerar mais confiança nas pessoas envolvidas: clientes bancários, investidores, accionistas, donos de capital, gestores, e os que estão a trabalhar ou prestam serviços a quem investe no mercado de capitais, legisladores. Tal política ou estratégia é uma ferramenta e que actua como um programa regulatório e de fiscalização, que deve ser implantado nas instituições para trazer bons resultados, seja económicos e financeiros, mas também de credibilidade e sustentabilidade.

O termo compliance surgiu do verbo em inglês “to comply”, que significa cumprir regras estabelecidas. Os programas de compliance asseguram que a empresa cumpra com rigor normas como as de prevenção a fraudes, auditorias internas e externas e gestão de riscos.

O mercado financeiro passa por mudanças constantes e desde a crise do sub-prime (crédito hipotecário nos Estados Unidos da América, em 2008), crise que se espalhou por todo o mundo e há entendidos que defendem a ideia que esta crise ainda não está encerrada e ela levantou a necessidade ou a premência de elaborar, implementar e fiscalizar uma prática eficiente de compliance para mitigar os efeitos nefastos/negativos das transformações que ocorrem na vida humana e se instalam também nas empresas e nos mercados de capitais. Uma dessas políticas serve para o combate ao crime de corrupção e à lavagem de dinheiro.

Em Angola temos um conjunto de leis e instrutivos de prevenção à corrupção, branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo, mas a meu ver, precisamos uma Circular Financeira para um novo cenário de compliance para as companhias financeiras no país: bancárias, seguradoras, e outras entidades financeiras não monetárias. Tal Circular passaria por estabelecer um novo conjunto de políticas e de controlos internos para garantir a prevenção à lavagem de dinheiro e ao terrorismo financeiro. A determinação da circular sobre procedimentos de prevenção aos crimes mencionados consideraria haver riscos em diversas esferas, entre elas:

•clientes;

•instituição;

•operações;

•transacções;

•produtos e serviços.

•funcionários;

•parceiros;

•prestadores de serviços terceirizados (outsourcing).

A base para que ferramentas de compliance sejam implantadas para prevenir lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo, conforme a Circular, inclui:

•Directrizes gerais: definição de papéis, novas tecnologias e capacitações.

•Directrizes para implementação de procedimentos: actualização de informações cadastrais, registo de operações, monitorização de actividades suspeitas e comunicação ao Conselho de Controlo de Actividades Financeiras.

•Comprometimento da alta administração: efectividade e melhoria contínua da política, dos procedimentos e dos controlos internos.

 A política de compliance das instituições devem ser aprovadas pelo Conselho de Administração da empresa ou por sua Direcção, com papel fundamental do Compliance Officer.

Clareza na implementação do compliance financeiro

Todos os sectores de uma instituição financeira devem-se adequar às novas regras quando uma área de compliance é implementada. O suporte de profissionais de compliance especialistas no assunto é muito bem-vindo, principalmente no início do processo, para que todas as normas possam ser desenvolvidas.

A gestão deve analisar e seguir determinadas condições para o bom funcionamento do programa e podem passar:

•código de conduta com linguagem clara e simples para o entendimento de todos os funcionários;

•comunicação interna, por meio, por exemplo, do endomarketing, para conscientizar os colaboradores sobre as regras;

•divulgação do “tone at the top”, para envolver a participação da alta Direcção, que deve dar o exemplo e engajar os demais membros da companhia.

 

Os programas de compliance podem actuar em diversas frentes dentro da instituição, como na gestão de risco, na governação corporativa e na gestão de processos. Uma dessas frentes deve cumprir algumas obrigações, como fazer avaliação de risco, conhecer os clientes, registar operações, analisar situações suspeitas e comunicá-las à Unidade de Informação Financeira e aos Reguladores Sectoriais: Banco Nacional de Angola, Agência Reguladora de Seguros de Angola, Instituto de Supervisão de Jogos, Comissão de Mercado de Capitais, etc. 

A avaliação de risco quanto à possibilidade de lavagem de dinheiro e de financiamento do terrorismo é obrigatória. Ela deve ser documentada e aprovada pelo responsável pelo cumprimento do programa de compliance e encaminhada aos Comités de Rrisco e de Auditoria e ao Conselho de Administração ou à Direcção da empresa.

As instituições financeiras também devem conhecer os clientes, por meio de procedimentos que identifiquem e validem a identidade deles, mesmo que, para isso, seja preciso confrontar informações disponíveis em bancos de dados públicos e privados. Sendo assim:

•Os clientes devem ser qualificados a partir de seu perfil de risco, inclusive se forem indivíduos expostos politicamente.

•A capacidade financeira de cada um deles deve ser avaliada.

•Entende-se como capacidade financeira, para pessoas físicas, o seu rendimento e origem dos mesmos e, para pessoas jurídicas, a facturação, resultados líquidos, as demonstrações financeiras, etc.

Em relação ao registo das operações, as companhias financeiras devem inscrever todas elas. Além disso, precisam ser registados todos os produtos e serviços contratados, incluindo depósitos, saques, pagamentos, aportes, transferências de recursos e recebimentos.

Devem ser realizados, ainda, processos de monitorização, de selecção e a análise de operações e situações suspeitas. Todos os procedimentos que analisem actividades suspeitas devem ser comunicados às entidades em cima mencionadas.

Se a instituições financeiras implementarem de facto o sistema de compliance no dia-a-dia vamos ambicionar e alcançar:

•Ganho de vantagens competitivas;

•Atracção de talentos;

•Atracção de investimentos;

•Incremento da segurança jurídica;

•Redução de custos operacionais e financeiros;

•Melhoria dos resultados económicos e financeiros, inclusive pelo aumento em número e em valor dos depositantes e do crédito;

•Estabilidade do sistema financeiro e do país onde estão instaladas;

•Melhoria do rating da instituição e do país;

•Mais fácil acesso a outros mercados financeiros de financiamento e correspondentes bancários.

O compliance não é uma opção, é uma boa amiga obrigação para sobrevivência e organização das instituições e delas dependem Estados, famílias e todo um mercado de negócios que são a razão de existir dos bancos e outras entidades financeiras, estando ou não no mercado de capitais, mas estando, o nível de responsabilidade aumenta e é aqui que também entra e está instalado o compliance.

Daniel Sapateiro

Daniel Sapateiro

professor doutorado em Economia Monetária e Comparada