Sonangol estimada entre 22 e 27 mil milhões USD
PETRÓLEO. Estimativa fixa em cerca de 6,4 mil milhões de dólares o que o Estado pode ganhar com a venda dos 30% da empresa. Especialistas questionam números, considerando subvalorizado.
Sonangol, a maior empresa pública do país, está avaliada entre 21,8 e 27 mil milhões de dólares. A estimativa foi fixada com base no fluxo de caixa e com apoio da consultora Ernest & Young contratada para trabalhar no processo de alienação de 30% da petrolífera.
“Assim, os 30% destinados para a alienação seriam equivalentes a 6,4 mil milhões de dólares”, estimou o administrador da Sonangol, Baltazar Miguel, durante a habitual conferência de imprensa anual da empresa.
É a primeira vez, há vários anos, que se torna pública uma estimativa sobre o valor da empresa. A estimativa foi calculada considerando o conglomerado de negócios da empresa, apesar da decisão de desmembramento dos negócios não nucleares ou fora do sector petrolífero.
Há, entretanto, uma corrente que considera “muito subvalorizados” os números apresentados. Recentemente, por exemplo, num texto de opinião publicado no VALOR, António Vieira, antigo director da petrolífera Cobalt Angola, estimou entre 117,20 e 145,8 mil milhões de dólares o valor da petrolífera.
“Portanto, quanto vale a Sonangol simplesmente em função das suas reservas? Todos os outros ‘assets’ que a Sonangol possui neste momento não estão aqui reflectidos, uma vez que acredito terem, nessa ocasião, sido vendidos em separado. Assim sendo, os angolanos na cadeira do poder têm a obrigação de trazer para os cofres do estado entre 117 e 145 mil milhões de dólares.”
Os defensores desta corrente entendem que “nenhuma avaliação é séria e honesta se não incluir as reservas das companhias” no cálculo do valor da empresa. Mas admitem ser “possível que se defendam com o argumento de que as reservas pertencem ao Estado e não à Sonangol, mas não é assim que deve ser feito o cálculo”.
O jurista Flávio Inocêncio também considera “um valor reduzido”, acrescentando que o cálculo do do valor deveria considerar “não só as reservas mas o potencial de valorização, considerando a nova lei de conteúdo local”
Por seu turno, um quadro sénior do Ministério dos Recursos Minerais, Petróleo e Gás defende que, mesmo tendo em conta as reservas, é errado considerarem-se “as reservas globais porque muitos blocos estão atribuídos a outras empresas”
AMBIÇÃO DIFERENCIADA NO PROPRIV
A lógica da petrolífera no processo de alienação dos activos não nucleares da petrolífera tem sido, muitas vezes, questionada, sobretudo pelo investimento que continua a fazer em alguns dos activos que estão na lista dos alienáveis como aconteceu, por exemplo, com o reforço da sua posição na Unitel. “A Sonangol não perdeu do ponto de vista estratégico a intenção de se desfazer dos negócios não nucleares, o que não quer dizer que, para se desfazer destes negócios não nucleares, não tenhamos de percorrer um percurso que, muitas vezes, implica entrar inicialmente, mas não perdeu o objectivo inicial. É o que está a acontecer com o Banco Económico e a própria actividade das telecomunicações. Temos de tornar os activos capazes de atrair quem queira comprar. Vamos fazer com todos os activos”, refere o PCA da empresa.
No entanto, quando questionado sobre o custo envolvido na alienação dos três activos até agora vendidos, indicador que serviria para avaliar os ganhos do negócio, Sebastião Pai Querido apresentou outro discurso, salientando que o mais importante não é o que se ganha, mas desfazer-se dos activos não nucleares. “Para nós, o que nos interessa é que foi um activo ‘não core’, não fazia parte das nossas necessidades mantê-lo nos nossos horizontes, fizemos esta alienação e vamos continuar a fazer com os activos não ligados à actividade de core para que fiquemos uma empresa mais focada”, explicou.
