Como vai a política orçamental/fiscal?
A instabilidade económica reflecte-se na execução orçamental. De 2011 a 2013, a economia teve um período de relativa estabilidade que originou execuções acima dos 98%; mesmo o orçamento de 2014 foi executado a 95%. Após a crise, o orçamento de 2015 foi executado em 81%, o de 2016 em 41% e o de 2017 em 88%. A resistência em aceitar as mudanças e em cortar despesas que agradam a diferentes sensibilidades e poderes passou a ser resolvida através de cortes, nem sempre com critérios muito claros e, por vezes, indisciplinados, durante a execução.
A política orçamental foi determinada pela diminuta capacidade da AGT em expandir a base tributária apesar dos diferentes planos e investimentos. Da mesma forma, as contribuições para a Segurança Social também nunca progrediram.
Como os números demonstram, a eficiência da AGT diminuiu ao longo dos anos e a Segurança Social, não só diminuiu como é perfeitamente residual. Esta tendência poderia ser normal numa economia em recessão se a base tributária fosse suficientemente ampla para ser rígida. Nas nossas condições, não apenas reflecte o mau momento da economia mas também a ineficiência das políticas criadas para expandir a base fiscal.
De referir, ainda, que comparando receitas da segurança social a prestações sociais, o quadro é altamente deficitário, ainda que as despesas sejam ridiculamente baixas.
Os impostos petrolíferos, que começaram por representar 75% do PIB Petrolífero não conseguiram manter este nível e reduziram-se drasticamente, em valor absoluto e percentual, à medida que a produção e as margens do negócio se reduziram.
Combinando todos os efeitos, a capacidade de recolha de rendimentos de todas os tipos por parte do Estado reduziu-se, mesmo em percentagem do PIB ...
... e as receitas totais, deflecionadas relativamente à inflação, reduziram-se 70% desde 2013, com as quedas mais acentuadas em 2015 e 2016:
As expectativas de crescimento das receitas, nos orçamentos de 2017 (e 2018) também demonstram que é necessário ser-se muito mais realista nas previsões orçamentais.
A maior parte da despesa corrente sem juros deveria ser rígida em termos nominais. Contudo, à parte as remunerações e transferências sociais, todas as restantes despesas de relevo desceram. Em termos reais, usando a inflação como deflator, a Despesa Corrente Total sem Juros desceu 64%, com 92% de redução nos subsídios, 73% nas compras do Estado, 48% nas Prestações Sociais e 41% nas remunerações. Foi um impressionante apertar do cinto!
Todos estes cortes, que reduziram os rendimentos dos funcionários públicos e beneficiários da Segurança Social; que privaram os departamentos do Estado das necessidades mais básicas como papel, cartões plastificados para cartas e BIs, com consequências dramáticas no sistema de saúde, que conduziram a um grande número de mortes evitáveis; parecem não ter fim à vista enquanto o PIB não descolar e a Dívida não parar de agravar os Juros, ano após ano. Parece que a política oficial, no que concerne à Despesa, nos últimos anos, tem sido, apenas, a de uma desesperada gestão de danos.
Evidentemente que um dos problemas é a ineficiência da administração com muitos procedimentos burocráticos e obsoletos mas também é verdade que os funcionários públicos estão, agora, em geral, mal pagos, os departamentos governamentais sem suprimentos e a Segurança Social não é senão uma ínfima fracção do que deveria ser. Isto significa que a Despesa actual não deve diminuir! Deve ganhar eficiência, reduzir os efectivos das forças de segurança e o número de funcionários públicos, excepto na educação e saúde mas os ganhos devem ser usados para melhorar os serviços; não para diminuir ainda mais a Despesa de funcionamento.
Isso significa que as despesas de investimento se devem reduzir para acomodar orçamentos positivos que ponham fim ao aumento da Dívida e dos Juros!
