Revisão do OGE dependente do Twitter do Trump
MACROECONOMIA. OGE foi aprovado na generalidade, na semana passada, pelos deputados e, coincidentemente, o preço do barril de petróleo esteve a ser negociado abaixo da referência utilizada na elaboração do documento e a níveis que agradam ao presidente dos Estados Unidos. OPEP promete tudo fazer para aumentar.
A vitória clara de Donald Trump, durante o mês de Outubro, sobre a Organização dos Países Produtores de Petróleo, OPEP, na disputa pelo preço do petróleo levou a que o Orçamento Geral do Estado fosse aprovado, na generalidade, num ambiente de desconfiança, visto que o barril estava a ser negociado a 67 dólares, quando o preço de referência da elaboração do documento é 68 dólares.
Perante a situação e a manifestada intenção de Trump de continuar a defender a redução do preço do petróleo, com recurso ao twitter, surgiram vozes a defender a revisão imediata do documento, mas também há os que defendem o contrário.
José Oliveira e António Vieira estimam que o preço médio rondará os 70 dólares e, por isso, consideram “desnecessária” a revisão da proposta do OGE.
“Considero o valor de base do OGE acertado. Nada indica que o petróleo ande muito tempo abaixo dos 70 dólares nos próximos meses”, argumentou José de Oliveira, especialista em questões energéticas e investigador da Universidade Católica de Angola.
Por sua vez, António Vieira, antigo director da petrolífera Cobalt, classifica “boa, apesar de algum risco”, a previsão de 68 dólares, porque “o preço médio vai estar acima dos 70 dólares”.
“Agora que a Europa está a entrar no inverno, a minha previsão é que, nos próximos dois meses, o preço esteja acima dos 70 dólares e nunca abaixo dos 65 e pode chegar aos 100 dólares”, argumentou, para depois justificar-se com a suposta incapacidade dos Estados Unidos de pressionar o recuo dos preços, perante a decisão da OPEP, liderada pela Arábia Saudida, reduzir a produção.
“Há pressão dos Estados Unidos no sentido de fixar o preço a 65 dólares, porque são os mais prejudicados, mas, se a OPEP apostar no corte, os Estados Unidos não conseguem garantir a demanda”, argumenta.
A estimativa de 70 dólares, de resto, coincide com as principais previsões internacionais. O Banco Mundial, por exemplo, calcula um preço médio de 74 dólares, enquanto a Agência Internacional de Energia, na sua mais recente previsão, realizada na semana passada, estimou em cerca de 73,7 dólares.
Por sua vez, o consultor financeiro Ivan Negro defende que o documento deveria ser elaborado com um preço base de 50 dólares para o barril de petróleo, porque “a volatilidade do preço do petróleo é elevada e os efeitos para Angola costumam ser catastróficos”. Assim, acrescenta, “Angola deve pensar na perspectiva de médio e longo prazos, o cenário pessimista, ou, pelo menos, negativo, aponta para 50 USD. Ora, toda e qualquer margem para o Orçamento seria melhor do que partir de um valor elevado, e ter de recuar perante a obtenção de receita e potencial despesa”, argumentou.
Tem a mesma opinião o economista Precioso Domingo, que considera “um grande erro”, defendendo um preço de referência de 50 dólares “como forma de garantir a estabilidade orçamental e evitar que as despesas cresçam conforme vem a acontecer”.
“O Governo, dessa forma, potencia os riscos orçamentais que poderão transmitir-se para o resto da economia. A esse ritmo, prevejo uma crise na economia em Angola ainda mais profunda do que a actual”, defendeu o docente da Universidade Católica de Angola e investigador do Centro de Estudos e Investigação da mesma instituição.
Precioso Domingos lembra ainda que, “dessa vez, uma queda vertiginosa do preço do petróleo não apanhará a produção petrolífera nos 1,7 milhões de barris/dia, mas sim nos 1,5 milhões de barris/dia ou menos”, o que tornaria a “situação muito mais crítica”.
