A resolução do desenvolvimento

09 Jan. 2017 Sem Autor Opinião

A decisão do Reino Unido de deixar a União Europeia e a eleição de Donald Trump nos EUA trouxeram um descontentamento nos países desenvolvidos. Com razão ou sem ela, culpam a globalização - ou, pelo menos, como ela foi administrada - pela estagnação dos rendimentos, pelo aumento do desemprego e pela crescente insegurança.

Os países em desenvolvimento têm expressado sentimentos semelhantes há muito mais tempo. Embora a globalização tenha trazido muitos benefícios ao mundo em desenvolvimento, muitos se opõem à economia neoliberal. Em particular, o que tem atraído muitas críticas ao longo dos anos, o chamado Consenso de Washington, que apela à liberalização e privatização livres e políticas macroeconômicas que se concentram na inflação, em vez de emprego e crescimento. É hora de rever a sabedoria económica convencional?

A Agência Sueca de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento achou que era uma questão que vale a pena considerar. Assim, convidou 13 economistas de todo o mundo a fazer exactamente isso. Concluímos que algumas das ideias subjacentes à economia tradicional do desenvolvimento podem, de facto, ter ajudado a criar alguns dos desafios que o mundo enfrenta. É agora evidente que a simples manutenção de orçamentos nacionais equilibrados e o controlo da inflação, deixando o mercado para fazer o resto, não gera automaticamente um crescimento sustentado e inclusivo. Com isso em mente, identificamos oito princípios gerais que devem orientar a política de desenvolvimento.

1 – O crescimento do PIB deve ser visto como um meio para um fim, não um fim em si mesmo. O crescimento é importante porque fornece os recursos necessários para reforçar as várias dimensões do bem-estar humano: emprego, consumo sustentável, habitação, saúde, educação e segurança.

2 – A política económica deve promover activamente o desenvolvimento inclusivo. Em vez de esperar que a maré de desenvolvimento levante todos os barcos, os formuladores de políticas devem assegurar que nenhum grupo seja deixado para trás. Devem enfrentar, de frente, as privações - do desemprego para o acesso inadequado aos cuidados de saúde ou à educação - que causam tanto mal aos pobres. Além do imperativo moral, tal abordagem ajudaria a manter o desempenho económico, que pode ser ameaçado pela desigualdade de renda excessiva, por meio de tensões sociais, turbulência política e até mesmo por conflitos violentos. De facto, alguns dos recentes tumultos políticos - incluindo as vitórias de Brexit e de Trump - foram impulsionados em parte pela excessiva desigualdade.

3 - A sustentabilidade ambiental não é uma opção. A nível nacional, o crescimento de rendimentos à custa dos danos ambientais é insustentável e, portanto, inaceitável. A nível global, as alterações climáticas constituem uma ameaça para a saúde, meios de subsistência e ‘habitats’. É imperativo que as políticas de mitigação e adaptação às mudanças climáticas sejam parte integrante da política de desenvolvimento, e não uma adenda.

4 - Precisa haver equilíbrio entre mercado, Estado e comunidade. Os mercados são fundamentalmente instituições sociais e exigem regulamentação para alocar recursos de forma eficiente. No último quarto de século, os mercados sub-regulados foram a causa de muitos resultados económicos adversos, incluindo a crise financeira de 2008 que atingiu níveis insustentáveis de desigualdade. Tanto para os mercados como para os actores não mercantis, o Estado é indispensável para uma regulamentação eficaz. As instituições da sociedade, por sua vez, são essenciais para garantir que o Estado funcione de forma eficiente e justa.

5 – A estabilidade macroeconómica exige flexibilidade política. O conselho político tradicional fetichizou um orçamento equilibrado - às vezes em detrimento da estabilidade macroeconómica. Uma abordagem melhor consideraria os equilíbrios fiscais e externos como restrições de médio prazo. Dessa forma, o estímulo fiscal, tal como o investimento público, pode ajudar a revigorar economias fracas e lançar as bases para o crescimento a longo prazo. A chave é assegurar que a dívida pública e as pressões inflacionárias sejam bem geridas durante os bons tempos.

6- O impacto da mudança tecnológica sobre a desigualdade exige uma atenção especial. Os recentes avanços tecnológicos deslocaram o trabalho, aumentando a participação do capital e, portanto, o nível de desigualdade. Afinal, a automação permite que as empresas gastem menos em salários, aumentando assim os retornos dos accionistas. Infelizmente, o que é fundamentalmente um problema de mão-de-obra, tem sido muitas vezes retratado como um problema laboral, com algumas economias avançadas a afirmar que os países em desenvolvimento estão a tomar os seus empregos. Isso contribui para a rejeição da abertura comercial e apela ao proteccionismo. O que é realmente necessário, no entanto, é a acção para aumentar o capital humano; Adaptar e melhorar os instrumentos de redistribuição do rendimento; Promover a igualdade nos rendimentos.

7 - As normas sociais, valores e mentalidades afectam o desempenho económico. Uma economia funciona melhor quando há confiança. As normas sociais também podem ajudar a conter a corrupção e incentivar práticas justas. A sociedade civil e os governos devem, portanto, promover valores e normas conducentes.

8 – A comunidade internacional tem um papel importante. As forças globais e as políticas nacionais criam externalidades que limitam opções políticas. Talvez o exemplo recente seja o impacto das políticas monetárias dos países avançados nos fluxos de capital dentro e fora das economias emergentes. Outros exemplos incluem restrições à migração, políticas comerciais e regulamentos sobre paraísos fiscais. Somente as instituições internacionais podem gerenciar as externalidades criadas por essas políticas. A chave para garantir que façam de forma justa e eficaz é amplificar a voz dos países em desenvolvimento.

Tal como o fim de 2016, também os velhos modos de pensamento económico que produziram tanta dificuldade e alimentaram tumultos devem acabar. O desenvolvimento económico passado, junto com os avanços no pensamento económico, proporcionaram uma riqueza de percepção sobre o que funciona e o que não funciona. Esse conhecimento deve estar no cerne da nova abordagem do desenvolvimento que o mundo precisa.

 

 

KAUSHIK BASU, ex-economista-chefe do Banco Mundial, professor de Economia na Universidade de Cornell.

FRANCOIS BOURGUIGNON, ex-economista-chefe do Banco Mundial, professor na Faculdade de Economia de Paris.

JUSTIN YIFU LIN, ex-economista-chefe e vice-presidente do Banco Mundial, professor e decano da Escola Nacional de Desenvolvimento da Universidade de Pequim e director fundador do Centro de Pesquisas Econômicas da China.

JOSEPH E. STIGLITZ, Prémio Nobel de Ciências Econômicas em 2001, professor na Universidade de Columbia, co-presidente do Grupo de Peritos de Alto Nível para a Medição do Desempenho Económico e Social Progresso na OCDE