Em causa, estão três activos imobiliários em Portugal (um edifício na Avenida da República, em Lisboa, o antigo Convento de Brancanes, em Setúbal, e a Quinta do Lazareto, em Almada), vendidos por cerca de 40,6 milhões de euros e, muitas vezes, citados como vendidos abaixo do valor real.
INVESTIR EM RENOVÁVEIS SEM OUSADIA
Assim como grande parte das petroleiras internacionais, a Sonangol também prepara caminho para investir nas energias renováveis como garantiu. “Estamos a fazer um percurso que visa esta transição de empresa só de ‘oil and gas’, mas também uma empresa de energia. O que não quer dizer que vamos parar o investimento no ‘oil and gas’, porque a maior fonte de receita para a maior parte das empresas que estão a fazer este mesmo percurso ainda é o ‘oil and gas’. Mas estamos a acompanhar as tendências, sem imitar, mas procurar fazer com os pés assentes”, declarou o PCA da petrolífera.
Questionado se, considerando a referida transição para as renováveis, a Sonangol nunca analisou a possibilidade de investir na Efacec, uma referência internacional nas renováveis que se encontra em processo de reprivatização depois de o Estado Português nacionalizar a posição (71%) que pertencia à Isabel dos Santos, o número um da Sonangol referiu que a empresa está virada para outros objectivos. “Sinceramente, neste momento, não estamos alinhados para isso, estamos focados nos nossos activos com que temos pleno controlo do que estamos a fazer e com as parcerias que temos. O efeito Efacec provavelmente ainda não está no nosso horizonte, porque não é nosso objectivo. Temos é no Namibe a parceria com a ENI e na Huila com a Total. É esse o nosso foco. Não vamos entrar porque alguém pretende que nós entremos ou não na Efacec.”
A administração da Sonangol sublinhou, no entanto, que a Sonangol tem “hoje uma direcção de estratégia e gestão de portfólio” que “avalia o investimento em termos do equilíbrio a nível de toda empresa”, estando, por isso, preparada para analisar diversas oportunidades.
LUCROS CAEM, PROVEITOS CAEM, DÍVIDA AUMENTA
O ano foi marcado por reduções em alguns dos principais indicadores financeiros da empresa com os lucros antes do pagamento dos impostos a caír 58,8%, passando de 4.779 para 1.971 milhões de dólares, enquanto proveitos operacionais recuaram 42,2% para 5.982 milhões de dólares.
A petrolífera justifica as reduções com “a baixa do preço do petróleo bruto decorrente da pandemia da covid-19”. A situação pandémica, entretanto, ajudou a empresa a reduzir os custos operacionais para 4.011 face aos 5.452 milhões de dólares, ou seja, uma redução de 26% que também contou com “o ambicioso programa de redução de custos”.
Em sentido oposto, a dívida líquida da petrolífera aumentou 80%, passando de 1.000 milhões para 1.801 milhões de dólares, “explicada pela exclusão dos fundos de abandono depositados em EscrowAccounts”. Esta mesma transferência é apresentada como razão para o recuo em 40% da disponibilidade financeira que passou de 4.034 para 2.423 milhões de dólares.
UM ANO SEM EXPLORAÇÃO
No que diz respeito à actividade petrolífera, o ano ficou marcado pela não realização de qualquer actividade de exploração “devido a condicionantes logísticas impostas pela pandemia”. Em 2019, foram realizadas oito actividades, repartidas entre a exploração de sete poços e a avaliação de um.
A produção de petróleo bruto registou uma variação negativa de 2,3% “devido à maturidade dos reservatórios e problemas operacionais adjacentes”. Foram produzidos 237.411 bpd contra os 243.313 bpd de 2019. A produção dos blocos operados pela petrolífera de bandeira caiu, por sua vez, 17%, passando de 9.943 para 8.235 bpd. Com estes números, de acordo com a petrolífera, a meta de produção diária foi alcançada em cerca de 78%.
A exportação petrolífera, por outro lado, recuou 4% ao passar de 169,8 para 163,4 milhões de barris, 86,3 milhões dos quais pertencentes à Agência Nacional de Petróleo e Gás, enquanto concessionária que viu a sua exportação recuar 19% face a 2019.
JLo do lado errado da história