Olhando para o desdobramento do Investimento Público vemos que, pelo menos metade são apenas investimentos de ostentação em mais edifícios públicos e obras de fachada inúteis, apenas para o deleite e vã-glória de dirigentes nacionais e locais, como: a auto-estrada para o Soyo, aeroportos por tudo quanto é sítio (Ndalatando, Benguela, Lobito, Luau) sem qualquer perspectiva de tráfico; fazendas do Estado improdutivas e abandonadas, etc. É verdade que alguns verdadeiros investimentos são necessários, nomeadamente em escolas, alguns hospitais, distribuição e produção de energia e água, estradas e caminhos de ferro, mas representam apenas metade do investimento, e, deles, mais de metade são apenas reconstruções de infra-estruturas mal projectadas e pior executadas.
Estes 4% do PIB poderiam imediatamente reduzir-se construindo bem, apenas as infra-estruturas necessárias!
O deficit médio, desde 2014, foi de -5%, com -4,5% em 2016 e -5,3% em 2017. A Despesa Total desceu de 40% do PIB, em 2013, para 23% em 2017; pode reduzir-se ainda mais apenas pela remoção do investimento desnecessário, mas encontra-se já dentro de parâmetros aceitáveis. Num país com as nossas carências em serviços públicos e infra-estruturas, não é conveniente que se reduza muito mais.
O que significa que um muito maior esforço deve ser feito do lado da receita, com políticas de incentivo ao crescimento dos negócios e através do alargamento da base tributária.
A economia está, no mínimo, em recessão e, portanto, deve ser ajudada com a redução das taxas de impostos; simultaneamente, o número de contribuintes fiscais tem que aumentar exponencialmente!
O modelo actual está visivelmente esgotado, como é demonstrado pelos números: um número irrisório de grandes empresas, um número reduzido de médias empresas e algumas pequenas empresas e respectivos trabalhadores são, em termos de impostos sobre rendimentos, os contribuintes fiscais, deixando fora do sistema os milhões de micro-negócios individuais que caracterizam o nosso sistema económico.
Existe um mercado informal significativo, cujo modelo de negócios não incorpora impostos. Estes negócios carecem, em geral, de coisas mínimas para prosperar, tais como: locais para o exercício tranquilo da sua actividade e o fim das extorsões e maus-tratos por fiscais, polícias e marginais. Um investimento mínimo nos locais de exercício da actividade, políticas adequadas de fiscalização e taxas mínimas que possam ser acomodadas pelo modelo de negócio é tudo o que é necessário para os organizar, registar e transformar em contribuintes fiscais. O verdadeiro obstáculo parece ser a forma como essas actividades não são, sequer, consideradas como negócios: parece que trabalho árduo com pouco rendimento não faz muito sentido aos olhos da elite dirigente.
Se impostos directos e indirectos podem afectar a economia, os impostos sobre a propriedade, nomeadamente o IPU, pode prosperar sem qualquer alteração das taxas. Não se consegue descortinar o sentido do Estado continuar a vender terrenos sem escritura pública, registo e imediato recenseamento dos proprietários como contribuintes fiscais. A propriedade dos milhares de terrenos e habitações não registados deve ser, imediatamente, legalizada e a base de contribuintes em sede de IPU aumentada exponencialmente; e o não pagamento reprimido com multas usando como garantia a propriedade. A propriedade registada conferiria segurança jurídica ao negócio imobiliário, organizaria os bairros e aumentaria as receitas fiscais.
Complementarmente, a venda de novos terrenos e a legalização dos ocupados deve ser feita a preços de mercado, acabando com a corrupção dos funcionários das administrações e os lucros imorais de quem compra ao Estado a preço bonificado para vender, no dia seguinte, a preço de mercado.
Já o IPU das rendas tem uma taxa absurda que é um convite à evasão fiscal: só os arrendamentos a empresas organizadas pagam este imposto, havendo milhares de arrendamentos fora do sistema fiscal. Uma redução profunda da taxa, complementada com repressão à evasão, poderia tornar socialmente aceitável o pagamento deste imposto, fazendo-o ganhar eficiência.
Em vez de criar políticas simples para aumentar a base fiscal com taxas reduzidas parece que as autoridades insistem no sistema de taxas altas e poucos contribuintes, sufocando a actividade económica, o que resulta na redução do nível de cobrança fiscal como os números demonstram.
*Economista e investigador do CEIC
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