À margem da sessão do Parlamento que aprovou o Orçamento, o ministro das Finanças, Archer Mangueira, adiantou que foram criados cenários para permitir que o documento seja aprovado na especialidade de “forma consciente”. Falou do cenário pessimista, optimista e conservador, visto que “ninguém sabe o que vai acontecer amanhã”, visto que uma simples decisão política pode alterar o preço do barril.
Salientou ainda que a possibilidade de revisão “nunca pode ser posta de parte”, salientando que vai depender da grandeza do impacto nas projecções do Orçamento.
Nos últimos oito anos, a queda do preço do petróleo forçou a revisão de três orçamentos. Em 2010, o documento foi projectado inicialmente com o preço a 74,40 dólares, mas acabou revisto para 65,32 dólares. O mesmo exercício registou-se em 2015, quando passou de 81 para 40 dólares e, em 2016, dos 53 para 45 dólares.
Uma guerra sem fim…
Tudo indica que o diferendo entre a OPEP e o presidente dos Estados Unidos não terminará tão cedo. Trump defende a redução do preço do petróleo e, na segunda metade de Outubro, viu isto acontecer e com quedas ‘records’. Interrompeu-se uma tendência crescente que se registava desde Agosto e que levou o barril a ser negociado a 84 dólares, em meados de Outubro. Depois foi só cair e, no dia 14 de Novembro, quando OGE foi aprovado, esteve a ser negociado a 65 dólares.
Três dias antes, os membros da OPEP reuniram-se e prometeram tudo fazer para manter os níveis que pretendem, o petróleo a ser negociado na casa dos 70 dólares. “Vamos fazer o que for preciso para manter a estabilidade que alcançámos”, prometeu o secretário-geral da OPEP, Mohammad Barkindo, à margem do encontro.
Defendeu ainda a necessidade de Donald Trump lembrar que as empresas americanas foram das mais prejudicadas com a crise petrolífera. “No final de contas, qualquer decisão que tomarmos será do interesse dos Estados Unidos”, disse Barkindo. “Tenho certeza de que ele [Trump] vai chegar a um acordo com a realidade.” Mas Trump, para já, respondeu apenas com apelos.
No mesmo dia da reunião da OPEP mais a Rússia, Trump pediu ao cartel para não cortar a produção, evitando o aumento do preço. “Esperemos que a Arábia Saudita e a OPEP não cortem a produção de petróleo”, ‘twittou’ o presidente norte-americano, acrescentando que “os preços do petróleo devem ser muito menores com base na oferta”.
O conflito e, sobretudo, o impacto que o aumento da produção petrolífera norte-americana e as posições de Donald Trump tiveram na queda do preço levantam interrogações sobre a actual capacidade de a OPEP influenciar o preço do crude. Os últimos dados da organização dão conta que a quota do cartel na produção petrolífera global é de 33% e foi de 32,9 milhões de b/d em Outubro. No mesmo período, a produção média diária mundial foi de 99,8 milhões.
Produção angolana também em dúvida
Além do preço de referência na elaboração do OGE, também existem dúvidas devido à produção prevista.
O documento foi elaborado com a produção média diária de 1,570.5 mil barris quando se regista uma tendência decrescente há vários anos, fixando a produção em pouco mais de 1,4 milhões de barris por dia. “Parece-me elevada a produção média estimada para 2019. Tenho sérias dúvidas de que a média anual ultrapasse os 1.550.000 b/d. Esperemos que a diferença de preço compense se não atingirmos a média de produção usada para o cálculo de receitas do OGE de 2019”, argumentou José Oliveira.
Por sua vez, António Vieira considera uma previsão “razoável”, estimando que se poderá registar uma diferença de 3% ou 4% que tanto pode ser para “baixo ou para cima”.
Já Ivan Negro considera “irreal” a produção prevista, visto que que a produção prevista “é irreal”, visto que “a capacidade angolana continua a diminuir”.
“Quem no fundo acaba por ter poder sobre o judicial...