Empreendimentos do Consórcio BPC–ABC abandonados há três anos
FALÊNCIA. Boa parte dos projectos entre o BPC e o ABC não saiu do papel. Poucos erguidos, entre lojas, restaurantes, bares e hotéis, em Luanda e no Bengo, estão encerrados há três anos sem qualquer explicação. Alguns já foram vandalizados. Plano de construção de 170 hotéis com financiamento suíço e britânico morreu.
Já passaram três anos desde que o Consórcio BPC-ABC fechou as portas de todos os empreendimentos em Luanda e no Bengo, sem apresentar qualquer esclarecimento público do projecto gizado no quadro do Programa de Desenvolvimento Estratégico Multissectorial e do Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) 2013-2017.
O projecto entre o Banco Poupança e Crédito (BPC) e o Angola Business Corporation (ABC) ficou paralisado, sem que se saibam os contornos do negócio. Os poucos empreendimentos erguidos, desde restaurantes, bares, talho, peixaria, discotecas, hotéis, salões de beleza, cooperativa de táxi, foram todos encerrados após as eleições de 2017.
Numa ronda feita pelo VALOR, foi possível constatar o estado de abandono e subaproveitamento. Na via expressa, na zona do Kikuxi próximo à conhecida paragem da Engenvia, encontra-se um dos empreendimentos completamente abandonado. O edifício tem os vidros partidos e outros sinais de vandalização, sem esquecer a vegetação e charcos de água que tomaram conta da parte frontal. Com diversas lojas, defronte ao empreendimento, estão amontoadas várias paletes a apanharem chuva e sol. Segundo frequentadores habituais da zona, o espaço foi aberto em 2017, mas por pouco tempo. “Só sabemos que a empresa faliu. Esteve pouco tempo aberta, havia ainda compartimentos por ocupar”, conta o funcionário de uma oficina nas proximidades.
A poucos quilómetros daí, ainda na via expressa, na paragem da Mutamba, havia um empreendimento do consórcio BPC-ABC. No ano passado, a placa foi removida, o espaço deu lugar a um centro comercial. Já no estádio '11 de Novembro', as lojas, incluindo a cooperativa de táxi, na altura inaugurada pelo então ministro da Juventude e Desportos, José van Dúnem, está de portas fechadas desde 2018. O mesmo aconteceu com outro restaurante localizado no Lar Patriota.
À semelhança, o hotel BPC-ABC, situado na avenida Pedro de Castro van Dúnem 'Loy', com mil quartos e lojas, também se encontra encerrado. Assim como o restaurante, denominado Barça Place, na chamada zona nobre do Alvalade. Ambos, segundo vizinhos, recebem visitas temporárias da direcção do ABC.
No Kikuxi, perto do centro de tratamento de água da Epal, encontra-se o único empreendimento aberto, com alguns funcionários. É o hotel Jenny Kelly. Os demais, no mesmo recinto, uma discoteca, restaurante, talho, boutique e salão de beleza, estão encerrados há três anos.
Não muito diferente do destino das infra-estruturas da capital, no Bengo, todas estão em completo estado de abandono desde 2018. O investimento estimado em mais de 53 milhões de dólares, empregue na construção de um hotel, farmácia, bar, centro de alimentação, discoteca, centro de emponderamento da mulher e de agricultura, ficou entregue à vegetação.
170 HOTÉIS NO SEGREDO DOS DEUSES
Em 2015, o consórcio representado pelo ex-PCA do BPC, Paixão Júnior, e do ABC, João Paulo Tomás, apoiado pelo então Ministério do Turismo, comprometeu-se a construir 170 hotéis, fruto de um financiamento de 1.265 milhões de dólares concedidos pela financiadora britânica Golden Peaks Capital. A previsão era de concluir todos os empreendimentos nas 18 províncias, até 2017, mas nunca veio a ser cumprida sequer meia dúzia.
Entre os 'segredos dos deuses', também ficou a promessa de criação de 275 mil micro, pequenas e médias empresas a nível nacional.
O consórcio chegou a ter a promessa de financiamento do banco suíço Commerce Bank, em projectos agrícolas avaliados em 15 milhões de dólares.
CONSÓRCIO NÃO FORMALIZADO
Uma fonte ligada à actual direcção do BPC revela que o tão mediático consórcio nunca chegou a ser formalizado, por "não ter seguido uma série de trâmites legais". E que, apesar da participação activa de Paixão Júnior, a relação era de banco e cliente. “Existe uma relação entre o cliente ABC e o BPC”, explica fonte, avançando que, “internamente, se estão a apurar as 'nuances' desse negócio.”
João Paulo Tomás, responsável do ABC, rejeitou sistematicamente dar explicações ao VALOR, alegando, durante duas semanas, "não poder falar sem a permissão da direcção do BPC por se tratar de um consórcio". O mesmo justifica Paixão Júnior, que se recusou a falar sobre o consórcio, com o argumento de já não estar na direcção do BPC. Por sua vez, o banco público responsabiliza o ABC, argumentando que cabe à direcção do ABC prestar esclarecimentos sobre empreendimentos abandonados e presos no papel.
O Angola Business Corporation (ABC) é um dos maiores devedores da carteira de malparado do banco público, cuja dívida foi comprada pela Recredit, em 2019.
Na assinatura do protocolo para a construção de 170 hotéis, de duas e três 'estrelas', entre o ABC e a Golden Peaks Capital, Paixão Júnior assumia o BPC apenas como um "intermediário financeiro" entre aquelas duas entidades.
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